domingo, 23 de outubro de 2022

CURTAS 7 - ANÁLISES RÁPIDAS

 

Após um último artigo solo, que foi necessário escrever, vem a 7ª parte de Curtas - Análises rápidas.
****

Damares e a cristopatia escatológica

        Damares Alves era uma ilustre e desconhecida senhora com expressão aparentemente doce e simpática à visão infantil, quando surgiu para compor a equipe de governo apresentada na cerimônia de posse do presidente eleito Jair Bolsonaro. 
        Nomeada para comandar a pasta do Ministério da Mulher, da Família e Direitos Humanos (MMFDH), Damares é uma pastora da Assembleia de Deus. Sulista de ascendência nordestina, herdou a forte religiosidade e a vida de pastora. 
        A sua biografia marcada por abusos na infância despertou uma empatia popular e no Congresso, durante sabatina em comissão da Câmara. Não era possível imaginar a faceta tão negativa que depois conheceríamos.
        Em quase todo o tempo à frente do MMFDH, Damares se notabilizou por suas tiradas absurdas e risíveis que distraíam a patuleia enquanto Bolsonaro e Guedes comandavam tudo em silêncio, mesmo em plena pandemia de C19. Essa foi a sua utilidade: criar uma espessa e eficiente cortina de fumaça.
        Algumas frases são de vídeos de cultos antigos viralizados após sua nomeação, como mamadeira de piroca e a suposta visão de Jesus na goiabeira. Também antiga, a suposta masturbação de bebês por pais holandeses rendeu até uma rasteira diplomática com o país europeu.
        O trauma de uma infância religiosa e abusada talvez torne compreensíveis tais falas. Mas não cala uma pergunta: ele justifica o envolvimento da ex-ministra em situações dignas de filme trash?
        Ela declarou que crianças marajoaras eram traficadas para a Guiana, onde tinham dentes extraídos para sexo oral, dando um tom macabro ao culto em igreja lotada com criança e tudo no DF. Contra ela já pesa a denúncia de ter sequestrado uma bebê indígena.
        Confirmado ou não tal sequestro, é fato que Damares tem uma filha adotiva de origem indígena. E é fato também que a declaração, importada do trumpismo estadunidense, gerou incidente diplomático com a Guiana, cujas autoridades já fazem cobranças. Damares admite que "ouviu das ruas". Mentiu.
        A completa ausência de registros de tal crime reforça a mentira, e o proferir na posição de pastora já carimba de vez a agenda cristopata que marca a campanha para reeleição de Bolsonaro. Ela agora já iniciará carreira política já maculando a imagem do neopentecostalismo. E a própria.

Para saber mais (ou se lembrar):
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/relembre-as-polemicas-da-ministra-damares-alves,e39919c669f1a41d9bdc48ec93b867c21a7urtnq.html
----

Bolsonarismo matou Deus, parte 1

        Outubro de 2022 entrará para os anais da história como uma data que definitivamente não deixará saudades.
        Dia 2/10, milhões de eleitores foram depositar suas escolhas nas urnas nas zonas eleitorais. Entre a maioria que foi depositar a esperança e a minoria a jogar mais gasolina no fogo e cometer centenas de crimes, as muitas emoções descambaram em resultado para o 2º turno. Mais 28 dias de sufoco.
        Passada toda a expectativa e vindo o conformismo,  veio a recente bomba de horrores solta pela ex-ministra e agora senadora eleita Damares Alves, com um enredo digno dos melhores roteiros de filmes de terror, numa igreja repleta de famílias heteronormativas com crianças e tudo.
        Em respeito a algum leitor porventura cardíaco ou de estômago muito sensível, foi preferível não detalhar os horrores verbais de Damares. As crianças na igreja devem ter ficado atemorizadas com a "tia" Damares.
        Dia 12, houve outro horror. Em Aparecida do Norte, apinhada de fiéis locais e romeiros que foram homenagear a padroeira do país, Bolsonaro foi à basílica fazer palanque, seguido por uma horda de bolsominions de cerveja vaiando o padre e atacando jornalistas e pessoas de camisas vermelhas.
        Um grupo de bolsominions tentou invadir a sacristia de outra igreja para reclamar do sino que já tocava há mais de 30 minutos. Achacado, o padre foi acusado de "censurar" Bolsonaro, pois disseram que o sino não tocava assim (mentira: ele toca por 1 hora entre uma missa e outra).
        Desde então, até esse momento não se sabe de novos fatos político-religiosos desse naipe. Mas, os acima citados já foram suficientes para repercutir muito mal na mídia estrangeira, não importa a alta proporção de seculares entre os europeus.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=McB8pRTFI_w (O Historiador - Bolsonaro e Moro soltam maior traficante do país).
- https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/10/10/traficante-andre-do-rap-e-libertado-em-sp-apos-habeas-corpus-concedido-pelo-stf.ghtml
----

Bolsonarismo matou Deus, parte 2

        Acompanhado pela caterva de seguranças, um dos filhos (ou a esposa) e comitiva de apaniguados, Jair Bolsonaro tem percorrido o Brasil entre motociatas, barcaciatas e cultos pentecostais. Essa tem sido a sua rotina de presidente da República nesses quase 4 anos, enquanto Paulo Guedes e Lira governam.
        Regada a exuberante grana pública à custa de caríssimos impostos e salários congelados, a revoada agrada muito a pastores oportunistas e a patuleia mais narcotizada, que agora protagoniza ataques a padres católicos e até ao Papa, principalmente quando os temas são desigualdade, violência e fome.
        

A cristofobia está na igreja

        A redemocratização inaugura no Brasil fatos novos, como a intensa midiatização da corrupção político-empresarial, a ascensão gospel na política, o SUS, o plano Real com inflação controlada e a privataria na era FHC, e a mitigação do neoliberalismo (mas não da corrupção) na era petista.
        A ascensão gospel na política oportunizou o amplo e organizado movimento que evangelizou boa parcela da população. No Centrão criado por Sarney brotariam gospels oportunistas como Feliciano, Cunha e até mesmo o católico Jair Bolsonaro, que seguiu parlamentar por 30 anos.
        Obscuro e defendendo ideias nazifascistas, Bolsonaro não era levado a sério. Exceto pela bancada da bíblia, que lhe deu voz. Fortaleceu-se nisso até ser eleito o presidente que hoje aterroriza o mundo e parte dos brazucas por feitos que dariam orgulho a nazistas de 80 anos atrás.
        Mesmo favorecidas no petismo, as igrejas gospels entram no centro nevrálgico da extrema-direita bolsonarista, com importante papel eleitoral desde 2018. A bolha só é permeável às fake news contra Lula e minorias de fé, sexuais e culturais, que voam soltas apesar das tesouradas recorrentes do TSE.
        Bolsonaro se ressente dessas tesouradas, mas há razão para ela: seu filho Carluxo preside uma fábrica de mentiras ofensivas e robôs numa sala com um painel repleto de celulares em Brasília.
        De 10 gospels, 6 declaram voto em Bolsonaro. Mas, em boa parte, por pressão no local em que procuram paz espiritual: a igreja. Relatos anônimos apontam sanções contra fiéis progressistas ou que denunciem podres de pastores. Essa perseguição interna é percebida por muitos fiéis.
        A agenda cristopata de Bolsonaro, Michele, Damares Alves, Feliciano e Malafaia alimenta a cartilha de ódio criada nas igrejas da AD¹, bem como a cristofobia, uma conspiração de Trump pega pelo bolsonarismo para atribuir a Lula, aludindo ao fechamento de templos por Ortega².
        Sim, a cristofobia não foi uma tese externa. É uma criação do clero gospel bolsonarizado a partir de uma conspiração pseudomoralista externa, cristalizando-se no ente que persegue os próprios cristãos.

