domingo, 6 de julho de 2025

CURTAS 97 - ANÁLISES (IURD na PMSP, censura a Jorge Amado)

 

IURD NA PM: EFEITOS EM SP

                Anos 1960: missionários cristãos a mando do governo dos EUA entram na América Latina para impor a fé anticomunista. Anos 1980: atletas de Cristo entram no mundo esportivo profissional regado a música, bebida e amores. Anos 1990: a bancada da bíblia surge no Congresso e o pastor Marcos Pereira entra em presídios. Desde 2012, Guerreiros de Jesus depredam terreiros afro-brasileiros em favelas e expulsam fiéis. Desde 2016, grupos de PMs de Cristo são vistos rezando antes de iniciar suas rondas.
                Em si, a evangelização é considerada normal, com história secular para nós. Mas não a sua fascistização, que se traduz na intolerância dos traficantes evangélicos contra as fés afro-brasileiras, e também no acirramento da guerra urbana por trás das mais perigosas operações policiais nas periferias de muitas cidades.
                Evangelização nas polícias? Sim. Não seria para melhorar a relação entre PMs e pobres? Deveria, mas só que não.
                IURD fundada por Edir Macedo no fim dos anos 1970, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD ou Universal) é pioneira do neopentecostalismo, dissidência pentecostal que não só promete fazer vencer a pobreza, como entra em vários mundos. O partido político Republicanos foi fundado por bispos da IURD.
                A criação de um partido político por uma igreja não só revela uma brecha na lei. Revela também como a IURD entra e se organiza nos espaços públicos laicos. Portanto, não é surpresa ela ter iniciado a evangelização dos reservados espaços das PMs Brasil afora. Em São Paulo, então...
                PM universal não é de hoje que o jornalismo investigativo tem reparado no porte e no poder da IURD. Mas só as reportagens mais recentes revelam como e o quanto esta organização empresarial-religiosa penetrou no mundo privado de cada policial militar e mais ainda, como tomou os quarteis da PM-SP.
                Foi tudo muito sutil. É totalmente plausível que as promessas fantásticas da IURD e aas revelações de seus pastores bem treinados atraíram de famílias a multidões pelo país. E se torna óbvio que, entre a crescente população fiel estejam soldados e/ou alguns oficiais PMs próximos a secretários estaduais de segurança. É só especulação.
                O que importa é que, para se chegar ao status atual nos quarteis paulistas, com direito a cultos e solenidades comemorativas organizadas pela IURD com presença do Secretário e do governador em pelo menos 10 Estados, algo deve ter começado lá de baixo para não chamar a atenção pública.
                Ferramentas possíveis fundado em 2005, o então Partido Municipalista Renovador (PMR), depois Republicano Brasileiro (PRB), atual Republicanos, tinha somente políticos fiéis. Mas liberou geral após o finado vice-presidente da República José de Alencar se filiar. Hoje ele integra o centrão e o liga à ultradireita.
                O PR foi a primeira evidência do projeto de poder de Macedo. Quando do flagra dos PMs rezando em 2016, a IURD já havia criado a organização Gladiadores do Altar, uma milícia paramilitar treinada com táticas militares para penetrar em recantos de difícil acesso do país e alcançar comunidades isoladas.
                Como as milícias que dominam favelas e bairros da zona metropolitana do RJ, a Gladiadores do Altar tem PMs nas fileiras ou é treinada por PMs ou militares das Forças Armadas para a citada penetração. Mas, quiçá, ela pode ter sido usada para adentrar nos espaços mais reservados da caserna da PM.
                Hoje hoje, a IURD formou 20 mil capelãos nas PMs estaduais em todo o Brasil. Em todos os quarteis paulistas há a Universal nas Forças Policiais (UFP) reúne capelãos para organizar vários eventos, como o aniversário da PM-SP e as cerimônias de formação de novos quadros de PMs aprovados em concurso.
                Sempre lotados, os cultos e eventos são realizados no salão de eventos do maior quartel da PM-SP ou no imenso Templo de Salomão. Em um culto no portentoso Templo, o coronel João Alves Cangerana Jr disse aos PMs a “necessidade” de “louvar os templos”, pois “os valores da PM coadunam com os da religião. Portanto, também considero importante para a saúde espiritual”.
                Só resta saber que valores são esses. Afinal, a PM contaminada pela IURD é a mesma que acumula recordes de letalidade nas periferias das cidades paulistas, inclusive na capital. É a mesma que recentemente tentou remover, com muita violência, moradores da Favela do Moinho, a última do centro da capital.
Para saber mais
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CONTRA BRIGAS, NÃO A JORGE AMADO

