Quando Jair Bolsonaro subiu ao poder, mais pela graça de mais de 40 milhões dos que se abstiveram de votar (maioria se ausentou) do que pelos 36 milhões que seus eleitores, mais de 8000 milicos ocuparam troscentos cargos de confiança só em Brasília. Ok, disso sabemos, e o resto é história, sem mais delongas aqui.
Agora na reta final de mandato e em segundo lugar, Bolsonaro tem se preocupado com a liderança constante de Lula. Não consegue entender porque nem o Auxílio Brasil e outras medidas de última hora não surtiram o efeito desejado. Mas segue com seus apoiadores de fé.
O ganho na preferência popular na última pesquisa se deve à desistência de Sergio Moro, que saiu do Podemos sem aviso prévio e dando um de$falque na sigla, alegando indecisão se vai à frente. Até que... surpresa!, se noticiou a sua filiação ao União Brasil, com direito a discurso de... presidenciável.
Isso foi suficiente para acender alerta na militância e dentro do PT, ainda que os números de Lula sigam constantes. Isso pode significar outras motivações, entre elas a proposta de demitir a montoeira de milicos em cargos-chave comissionados no governo federal.
Serão mesmo cortados? - e reflexões finais
Ter até 10 mil milicos nesses cargos parece ser um apreço de Bolsonaro a eles, ou à memória de sua vida militar, até sair "reformado" capitão após revelar à Veja (1987) o seu fracassado plano de terror em quarteis. Já era famoso no círculo por sua agressividade, ganância e humilhar patentes mais baixas.
Tal suposto apreço ou memória e o enganoso slogan Deus, Pátria e Família mantêm popularidade entre um público pequeno, mas muito ativo e fervoroso de apoiadores compromissados em seu prol, na ideação de valores conservadores que permeariam os ambientes militares.
Nesse ínterim, Lula revelou sua proposta de demitir milicos. Um assunto delicado: os ocupantes já emendaram que não pretendem sair do governo, independente do resultado eleitoral, e "asseguram" que Lula eleito não será impedido - apesar da desconfiável relação respeitosa com os petistas.
Em suas várias entrevistas durante a prisão em Curitiba, Lula afirmou e reiterou seu respeito pelas FAs, sempre enfatizando a sua função estatutária de "defesa da soberania nacional contra inimigos externos". Função só teórica: para elas, o inimigo é o povo popular. E Lula sabe muito bem disso.
Justamente por ele saber dessa realidade que as FAs em geral não digerem bem os progressistas democráticos de esquerda. As FAs não são democráticas, apesar de enfatizarem tanto a democracia que a geral tende a comparar o generalato com os bolsominions de motociata, considerados "frustrados"1.
Um detalhe interessante é que, justamente nos governos petistas, as FAs tiveram seus orçamentos mais altos, ainda que não tenham a velha tradição de guerra e ainda tiveram reajustes nos gordos saltos das patentes mais altas. Hoje, o orçamento do Centrão é maior do que o da Defesa.
Como já sabemos, as FAs não veem com bons olhos, ou não compreendem, sei lá, democratas de esquerda ou simples discordantes com seus ideários, apesar de, em toda a sua era, os governos petistas terem prestado relação respeitosa e com direito a reajustes de soldos e de orçamentos da Defesa.
Porém, é preciso saber interpretar a proposta de Lula: a intenção se pauta na sua velha defesa por servidores concursados para cargos comissionados. Afinal, os milicos bolsonaristas estão lá para dar a aparência de moral ilibada e disciplina, por trás, claro, das obscuras tarefas que sempre existiram nos círculos militares.
Apesar da defesa a servidores concursados em cargos de comissão, Lula já nomeou não servidores. Mas em geral tinham capacitação correlata. E esse é o principal motivo, pois os milicos bolsonaristas não o são. Que o diga Pazuello, que derrapou e quase faliu o MS - mesmo na Logística, sua área, um entre vários exemplos.
Mas, dada a duvidosa capacidade desses milicos compreenderem nas entrelinhas do contexto, em meio à exposição direta, se opera possível estremecimento deles com o velho petista. Este se respaldou em dispositivos da própria Constituição e de sua lei sequente, a 8112/1990 (estatuto do servidor).
Todavia, há de se refletir que, se os militares não pretendem mesmo recuar, mesmo reconhecendo Lula como eleito governante a partir de 2023, existem duas possibilidades que podem motivar a sua resistência. Uma delas é, com certeza, a manutenção da boquinha, com mais grana para a Defesa.
Como Bolsonaro conseguiu implantar completa incerteza logo nos instantes seguintes no cenário sociopolítico, aqui cabe a segunda possibilidade, antes impensada diante de tanta falácia: um plano B arquitetado para reprimir duramente populares em festa pós-posse de Lula, ou mesmo, armar golpe de Estado usando a esfarrapadíssima desculpa de fraude eleitoral.
A grande correlação que podemos tranquilamente acatar é a de que a era Bolsonaro tornou possível o antes impensado, e que a incerteza é estreita amiga da anomia social - um grande sonho construído pelo extremado tradicionalismo bolsonarista. Nos resta sobreviver, e pagar para ver.
----
Imagens: arquivos retirados do Google (edição autoria do artigo)
Notas da autoria
1. Paulo Ghiraldelli os considera como caras "que não mais satisfazem suas cônjuges", uma avaliação psicológica própria com base freudiana.
Para saber mais
-
- https://www.metropoles.com/brasil/eleicoes-2022/lula-diz-que-vai-demitir-8-mil-militares-de-cargos-comissionados
- https://congressoemfoco.uol.com.br/area/governo/levantamento-mostra-que-centrao-controla-r-150-bilhoes-no-governo/
- http://www.programafaixalivre.com.br/noticias/pimentel-militares-planejam-seguir-no-governo-com-ou-sem-bolsonaro/?fbclid=IwAR0ipy2BVz4Rl9sGzJIsfZiSarZC_HrAeZkmse1EYxr3wd3HE3V2Wc0rYQQ
Nenhum comentário:
Postar um comentário