Notas da autoria
¹ Assembleia de Deus, doutrina com vários ministérios no Brasil e que agrega 12 milhões de seguidores.
² Daniel Ortega, presidente eleito que implantou um governo totalitário na Nicarágua.

Para saber mais
- https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63285936 (perseguição a cristãos já começou).
----

A pressão do curral gospel

        Pastores que se vestem de cores verde-amarelo se proliferam em igrejas aqui e ali nas periferias urbanas, denunciando o caráter ideológico dos cultos nos últimos dias da eleição presidencial.
        Chamados de "revelações do Espírito Santo", suas pregações apontam as correntes pentecostal e neopentecostal do mundo gospel. Diante de tais "revelações", os fiéis abaixam, submissos e temerosos, as cabeças em oração. Sim, temerosos também. Por um motivo revelador.
        Mesmo sem citarem o nome, os pastores de verde-amarelo mostram toda a sua autoridade e até ameaçam os fiéis se votarem em candidato de "programa político contrário ao reino de Deus". Essas ameaças são traduzidas em medidas disciplinares como "punição divina".
        Essa denúncia atesta o curral eleitoral gospel já abordado outras vezes neste blog. Nesse estágio da corrida eleitoral, ele se espalha mais, tal como tentáculos de um monstro de ficção, o curral contagia muitas igrejas de ministérios da Assembleia de Deus e correlatas da IURD Brasil afora.
        O curral gospel é o perfeito análogo ao observado nas zonas dominadas pelas milícias no Rio e em outros Estados, e também no vasto interior sertanejo ainda muito coronelizado. Viola o caráter pessoal e secreto do voto e dilapida, portanto, a liberdade de escolha do eleitor por identidade.
        Sabemos todos que as urnas eletrônicas são, até prova em contrário, imunes a fraudes.  

Para saber mais
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63209750 (pastores fazem pressão e ameaçam fiéis com punições...)
- https://www.youtube.com/watch?v=CiqVj974n6E (Reinaldo Azevedo sobre intolerância religiosa e ódio gospel)
----

Carta sensata, povo nem tanto

        Preocupado com a repercussão das ações eleitoreiras de Bolsonaro sobre os grupos cristãos gospels, o ex-presidente Lula escreveu uma carta especialmente destinada ao povo evangélico. A carta já estava nos planos do petista, sendo escrita no dia 11, antes da explosão de ataques contra missas católicas iniciada com o ataque em Aparecida do Norte., ocorrida no dia seguinte..
        A intenção de Lula escrever a carta se deu por conta da disseminação de fake news destinadas a indispor os fiéis gospels contra ele. O teor das mesmas variava de Lula supostamente “possuído pelo demônio” em templo afro-brasileiro, à falácia de “fechar igrejas” – em alusão ao ato do ditador Daniel Ortega, da Nicarágua, que mandou fechar igrejas no país. 
        Vale acrescentar que, mesmo sendo anterior ao citado ataque - que por seu turno oportunizou outros ataques a fiéis, padres e objetos das igrejas católicas em vários recantos do país, com repercussão negativa no exterior -, a carta, que foi posteriormente lida por um pastor em público, foi interpretada pelos presentes como uma lufada de bom senso e acalanto em meio a tantos conflitos.
        Mas as lufadas de vento não alcançam distâncias suficientes para abranger o máximo de locais a terem os ânimos refrescados. Em igrejas evangélicas onde já infestadas pelo hálito nefasto do bolsonarismo, segue-se um mormaço que já desconforta cada vez mais frequentadores, enquanto que no seio católico já se propõe cancelamentos de homilias públicas para evitar novos ataques.
        Por outro lado, a carta de Lula reverberou positivamente entre os mais de 30% do povo gospel que teve ciência dela pela mídia. De fato a carta é sensata e coerente com a realidade. Mas não podemos dizer o mesmo sobre a maior parcela dos gospels, que neste momento se narcotiza nos cultos a Bolsonaro.

Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/10/19/lula-publica-carta-aos-evangelicos-e-reafirma-respeito-a-liberdade-religiosa
- https://www.brasildefato.com.br/2022/10/22/crescem-ataques-de-bolsonaristas-a-igreja-catolica-fieis-padres-e-ate-o-papa-sao-alvo
----

Pós-Bolsonaro, a certeza da incerteza

        2022 vai cada vez mais perto de seu próprio fim. Ainda a caminho do 2º turno, a maioria dos brasileiros assiste, entre aturdida e em expectativa, a dança quase diária dos números finais para a presidência. As pesquisas continuam sendo alicerces, mesmo na pauta dos projetos absurdos dos congressistas de criminalização dos institutos.
        A exemplo dos debates preparatórios para o 1º turno, o primeiro para o 2º turno, realizado na Band no último domingo, não abriu mais chances para se ter certeza de quem ao final levará os louros da vitória. Segundo as mídias, Lula teve uma vitória por pontos: foi melhor no 1º bloco, empatando com o adversário no 2º. 
        Com isso, até o momento impera a estabilidade dos dados, com Lula entre 51 e 55% de votos válidos e Bolsonaro, entre 43 e 47%, considerando-se margens de erros, graças à discrepância ainda maior entre os dois no Nordeste, onde o petista subiu mais 5 pontos em média, mesmo que nas demais regiões o extremista esteja pouco à frente.
        Cerca de 95% dos eleitores entrevistados se dizem decididos sobre sua escolha para presidente, indicando que parte dos 5% indecisos deverá se direcionar no dia D, e que a maior parte da expectativa sentida está mais para o futuro, por conta do caráter do novo Congresso, que conta muito.
        Um caráter que conta muito: o escolhido para a presidência fará seu molde particular nos diálogos com os congressistas. Como sabemos muito bem as notórias diferenças entre Bolsonaro e Lula, cabe somente a nós a decisão pelo retorno do diálogo conciliador para a sobrevivência da nação, ou pela agudização e perpetuação da barbárie.
        Enquanto a situação não se resolve, imaginamos as pautas discutidas no Congresso, como uma agenda de costumes baseada numa sharia cristã, prisão de 10 anos para quem errar em estatísticas demográficas, como perpetuar a mamata secreta, uma licença para eliminar populações tradicionais do campo e florestas, ou matar mais pobres e não-brancos nas ruas urbanas.
        Se mais de 90% dos eleitores já definiram seu voto, segundo pesquisas, a única certeza que nos restará será a que vier após 30/10. 

