domingo, 21 de março de 2021

Análise: a ditadura bolsonarista parte 2 


        Nessa semana, o presidente Jair Bolsonaro ficou irado com o desabafo da patuleia geral o chamando de "genocida" pela sua inação total diante das dimensões da tragédia da C19. Decidiu ameaçar geral com a Lei de Segurança Nacional.
        No dia 18/3, Bolsonaro foi ao STF conversar com o ministro e presidente do órgão Luiz Fux, que o questionou sobre a suposta ameaça de estado de sítio para "sossegar os ânimos" da geral.
        No calor da coisa, o presidente pediu na Justiça que liberasse comemorações oficiais do golpe militar de 1964. O ministro do STF Gilmar Mendes, quer analisar tudo isso.

-> "Genocida!"

        Que o mundo está sob uma nova onda da sindemia de C19 ninguém duvida. Houve novos dados mais altos de óbitos, o que já ocorre há algum tempo. Mas, nada comparado ao Brasil, cuja curva de óbitos sobe sem controle, frente à sorridente indiferença de Bolsonaro, Guedes et caterva.
        Continuando a defender o perigoso e fracassado Kit-C19 e aglomerações sem máscaras por aí, os Bolsonaros sorriem ao ver a atual faixa da assustadora cifra próxima de 3000 mortes oficiais diárias, que seria perfeitamente evitável se o governo tivesse tomado atitude certa há um ano atrás.
        Resultado: ecoa o grito "Genocida, genocida!!", iniciado por políticos, intelectuais, artistas e digital influencers, como resposta às exibições de frieza e desprezo à dor de milhares de famílias com medo e fome. Atravessou oceanos até chegar à ONU e Haia, onde as denúncias de genocídio estão em apreciação.
        Em 7/9/2020, Lula apontou Bolsonaro por usar a C19 como instrumento de "morte em massa", e repetiu a dose em discursos recentes. Também o chamando de genocida, Haddad engrossou o deboche em resposta à ameaça do presidente à geral por ser acusado de... genocídio.
        Genocídio vem do grego genis (origem), e cidis (morte), matar povo de certa nacionalidade, etnia ou cultura. Mais especificamente, é a morte em massa de um povo local em curto espaço de tempo, por diversos motivos e usando métodos e instrumentos mais convenientes ou variados.
        Na história das Américas há registros de genocídios de nativos praticados pelos colonizadores. No século XX há vários, como em várias guerras (sino-japonesa, II Guerra, as da Coreia e do Vietnã...). Há os internos, como o da Bósnia e o da etnia tutsi de Ruanda nos anos 1990, e dos palestinos por Israel até hoje. 
        Aqui há diferenças: embora queira muito armar toda a população, Bolsonaro tem utilizado outros meios perigosos, como os mais de 400 agrotóxicos proibidos no resto do mundo, devastação ambiental, grilagens, assassinatos de índios e MSTs, cortes de benefícios sociais, e agora, o vírus da C19.
        Sua aliança com o Corona gerou o bolsovírus, que se tornou o mais eficiente instrumento de sua política de extermínio. O Corona sozinho é uma poderosa força da natureza, mas é bem menos letal do que o político bolsovírus, que se mostra mais perigoso do que as piores variantes naturais.
        Nessa semana em que houve quase 3000 mortes oficiais diárias, houve entrelinhas de que o dado é ainda maior, na faixa dos 3000 nos piores dias. Por conta disso, há quem aponte a possibilidade de o bolsovírus ser outra arma para um suposto golpe anarcomilitar.
        Calma, que ainda tem mais.

-> Ameaça na Lei de Segurança Nacional (LSN)