                Como já abordado em vários artigos, o Brasil elegeu Lula de volta após 4 anos de pesadelo. Mas, junto às heranças malditas na governança, se segue forte o pânico moral criado pela fascistização da fé com o bolsonarismo. E, claro, a saudade dos mais velhos dos “gloriosos” tempos da ditadura militar.
                Tudo que se refere a gênero, sexo e sexualidade é alvo conhecido do pânico moral. Vemos várias expressões homotransfóbicas de Nikolas Ferreira e a insistência do pastor Sargento Isidório em não reconhecer a identidade sexual da colega Erika Hilton ao chama-la de “meu amigo”, mesmo respeitosamente.
                Em matéria de infância, os bolsonaristas falam muito de protege-las da sexualização. E em matéria de violência infantil? A vereadora bolsonarista Jéssica Lemonie, de Itapoá (SC) disse ter a solução para contra os problemas infantis: censurar a “literatura violenta” na rede de ensino básico.
                Censura a Jorge Amado – a riqueza literária brasileira tem sido explorada em cursos preparatórios para concursos públicos e ENEM. Entre os grandes escritores, em geral críticos da sociedade, se destaca para este artigo o saudoso baiano Jorge Amado – o meu escritor favorito.
                De Itabuna (1912), Jorge Amado foi advogado, jornalista e político. Mas seu reconhecimento global é o de um dos maiores escritores de todos os tempos. Modernista, sua obra é riquíssima, recheada de crítica à moral de costumes, luta de classes e ritos de candomblé, e a mais adaptada para TV e cinema.
                A zona rural do Cacau o inspirou a escrever Tocaia Grande, Tieta do Agreste, Gabriela, cravo e canela e Pastores da noite. Já Salvador chancelou mais títulos: Jubiabá, Capitães da Areia, Dona Flor e seus dois maridos, Tenda dos Milagres e a menos conhecida e hilária O sumiço da santa: uma história de feitiçaria.
                Capitães da Areia – o alvo literário de Jéssica é Capitães da Areia. Adaptada na TV e no cinema, a obra foca um grupo de meninos de rua que vivem os efeitos do abandono como exposição à violência e a vícios, rejeição, sexo e desigualdade. Cada menino trilha caminhos singulares redundando em diferentes finais.
                Para Jéssica, a obra “promove a marginalização infantil” e tem trechos com “violência e criminalidade”. Disse que a idade estimada pelas bibliotecas para sua leitura é de 18 anos. E ainda depreciou o escritor por ter sido comunista considerando a inclusão de sua obra uma “infiltração da esquerda nas escolas pela literatura”.
                Até o momento, a Câmara de Itapoá não apreciou o texto. As Secretarias de Educação (municipal e estadual) não se pronunciaram.
                Contradição e bizarrices - os bolsonaristas se dizem defensores da ideologia biológica binária de gênero e heteronormatividade de mando masculino. Por outro lado, são contraditórios entre defender o armamentismo civil e reprovar a violência infantil, entre ser pró-vida (antiaborto) e ser indiferente ao abandono infantil.
                Nunca vimos políticos bolsonaristas defenderem a infância periférica e não-branca, mais exposta à violência que dizem condenar. E são indiferentes à letalidade policial sobre menores inocentes pelas ditas “operações de guerra ao tráfico”, no jargão das polícias. Ou seja, simplesmente os consideram criminosos.
                Daí serem bizarros seus projetos de lei. Como a Lei da Calcinha, que condena exposição corporal em eventos públicos e noivas sem calcinha desde 2013 em Vila Velha (ES); a bolsa-estupro que prevê bolsa para a vítima grávida para não abortar; e a PL da prisão da vítima que abortar gravidez resultante de estupro.
                Exceto a de Vila Velha, que é municipal e está válida, demais bizarrices ainda tramitam no Congresso, com chances remotíssimas de aprovação. Todas resultam da fascistização religiosa, já abordada no blog. A proposta da vereadora catarinense é apenas mais uma que entra no estranho rol de bizarrices.
Para saber mais
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