Fonte: leitura de diversas fontes midiáticas.
----

A vantagem do "enegrecer"

        Na era Lula entrou em vigor a Lei de Cotas. Segundo o então presidente, ela serve para "quitar uma dívida histórica de 350 anos de escravidão". Faz pleno sentido, pois foi elaborada para que haja um número mínimo de vagas para negros, indígenas e pobres para ingresso em espaços públicos historicamente destinados aos brancos abastados e estudados.
        A lei foi imediatamente criticada no debate público na alegação de mau investimento em educação básica e o fracasso das cotas nos EUA. Verdade. Mas o elitismo histórico e silente virou empecilho às mudanças necessárias. Então, a lei ainda permanece, mantendo-se até hoje incólume na era extremista de Bolsonaro.
        Em paralelo, não demoraram a surgir matérias com relatos de fraudes cometidas por brancos nada pobres que se declaravam cotistas em vestibulares universitários e, esporadicamente, em concursos públicos. Após algum tempo silentes, as críticas retornaram com mais força: "essa lei é um fracasso". Mas, segue.
        Assim como concurseiros no momento da posse de cargo público, os candidatos à carreira política também prestam declarações patrimoniais (financeiro, inclusive) e civis (dados pessoais, incluindo o elemento cor/raça). Até aí beleza, mas um paradoxo chamou a atenção da mídia nessa eleição 2022: a mudança na declaração de cor.
        Como os reeleitos devem atualizar as suas declarações patrimoniais, as eventuais mudanças são naturais. Mas o que chamou a atenção de jornalistas da Brasil de Fato é que alguns deputados reeleitos, a maioria de direita, "mudaram de cor", autodeclarando-se negros, mesmo alguns deles sendo terrivelmente brancos e de traços europeus.
        A razão foi logo descoberta pelos jornalistas: a lei de cotas teve uma alteração mais recente que permite aos eleitos cotistas uma vantagem financeira em relação aos não cotistas. Daí ser provável que os reeleitos expostos na reportagem, a maioria de direita, tenham declarado patrimônios financeiros ridículos.
        É notório que o problema não é bem a lei de cotas, pois em vias honestas ela permitiu a qualificação profissional e a ascensão social de milhares de pessoas de grupos historicamente relegados pelo elitismo. Mas há uma falha, que virou tradição nos serviços públicos brasileiros: a de fiscalização.
        A falha fiscalizatória evidencia claramente que o problema não está na lei de cotas, e sim nas pessoas, que secularmente aprenderam a naturalizar os maus exemplos vindos "de cima". A nossa elite se construiu em contexto fraudulento e opressor, e assim se mantém. Como nunca houve uma educação combativa, o problema seguirá, piorando nessa era do vale-tudo.

Para saber mais
- https://www.brasildefato.com.br/2022/10/11/dos-135-deputados-federais-negros-eleitos-19-eram-brancos-na-ultima-eleicao
----

Xandão, JP e regulação da mídia

        Desde que assumiu o STF, indicado por Michel Temer, Alexandre de Moraes, o popular Xandão, tem se destacado por sua conduta tão ativa quanto altiva. É um dos ministros mais jovens do Supremo e atual presidente do TSE. E desde então, tem mostrado que não tem medo de serpentes peçonhentas.
        Sua atuação com os Bolsonaro tem sido bastante relevante desde o ano passado, gerando desde então uma profunda desafeição do presidente da República, que piora com as recentes atuações diante da corrida eleitoral, por conta das várias tesouradas que deu a fake news contra Lula e o PT.
        Agora, fez o TSE entrar novamente em evidência midiática ao dar cabo de um documentário da Jovem Pan (JP) que detrime a imagem e honra, e a presunção legal de inocência de Lula (PT) e hipervaloriza as supostas virtudes de Jair Bolsonaro utilizando-se de possíveis notícias falaciosas.
        A parte bolsonarista da imprensa e canais de redes sociais consideram que a ação impetrada por Xandão foi "censura", que "viola o direito constitucional de expressão" e otras coisitas más do gênero. Mas, por incrível que pareça, não foi censura, e há como explicar por quê.
        A censura propriamente dita se define como impedimento à divulgação de inteiro teor de um tema ou assunto pela mídia de massa. Um exemplo bem conhecido é a censura impetrada pela ditadura a produções midiáticas que porventura criticassem as figuras e/ou os atos governamentais de então.
        Como o poder de polícia do TSE se deu contra falácias falsas e difamatórias à pessoa e honra do adversário de Bolsonaro, o que ocorreu contra a JP foi uma punição por já não ter acatado a uma norma de editar devidamente ou refazer o programa. E isso, por uma razão importantíssima.
        Além do conteúdo ser passível de condenação judicial, a JP é uma emissora de radio jornalismo transmitida tanto em TV quanto em canal online. Portanto, uma concessão pública tal como Globo, SBT, Band, etc., se sujeitando a regras mais rigorosas quanto ao teor dos conteúdos divulgados.
        Isso as diferencia dos canais independentes, que sobrevivem de colaboração popular, como os que rolam em plataformas de vídeos como Youtube e correlatos, e sites de blogs e correlatos.
        Esse caso traz à luz a velha proposta petista de regulação da mídia, na intenção de dissolver o monopólio hegemônico que se concentra nas mãos de poucos, como os grupos Globo, Band, Folha, Estadão, Abril, etc., e descredita o restante para o grande público. E entra outra razão aí.
        Em países com mídia regulada (Argentina, EUA, França...), a circulação de fake news é menor, pois o canal divulgador é alertado por outros, ou responsabilizado judicialmente, se necessário.
        Não por acaso, em diversas vezes Bolsonaro já depreciou Lula quanto ao intento de regulação da mídia. Pois as fake news são os seus alicerces de campanha e lhe agregam público, compensando a falta de propostas e atuando como cortinas de fumaça encobrindo os seus silenciosos maus feitos políticos.
        Só Xandão mesmo na causa.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=CKzR8cD6rxE (UOL - TSE vota poder amplo para decidir sobre corte de fake news sem MP)
- https://www.youtube.com/watch?v=cCxWwoHejFc (UOL - TSE tomou medida correta ao ampliar poder de polícia contra fake news)
- https://www.youtube.com/watch?v=gYAWif9mmNE (UOL - o que o TSE decidiu sobre a Jovem Pan)
- https://www.brasildefato.com.br/2022/10/21/direitos-de-resposta-de-lula-sao-suspensos-tse-aprova-ampliacao-do-combate-a-fake-news-e-mais
----

