Feminicídio: a
atualização de um antigo flagelo sociocultural
Como referência no artigo Fatores
da violência: uma teia bem entranhada de fatores, de minha autoria, a violência
é um problema tão historicamente arraigado que se tornou um marco de nossa
sociedade, com várias formas a depender do tipo de crime. Entre essas formas, uma
delas se destaca no cenário contemporâneo: o feminicídio.
O nome já descreve o crime: a
morte ou a invalidez permanente da mulher decorrente da violência desferida
contra ela em função de gênero. Seu reconhecimento recente como crime no nosso
código penal deriva de “feminicídio” ser um termo descritivo novo, ainda que
seja há muito conhecido e criminalizado nas legislações de vários países da
Europa e América do Norte.
Embora a tipificação como crime
no código penal brasileiro em 2016, a luta das mulheres para isso já dura há
muitos anos. Hoje, feminicídio é cerne na Lei Maria da Penha de 2006,
tornando-se referência para refinamento estatístico, cujos dados obtidos, somando-se
denúncias e subnotificações, revela o país entre os 10 mais perigosos do mundo
para as mulheres.
Sua relevância confronta a política
de “conservadorismo de costumes” do novo governo, que tem se concentrado na
retirada de conteúdos didáticos como sexo e reprodução humanos, sociologia,
filosofia e referências a nomes conhecidos de ideologia progressista e de
esquerda; a obrigatoriedade do ensino religioso confessional e a exclusão dos
LGBTQs das novas diretrizes de direitos humanos.
O MEC atual excluiu qualquer
assunto referente a discussão de gênero e... feminicídio. O que preocupa,
diante de números assustadores. Em 2017 morreram pouco mais de 5000 mulheres, a
maioria nas mãos de homens próximos (namorado, cônjuge, padrasto, vizinho). Só neste
janeiro/2019 se confirmaram 91 casos novos. Média de 3 casos/dia. Fora as
subnotificações. Parece pouco, mas é muito.
A causa de tantos feminicídios no
país é multifatorial. Ao machismo secularmente assimilado por tantas mulheres se
aliam outros fatores, como a impunidade policial e até jurídica, e a omissão
popular dos que seguem o ditame “em briga de marido e mulher não se mete a colher”.
A afirmação “com certeza houve motivo” soa no mínimo cruel, se não sórdida de
tamanho cinismo e insensibilidade.
O momento urge muita reflexão sobre
discussão de gênero. É necessária a
sua compreensão e reflexão educativa, visando eliminar a política de ódio ao
progresso social da mulher, que distorce o tema como “ideologia de gênero” e
alimenta o ódio misógino. Pois é essa política que, adotada pelo atual governo,
que agudiza as relações destrutivas e em sua consequência, a violência de
gênero.
Daí ser tão necessária a tenaz
resiliência dos contrários à misoginia. O equilíbrio delicado se sustenta na
confrontação de forças opostas. Deve-se resistir a essa política de ódio que
incita à violência misógina que mata, até que os ultraconservadores se sintam
enfraquecidos pelo lento sucesso da mitigação do ódio e das mortes resultantes.
É necessário que a população seja conscientizada de
que o feminicídio não é mimimi, é tão hediondo quanto violações sexuais em
geral, sequestro, latrocínio e tráfico. Deve-se ter ciência de que a lei
sozinha não resolve o problema, deve ter a educação cidadã como aliada, pois
ambas se somam para redirecionar a vida social, contribuindo para que a
cidadania plena, crítica, justa e solidária, possa combater o feminicídio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário