#Curiosidade: Microscópio e microscopia eletrônica
Sexto artigo da categoria #Curiosidades, que aborda sobre um dos mais extraordinários instrumentos da ciência moderna, em versão resumida, mas a mais completa possível.
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O desejo do homem ver o diminuto remonta da Antiguidade, por isso ainda se discute quem de fato inventou o primeiro microscópio. Daí atribuírem a Hans Janssen e seu filho Zacharias, fabricantes de óculos, a sua criação em 1590. Mas, pelo visto, era uma lupa, pois não aumentava muito.
O termo microscópio vem do grego (mícron = minúsculo ou diminuto; òptikós = visualizar), e é o mais adequado para a função do aparelho. Afinal, graças a ele sabemos mais sobre o reino do micromundo.
No século XVII, o comerciante holandês Anton Van Leeuvenhoek montou uma engenhoca e, com ela viu materiais minúsculos: embriões de plantas, bactérias, hemácias e espermatozoides animais. As bactérias mediam de 1 a 2 micra (milésimo de milímetro).
O inglês Robert Hooke (séc. XVII) montou protótipo dos modelos ópticos modernos, com mesa de material observável com luz abaixo dela. Notou estruturas de vegetais e de animais, com desenhos fiéis. Os vazios da cortiça foram ele batizou de células (pequenas celas), em comparação com as celas dos monges.
Os microscópios de ambos já apresentavam lentes com resolução de até 0,2 micron - medida ainda válida nos modelos ópticos atuais, pelos quais se seguiram centenas de descobertas científicas. Sem saber, o holandês e o inglês abriram um caminho extraordinário para o progresso da ciência moderna.
O microscópio óptico tem sido tão útil ao desenvolvimento da ciência, que acabou sendo aproveitado em acoplamento a equipamentos eletrônicos, como a informática - um pulo do gato para duas novas etapas: microscópio de contraste de fase e o eletrônico.
Criado por Fritz Zernicke em 1932, o microscópio de contraste de fase é um tipo óptico adaptado, que diferencia os raios luminosos pelo fenômeno da difração1. A difração permite observar através dos objetos, auferindo grande utilidade ao aparelho, e o prémio Nobel ao seu criador em 1953.
-> Microscópio eletrônico (ME)
Como diz o nome, o microscópio eletrônico resulta da tecnologia sofisticada, na combinação de eletrônica com a mecânica, substituindo a luz por feixes de elétrons e lentes eletromagnéticas. O primeiro exemplar foi inventado em 1933 pelo físico holandês Ernst Ruska.
Enquanto os tipos ópticos tem poder ampliador de até 1200x (o feito por Van Leeuvenhoek tinha 280x), o microscópio eletrônico pode aumentar milhões de vezes, levando à visão de objetos invisíveis naqueles. Possui ainda um dispositivo para micrografia (foto).
A invenção se revelou tão valiosa que conferiu a Ruska o prêmio Nobel de Física em 1986 -53 anos depois.
Nesses 87 anos, já foram desenvolvidos modelos cada vez mais sofisticados e com maior capacidade de aumento e qualidade de imagem. O mais potente hoje, desenvolvido pela Hitachi em 2015, tem resolução de 43 picômetros (trilhonésima parte do metro). É muita coisa!
Hoje há vários tipos de microscópio eletrônico, para atender a diversas especificidades. De qualquer forma, as partes principais são: fonte de iluminação, lentes condensadoras, plano de amostra, lentes (objetivas, intermediárias, projetivas), sistema de observação da amostra, sistema de vácuo, canhão (que contém algumas das estruturas citadas).
Basicamente, há dois tipos principais: de transmissão (MET) e de varredura (MEV).
