Suicídio: um tabu crescente
Terceiro artigo da série #Curiosidades, falando sobre um tema abordado em todos os setembros. Também foi uma sugestão. Mesmo saindo de setembro, sempre vale a pena abordá-lo, o que se merece por todos os meses, todos os dias.
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Todas as culturas têm assuntos tabus, que são evitados de se falar abertamente. Eles ocorrem mesmo em países tops em educação. Um deles é o suicídio, tema deste artigo. Por que esse acanhamento de falar de uma realidade aos nossos olhos?
Inicialmente, falar de suicídio já remete ao tema da morte, que ainda vemos como um dos maiores temores e mistérios humanos. Temos naturalmente um instinto em viver, mesmo com tantos problemas a resolver.
Inicialmente, falar de suicídio já remete ao tema da morte, que ainda vemos como um dos maiores temores e mistérios humanos. Temos naturalmente um instinto em viver, mesmo com tantos problemas a resolver.
A explicação está em posições culturais ou religiosas: na concepção judaico-católica, se suicidar confronta com as leis de Deus que visam a perpetuação da vida e veem no tirar a própria vida o purgatório da alma.
Para os kardecistas, o espírito do suicida se destina ao Vale dos Suicidas, versão do purgatório católico, onde esses espíritos, eternamente transtornados pelo sofrimento terreno que levou ao ato extremo, vivem a eterna procura da sua já impossível solução. Os afro-brasileiros adotaram concepção muito parecida ou idêntica, conforme a corrente.
Entre os evangélicos, o purgatório ou não existe ou é o inferno propriamente dito: é oito ou oitenta. Portanto, falar naturalmente de suicídio é mais problemático ainda, é coisa de poucos. Como o suicídio é pecado mortal, a alma padece no inferno.
Mas, na maioria das nações a ciência ganha lugar crescente, paralelo à fé. Assim o suicídio ganha mais espaço para se debater junto ao público. Até no Brasil, país que faz piadinhas com forte pitada de mau gosto, a ciência cresce, o que é uma luz no fim do túnel num país religioso.
Suicídio é um termo que vem do grego, significando "tirar a própria vida" ou "matar a si próprio" - um homicídio de si mesmo. É o ato extremo de alguém que já perdeu toda a esperança em minar sua carga de sofrimento ou o que levou a tanto sofrer. É uma definição genérica com causalidade ainda muito debatida em dados específicos e técnicos.
A Psiquiatria e a Psicologia veem no suicídio a consequência última e extrema de agravo de transtorno mental preexistente (depressão ou episódio esquizofrênico ou psicótico de origem diversa, inclusive abuso de drogas). Psicólogos não descartam fatores que geram o sofrimento enorme por perda total de esperança em resolver sua causa-base.
O grande mistério para essas áreas é o mecanismo psíquico que leva os pacientes ao ápice da aflição, no qual adentram, sem conseguir se conter, em incessante ideação suicida. Por isso que o tratamento mais adequado sempre envolve medicamentos e psicoterapia para empurrar o doente a enfrentar e vencer a doença e recuperar as esperanças e o prazer de viver.
O grande mistério para essas áreas é o mecanismo psíquico que leva os pacientes ao ápice da aflição, no qual adentram, sem conseguir se conter, em incessante ideação suicida. Por isso que o tratamento mais adequado sempre envolve medicamentos e psicoterapia para empurrar o doente a enfrentar e vencer a doença e recuperar as esperanças e o prazer de viver.
Na biologia há uma tese de que não haver suicídio entre outros animais, na suposta falta de consciência subjetiva, daí a ilusão de baleias se encalhar para se matar, por exemplo. Todavia, experimentalmente se percebeu que primatas têm capacidade de reconhecer seus semelhantes como outros. Nesse sentido, é coisa para se pensar.
Superpopulação: o mito dos lemingues* poderia servir para a nossa espécie, visto que, em versão piorada, viramos praga: nosso aumento populacional hoje é mais rápido do que há 100 anos, e a exploração-consumo de recursos naturais se acelera, o que, supostamente, nos levaria a um autocolapso em massa em ápice de desequilíbrio. Mas, isso é mera suposição...
Spoiler: quem acha que com a quarentena de Covid19 a Terra mostrou "recuperação rápida" se iludiu: pequenas mudanças pontuais não correspondem à realidade do todo.
Superpopulação: o mito dos lemingues* poderia servir para a nossa espécie, visto que, em versão piorada, viramos praga: nosso aumento populacional hoje é mais rápido do que há 100 anos, e a exploração-consumo de recursos naturais se acelera, o que, supostamente, nos levaria a um autocolapso em massa em ápice de desequilíbrio. Mas, isso é mera suposição...
Spoiler: quem acha que com a quarentena de Covid19 a Terra mostrou "recuperação rápida" se iludiu: pequenas mudanças pontuais não correspondem à realidade do todo.
Na Sociologia, Émile Durkheim, eminência parda da área entre os séculos XIX e XX, vê no suicídio uma "trágica denúncia de uma crise coletiva", ou civilizatória, em um contexto amplo de "capitalismo puro" que prega um individualismo solitário, em vez da profunda e atraente individualidade.