Bolsonaro sobe, mas economia desce. E conta

        Enquanto o tempo segue inexoravelmente aproximando o grande dia D da finalíssima eleitoral, os institutos de pesquisa, sérios ou suspeitos, continuam em seus levantamentos. Suspeitas à parte, os dados obtidos apontam Bolsonaro quase encostando em Lula. Num deles, a menor margem do petista e a superior do extremista dá empate técnico.
        Apesar de Lula parecer esbanjar otimismo, a sua equipe segue em alerta vermelho, estudando os fatos mais recentes e analisando as reações da patuleia aos mesmos. Diante disso, Bolsonaro subiu entre os contemplados que conseguiram o empréstimo consignado via Auxílio Brasil, que por seu turno vai até dezembro.
        A liberação da grana para empréstimos é a mais clara evidência de que a patuleia flagelada vota conforme os desígnios estomacais, na necessidade mais imediata de sobrevivência. Com experiência pretérita de fome, Lula sabe bem disso, e diante da ansiedade da grande mídia em economia, ainda aguarda revelar seus planos para momento oportuno.
        Talvez isso dê a impressão de que só Bolsonaro está ativo e Lula não. O imediatismo de sobrevida conjugado a má educação e muita fake news não permite raciocínio analítico entre muitos, e leva a mudanças momentâneas de escolha, com ajuda das igrejas gospels caça-níqueis.
        Mas há fatos fora da atenção pública: a economia segue em queda: todos os índices produtivos (agro, indústria, serviços, etc.) caíram prenunciando 2023 em recessão, e para piorar mais um pouco, Paulo Guedes anunciou que reajustes salariais e previdenciários serão desvinculados das médias inflacionárias passadas.
        Não bastando o possível fracasso do Auxílio bolsonarista, a desvinculação sozinha já responderá por amplificar a margem de 60 milhões de brasileiros jogados na miséria levando a um nível ainda imprevisível de consequências sociais ainda antes da entrada de 2023, mas já prenunciando o cenário de terra arrasada que já pisca a luz de alerta há tempo.
        Por enquanto Bolsonaro sobe, enquanto a economia desce mais ainda. E quiçá, isso possa beneficiar Lula eleitoralemente nos últimos dias da eleição. Pois como os fatos já estão até na grande mídia, em pouco tempo a patuleia saberá e, mesmo cada um a seu modo, a maioria concluirá que a reeleição será o caminho direto para a morte.

Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/10/21/politicas-eleitoreiras-de-bolsonaro-foram-insuficientes-para-barrar-queda-da-economia
----
        
Em MG, Novo privatiza o meio ambiente

        Após quase quatro anos de um governo pífio, o governador de Minas Gerais Romeu Zema (Novo) foi reeleito. Uma idiossincrasia local, tendo-se o fato de que Lula terminou à frente de Bolsonaro no primeiro turno. Mas, outros fatores motivam a natureza idiossincrásica dessa escolha.
        Contrariando a maioria do colégio eleitoral mineiro, Zema declarou a continuidade de seu apoio ao presidenciável à reeleição Jair Bolsonaro (PL), e ainda rebateu uma declaração de Lula, por má interpretação ou má-fé em ludibriar os eleitores, pois ainda na corrida eleitoral havia negado apoio ao fascista, e agora retorna o se apoio.
        E esse apoio reforça o significado político de seu próprio partido, o Novo. Por ser relativamente nanico em termos de tamanho e número reduzido de cadeiras no Congresso para a legislatura 2023-27, muitos desconhecem a sua personalidade intangível, mas ativa. Seus eleitos atendem aos desígnios de seu partido, além da iniciativa própria. Daí a surpreendente declaração de Amoêdo de apoiar Lula.
        Zema se destaca por ser, pelo visto, o único novista na posição de chefe do Executivo - o restante ocupa cadeiras dos Legislativos regionais e federal. Enquanto Bolsonaro entrega a Amazônia às orcrim's ligadas ao extrativismo ilegal indiscriminado e ao agronegócio, o governador entrega parques ambientais à iniciativa privada. Em especial, a grupos empresariais de mineração. O Novo sorri satisfeito.

Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/10/19/menos-de-um-mes-apos-ser-reeleito-em-mg-zema-entrega-parques-a-vale-e-a-iniciativa-privada
----






        
        

terça-feira, 11 de outubro de 2022

CURTAS 6 -ANÁLISES RÁPIDAS

 

        Devido a uma série de fatos e reflexões nas mídias e nas redes sociais, se segue a 6ª parte da série Curtas - Análises rápidas.
****

Um governo kamikaze

        O termo japonês kamikaze nomina pilotos da II Guerra treinados para atacarem as bases militares estadunidenses no Pacífico como forma de ataque, chocando seus aviões nas citadas bases. Foi inspirada no antigo seppuku samurai (ou haraquiri no Ocidente), um suicídio simbólico de coragem e firmeza de caráter.
        Da Guerra Fria em diante, o termo se popularizou pra nominar fatos análogos em campos diversos, em especial no cotidiano e no político. E voltou mais uma vez na era Bolsonaro, neste 2022.
        Foi através da PEC dos Auxílios, elaborada para gerar auxílio temporário para famílias pobres, taxistas e caminhoneiros, em R$ 600 e 1000, respectivamente. Um rombo de R$ 41 bi no teto de gastos, segundo Guedes e a mídia, que a alcunharam de PEC kamikaze. Uma alcunha, vários motivos.
        Oriundo da venda da Eletrobrás, o rombo serviu para custear a PEC, cuja aprovação ilegal em um temporada eleitoral oficial e o caráter temporário dos auxílios dão mais sentido ao apelido. Bolsonaro a negou ser eleitoreira, mas isso não colou devido ao contexto sociopolítico claro que ele mesmo plantou.
        Desesperou-se por estar bem atrás de Lula e ter recordes de rejeição. Pagou generosamente votos do Centrão pela aprovação da PEC. Os auxílios aliviaram o potencial eleitoral, mas a fonte secou logo. E o orçamento secreto bilionário crescente ajudou a dívida pública a arrombar o teto dos gastos.
        Bolsonaro e Guedes instituíram o ódio e a violência. Gelaram educação, cultura e saúde, liberaram armas e espalharam doença que gerou mais de 700 mil órfãos e viúvos, mergulharam milhões na fome, na miséria e sob as marquises e ainda entregaram estatais a capitalistas obscuros. Títeres da guerra, da peste, da fome e da morte.
        Agora que a patuleia sabe mais do que o governo tem representado desde o seu início, Bolsonaro sente seu fim próximo. Após a fala de Lula aos evangélicos, parte deste público decidiu redirecionar o voto. Ao testar todos os limites, Bolsonaro trilha seu último caminho. Um caminho kamikaze.