        A raiva presidencial se traduziu em ameaças a quem o chamasse de genocida. Enquanto a proposta de reformulação das PMs (falada neste blog) não sai, Bolsonaro lança mão da LSN como intimidação.
        A Lei de Segurança Nacional (LSN) atual foi criada em 1983, no final da ditadura. A alegação na época foi a mesma dos demais países, a de forma primária de defesa à soberania nacional. Mas, como ainda era uma ditadura e a demagogia sempre existiu, no Brasil ela teve outros fins.
        Na prática, essa lei serviu mais para regulamentar a intimidação sobre o próprio povo brazuca se resistir aos desmandos do governo e da elite. Endureceu a proteção à elite contra o suposto perigo dos pobres. Claro que na ditadura a desculpa era encontrar comunas infiltrados. Só que... 
        Agora estamos em contexto que restringe os comunistas à psicose da família Bolsonaro, pela qual bastou o presidente enquadrar o influenciador digital Felipe Neto, que nada tem de comunista, na LSN. E, não satisfeito, quer estendê-la a qualquer um que o chame de genocida.
        Se isso vier à tona, significaria praticamente um estado de sítio (previsto na LSN para situações excepcionais). Em se falando de estado de sítio, Bolsonaro se encrencou ao acionar o STF contra as ações restritivas de governadores de 3 estados para frear o descontrole da C19.
        Se encrencou porque o ministro do STF Luiz Fux o chamou para se explicar sobre esse estado de sítio. Pois, pela Constituição, a liberdade de expressão, desde que não lesione os governantes, tanto da parte do povo quanto de cátedra e de imprensa, são garantias democráticas constituídas.
        Bolsonaro disse não ter decretado estado de sítio contra ninguém, mas comparou o lockdown dos governadores dos três estados a estado de sítio. Nada a ver. Será que a Europa aplicou estado de sítio por causa de um vírus? Sem sentido algum.
        O lockdown tem sido medida encontrada para conter, com relativa eficiência. o descontrole da sindemia de C19, somado às medidas profiláticas da OMS. O estado de sítio é empregado em extrema crise sociopolítica, guerra civil, ditadura ou guerra geral. Dois eventos distintos, mesmo semelhantes.
        O STF reagiu. O ministro Lewandowsky mencionou que a ameaça de estado de sítio através da LSN sobre a geral por chamá-lo de genocida, e a questão do lockdown em três estados é, na verdade, "um fóssil normativo". Ou seja, apelar por uma atitude típica da ditadura não cabe ao contexto atual.

-> Reflexão final: a atenção continua

        Como se pode ver, as ações de Bolsonaro têm muito de alarde onde não há necessidade. Por ser mestre em causar alarmes e cortinas de fumaça justamente em momentos tão cruciais nessa esfera sociopolítica, muitos já se perguntam o que há por trás do festival de bravatas.
        Sim, esses dois anos têm sido de muita bravata, que alimentou a popularidade do presidente, ainda que seja no seu nicho eleitoral, hoje cada vez menor. Mas, foram maciotas para distrair o povo de seu viés autoritário e seus objetivos escusos.
        Viés que agora se transparece e com que Guedes se afina bem. Que o diga Pinochet. A tranca de direitos tem sido bem festejada pelos mais ricos, que lucram sobre os encargos pesados pagos pela patuleia popular. Somada com a encolha da oposição, Bolsonaro se sente totalmente à vontade.
        As ameaças e interferências do presidente mostra não só o seu autoritarismo, mas também suas fragilidades: sabe que tudo tem um limite e sente que o seu próprio limite pode estar mais próximo do que se imagina. Só não sabemos qual e como vai se operar.
        Os primeiros limites já se vislumbram: a lua de mel com o Centrão já acabou, e a relação com as FFAA não é muito diferente: promíscua, prostituída e hipócrita. Eles estão lá pelo salário. Não há, na verdade, um apoio incondicional dessas duas partes a Jair.
        Mas devemos ter atenção a Bolsonaro mesmo assim: ao dizer a apoiadores que "só Deus me tira daqui", ele pode estar em ameaça real, e pode usar seu plano B: decretar a formação de ala paramilitar de PMs estaduais que, alerta Marcelo Freixo (PSOL) ao canal do Youtube Galãs Feios, pode ser um instrumento de golpe - caso o resto se fracasse.
        Claro que esse plano B também expressa a fraqueza pessoal do governante. Mas, para um sujeito com possível perfil psicopata, merecemos estar alertas a qualquer movimento. Toda atenção é pouca.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. 

Para saber mais
- https://www.politize.com.br/lei-de-seguranca-nacional-o-que-e/
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_de_Seguran%C3%A7a_Nacional
- https://www.dw.com/pt-br/lei-de-seguran%C3%A7a-nacional-vira-meio-para-constranger-opositores-do-governo/a-56934688
- https://noticias.uol.com.br/colunas/camilo-vannuchi/2021/03/18/bolsonaro-pode-ser-chamado-de-genocida.htm
- https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2021/03/17/haddad-chama-bolsonaro-de-genocida-por-que-nao-manda-a-policia-aqui.htm
- https://www.uol.com.br/ecoa/colunas/julia-rocha/2021/03/16/se-nao-posso-chamar-de-genocida-eu-chamo-de-que.htm
- https://www.poder360.com.br/internacional/lula-volta-a-cobrar-articulacao-do-g20-por-vacinas-e-ataca-bolsonaro/
- https://odia.ig.com.br/brasil/2021/03/6108367-manifestantes-fazem-ato-a-favor-da-vacina-e-chamam-bolsonaro-de-genocida.html
- https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2020/12/12/interna_politica,1219925/bolsonaro-ataca-jornalista-que-o-chamou-de-genocida-assunto-repercute.shtml
- https://www.cartacapital.com.br/justica/policia-intima-felipe-neto-por-chamar-bolsonaro-de-genocida/
- https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/03/4912874-fux-liga-para-bolsonaro-questionando-declaracoes-sobre-estado-de-sitio.html




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