Curiosidade: Depressão, o vazio de si
Devido à vivência sociocultural, algumas doenças são estigmatizadas - até hoje. Uma delas é a depressão, tema deste sétimo artigo de #Curisiosidades, que pretende contribuir para desmistificar este importante mal.
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As risadas dos amigos irritam Juca, que está introspectivo, desmotivado, abatido sem fim, querendo se afastar, e se senta num banco próximo. Um amigo se aproxima e o chama, mas ele se recusa. O amigo se afasta.
Instantes depois uma amiga se aproxima do rapaz, que está cabisbaixo. Ela pergunta o que houve, ele diz "nada". Ela ri baixo imaginando ser "frescura de amor partido", e se afasta.
Os demais lhe percebem a tristeza, mas nada fazem. Rindo, um deles é indiscreto: "que frescura é essa". Juca não reage, mas a palavra o toca: tapa o rosto, uma ideia fixa aparece: quer só livrar o mundo do pior - dele próprio.
O tempo passa, os amigos se despedem, dele também, e se vão. Ele ali fica, na solidão da praça, na ideia fixa que o tortura ainda mais: livrar o mundo do pior- ele mesmo. Não, não é tristeza, frescura, nada disso. Ele está deprimido.
Passa o tempo, os amigos se despedem, dele inclusive, e se vão. Ele ali permanece, imerso na ideia fixa que o tortura ainda mais, sem que pudesse entender. Não, não é mera tristeza. Ele está deprimido.
-> Sobre depressão: visão geral
A depressão é uma alteração psíquica, um transtorno de humor e de afeto, variável em sintomas e gravidade. Esse conceito genérico foi criado a partir das observações clínicas de pessoas com sintomas-chave como abatimento, tristeza e ideação autodestrutiva.
O termo depressão é uma alusão da pessoa que se sente "para baixo", tamanha a desmotivação para tarefas simples como tomar um banho, um líquido ou algum remédio.
Esse é apenas um dos vários objetos de estudo da Psicopatologia, ramo científico que visa estudar os transtornos psíquicos visando sua compreensão, e que nasceu de estudos pioneiros de Pinel e Esquirol no fim do século XVIII, e de Emil Kraepelin no século seguinte.
Esquirol descreveu, em 1819, quadro de "melancolia sem delírio" com tristeza, abatimento, desgosto e ideia fixa. Autor do primeiro Compêndio de Psiquiatria, Emil descreveu em 1883 o que hoje é o conhecido transtorno bipolar ou lobitimia.
Hoje, a Psicopatologia é o objeto-chave dos estudos específicos da psicologia e da especialidade médica Psiquiatria, que se juntam no intuito de devolver aos pacientes a qualidade de vida prejudicada pelos transtornos psíquicos. E a depressão é um dos
A Psicopatologia se tornou o objeto-chave da medicina psiquiátrica, que cuida do estudo clínico, de etiologia e de meios para aliviar ou combater o sofrimento imposto pelos transtornos. A depressão é um dos transtornos mais desafiadores na atualidade.
Visões subjetivas de diferentes saberes
Existem várias vertentes, que possuem visões subjetivas sobre a depressão: a médica, a biológica, a psicológica, a sociológica, sem descartar interdisciplinaridade, por influência filosófica. Eis:
Biológica- visão organicista do fenômeno para a investigação científica para ver a possível origem evolutiva (pressões genéticas e ambientais).
Médica- visão organicista e finalidade científica idem, mas visando desenvolver meios de mitigação e/ou cura dos transtornos.
Psicológica- adota postura flexível, a partir das perspectivas do indivíduo assistido, com métodos clínico e psicanalítico. Também assimila influência sociológica.
Sociológica- algumas referências antropológicas e culturais como estímulos psíquicos negativos.
Pelas finalidades supracitadas, a psiquiatria tem seu humanismo reconhecido pelas ciências humanas como psicologia e sociologia, independente de suas visões próprias. A depressão é hoje um objeto de constante estudo psiquiátrico.
Psicologia e sociologia compartilham suas visões em depressão no estudo de fatores estimuladores externos. A primeira auxilia a psiquiatria, e a segunda aponta fatores econômicos e culturais sobre a amplificação do transtorno.
Tipos de depressão
A depressão é um transtorno de manifestação heterogênea, sendo por isso classificada em tipos.