Nota da autoria: o texto é resultado de pura e fria análise pessoal.

Para saber mais:
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Seppuku
- https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/pec-kamikaze-a-morfina-eleitoral-do-governo-bolsonaro-04072022
----

A Defesa e seus sigilos nas redes sociais

        Apresentada ao mundo nos anos 1990, a internet representou a democratização do conhecimento, e de fato até acessávamos uma infinidade de coisas. Mas a ascensão da extrema-direita nos anos 2010 tem impedido alguns acessos sem que a geral se desse conta, dada a preferência pelo entretenimento, que engloba 75% dos acessos.
        No Brasil não foi diferente. A era Bolsonaro trouxe de volta a censura de informações, iniciada com a depleção do Portal da Transparência, criado na era petista para que a população pudesse acessar dados e movimentos institucionais, inclusive de recursos financeiros e humanos¹.
        Com o sucesso dessa depleção sem protesto popular digno de nota, e os seguidos sigilos seculares de Bolsonaro para impossibilitar investigações de crimes envolvendo sua família, foi a vez das FAs de censurar o acesso a relatórios contidos em perfis do alto oficialato nas redes sociais, para evitar "más interpretações" por parte de outros influencers, dos populares e do Judiciário.
        A fiscalização das redes sociais pelas FAs não se limita às suas próprias páginas. Ela se estende aos perfis de alguns influencers que porventura as tenham criticado em algum fato, enumerando-os como "detratores", a exemplo da perseguição a servidores com dossiê pelo Ministério da Justiça em 2020, então sob o comando de André Mendonça, que hoje compõe o seleto grupo de juízes do STF.
        Nesse sentido, o vasculhamento dos perfis de influenciadores e de servidores públicos em redes sociais pelas FAs pode também estar por trás das aparentemente inexplicáveis indisponibilizações de postagens (textos ou vídeos) pelas plataformas responsáveis pelas redes sociais. Desmonetizações de vídeos de influenciadores críticos têm sido relatadas com certa frequência.
        Mas, ora, se tanto dizem defender a democracia plena, por que então esse temor e acessos a dados de seus perfis pessoais nas redes sociais? Bem, vale a nós lembrarmos de que "defesa da democracia" tem sido a expressão mais comumente bradada nos discursos de extremistas e milicos aliados, desde a Guerra Fria clássica criada pelos paranoicos EUA.

Notas da autoria
¹ Em acordo com a classe política, a elite do funcionalismo público estável conseguiu manter em sigilo parte de seus direitos pecuniários e suas matrículas individuais.

Para saber mais:
- https://theintercept.com/2022/09/17/ministerio-da-defesa-esconde-relatorios-de-redes-sociais/
----

A funcional corrupção no Grande Sertão

        Mote na direita, o combate à corrupção é um sonho na esquerda. Utopia inglória: até nos top five escandinavos ela existe, em doses bem menores. As doses cavalares brasileiras já são banalizadas há tempos. Mas o nível inaudito de agora coloca a era Bolsonaro como a mais corrupta da nossa história.
        Surge no caminho uma velha novidade: cerca de 20 municípios do interior do Piauí do ministro Ciro Nogueira, se declararam ter em suas prefeituras RHs bem robustos para as pequenas populações. Embora não seja ilegal em si, essa desproporção gera suspeita de malversação de verbas da União.
        Foi isso que levou a uma descoberta interessante, revelada em reportagem do The Intercept em 19/9. Nas 20 cidades piauienses, matrículas sem servidor e escolas sem aluno florescem por meio dos recursos da União graças ao ministro do Centrão. Tudo fantasma.
        Na prática, essa malversação é antiga e continua forte, mantendo o coronelismo que a mídia diz ter acabado desde as eleições diretas para todos os políticos. Como as igrejas gospels e o crime organizado nas grandes urbes, o coronelismo ainda impõe o voto de cabresto. A grana extra convence os eleitores. 
        É um costume genérico em cidades do Grande Sertão brazuca sustentadas pela subsistência agro pastoril, pobre em contraste com a abundância nos gabinetes das prefeituras locais, e favorecido por muita ignorância e pouca educação.
        É nesse terreno que Jair Bolsonaro investiu mais em 2021, como também mostra a reportagem da revista Piauí 184, de janeiro/2022, que descobriu como uma dessas cidades, após votar em peso em Haddad em 2018, passou a ser bolsonarista três anos depois.
        Volume e origem da grana- os recursos distribuídos são do orçamento secreto. Ciro é do PP de Arthur Lira, presidente do Centrão e da Câmara, e de 13 dos 20 prefeitos beneficiados e dos coroneis. É a sigla mais corrupta (ranking de 2016) e de maior fundo em 2022.
        Segundo Simone Tebet, ex-candidata à presidência, em entrevista recente ao Flow podcast, a grana recebida em cada cidade é similar à destinada a capitais como São Paulo ou Rio. Seria como pagar uma equipe odontológica para fazer 14 extrações dentárias por pessoa, incluindo lactentes ainda sem dente.
        É certo que no sertão de Alagoas não difira do caso piauiense, pois Lira é o maior beneficiado dessa grana. Afinal, para Bolsonaro e sua caterva se reelegerem vale até voto fantasma. Mas, para isso, eles têm que vencer a onda vermelha que volta a se fortalecer no Grande Sertão.

Notas da autoria

*Uma fonte auxiliar de base dessa análise é uma newsletter do The Intercept via e-mail, de 27/9/2022.

