sexta-feira, 25 de julho de 2025

ANÁLISE: Político não monetiza: questão de ética

 
          Iniciadas nos primeiros mensageiros instantâneos como ICQ e MSN Messenger e partindo na primeira plataforma de interface moderna de amizades em comunidades (Orkut), as redes sociais oportunizaram mais do que amizades sem fronteiras. Elas têm bolhas (comunidades) limitadas por algoritmos.

Algoritmo e monetização  
                Algoritmo é a direção de uma postagem para pessoas ou grupos específicos de posições afins.  Se a postagem aprovada pela plataforma tem um bom apoio financeiro, ela gera lucro ao influenciador, ou seja, é monetizada. Não são monetizadas postagens sem apoio financeiro suficiente.
                O influenciador é mais do que um simples divulgador ou analista de conteúdo digital de qualquer teor. No contexto capitalista, ele só é digno desse nome quando lucra com conteúdo direto de boa capilaridade entre os internautas – mesmo se for inverídico.  E inverdades é o que mais foi espalhada na internet nos últimos 8 anos.
                Já abordadas no blog por suas implicações nefastas, as inverdades representam apenas um detalhe, mas importante, de um problema muito maior, de profunda importância pública: a monetização de conteúdos por agentes públicos ativos. Sua legalidade – ou não – é assunto em trâmite no Congresso nesse momento.
                
Agentes públicos 
                Pessoas que ocupam qualquer cargo público definido em lei. São: servidores (estáveis ou temporários), de comissão  (temporário, nomeação política, por lei deve ser servidor), empregados públicos (de estatais de capital fechado ou misto), e políticos (eletivos, exercem profissão política nos poderes Executivo e Legislativo).
                Exceto os empregados públicos, (CLT), os demais têm outros vínculos trabalhistas. Recebem salários normalmente, mesmo em férias ou licença. Não é raro governantes nomearem comissionados vindos da iniciativa privada, o que faz muita gente se perguntar: é incompatível conjugar atividade privada e a pública?
                
Restrições
                Via de regra, os agentes públicos têm restrições específicas. Acúmulo de cargos é legal entre profissionais de saúde (duplo vínculo), desde que não coincidam dias e horários e não ultrapasse a soma de 60 horas semanais. Servidores públicos não podem ter negócio em seu nome, para evitar ganhos extras de qualquer natureza.
                Diferente dos servidores, muitos políticos são empresários. E, em linhas gerais, agentes públicos podem ser influenciadores? Ainda não há uma definição legal muito clara, mas vamos lá: muitos influenciadores têm na monetização de seus conteúdos como sua única fonte de renda e são pejotizados (com CNPJ) por exigência das plataformas.
                Os trabalhadores pejotizados são microempreendedores individuais (MEIs): têm negócio em seu nome, mesmo sendo trabalhadores.  E como lei geral agentes públicos não devem ter negócio em seu nome, a monetização de conteúdos – cuja massificação é parte do objetivo de lucro – merece toda a atenção. Daí tramitar uma nova PL no Congresso.
                
PL 1674/2022
                De Chico Alencar (Psol-RJ), o texto altera a Lei de Improbidade-2020, que coíbe o lucro de deputados por vídeos no Youtube. Na verdade, ele pretende preencher lacunas na lei vigente, ao propor vetar agentes públicos de obter vantagem financeira de qualquer natureza, tipificando a infração como improbidade administrativa. Tornou-se conhecida no jornalismo como PL anti-Nikolas.
                A alcunha se refere ao deputado federal mineiro Nikolas Ferreira, famoso por monetizar seus conteúdos em redes como Instagram, no qual tem conteúdo exclusivo para assinantes, no TikTok e no X. Foram descobertos também ganhos em seu negócio de mentoria Caixa Preta, para treinar futuros pretendentes à carreira política, com professores políticos bolsonaristas.
                Os "professores" em questão são: Cleitinho, Magno Malta, Eduardo Bolsonaro, André Fernandes, Ana Campagnolo, Coronel Zucco, e Bia Kicis, todos eles parlamentares bolsonaristas famosos por seus currículos de indecoros, mentiras e cristofascismo (se bem que Malta tem se encharcado mais do que pregado).
                No Youtube, outros políticos monetizadores, que tiveram reembolsos vetados foram Carla Zambelli, Joice Hasselmann, Bia Kicis, Otoni de Paula, e Flordelis, esta última cassada e folclorizada após ser condenada à prisão por ter matado o ex-marido. O único não bolsonarista também afetado foi o petista Paulo Pimenta.
                Vale citar nesse rol o colega bolsonarista Gustavo Gayer. Ele também tem lucrado com monetização nas redes. Além de conteúdo exclusivo para seus assinantes, ele possui loja virtual que vende o livro A mentalidade conservadora, do filósofo estadunidense Russel Kirk, a mais de R$ 150.
                Os exemplos acima revelam que, mesmo não totalmente proibida, a atividade liberal por agentes públicos é permissível a irregularidades. Por isso, o PL anti-Nikolas avançou com aprove pela Comissão de Administração e Serviço Público da Câmara. Mas, se avançar em comissões maiores, não sabemos.
                
