segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

# O perfeccionista ao extremo


Às vezes lidamos com gente tão perfeccionista que chega a nos dar aflição. É sobre essas pessoas que se trata o décimo-terceiro artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de personalidade.
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     Ele se esmera no seu escritório nos mínimos detalhes. Maços de papel perfeitos, o monitor e o teclado à frente bem alinhados. Pastas organizadas por cor no armário. Tudo impecável, perfeito
     A equipe se acostumou ao seu jeito, mas não à chatice. Uma manchinha na mesa motiva reclames. Os demais não sabem, mas ele tem um transtorno, silenciado pela vergonha.
     Este artigo tem por objetivo versar sobre dois transtornos psíquicos bem parecidos, mas distintos.

-> Dois transtornos, uma confusão
     
     Este tópico visa mostrar distinções sobre dois fenômenos muito confundíveis pela semelhança, mas diferentes: o Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva (TPOC) e o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC).

TPOC: características gerais
     É um fenômeno psíquico de preocupação exagerada com a organização, muita inflexibilidade e perfeccionismo que pode interferir nas tarefas cotidianas. O sujeito TPOC é rígido, inflexível, teimoso e desconfiado, recusando ajuda em suas tarefas e tendo atuação solitária.
     Ele se preocupa tanto com perfeição e controle que tudo tem que ser feito de modo bem específico. Verifica detalhes minuciosos, listas, documentos, procedimentos, cronogramas e regras. Daí não terem bom proveito de tempo, atrasando a conclusão de tarefas importantes.
     Com a equipe, pode mostrar lista de detalhes a serem seguidos, se chateando (ou negando) com alternativa sugerida por colegas. Sua excessiva dedicação ao trabalho e produtividade pode deixar em segundo plano o lazer, que deve ser perfeito para ser vivido.
     É afetivamente muito controlado, sério ou formal. Pode ser racionalista e não tolerar uma expressão emocional. Pode ser fanático e moralista consigo e com os outros. É obediente aos superiores e defende seguimento exato das regras, sem tolerar atenuantes circunstanciais.
     Prevalência: varia de 2,1% a 8% na população geral; mais comum entre homens.
     Comorbidade: depressão maior ou distímica; abusos de álcool. A maioria dos casos é isolada.
     Etiologia: possivelmente traço familiar de compulsividade, perfeccionismo e rigidez.
     Diagnóstico: critério específico DSM-V; sinais-chave: preocupação persistente com perfeccionismo, ordem. Outros: preocupação (detalhes, regras, horário, etc.); esforço de perfeição que interfere no tempo; dedicação excessiva ao trabalho; rigidez excessiva; relutar em  dividir tarefas; etc. 
     Diferencial: TOC (obsessão com ritualismos?, ou com ordem e perfeição?); TPEsquiva (isolamento social se deve ao trabalho ou para evitar relações?); TPEsquizoide (formalidade por rigidez extrema ou por incapacidade de intimidade?)
     Tratamento: psicoterapia psicodinâmica e medicação com inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs).

TOC: características gerais
     É um fenômeno psiquiátrico com pensamentos, compulsões e obsessões indesejados, recorrentes e persistentes, e comportamentos repetitivos (compulsões) inconscientes para tentar minar ou prevenir a ansiedade ligada às obsessões. Tem gravidade bem variável e gera sofrimento ao paciente.
     A tríade indesejada causa angústia ou ansiedade acentuada. Os pensamentos intrusos são de danos, riscos a si e/ou a outrem, contaminação, dúvida, perda ou agressão. Esses pensamentos impulsionam atos repetitivos (compulsões). O paciente luta para inibir pensamentos e compulsões.
     As compulsões são várias: asseios, verificações de detalhes, contagem, ordenação de objetos em padrão específico. Especialmente se ligadas a eventos reais, são feitas várias vezes por dia. Em casos extremos, a soma sintomática interfere tanto na vida do paciente que este tem incapacidade laboral.
     A luta do paciente contra a ansiedade se deve por reconhecer serem infundadas muitos pensamentos, mas, conscientemente ou não, considera outros razoáveis. Esconde seus ritos e obsessões temendo os constrangimentos e estigmas. Daí romperem relações afetivas e se isolarem socialmente.
     Prevalência: de 1 a 2% da população geral, maioria no sexo feminino (EUA).
     Comorbidade: ansiedade (76%), bipolar (63%), depressão maior (41%), TPOC (23 a 32%).
     Etiologia: componente possivelmente familiar ou pressão ambiental (inconclusivo)
     Diagnóstico: história clínica dos pensamentos e compulsões que demoram pelo menos 1 h/vez1. O diferencial com TPOC é principalmente pela conduta psíquica e comportamento.
     Tratamento: Psicoterapia de exposição e prevenção de rituais, e medicação com clomipramina ou ISRSs. 

-> Considerações finais

     O objetivo inicial deste artigo foi, na medida do possível, expor diferenças de dois transtornos, que são confundidos pelas semelhanças de nome. Mas vale nessas considerações finais expor mais uns dados importantes.
     É possível que a maioria dos leitores possa identificar em si a presença de um comportamento ritual ou, então, uma preocupação intensa em organizar as coisas ou esmiuçar detalhes. Mas identidade de um caractere ou outro não vai significar, necessariamente, um diagnóstico. 
     Um motivo que pode explicar isso é a exigência contemporânea, aliada à sofisticação tecnológica incessante que impõe novos detalhes em tarefas e, daí, novas preocupações que podem nos deixar ansiosos ou preocupados em organizar dados.
     Pacientes com qualquer um desses transtornos são, de fato, estigmatizados, e como há confusão, ambos os transtornos são tidos pelo senso comum como TOC. Justamente porque possamos ter um ou mais caracteres encaixáveis com um dos males, devemos sempre refletir antes de julgar.
     Os pacientes TOC e TPOC devem assumir assumir as suas respectivas condições, e pelo sofrimento ocasionado, procurar um profissional. O TOC necessita de ajuda psiquiátrica, mas muitos psiquiatras fazem psicoterapia, o que facilita muito diante da crescente dificuldade de acesso a psicólogos.
     Para os pacientes TPOC, a ajuda profissional é a garantia de melhora plena dos "defeitos". Para os TOC, pode ser o passo da melhora plena ou mesmo a cura. É o caminho para a conquista de uma vida praticamente normal e de qualidade.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. H/vez: hora por vez (abreviatura)

Para saber mais
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-obsessivo-compulsiva-tpoc
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtorno-obsessivo-compulsivo-e-transtornos-relacionados/transtorno-obsessivo-compulsivo
- https://www.psicologiasdobrasil.com.br/voce-sabia-que-transtorno-obsessivo-compulsivo-toc-e-diferente-de-transtorno-da-personalidade-obsessivo-compulsiva/


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