Para saber mais
https://theintercept.com/2022/09/19/aliados-de-ciro-nogueira-no-piaui-usam-matriculas-fantasmas/ (acessível ao público)
----

Bolsonaro acusado, mas nem tanto

        A corrupção tem sido tema constante nos debates promovidos pelas emissoras de TV aberta, sendo Lula o maior alvo natural sobre coisas batidas e já resolvidas. Todos os adversários foram duros, e Jair Bolsonaro lançava ofensas. Mas Lula até que teve bom desempenho, em especial no último debate, exigindo fontes e ainda tocando em feridas dos adversários. 
        Bolsonaro também foi alvo. Simone Tebet apontou sobre as negociatas das vacinas e a má política para a mulher, e Soraya Thronicke foi na onda com insinuações. Lula foi o único a ir mais fundo, sobre a compra de 107 imóveis de luxo, a corrupção pastoral na educação e outros escândalos.
        Até um o suposto padre Kelmon, arranjo de última hora do condenado Roberto Jefferson para ser candidato do PTB e virar boca de aluguel de Bolsonaro, apareceu para fazer fita com ataques a Lula ao ponto de tirá-lo do sério no debate da Globo. Mas Lula se safou no fim.
        Mas, vale salientar. As cobranças dos adversários foram sopros, em comparação com o teor dos seguidos e evidentes escândalos de corrupção financeira e ético-moral, aparelhamento institucional, opacidade de informações, violações de direitos humanos e contra princípios constitucionais pétreos.
        Tal como Lula, Bolsonaro não escapou das acusações, ainda que as negue com suas mentiras. Mas, em comparação com o petista, não foi exigido como deveria. Como Bolsonaro, os adversários faltaram com a coragem mínima necessária para irem mais a fundo. Ou faltaram com a ética mesmo.
        No debate da Globo, até que Lula foi quem mais cobrou do mandatário. De boa, fez menção das rachadinhas, da gestão da C19 com escândalos das vacinas e tudo, e até das negociatas com troscentos imóveis com dinheiro vivo. Mas, quem roubou a cena foi o padre boca de aluguel.
        Faltou a todos apontar a Bolsonaro a sua condenação pelo Tribunal Permanente dos Povos, que mesmo sendo de opinião, fez um relatório digno de nota cuja cópia foi entregue ao Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade. 
        Quiçá, como dizem os mais otimistas, o dele já esteja guardado.

Fonte: interpretação analítica pessoal ao acompanhar o debate.
----

O urgente combate à politização religiosa

        Em 2003 e em 2009, o então presidente Lula sancionou tranquilamente duas leis ligadas à religião: a primeira, que consolida a liberdade de culto já prevista desde a 1ª constituição da República (1891), mas carecia de regulamentação; e a segunda e última, que cria o Dia da Marcha para Jesus, dedicada ao público evangélico.
        Como já abordado no blog, a marcha para Jesus surgiu na Inglaterra como movimento de rua para aumentar o rebanho fiel  em meio ao aprofundamento da secularização popular e ao crescimento do islamismo pela imigração oriunda do Oriente Médio e Norte da África.
        Também abordado, esse movimento gospel no Brasil, trazido pelo casal Hernandez da Renascer em Cristo, assumiu paulatinamente um viés diverso do original: financeirizado e também político-ideológico. Seu efeito de evangelização em massa de grande alcance proveu sucesso ao movimento no país.
        Embora o protestantismo já fosse mais permissivo quanto à carreira política de pastores - visando maior evangelização popular-, foi a partir da aproximação dos políticos com líderes de grandes igrejas no final da década de 1990 que se abriu, lenta e sutilmente, o caminho para a politização no mundo religioso.
        Isso se revelou especialmente útil para os líderes de grandes corporações pentecostais e neopentecostais. Em meio ao status democrático iniciado na era Collor e maximizado na era petista. esses líderes já apontavam sua suposta preocupação com os também supostos riscos da "democratização dos costumes".
        Após 2009, as marchas para Jesus já sacramentadas na lei carregavam em seus trios elétricos e palcos, candidatos durante as campanhas eleitorais, puxando milhares de fiéis nas ruas. E aí explode, em caráter crescente, a barulhenta bancada da bíblia, que tem sido bem barulhenta na era Dilma.
        Com cada vez mais parlamentares no Congresso e nos parlamentos regionais Brasil afora, a bancada assumiu caráter histriônico e, baseando-se em falácias, gritava por pautas de costumes e cobrear garantias que privilegiassem "seu rebanho" - rebanho composto por eles próprios, claro.
        É aí que se verifica o destaque aos evangélicos como um mundo à parte. Organizações como a IURD criam partidos políticos, e desde então, em campanhas eleitorais, políticos vão aos cultos ou conversam com os pastores mais influentes na fé, na política e no poder econômico. Talvez prometendo mundos e fundos.
        O embarque de Jair Bolsonaro nesse meio elevou a ligação política-religião a um nível inaudito, ao ponto de o presidente querer colocar as igrejas evangélicas em lugar de honra nas decisões de Estado, forçando, ainda sem sucesso, um caminho rumo a uma ditadura semiteocrática que pode acontecer se Bolsonaro for reeleito.
        Esse privilégio tão almejado pelos pastores poderosos favoreceu uma geração arrogante e hostil à diversidade por trás das falas delicadas e bonitas, observada há algum tempo. Um claro indício de que urge - já passando da hora - de se combater essa politização religiosa. Sabemos que a direita disso se aproveita, resta à esquerda correr atrás.

Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/10/09/e-fundamental-tirar-a-dimensao-religiosa-da-disputa-politica-afirma-cientista-politico
----

Bolsonaro canibal e o tráfico de Damares

        Nessa corrida padra o 2º turno, a agressividade marca as campanhas do presidente Jair Bolsonaro e de Luiz Inácio Lula da Silva, com explorações de alguns temas, sendo o moral-religioso o mais tocado, com respostas do petista. Mas, outro tema apareceu e chamou a atenção: o canibalismo.
        O tema, mencionado por Bolsonaro numa entrevista há algum tempo, caiu no debate público com perguntas sobre sua veracidade. O contexto deste debate é presente, como atribuição da campanha de Lula em sua propaganda eleitoral contra o adversário.
        A entrevista- ela de fato aconteceu, e Bolsonaro afirmou que "comeria o índio" se a comitiva que o acompanhou até a aldeia na Amazônia não tivesse se recusado. Se justificou em seu alegado "respeito à cultura dos Yanomamis", que "se todo mundo ficasse, teria que se sujeitar ao momento".
        Bolsonaro ainda se referiu aos Yanomamis do rio Surucucu. Mas sua fala foi rebatida por Júnior Hekurari, presidente do Condisi (Conselho do Distrito Sanitário Indígena): "não há canibalismo entre indígenas brasileiros hoje", e reforçou: "nós do Surucucu não o praticamos".
        Hekurari explicou que um povo Yanomami Xamathari, da Amazônia venezuelana, pratica um rito no qual o corpo do morto é cremado por dias, e um pouco de cinza fina dos ossos é pulverizado como sal ou pimenta em um caldo de banana consumido apenas pela família do morto. Não é canibalismo.
        É certo que o TSE tenha se valido dessa informação para determinar à equipe de Lula retirar o vídeo do ar. Pode ter sido para prevenir distorções, ainda que a fala de Bolsonaro seja verídica, pois o vídeo originalmente é dele próprio, sendo aproveitado pela campanha petista.
        Mas também pode ter sido um contrapeso, tendo-se em vista que Alexandre de Moraes segue de olho naquele que o toma por desafeto, determinando tirar do ar alguns vídeos de fato falsos contra o petista, como os que claramente promoveriam a intolerância religiosa. 
        Mas segue a polêmica, com Bolsonaro canibal, Lula "endemoniado" em templo afrobrasileiro, e temperada com a senadora eleita Damares Alves dizer que "crianças pequenas têm dentes arrancados para sexo oral em Marajó", e o seu antigo e suposto envolvimento em tráfico de crianças. Até vésperas de 30/10.