E as postagens dos perfis oficiais?
                Em linhas gerais, hoje todos os políticos têm perfis nas redes sociais. É o marketing político atual. Mas não são monetizáveis, mesmo com milhares de seguidores. São perfis oficiais, criados por suas respectivas assessorias de comunicação, para divulgar seus respectivos feitos. Portanto, eles operam dentro da legalidade vigente.
                Mas os perfis oficiais dos políticos dentro da lei enfrentam um problema: baixo alcance entre a população internauta. Como somos influenciados pelo apelo visual ou audiovisual, o caleidoscópio chamativo de cores conjugado com o tom sensacionalista dos áudios fomenta a viralização massiva das postagens.  É aí que entram os perfis oficiosos, de natureza pessoal, mas para fins ideológicos. É neles que políticos lucram com monetização.

Fria análise
                 O novo texto elaborado por Chico Alencar é bem vindo nesse contexto de engavetamento da PL2630 da regulação das redes. Mas enfrentará barreira da oposição no Congresso. Não só pela autoria ser de esquerda, mas também pelo lobby político de Nikolas Ferreira e outros bolsonaristas junto às big techs no projeto de poder com inverdades. Falar que é inveja do alcance de Nikolas é fácil, mas sabemos que é uma questão de regulação.
                Além desse lucro compartilhado, o núcleo Lira-Motta no Congresso também guerreia contra o governo. O arquivamento da PL 2630 é só um detalhe. A dupla chefe do centrão tem amansado os bolsonaristas revogando os vetos de Lula 3 para proteger a elite econômica da justiça social tributária, incluindo aí aqueles por trás das gigantes big techs.
                Enquanto o STF julga a regulação das redes e a PL anti-Nikolas tramita a passos de tartaruga e esquecida pela grande mídia, duas lutas devem ocorrer: um abaixo-assinado pelo aprove da dita proposta, e o perfil oficial do governo lançar mão de conteúdos chamativos, com o presidente falando, no seu perfil oficial. Afinal, os bolsonaristas têm projeto de poder para 2026. E o templo passa rápido até as eleições.
Nota: [1] exceto em alguns casos, como licença para concorrer à profissão política.
Para saber mais
- Intercept Brasil - Lei anti-Nikolas é aprovada em comissão após reportagem do Intercept e pode vetar deputados-influencers. (newsletter por e-mail).
- Meteoro Brasilo que é o projeto de lei anti-Nikolas, aprovado em comissão no Senado. https://www.youtube.com/watch?v=FytmegSQ5Ag
- https://nikolasferreira.com/caixa-preta/ (treino para ser político)
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Bônus - O DESESPERO DE UM INFLUENCER