Microscópio eletrônico de transmissão (MET):
É o primeiro tipo, correlato ao invento de Ruska. O feixe de elétrons atravessa uma amostra muito fina, permitindo a visualização através dela. A imagem é ampliada e focada num dispositivo próprio, como uma tela fluorescente numa camada de filme fotográfico, ou sensor tipo câmera CCD. Tons claros e escuros se devem
Os tons claros e escuros das imagens se devem aos graus de absorção de elétrons pela amostra, de acordo com a espessura local em pouca ampliação, ou por interações das ondas em grande ampliação. Isso contribui para uma boa qualidade da imagem, com visualização de mínimos detalhes.
O MET é valioso em estudos diversos, como para análise de câncer, virologia, pesquisa da poluição, em nanotecnologia, semicondutores e ciência dos materiais2. Suas desvantagens estão na exigência de amostras muito finas de preparo trabalhoso (podendo alterar o material), daí ser poucas amostras de sucesso; e pequeno campo de visão, podendo a área analisada diferir do resto da amostra.
Subtipos de MET:
Crioeletrônico: com método a frio, visualização de moléculas grandes (de proteínas e outras).
Por filtração de energia: formação da imagem por elétrons cinéticos ou por padrão de difração.
De alta velocidade ou dinâmica (METD): para análise de fenômenos biológicos, químicos e da ciência de materiais que duram nanosegundos.
De alta resolução: obtenção de imagens de estrutura cristalográfica de sólidos3.
De aberração corrigida: de grande ampliação, para imagens de até 0,05 nanômetro (metade do tamanho do átomo de hidrogênio).
Microscópio eletrônico de varredura (MEV):
Produz, em alta resolução, imagens superficiais tridimensionais, e favorece a análise de composição, forma e outras características da amostra. Um feixe de elétrons é guiado por bobina de deflexão, que "varre" a superfície da amostra e transmite o sinal do detector a uma tela catódica4.
O feixe é emitido por um filamento de tungstênio aquecido e acelerado por alta tensão entre este e o ânodo4, e focalizado sobre a amostra por três lentes eletromagnéticas. O feixe sobre a amostra produz fótons que podem ser detectados e convertidos em sinais de vídeo, ou, em parte sobre a amostra, se difunde e forma volume de interação no qual elétrons e ondas eletromagnéticas formam a imagem.
Os contrastes nas imagens sinalizam três tipos de elétrons, cada tipo com função: I- topografia; II- composição química; e III- consequência das interações do feixe com estruturas do microscópio.
Como a prioridade do MEV é a visualização de superfícies bem detalhadas e tridimensionais, uma vantagem do MEV em relação ao MET é poder usar amostras um pouco mais grossas, com menor margem de perda destas.
O preparo da amostra para MEV depende da natureza, biológica ou não, do material. Há imersão em fixador químico para torná-la estável e condutora no processo. Amostras úmidas são desidratadas por etanol ou acetona, e depois por gás carbônico liquefeito em câmara de pressão. As secas e bem sólidas não precisam ser desidratadas. Depois, há a cobertura de ouro ou carbono por evaporação em câmara.
Para maior detalhamento técnico sobre os princípios e componentes do MEV, vide aqui.
Convencional: o mais comum. Exige bom vácuo, e amostra condutora seca e metalizada.
De baixo vácuo: é como o convencional, mas permite ajuste de pressão para eliminar artefato (ruído como riscos, durante obtenção da imagem pelo feixe de elétrons).
Criogênico: com amostras congeladas, hidratadas, delicadas (tecidos biológicos, hidrogéis, alimentos, biofilmes, etc.). Em materiais mais finos, é possível observar estruturas internas.
Com deixe focado de íons: usa feixe de íons de gálio focado numa sonda menor que 10 nanômetros, que se chocam na superfície do material e criam elétrons secundários.
Ambiental: análise de biomateriais em estado natural, sem preparo à moda do convencional. Possui uma câmara no interior que controla a umidade do material.
De baixa voltagem: subtipo mais recente, usa elétrons a baixa voltagem dispensando a metalização da amostra permitindo observação direta de estrutura de polímeros semicristalinos sem preparo prévio.
