Brasil: extremos de calorões, temporais ciclônicos e um
indígena viu a “água ferver” num lago na recente seca amazônica. Mundo:
geleiras recuam, nível do mar aumenta e verões ficam tórridos com rios secos na
Europa.
No
Brasil, tudo isso começaria, antes sutilmente, há uns 35 anos, quando a
expressão aquecimento global tomou a geral de assalto fazendo-a admitir sentir
verões mais quentes e invernos mais suaves. Mas depois a patuleia esqueceu.
Até
vir a nova extrema-direita e sua onda negacionista que incentivou a série de
crimes socioambientais de larga escala, que ocasionaram nova preocupação
global: a ciência aponta a emergência climática.
História
do calor –
a dança climática acompanha a história da Terra desde que a vida ocupa a terra
firme. Há 12-10 mil anos atrás, a última era glacial deu lugar à era
pós-glacial atual, que permitiu a Revolução Agrícola e as primeiras
cidades. O fator: o aumento de gases-estufa¹ naturais na atmosfera.
A
relação entre clima e tais gases na história geológica é comprovada, mas não
esclarece quais doses foram fatais nas extinções massivas ocorridas. Na era dos
dinos o ar era bem mais saturado do que hoje, e a vida, exuberante.
Os
gases-estufa naturais (gás carbônico, sulfídrico, metano, vapor d’água)
são emitidos por seres vivos e vulcões. Os artificiais (fluoretos e CFCs)
se somam aos naturais por surgirem da ação antrópica (indústria, automóveis,
agro).
Londres,
1850: surgiu a série
histórica de médias por variação térmica periódica. As médias obtidas
revelaram um calor progressivo e contínuo. John Tyndall (1861) descobriu que mais
gás carbônico e vapor d’água retêm mais calor, quanto maior a quantidade.
Comprovados
hoje pela ciência, tais estudos (e os ambientais) são referenciados pelo Painel
Intergovernamental de Ciência do Clima (IPCC) para explicar a progressão
dos dados – e “nova” consequência.
Mudança
climática e emergência – a
mudança gera novo padrão climático com alteração das correntes marinhas e do ar
e eventos meteorológicos e térmicos mais frequentes e intensos conforme os
ciclos térmicos do oceano Pacífico (El Niño e La Niña).
Para
alguns climatologistas, tais eventos resultam da mudança climática. Outros já
os apontam como próprios do novo padrão, sendo as consequências os impactos
diretos na vida humana, no ambiente e na biodiversidade.
Discussões
teóricas à parte, as consequências são: redução da biodiversidade, aumento de
mutações, acidificação do ar e dos oceanos pelo CO2 aéreo excedente, aumento
térmico e de nível do mar e perdas humanas extensas.
O
IPCC alerta governos, mídias e entes econômicos a buscar soluções para capturar
carbono, como recuperação de áreas degradadas, exploração e consumo
conscientes, até a redução de desigualdades sociais.
O
IPCC ressalta que é uma emergência, para ser
resolvida o mais breve possível pelos governantes e pelos setores econômicos os mais diversos, com o fim de salvaguarda do planeta para si próprios.
Entraves – a sugestão do IPCC prevê estudos e ações conjuntas
da ciência, governos e sociedades para resultar em efetividade a longo prazo. O
que, em si, exige recursos vultosos e início para já. Daí encontrar
resistências.
Capitalismo – ele seduz as massas por apostar em menor apelo
popular ao Estado, e defesa ao individualismo e ao consumismo visando o lucro.
Mas, o que isso tem a ver com o artigo? Parece nada a ver, mas tem muita coisa.
Recursos
naturais são sempre explorados para mover a atividade produtiva, o que altera o
ambiente natural e afeta a biodiversidade.
O mercado financeiro fomenta todas as ações relacionadas, num feedback
contínuo.
Já
viemos inseridos num sistema que ameaça o Estado e nos carece de educação socioambiental
para exploração e consumo conscientes. Não por acaso, a educação sempre sofreu
com o descaso político. O meio ambiente então...
Antigo,
o descaso com o meio natural teve seu ápice na era 2016-22. Mas a melhora recente
não combateu a fúria dos criminosos do campo e da floresta, também (bem) pagos
pelos capitalistas do agro e do extrativismo ilegal.
Negacionismo climático – é pregado por grupos sugestionáveis ou ideológicos que negam a realidade da ciência e dos fatos. A indústria paga cientistas para refutar as evidências
científicas, como o ramo tabagista o fez no passado. Os de ordem política serão melhor
abordados no próximo artigo.
Fria
análise final –
na realidade mais crua e fria, o novo padrão nos revela que já estamos em
emergência climática. Repetidamente divulgado, o aviso científico aponta que
ainda é possível prevenir situação pior, por meio das mais diversas medidas.
O desmate
dos meios naturais propicia atmosfera mais seca alterando a distribuição anual
de chuvas e dando mais força a bolhas de alta pressão mais quentes, secas e
duradouras em diferentes e vastas regiões do país. E isso já dá uma lição ao Brasil.
Os brasileiros precisam entender que a exacerbação climática que causamos ao apressarmos o aquecer natural nos impele a desenvolver urgentemente a cultura preventiva além de aprimorar a da remediação. É certo que novos desastres virão, mas podemos prevenir o pior ao investir em infraestrutura adequada.
