quarta-feira, 29 de maio de 2019

Damares Alves: cortina de fumaça, ou de chumbo?
     Apesar de mencionada em outros artigos deste blog, Damares Alves merece menção própria à parte, não por sua pessoa em si, mas por suas declarações um tanto quanto polêmicas.
     Damares nasceu no Paraná, filha de migrantes nordestinos evangélicos pentecostais. Seu pai era pastor de uma pequena igreja e nesse ambiente ela e os irmãos cresceram.
    Sua infância foi dificultada pelo trauma dos abusos sexuais cometidos por um pastor, amigo próximo de seu pai que por vezes fazia orações na casa. Ela contou aos pais, que não a levaram a sério. Cresceu com trauma e tudo, mesmo após o abusador ter se afastado anos depois.
     Já adulta, Damares cursou Pedagogia, mas aparentemente não exerceu o magistério. Logo acolheu-se na formação religiosa, tornando-se a pastora que conhecemos atualmente.
     Nomeada por Bolsonaro como ministra da pasta da Mulher e dos Direitos Humanos, ela se mostrou conservadora e antifeminista. E também ganhou notoriedade por muitas declarações, algumas polêmicas, outras insólitas.
     Nas redes sociais, humor crítico ao lado do trauma reconhecido. Vídeos de cultos em que se originaram muitas das declarações, como a da mamadeira de piroca e a do kit gay. Já ministra, a ideia de Igreja sobre o Estado, mulher submissa, menino de azul e menina de rosa. Propõe a criminalização do aborto mesmo nas condições previstas em lei.
     Em paralelo, também nas redes sociais, foram divulgadas matérias apontando suposto envolvimento de Damares em sequestro de crianças indígenas, mas até o momento, sem comprovação, nem se tais notícias são falsas ou verdadeiras.
     Além das críticas humoradas, as declarações da ministra são minimizadas por internautas nas redes sociais, como "cortina de fumaça" estratégica do governo para distrair o público quanto às mais pérfidas políticas em tramitação.
     Talvez essa reflexão tenha causado questionamentos importantes pela Comissão de Direitos Humanos na Câmara, sobre as consequências da criminalização da educação sexual na escola e do aborto em qualquer caso, a realidade do papel social atual da mulher, a política da pasta para atendimento a mulheres em vulnerabilidade.
     Mesmo depois dessas paradas na Câmara, Damares ainda "causa": a mais nova e insólita declaração é a de um suposto caso gay por baixo da amizade entre os famosos personagens marinhos Bob Esponja e Patrick, do engraçado desenho animado televisivo.
     Se o momento Damares é só uma cortina de fumaça mesmo, não dá para saber direto. Mas vale repensar, pois em paralelo a isso, há quem veja com preocupação o significado disso. O que é bastante compreensível.
     Afial, vale análise cruzando os dados: enquanto a ministra segue sem proposta coerente, os "direitos humanos para humanos direitos" seguem em frente: aumento de índices de estupros e outras violações de gênero, incluindo crianças e outros grupos vulneráveis.
    E vale cruzar análise com a agenda presidencial com decretos e propostas impopulares e cerceadoras, ideológico-religiosas, em comum com Paulo Guedes e Damares juntos. Ah,e tem o moralismo de Mandetta na saúde, com relação à política de HIV/DST co proposta de negar atendimento aos infectados e às mulheres violadas pelo SUS.
     Diante de tudo isso, vale a pergunta: a cortina de Damares pode não ser exatamente de fumaça, mas de ferro e chumbo.


   
   
   



