sexta-feira, 10 de abril de 2020

Fria análise: Mandetta e a saúde federal

     Se o último artigo objetivou a análise do pronunciamento de Bolsonaro em cadeia de rádio e TV, este visa analisar, com a frieza necessária, a fala do ministro Mandetta, que ocorreu antes, sobre a saúde federal.
     Com o crescimento acelerado dos casos de Corona nesta semana, Mandetta foi indagado pelos jornalistas sobre o colapso na saúde pública, centrando-se nos hospitais federais.
     A fala ocorreu após dois momentos: a desistência do presidente em demiti-lo via general Braga Netto, e uma declaração esdrúxula de um Mandetta recuado, de que com o tempo, "o povo se curará com chá".
     Nessa situação, Mandetta foi indagado por jornalistas sobre a atuação da saúde federal com a pandemia. A sua resposta presumiu a isenção das unidades federais num contexto um tanto intrigante, com importantes pontos obscuros postos a seguir.
     Segundo ele, os quadros de servidores dos hospitais e institutos federais estão idosos, "sem renovação, muitos se aposentando". E como motivo, apontou a "falta de concursos há mais de 20 anos".
     De fato, na saúde federal se concentram os concursados mais velhos. Porém, poucos em fim de carreira: a faixa etária dominante é de 35 e 45 anos, graças aos concursos de 2005 e 2009, para Rio de Janeiro e Brasília, respectivamente.
     O de 2005 foi amplo, para cargos de nível médio (administrativo e técnicos em várias áreas) e superior, também em várias áreas. de 2009 foi específico para lotação em Brasília e abrangeu várias áreas de nível superior, e o único de nível médio de técnico contábil.
     Seja como for, nestes dois concursos RJU foram nomeados aprovados relativamente jovens em grande número. Desde então, os afastados por aposentadoria e outros motivos estão sendo substituídos por terceirizados privados e contratados temporários da União (CTU).
     Desde a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) por lei específica de 2011, não há mais concursos RJU na saúde federal, e nem nas esferas municipal e estadual, graças às Organizações Sociais (OSs) que terceirizam serviços de saúde.
     As autoridades alegam que a substituição de RJU por CTUs e terceirizados facilita chamar novos profissionais para cobrir a lacuna dos antigos que se aposentam. Mas a rotatividade tem precarizado o serviço e agravado a crise de pessoal.
     Pior: estão mais esporádicas as novas contratações de CTUs para cobrir colegas em fim de contrato ou RJUs a aposentar. Tudo isso e a propaganda irresponsável de Bolsonaro sobre a cloroquina se somam num cenário perigoso no enfrentamento da pandemia.
     Esses pontos obscuros e as omissões e erros de Mandetta sobre o pessoal da saúde federal tornaram sua fala esdrúxula e ridícula, evidenciando o fato de que o ministro foi estratégico em se calar aos caprichos do presidente para a coisa não ficar pior para o MS.
     No cenário de representatividade nos quadros do governo, ninguém ainda é melhor do que Mandetta para segurar esse terrível jogo político na saúde pública. Antes ele do que olavistas como Osmar Terra e o presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres.
     Quem sabe, diante dessa mixórdia em que se meteu e a realidade da pandemia, que não ignora, Mandetta abra os olhos e pense no quanto o SUS é sempre imprescindível como o único caminho para evitar uma tragédia de "proporções bíblicas".
     É só olhar para o completo caos na saúde dos EUA, que é totalmente privada e não evitou a tragédia que se abate sobre os estadunidenses. Então, viva o SUS!
     
     

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