Para saber mais
- https://www.nexojornal.com.br/externo/2022/10/07/O-falso-canibalismo-Yanomami-relatado-por-Bolsonaro
- https://www.megacurioso.com.br/artes-cultura/123165-tribos-indigenas-brasileiras-praticam-canibalismo.htm
- https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2022/10/11/apos-fala-de-damares-mpf-da-3-dias-para-ministerio-detalhar-denuncias-sobre-estupro-e-trafico-de-criancas-na-ilha-do-marajo.ghtml
----



segunda-feira, 10 de outubro de 2022

ANÁLISE: ATIPICIDADES DA ELEIÇÃO 2022

 

        Dia 2/10/2022: enfim, chegou o dia D das eleições para presidente da República, governadores dos estados, senadores e deputados estaduais e federais. A propalada promessa de seu destaque para os analistas do presente e historiadores do futuro se concretizou. E há razões suficientes para isso.
        A começar, lógico, por ter sido um dia de eleição para presidente da República, em um país que em toda a história da República tem trilhado uma verdadeira cordilheira do Himalaia de altos e baixos – sempre com dominância depressiva para a patuleia, é claro.
        Muito do que se seguirá não se baseia numa fonte específica, mas em muitas e várias – do rádio corredor de pessoas dentro e fora da família às mídias de todas as vertentes. Essa diversidade de fontes é essencial para a minha análise de conjuntura, pois quanto mais restrito o número e variedade de fontes, mais limitada e superficial é a análise. 
        Para simplificar a vida e o interesse dos leitores, os destaques de análise são apresentados em subtítulos, para o entendimento da conjuntura explicativa dos fatos. 

Falhas dos institutos de pesquisa
        As primeiras pesquisas sobre sucessão presidencial e nos Estados surgiram em agosto/2021 e se atingiram o ápice de frequência a poucos dias das eleições, por todos os muitos institutos. As pesquisas são essenciais para avaliar os governos vigentes e ajudar a movimentação dos partidos nas convenções que aprovam as candidaturas.
        Me indagaram por que não perguntam sobre deputados e senadores. Como são muitos nomes para assembleias e congresso, seria melhor aos institutos abordar a preferência partidária, o que não seria uma boa, dada a forte antipatia de grande parte da patuleia aos partidos, e há predileção geral aos chefes do Executivo, que são poucos e decisivos. 
        A abordagem sobre os chefes do Executivo é mais fácil e acessível ao público. O executivo é o poder responsável por avalizar os paradigmas e o pragmatismo das políticas públicas – apesar da crescente atenção pública ao legislativo.
        Métodos e números- Os métodos são: presenciais (por abordagem; é detalhada ou espontânea); telefônicos (o entrevistado tecla o número do candidato preferido), ou virtuais (por formulários online), com amostras definidas numericamente . Nas pesquisas presenciais o popular deve ser abordado pelo pesquisador, e não o contrário. 
        No presencial detalhado, o pesquisador preenche formulário com dados do abordado; na espontânea ele pergunta, sem citar nome, em quem o abordado prefere votar. Os métodos telefônicos e virtuais também podem variar entre si. Alguns institutos escolhem um, e outros utilizam mais de um, após avaliação subjetiva de eficiência.
        Os institutos foram tantos quanto os métodos – e os resultados, alguns tão díspares que despertaram suspeitas, como os casos do Paraná Pesquisa e Brasmarket, que segundo noticiosos, receberam grana dos Bolsonaro, explicando supostos empates técnicos ou liderança absoluta do atual presidente sobre Lula. 
        Vale citar outro fator de erro: o Censo Demográfico IBGE, atualizado decenalmente e referência nas pesquisas de opinião. Como o de 2020 está em curso só agora por desinvestimento no tempo certo, os pesquisadores se valeram do de 2010 adaptados com dados de estudos isolados mais recentes do IBGE. 
        Projeções- as pesquisas eleitorais se valem da suposição: "em quem você votaria se a eleição fosse hoje?". Uma clara evidência de que são projeções de momento. Essa projeção sugere ainda margens de erro, em geral de 2 a 4% por cada dado obtido, já indicando a chance de erros para mais ou para menos.
        Por isso, o descrédito aos institutos de pesquisa se sustenta na desinformação, um excelente motivo para a claque bolsonarista se destacar, poupando descaradamente o Brasmarket e o Paraná Pesquisas, que inverteram os dados sem punição alguma durante toda a temporada da corrida eleitoral. Desses, falar mal já soa elogioso.
      Uma proposta estúpida-  a margem de erro de 5 pontos que favoreceu Bolsonaro no resultado do 1º turno moveu pauzinhos na Câmara. O presidente desta, Arthur Lira, bradou algumas críticas, mas Ricardo Barros, líder do governo, propôs discutir a prisão de até 10 anos para quem errar nas pesquisas. 
        A proposta reflete a estupidez e o mau caratismo dos governistas. Até parece que os pesquisadores têm, agora, que andar com bola de cristal, cartas de tarô ou mapa astral para saber se seus dados cravarão os fatos no futuro. 