   
LGBTIs x conservadores: conceitos de relações em conflito

     Política de ódio bolsonarista e religiosa radical à parte, o objetivo principal deste artigo é, a priori, destrinchar os conceitos de relações humanas na ótica da orientação sexual.
     Homofobia, transfobia e homotransfobia são termos usados para identificar e caracterizar relações discriminatórias contra pessoas LGBTI, mesmo sutis. Mas, será que todo tratamento diferenciado a um LGBTI pode ser rotulado assim?
     Os termos, gregos, têm o radical phobos, que significa aversão. Assim, o primeiro é aversão aos homossexuais, o segundo aos transexuais, e o último, a todos. Em geral, toda pessoa homofóbica é transfóbica sendo, portanto, homotransfóbica.
     "Homofobia" é usada em várias fontes há mais tempo, os demais termos surgiram depois, na medida em que a mentalidade coletiva, a comunidade acadêmica e mesmo a OMS passaram a reconhecer a diversidade sexual como elemento da natureza humana.
     Expressões francamente homotransfóbicas, algumas bem delituosas, são cada vez mais denunciadas, mas quase sempre sem solução. O Brasil é considerado campeão em homicídios, com quase 500 registros em 2017. Fora os muitos casos não notificados.
     Todavia, no ambiente de trabalho a sutileza predomina, o que dificulta ou impossibilita a denúncia. Há constante disfarce por elogios, hipócritas ou sinceros. E as pausas do cafezinho são quase sempre agradáveis.
     Aí vem a pergunta: pode haver homotransfobia durante uma amistosa pausa do cafezinho?
     Nesses casos, a dúvida é benéfica e suscita reflexão saudável. Recentemente, ouvi de um colega a confissão de ser homofóbico, embora nossas relações sejam "normais". Outra colega diz ensinar a filha a conviver com a diversidade, embora desconsidere homossexualidade e transexualidade normais à nossa natureza.
     É muito difícil, ou impossível, qualificar como homofobia uma relação mais distante ou fria de colegas ou chefes sem indícios. A possibilidade, nesses casos, se limita a flagrantes sobre declarações com outros, na expressão de uma aversão contida.
     A despeito da extrema discrição rotineira, a homotransfobia é real. Ela tem fundamentos bem sólidos, havendo no fundo religioso o fator de base, que permeia a educação familiar e determina os conceitos tradicionais de sexualidade.
     Num governo largamente conservador, nas vestes do cristofascismo, resta-nos saber se a sexualidade será realmente contida pelas normas. Acredito que não, pois a natureza instintiva humana tem semostrado mais poderosa que as leis e tradições ao long da história, e não é em plena era da informação que ela será subjugada politicamente.
 

sábado, 18 de maio de 2019

#15M: a resistência ao governo que deseduca

     Entre o fim de abril e o incio de maio deste ano, o ministro Abraham Weintraub anunciou cortes nas universidades federais. A alegação divulgada pelas mídias foi a de "balbúrdia" dos universitários, ensinada por "doutrinadores do marxismo cultural".
     Com a forte reação negativa do público, Weintraub disse: "é contingenciamento, não corte", o que, como se sabe, na prática é a mesma coisa. Emendou que o dinheiro será investido na educação básica, mas anunciou logo em seguida um corte de R$ 2,4 bilhões na área básica.
     Em consequência, pesquisadores mostraram preocupação com o futuro da qualificação técnica, científica, tecnológica e intelectual no país, explicando as influências nefastas diretas para o próprio investimento e o mercado de trabalho qualificado no país.
     Do ensino básico, educadores e outros servidores apontavam riscos salariais, nas condições de trabalho e na disponibilidade alimentar: para muitos alunos carentes, a merenda é a grande refeição do dia e grande incentivador nos estudos.
     Em resposta, estudantes, professores e funcionários de universidades e escolas públicas e privadas anunciaram reação coletiva à medida. Numa rede solidária, trabalhadores e servidores públicos de vários ramos decidem cruzar os braços em 15 de maio: surge o #15M.
     O #15M também teve o nome "TsunamidaEducação", em referência a Bolsonaro anunciar um "tsunami de novas medidas" para breve, antes de viajar para Dallas (EUA).
     Para os organizadores, o #15M já se configura histórico. E não sem razão: não era esperado em um momento de forte influência beligerante da extrema-direita bolsonarista, com ameaça à democracia. Foi largamente reportado, com repercussão internacional em rede social.
     Outro elemento indicador foi a pluralidade convergida no coletivismo solidário, que mostrou a amplitude do movimento, que se tornou o maior e mais bem organizado desde o início da era Bolsonaro, bem como a indignação popular com os cortes e o governo.
     A amplitude do #15M, se mencionada em números, o torna o maior desde as Jornadas de 2013, por sua presença nacional em mais de 180 cidades com a participação de centenas de milhares de pessoas. Um tsunami em confronto com o bolsonarismo.
     Os cartazes exibidos traduzindo "balbúrdia" como os ataques do governo à vida pública e à educação, ou como as pesquisas desenvolvidas principalmente nas universidades públicas, e a contribuição da filosofia em questões científicas e da sociologia sobre a vida social.
     O #15M também deu visibilidade aos problemas enfrentados pela saúde pública e ao Dia Mundial de Combate à LGBTfobia, também lembrado no país inteiro.
     Nesse sentido, ao #15M é possível auferir conclusivamente que assume status histórico em razão da sua grandeza solidária, plural e dominantemente libertária. Uma reação educativa de resistência a um governo que deseduca.
     