*Tunelamento: sonda aplica tensão elétrica sobre a amostra, por um sistema de altíssima precisão. Se a ponta da sonda for movida, alterações na imagem são mapeadas em imagens, cuja resolução permite se observar átomos. É às vezes considerado um tipo à parte, mas basicamente é por varredura.
-> Reflexões
Após uma leitura mais aprofundada nas fontes abaixo relacionadas, poderão surgir entre os leitores, em geral leigos, qual dos principais tipos , MEV ou MET, é melhor. Na realidade, dadas as especificidades de suas funções e finalidades, todos se revelam igualmente essenciais para a ciência do micromundo.
A verdade é que cada tipo de microscópio descrito neste artigo tem o seu valor determinado. Mesmo os microscópios ópticos em geral, que têm capacidades de aumento limitadas, tanto é que até hoje são imprescindíveis mesmo em plena era da crescente sofisticação tecnológica dos MEs.
Dependendo da natureza da amostra, o MEV pode ter vantagem relativa em matéria de preparo, e quanto à revelação da forma e composição do material. Mas, são vantagens apenas relativas, pois imagens em METs tendem a revelar estruturas fantásticas do interior dos objetos, a gerar uma infinidade de ricas informações para os pesquisadores.
O que se pode afirmar é que, nas imagens obtidas METs e MEVs contribuem valorosamente para somar a gama de informações que cada vista oferece. Destarte, o que importa conclusivamente é que, desde os seus primórdios, a microscopia só veio para promover o bem da ciência, daí ser tão fascinante, apesar de alguns males produzidos na história.
Mas é bom saber: os males em nome da ciência são exclusivamente humanos, mas predominam os bons. Ainda bem.
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Notas da autoria:
1. Física: flexão das ondas de luz em torno de obstáculos ou seu desdobramento ao passar por orifícios.
2. Ciência interdisciplinar que estuda o caráter dos materiais, na relação entre a parte atômica/molecular e a macroscópica.
3. Na área da Mineralogia (Geologia), mais especificamente no estudo de estruturas moleculares de cristais naturais.
4. Cátodo: eletrodo de polo positivo, 'ganha' elétrons; ânodo: eletrodo de polo negativo, 'perde' elétrons.
Imagens: Google (microscópios de Hooke e Van Leeuvenhoek; e microscópio eletrônico)
Para saber mais:
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio#:~:text=Acredita%2Dse%20que%20o%20microsc%C3%B3pio,dois%20holandeses%20fabricantes%20de%20%C3%B3culos.&text=Foi%20tamb%C3%A9m%20Leeuwenhoek%20quem%20descobriu,hoje%20conhecidos%20como%20micro%2Dorganismos.
- https://kasvi.com.br/microscopio-microscopia-historia-evolucao/
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_de_contraste_de_fase
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_eletr%C3%B4nico
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_eletr%C3%B4nico_de_transmiss%C3%A3o
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microscopia_eletr%C3%B4nica_de_transmiss%C3%A3o_por_filtra%C3%A7%C3%A3o_de_energia
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_eletr%C3%B4nico_de_transmiss%C3%A3o_de_aberra%C3%A7%C3%A3o_corrigida
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia_dos_materiais
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_eletr%C3%B4nico_de_varredura
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsc%C3%B3pio_eletr%C3%B4nico_de_transmiss%C3%A3o
- https://www.uol.com.br/tilt/ultimas-noticias/efe/2015/02/20/microscopio-mais-potente-do-mundo-e-desenvolvido-no-japao.htm#:~:text=O%20fabricante%20tecnol%C3%B3gico%20japon%C3%AAs%20Hitachi,de%20not%C3%ADcias%20Efe%20esta%20empresa.
- https://www.coladaweb.com/quimica/eletroquimica/eletroquimica-e-pilha
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