Maior- a mais comum e genérica. Tristeza, desânimo, angústia, e alterações (concentração, apetite, sono, libido) persistentes. Graus leve, moderado e grave. Trata-se no combo de antidepressivos, hábitos saudáveis e psicoterapia.
Sazonal- crises no inverno, em países bem frios como Escandinávia, Canadá e norte dos EUA. Se manifesta com melancolia. Trata-se no combo acima e fototerapia1 (o inverno quase não tem luz solar) para estimular o cérebro.
Distímica- termo em paulatino desuso. Melancolia leve e persistente, mas prejudicial com o tempo. Trata-se com psicoterapia e alguma atividade física.
Atípica- necessidades alteradas (insônia ou sonolência, perda de apetite ou ânsia de comer) que pioram no fim do dia, com humor sensível. Trata-se com o combo, e estabilizadores de humor para os casos mais instáveis ou graves.
Psicótica- além dos sintomas corriqueiros, há delírios de perseguição ou pressentimentos negativos. Raros casos graves de se acharem mortos. Tratamento: antipsicóticos são essenciais; antidepressivos dependem do caso, com avaliação profissional. É um tipo bem prejudicial ao paciente e à família.
Mista- confunde com ansiedade; tem pensamento acelerado, compulsão de compras, de sexo ou de reação a outrem. Tratamento: estabilizadores de humor, antes de se pensar em antidepressivos2.
Melancólica- angústia, falta de energia e tristeza absoluta muito intensos pela manhã, melhorando durante o dia. É facilmente identificável, mas necessita suporte de família e amigos para incentivo. Se trata com o combo; a eletroconvulsoterapia3 (estímulos elétricos), só em casos graves.
Vale salientar a infantil, que se manifesta na infância e pode ser intrínseca (congênita ou genética) ou extrínseca (abuso por adulto). Seu diagnóstico chancela tratamento mais leve e melhora a qualidade de vida dos pequenos, visando um futuro melhor quando crescidos.
-> Reflexões finais
Independentemente de sua heterogeneidade clínica, a depressão é, como qualquer outro transtorno psíquico, um desafio à vida dos pacientes, pois altera padrões de pensamentos e pode abrir portas para uma percepção negativa de si mesmo, o que é muito perigoso.
A fixação de ideação negativa, que afeta a consciência, é o gatilho para muitos casos de suicídio de depressivos e outros. Embora não totalmente elucidada pela ciência, pode estar ligada a um déficit de serotonina, neurormônio que estabiliza humor e pensamento.
Mas não se deve descartar os estímulos negativos, como os midiáticos, como a tragédia4 brasileira e notícias sobre famosos que vivem a exibir seus corpos "photoshopados" nas academias (ou no PC), que causam forte baixa autoestima em leitores mais sensíveis.
Apesar de setembro ser o mês comemorativo de prevenção ao suicídio, todos os dias são válidos em se instruir sobre os transtornos psíquicos. Para tanto, é preciosa a iniciativa de todos os meios de mídia, sociedade e esferas governamentais (ou ONGs), para a promoção da saúde psíquica.
Pois, apesar de seus riscos, a depressão é perfeitamente tratável, e até curável em muitos casos, se seguir as regras com afinco. O reconhecimento pelo paciente é o primeiro grande passo para o objetivo final, que é o combate a um dos mais temidos e desafiantes problemas de saúde pública de nosso tempo.
2020 está no fim, e chegamos vivos. Que todos tenham por todo 2021, e anos posteriores, o desfrute do mais valioso dos direitos: o de viver a vida.
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Notas da autoria:
1. Realizada em recinto iluminado, ela estimula o cérebro do doente a secretar neurormônios estabilizadores.
2. Antidepressivos podem acelerar mais o pensamento, daí a necessária análise do profissional antes de receitá-lo.
3. Eficácia comprovada nesses casos, segundo o psiquiatra Ricardo Alberto Moreno.
4. Tragédia sociopolítica, socioeconômica e institucional presente, que afetam a nação.
Imagem: Google.
Para saber mais:
- https://www.scielo.br/pdf/pcp/v27n1/v27n1a09.pdf (depressão segundo a Psicologia)
- https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0828.pdf (idem)
- http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1870-350X2007000300008 (psicopatologia e depressão)
- https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/quais-sao-os-principais-tipos-de-depressao/
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