     

quarta-feira, 15 de maio de 2019

Sabatinas dos ministros: mostras de um governo mal proposto

     Quando candidato, Bolsonaro prometera mexer nos ministérios para "acabar com tudo que tá aí". De fato enxugou bastante, extinguindo pastas importantes e rebaixando outras em outras que viraram "superministérios", como as da Economia, Justiça e Agricultura.
     Como disse Paulo Guedes (Economia), os ministros devem ter um "perfil técnico", com "novas propostas", e não político.
     De fato, Paulo Guedes é economista, Sérgio Moro juiz, Ricardo Vélez filósofo, e Ernesto Araújo nas Relações Exteriores, todos de linha conservadora, animando eleitores e mercado. Mas, dados os últimos fatos, ter uma atuação puramente técnica é suficiente?
     Inteiramente relativa às sabatinas no Congresso aos ministros, a resposta se deslinda, a ser interpretada inteiramente pelos leitores deste blog.
     Dos ministros sabatinados, dois apresentaram propostas: Moro com o pacote anticrime, e Guedes com aperfeiçoada "reforma" da previdência de Temer. Mas os sem propostas também o foram, como Araújo, Vélez, e Damares Alves, dos direitos humanos.
     Apesar de agressivo na defesa dos pontos mais críticos da proposta e ao revidar ao deboche do petista Zeca Dirceu, Guedes respondia às perguntas. Por sua vez, Moro foi bem reservado, como de costume, ao explicar seu criticado pacote anticrime. E os demais?
     À comissão de direitos humanos da câmara, Damares elogiou as jovens Tábata Amaral e Sâmia Bomfim e se emocionou ao aceno respeitoso da petista Maria do Rosário. A despeito de seu interesse, ela pecou no viés religioso e antifeminista na sua política para a mulher, o que destoa da complexa realidade das relações de gênero e dos valores sociais.
     Hesitação e total inconsistência foram as marcas registradas de Araújo e Vélez. Nervoso, o diplomata se esquivava em balbucios equivocados. Vélez sequer explicou o idiossincrásico slogan do governo após o Hino Nacional em carta às escolas, sendo igualmente esquivo. Após o banho de Tábata Amaral, acabou saindo de vez pela porta do esquecimento.
     Substituto de Vélez no MEC, o economista Abraham Weintraub acusou haver "balbúrdia" nas universidades, por conta da "liberdade excessiva concedida pelo PT", e justificou o "contingenciamento (corte) orçamentário" médio de 30%, que atingiu até a educação básica.
     Uma saraivada de críticas lotou a internet, nas redes sociais. A contundente repercussão levou à inserção da educação no tema dos protestos de ontem e hoje. O ministro foi convocado para se explicar na Câmara à comissão de educação, e Bolsonaro zarpou aos EUA onde se sentiu à vontade para chamar os manifestantes de "idiotas úteis" (do PT, claro).
      Até o momento, duas informações totalmente opostas circulam nos corredores enquanto os protestos do "Tsunami da educação" rolam nas ruas do país: a de que o ministro teria recuado do corte, e a outra que sustenta que mantém o corte. Uma sopa de supostas verdades e mentiras ainda a serem desvendadas.
      Enfim. Entre estas e outras sabatinas, sobram trocas de farpas nas casas legislativas com os ministros e o festival de polêmicas ainda permanecerão. Entre ministros sem propostas, outros bem agressivos e outros fundamentalistas, o certo é que nas sabatinas há dois destaques bem positivos: a atuação da oposição, e dos movimentos populares.
     

   
   
   

     

CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...