Desempenho dos candidatos
        A maior frequência de pesquisas em dias próximos e decisivos do pleito busca medir a reação popular a cada candidato em última hora. A medição de desempenho se valeu na expressividade nas propostas de governo e críticas a adversários. Se a lei eleitoral¹ exigisse todos os candidatos oficiais nos debates, os dados seriam bem interessantes. 
        Mas, enquanto isso, analisemos Lula, Bolsonaro, Ciro, Tebet  e o nanico Felipe D'Ávila. O padre também.
        Lula- muito bem nas sabatinas (Globo e SBT-Ratinho), foi mediano no primeiro debate (Band) e decisivo no da Globo, no qual cobrou de Bolsonaro explicações sobre as rachadinhas e nos escândalos do MEC, vacinas e imóveis. Seu forte destaque nas eleições nordestinas e em MG o fez ultrapassar Bolsonaro ao fim da contagem de votos.
        Bolsonaro- tentou na moderação, mas seus traços psicopáticos prevaleceram em vários momentos: misoginia, belicismo e mentiras. Ruim no debate da Band, ficou mais à vontade no SBT (que o apoia), na ausência de Lula.
        Ciro- cometeu suicídio político ao ser belicoso contra Lula e incitar, no final, a migração de seus eleitores para Bolsonaro e negar apoio ao petista em 2º turno, isolando-se do PDT. Perdeu o 3º lugar na sua reta final, evidenciando a sua ferrada política. Talvez sua maior burrada tenha sido acenar à direita.
        Simone- declarando-se representante das mulheres, a ruralista conseguiu arrebanhar mais mulheres e foi bem em todos os debates, mas não cobrou de Bolsonaro sobre a negociata claramente suspeita com tantos imóveis em dinheiro vivo, ainda que o tenha feito em outros escândalos e nos preconceitos contra minorias.
        D'Ávila- o nanico do Novo (bolsonarismo de sapatênis) só saiu da proposta privatista para atacar Lula no SBT. Fora isso, só privataria e antipatia popular. Bem, agora vamos ao padre Kelmon.
        Substituto de Roberto Jefferson, com candidatura impedida pela Justiça, o suposto padre foi mera bengala de Bolsonaro para desarmar Lula em eventual embate no debate da Globo. Embora parte da militância petista acusasse a emissora de favorecer o extremista, Lula foi bem no geral.

Abstenção
        A abstenção foi uma preocupação grande para a campanha de Lula, pois sua equipe viu o acontecido em 2018 como fator da derrota de Haddad. Faz sentido. E como muitos populares tiveram alterado o seu local para votação, diversas prefeituras forneceram transporte público gratuito para eleitores mais pobres.
        A campanha de Bolsonaro bateu tecla contra essa gratuidade, enquanto o STF julgava a medida dos prefeitos. O ministro Luís Roberto Barroso indeferiu a medida, mas sem prejuízo das cidades que a adotaram. Assim, nas cidades com gratuidade a abstenção foi baixa, enquanto que nas sem gratuidade, o número de ausências foi bem sentido.
        Apesar das filas grandes em zonas eleitorais em todo o país, términos atrasados aqui e ali e até urna com voto de papel numa cidade do Amazonas, ao fim da contagem houve em torno de 20% de abstenção. Não se sabe se deveu à negação da gratuidade por Barroso, ou se foi resposta da campanha de Bolsonaro à incitação de Lula de irem votar.

Cabresto gospel
        Entre tantas possibilidades, vale citar outro fator, tão importante quanto ignorado: a pressão sobre moradores de favelas na capital fluminense. Eleitor em Inhoaíba, bairro pobre salpicado de igrejas evangélicas da zona oeste carioca, um jornalista do The Intercept relatou em newsletter o seu testemunho.
        Eleitores de verde-amarelo dominavam, alguns portando bíblias indicando ida anterior a cultos. Os poucos corajosos de camisas vermelhas eram hostilizados. É sabido que em algumas favelas pastores dessas igrejas se aliam a criminosos organizados locais, e durante os cultos incitam os fiéis a votar nos candidatos deles.
        O jornalista não menciona esse curral eleitoral em Inhoaíba, mas é bem provável a sua ocorrência. Igrejas da Assembleia de Deus estão em todos os bairros e favelas e é a denominação mais poderosa em termos políticos. Não tem sido raro que em seus cultos de revelação os pastores ainda preguem que Bolsonaro é "enviado de Deus".
        Nesse clima, eles ainda usam a cartilha de ódio para doutrinar seus fiéis contra as esquerdas, feministas, mulheres independentes, religiões de matriz afro e LGBTQIA+. Não por acaso, 72% dos evangélicos votaram no extremista no 1º turno, cifra muito acima dos 65% estimados nas pesquisas. A intensificação dos cultos a Bolsonaro, regados de ódio  e preconceito, chegou ao ápice nas vésperas da eleição.

Reflexão final...
        Diante de todos os dados expostos acima, percebe-se que muito mais coisas ocorreram por debaixo dos panos do que os institutos de pesquisas poderiam imaginar. A dança dos números de Bolsonaro e Lula na corrida eleitoral não deu indícios claros de que tudo e mais um pouco iria acontecer a poucas horas do pleito. 
        A elaboração deste artigo demorou devido à adição de mais fatos que fazem reinterpretar e contextualizar. Em especial sobre os evangélicos, ficou muito claro o ataque final da campanha de Bolsonaro nos últimos momentos antes do pleito, no temor de perder no 1º turno graças aos vídeos de sua passagem nas incompreendidas lojas maçônicas.
        A migração dos eleitores de Tebet e Ciro mostraria a sua diversificação em cima da hora. Os eleitores de Ciro migrados para Bolsonaro foram os mais à direita e pareceram majoritários de fato, pois Ciro preferiu guinar à direita, apressando seu colapso político já previamente pavimentado pelo enfadonho rancor contra Lula e PT.
        Agora, mesmo alvejados pelo descrédito popular alimentado pela estupidez dos governistas no Congresso, os institutos de pesquisa seguem em seu dever legal, agora adotando novas metodologias de forma a ter uma previsão com maior precisão ou alcance.
        Mas cabe salientar, mais uma vez: pesquisa não é adivinhação. Elemento essencial à ciência (afinal, matemática e estatística são ciências), a pesquisa serve justamente para desvendar e interpretar dados quantitativos e qualitativos. Claro que nada é 100% certeiro, pois são elucubradas por humanos, que não são 100%.
        Adivinhação, eu sugiro aos bolsonaristas congressistas uma boa consulta a videntes e outros bruxos. Ah! verifiquem antes o atestado de eficiência profissional deles, tá? E, aos populares que desacreditam totalmente das pesquisas: antes disso, descreditam a boçalidade dos governistas do Congresso.

----
Imagem: Google

Notas da autoria
¹. Segundo a lei eleitoral, são convidados todos os candidatos oficiais ao debate televisivo, desde que seus partidos tenham ao menos 5 representantes no Congresso.

Para saber mais
https://br.noticias.yahoo.com/partido-de-bolsonaro-pagou-r-27-milhoes-para-instituto-parana-pesquisas-164632122.html
- https://www.youtube.com/watch?v=RbPOPswtHrQ (canal Desmascarando - fatores dos resultados 1º turno)
- https://www.youtube.com/watch?v=DhE6gyiBpKc (Reinaldo Azevedo - fascistoides contra pesquisas)
- https://www.conexaopolitica.com.br/congresso/projeto-prisao-pesquisas-institutos-camara/
- Newsletter The Intercept, A pior política em minha casa, por Lorran Matheu, de 8/10/2022 (por e-mail)
- https://theintercept.com/2022/09/20/as-vesperas-da-eleicao-assembleia-de-deus-usa-cartilha-de-odio-para-doutrinar-fieis-contra-lula-feministas-e-lgbts/


CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...