A visão sociológica importa, por estarmos há 30 anos nesse contexto**. Afinal, desde então o mix de relações fugazes, individualismo, consumismo e solidão aumentou muito, havendo um acompanhamento dos índices de suicídio, em especial onde os dados eram mais baixos.
No Brasil e outros países em situação similar, a tal contexto se juntam políticas regressivas, desemprego ou perda rápida de renda, ameaças à função social do Estado e omissão na tragédia do Covid19 que podem engatilhar aumento nas taxas de suicídio. É uma hipótese plausível, já que muitos se dizem ansiosos ou depressivos com a quarentena.
A visão sociológica importa, por estarmos há 30 anos nesse contexto**. Afinal, desde então o mix de relações fugazes, individualismo, consumismo e solidão aumentou muito, havendo um acompanhamento dos índices de suicídio, em especial onde os dados eram mais baixos.
No Brasil e outros países em situação similar, a tal contexto se juntam políticas regressivas, desemprego ou perda rápida de renda, ameaças à função social do Estado e omissão na tragédia do Covid19 que podem engatilhar aumento nas taxas de suicídio. É uma hipótese plausível, já que muitos se dizem ansiosos ou depressivos com a quarentena.
Segundo a OMS, ocorre um suicídio a cada 40 segundos no mundo. Embora os líderes do ranking estejam no Hemisfério Norte, países africanos e latino americanos têm subido em suas taxas. No Brasil é a segunda maior causa de morte de jovens entre 18 e 24 anos, e hoje alcança o 8ºlugar, à frente de alguns "tradicionais"***, como a famosa Escandinávia.
Os transtornos mentais são uma realidade, devem ser assumidos e merecer o tratamento adequado e humanizado por profissionais habilitados. Mas também se deve reconhecer o valor da função social do Estado na saúde e outros serviços, quebrando o excesso hegemônico do contexto de desregulamentação financeira, cuja única função é perpetuar o stablishment de extenuação geral em seu nome.
A contribuição conjunta das necessidades sociopolíticas para minimização dos problemas e o investimento integral às necessidades de saúde podem servir, quiçá, de amortecedores do avanço do suicídio no mundo. Mas, uma vez imposta globalmente essa ação conjunta, e as taxas continuarem avançando, aí será outro desafio: resolver um novo mistério humano.
Os transtornos mentais são uma realidade, devem ser assumidos e merecer o tratamento adequado e humanizado por profissionais habilitados. Mas também se deve reconhecer o valor da função social do Estado na saúde e outros serviços, quebrando o excesso hegemônico do contexto de desregulamentação financeira, cuja única função é perpetuar o stablishment de extenuação geral em seu nome.
A contribuição conjunta das necessidades sociopolíticas para minimização dos problemas e o investimento integral às necessidades de saúde podem servir, quiçá, de amortecedores do avanço do suicídio no mundo. Mas, uma vez imposta globalmente essa ação conjunta, e as taxas continuarem avançando, aí será outro desafio: resolver um novo mistério humano.
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Atenção: os trechos em azul e roxo são linkados com algumas das fontes abaixo listadas.
Notas da autoria:
Notas da autoria:
*Pequenos roedores do norte da Escandinávia que, ciclicamente, aumentam rapidamente suas populações locais, o que esgota o estoque alimentar local. Eles se dispersam em busca de novas fontes de alimento abundante. Por que eles quase desaparecem e retomam grandes populações a cada 3-4 anos ainda é um mistério.
**O contexto referido é o do atual capitalismo financeiro, no qual persistem características do industrial, como a sociedade de consumo, mas dependente de aplicações financeiras diversas.
***Alguns destes se perpetuam como tradicionais, como EUA, Rússia e Japão.
**O contexto referido é o do atual capitalismo financeiro, no qual persistem características do industrial, como a sociedade de consumo, mas dependente de aplicações financeiras diversas.
***Alguns destes se perpetuam como tradicionais, como EUA, Rússia e Japão.
Para saber mais:
- https://psicologado.com.br/atuacao/psicologia-social/suicidio-um-homicidio-de-si-mesmo
- http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932008000400005
- http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/anexos/AnaisXIVENA/conteudo/html/sessoes/2902_sessoes_resumo.htm
- https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2013/12/Suicidio-FINAL-revisao61.pdf
- http://periodicos.uniarp.edu.br/index.php/ries/article/view/236/285
- https://www.editorarealize.com.br/editora/anais/conbracis/2017/TRABALHO_EV071_MD1_SA5_ID1568_30042017192612.pdf
- https://darwinianas.com/2019/05/21/animais-nao-humanos-cometem-suicidio/
- https://www.megacurioso.com.br/animais/89373-e-verdade-que-os-lemingues-cometem-suicidio-coletivo.htm
- https://www.megacurioso.com.br/animais/89373-e-verdade-que-os-lemingues-cometem-suicidio-coletivo.htm
- https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2019/09/09/suicidio-mata-uma-pessoa-a-cada-40-segundos-no-mundo-diz-oms.ghtml
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Suic%C3%ADdio_no_Brasil
- https://www.ecodebate.com.br/2019/02/01/as-taxas-de-suicidio-no-mundo-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
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