Mas o desenvolvimento da cultura preventiva para desastres só será possível se nos conscientizarmos de vez que devemos nos adaptar ao novo padrão climático. A prevenção também se define no conselho do IPCC para evitar a piora desse padrão.
Se isso custará muito, não sabemos. Mas antes um caro saindo mais barato do que o barato que sai caro.
Sal Ross - reflexões
Nota da autoria
¹ Gás
carbônico e metano (por processos biológicos) e gás sulfídrico (vulcões).
Outros gases têm origem antrópica, como fluoretos e CFCs.
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A crença de que o "Brasil é país abençoado por Deus, pois não tem terremoto, furacão e tsunami" tem sido abalada por eventos climáticos extremos como calorões duradouros, frios inesperados, ciclones, tempestades e secas que têm se tornado históricos.
Sempre
houve ventos ciclônicos (tornados, ciclones) e demais eventos citados, mas sua
raridade justificou a crença popular. Mas eles estão agora bem mais frequentes
e furiosos, refletindo nova realidade climática a revelar o fator humano.
Fator
acusativo – o fator das atuais
exacerbações climáticas é o mesmo que aponta o dedo acusando os seus
semelhantes, especialmente autoridades – que de fato têm falhado tantas vezes,
como mostra a História.
Mas,
com a exploração midiática intensa e a má politização, a presente tragédia
climática no Rio Grande do Sul revela a nós que há muito mais culpados do que
habitualmente pensamos.
Capital – a prioridade é obter lucros volumosos, seja por
produção e/ou investimento acionário. Meio ambiente só interessa na manutenção
dos recursos de interesse, ou mera publicidade. O resto é só problema político.
Em
geral, governos de países emergentes, ex-colônias europeias devastadas e de
índices sociais ruins, tentam dialogar com os capitalistas que, ironia, lideram eventos de clima e meio ambiente, em que interesses econômicos solapam a visão planetária.
Conspirações
e mentiras – são distorções criadas
pelos negacionistas, que negam a verdade dos fatos, inclusa a ciência. São
grupos ideologizados nos quais valem as convicções e conspirações com força no
meio digital.
Por
aí, conspiração é fantasia destoada da realidade por incompreensão da
realidade ou má intenção. Mentira é a enganação para descreditar ações
sociopolíticas legítimas. Ambas são, em essência, narrativas de
desinformação.
Fortalecido
no bolsonarismo, o negacionismo climático tornou o Brasil ameaça global
entre 2019-22. Com Lula 3, ele continua bastante vivo e confundindo a cabeça de
muita gente. Ainda mais agora.
Caso
gaúcho – o Sul sempre foi sujeito
a tais extremos. Em 1841, a mesma região gaúcha teve uma histórica cheia. 42
anos depois veio a mais extensa, no Sul todo. E 40 anos depois, as mais
recentes (2023-4 no RS). A causa: super El Niño.
O intervalo
de 40 anos entre extremos revela a natural raridade dos super El Niños. O
El Niño moderado implica em chuvas primaveris e invernais menos intensas
no Sudeste-Sul brasileiro. Mas agora a coisa está diferente.
A
atenção deve se centrar no encurtamento dos intervalos entre extremos e
de formação de super El Niño, com aumento exponencial de intensidade e de
frequência gerando eventos cada vez mais desastrosos.
Previstos – os desastres climáticos sulistas já estavam
previstos. A primeira projeção é de 2015, com posteriores confirmações, como a
de 2021. Não houve projeção para medidas preventivas em desastres
climáticos.
Ataques – com três desastres climáticos e espalhe de doenças
por vetores, Lula enfrenta ataques bolsonaristas, parlamentares inclusos. Não
importa quão intensamente atue e invista em recordes bilionários em reconstrução.
Eles
negam a participação do governo federal (Forças Armadas e ministérios) e
estaduais (bombeiros) elogiando só civis voluntários e homenageando empresários
bolsonaristas. Inventam que o governo impede entrega de donativos e que o MST ataca
flagelados com jet skis.
Negam
também a atuação das Cozinhas Solidárias com alimentos do MST. Uma pastora
atribuiu a Deus o flagelo contra terreiros afrobrasileiros (racismo religioso).
Conspirações malucas sobre a mudança climática pipocam fertilmente.
Mal
hediondo – muitas conspirações
revelam incompreensão da verdade dos fatos. Já as fakes bolsonaristas são
um intento de depreciar o mérito do governo, a partir da desconfiança dos solidários
sobre o real destino dos donativos.
Não
é preciso gostar de Lula ou de qualquer outro governante com atuação política
positiva. É preciso apenas reconhecer nenhum político é igual e outro, e que há
os que só entram na vida política para cometer crimes.
A
crítica pessoal ao governo é por ainda não pôr em prática a cultura preventiva,
que começa desde manter a cidade limpa até mitigar desigualdades e preservar as
áreas naturais remanescentes.
Atenção,
patuleia: qualquer impeditivo ao destino final dos donativos não vem do governo
(exceto Edu Leite), somente de quem tem tempo, má intenção e privilégios demais
e muita, muita falta de serviço a prestar. Esses, sim, são os que impedem a
solidariedade e fomentam o ódio: são os verdadeiros assassinos.
Para saber mais
- https://www.brasildefato.com.br/2024/05/15/mundo-devera-viver-era-de-extremos-climaticos-nao-tem-mais-volta-diz-carlos-nobre.
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