                Como todo mundo já sabe de sobejo, o deputado federal Nikolas Ferreira teve o seu recorde de votos - em torno de 1,5 milhão - graças à sua influência nas redes sociais. Ele conseguiu esse número graças ao engajamento da galera mais jovem, entre os 16 e 20 anos de idade, nas redes sociais, o seu grande refúgio e seu meio primário antes da eleição.
                Enquanto festejava nas redes a sua vitória eleitoral, ele assistiu a derrota do candidato a presidente com quem sempre se identificou: Jair Bolsonaro. E, em 2023, antes da posse da nova legislatura em fevereiro, ele amargou ao ver a cena de Lula subir a rampa com um grupo de representantes de parte da diversidade social.
                Como Nikolas já demonstrou tantas vezes, não podemos de forma alguma subestimá-lo. A começar pela sua eficiência comunicativa e por ter influência financeira através da comunicação online. Mesmo o apelidando como Chupetinha, o adversário André Janones já advertiu o governo e o STF sobre o real perigo que ele carrega.
                Desespero- mas,  o avançar dos novos depoimentos no julgamento da intentona de 8/1  pelo STF com prisão de vários réus tem ocasionado um clima de tensão entre os parlamentares bolsonaristas. Pesam suspeitas de que eles tenham incentivado daquele vandalismo, ainda em investigação sigilosa da PF.
                É nessa hora que, a despeito de toda a sua autoconfiança na sua capacidade de engajar, Nikolas revela suas fraquezas, como todo mundo que se forma em encrenca. Ele viu a prisão preventiva de réus graúdos, generais de quatro estrelas, e Bolsonaro, seu esteio político, na iminência desse caminho com uma tornozeleira eletrônica.
                E olha que a Justiça está sendo uma verdadeira mãe com o ex-presidente!
                Primeiro fracasso - com Bolsonaro advertido por Xandão de não postar entrevistas nas redes sociais e não ultrapassar os limites de horários fora de casa, Nikolas e seus colegas ideológicos criaram um cenário para entrevista coletiva ao ex-presidente, que deu bolo. Disfarçando, ele mentiu descarado: "Moraes o proibiu de dar entrevista".
                O recuo de Bolsonaro - que chorou durante pregação de Michele em culto - pode ter sido acertado. Mesmo em obediência, ele poderia ser filmado por alguém infiltrado em meio à plateia jornalística que poderia postar em possível perfil falso nas redes sociais, tornando sua prisão inevitável. E a mentira de Nikolas pode reforçar a suspeita entre o STF.
                Cenário ridículo- atrás da mesa dos líderes na tribuna, um grupo de parlamentares bolsonaristas esticou uma bandeira azul com a inscrição "Trump: make America great again". Foi uma homenagem ao presidente dos EUA por enfrentar as autoridades brasileira. Além de patética, a cena revelou o antipatriotismo dos partícipes. 
                Um dos partícipes, Nikolas mantém a mesma consonância ideológica com o seu quase desafeto Eduardo Bolsonaro. Dias antes, ele homenageou o estadunidense na tribuna. Janones tentou filmá-lo como antipátria, mas foi impedido por outros bolsonaristas com socos, pontapés e uma aparente apalpada na genitália.
                Queda possível- como dizem os antigos, quanto mais alta a montanha, mais profundo é o precipício. A carreira meteórica de Nikolas com recorde de votos para deputado pode redundar, nas eleições seguintes, em um recorde negativo. E talvez não seja difícil explicar por que.
                O primeiro sinal veio quando a patuleia enfim entendeu que ele votou a favor de pautas impopulares como taxa das blusinhas, aumento de deputados com ganhos redobrados e contra a tributação de grandes rendas. Ele reagiu ameaçando o governo pelo efeito das campanhas de IA pela IRRF maior para os mais ricos.
                O outro sinal é a denúncia recebida do Ministério Público Eleitoral de MG (MPE-MG),  acolhida pela Justiça Eleitoral mineira. Segundo o texto, Nikolas é acusado de caluniar o então candidato Fuad Noman à reeleição de 2024 em BH. Outro denunciado é o ex-candidato bolsonarista Bruno Engler. Noman morreu em 2025.
                O juiz da 29ª Zona Eleitoral de BH Marcos Antônio da Silva deu 10 dias para os dois apresentarem as suas defesas. Se condenados, Nikolas e Bruno terão que indenizar a família de Noman. O deputado e o vereador ainda podem ser cassados e tornados inelegíveis por 8 anos.
                A condenação também pode ser parcial, limitando-se a um dos dois vereditos acima citados. No momento nada se descarta, ainda que a punição completa seja a mais correta. Não só daria razão ao ditado, como também poderá iniciar a tão sonhada limpeza moral no parlamento, a começar pelo Congresso.
                É aí que mais se centra o desespero de Nikolas. As três condenações indicam que ele não é 100% gênio. Agora o desafio judicial é maior e bem mais robusto: a questão está na lei e não na moral que se se pretende impor.
Para saber mais

                
                













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