sábado, 13 de março de 2021

Análise dos fatos pós-decisão de Fachin

Análise: o furacão Lula!


     O Dia Internacional da Mulher de 2021 veio fulminante. Muito mais do que um dia de lembrar de tantas lutas renhidas há mais de um século, foi um momento especial no contexto sociopolítico brasileiro: o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, o Lula, está de volta. Com direitos políticos plenos.
     Esse retorno aconteceu graças à decisão do ministro do STF Edson Fachin de suspender as penalidades imputadas ao ex-presidente pelos ex-juízes federais Sérgio Moro e Gabriela Hardt, em tribunal de Curitiba, ambas no âmbito da operação Lava Jato, pelo caso do tríplex do Guarujá, no litoral de São Paulo, e no do sítio de Atibaia, no interior do estado.
     A decisão retira de Lula a espada jurídica pela qual as condenações em 2ª instância o enquadraram na Lei da Ficha Limpa, devolvendo a ele os direitos políticos então suspensos, conforme previsto na citada Lei.

-> Fatores da decisão de Fachin

     A decisão de Fachin foi movida por razões jurídicas a escancarar a conduta ilegal de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol no caso Lula. Mas, o foi também por razão interna: Fachin sempre foi favorável à operação da PF sobre corrupção que envolveu agentes políticos, gestores públicos (Petrobras) e empresários. 
     As empresas privadas envolvidas foram as empreiteiras Odebrecht, da família de mesmo nome; e a OAS. Também foi envolvido no imbróglio o grupo JBS, do qual faz parte a empresa Friboi, que entrou nas fake news como sendo propriedade de Lulinha, filho do ex-presidente.
     As citadas empreiteiras participaram de várias obras dos governos petistas, em especial as obras do PAC1. Aliás, a Odebrecht atua junto desde a ditadura. Como previsto em lei. O que pegou foi o mau uso dos recursos públicos pelas empresas. Que, vale lembrar, é um ato bem anterior ao PT e a Lula.
     E, na intepretação do STF, as ações de Moro em coordenar as investigações e Dallagnol em forjar provas documentais foram provadas em diálogos captados por hackers que ajudaram no derrame de informações conhecido como Vaza Jato pelo The Intercept Brasil ainda em 2018. Elas foram liberadas a Lula pelo STF recentemente.
     Além de toda a ilegalidade das atuações de Moro e Dallagnol, as conversas provaram a parcialidade de Moro, revelada no claro intento dos envolvidos em tirar Lula da disputa eleitoral de 2018, quando as pesquisas de intenção de voto davam ampla possibilidade do petista sobre Bolsonaro e demais nomes.
     Junta-se também na lista de ilegalidades o fato de uma sede de Curitiba não ter a competência para julgar a série de fatos de âmbito federal muito mais amplo, que deveria ser feita em Brasília. Mais do que as conversas, a incompetência local foi considerada por Fachin.
     Apesar das provas de má-fé dos de Moro e Dallagnol, Fachin queria a todo custo evitar a votação da suspeição de Moro pelos colegas para livrá-lo do pior. Mas, a votação acabou ocorrendo a posteriori, terminando empatada em 2 a 2, com Nunes Marques pedindo vistas "para se decidir". 
     Quem se deu bem nesse momento foi Lula. Até situação em contrário.

-> O efeito Lula

     Como a internet informa em tempo real, logo o fato a libertar Lula caiu na imprensa internacional, com repercussão em sua maior parte positiva, ainda que cautelosa. No mesmo dia 8/3, Lula recebeu mais ligações felizes dos governantes de outros países do que Bolsonaro em todo o seu governo.
     O povo se dividiu na maioria que foi positiva à decisão de Fachin, e a parte minoritária teve certa ironia ou revolta, mas os bolsonaristas e a caterva de Bolsonaro ficaram irados.
     Brasília ficou em polvorosa. O presidente da Câmara Arthur Lira condenou a decisão de Fachin; a PGR de Augusto Aras entrou com recurso contra a decisão. Nos bastidores se comentou que o Planalto teve chilique antes de Bolsonaro alegar a inverdade de que Fachin "teve forte ligação com o PT". 
     O vice-presidente Hamilton Mourão argumentou sobre a decisão como um "perdão à corrupção", e, "diplomático", tentou minimizar: "se em 2022 escolherem o PT, paciência". Mas seria ofuscado após o que veio: o discurso devastador de Lula.
     O discurso mostrou o estadista que a prisão refinou em vez de apagar. As muitas leituras, visitas de autoridades e entrevistas lhe refinaram o linguajar sem perder a arte do improviso, bem humorado e as rasteiras na mídia e no governo na condução da C19, com direito a campanha de conscientização.
     Claro que houve algumas escorregadas em um ou outro ponto no discurso, mas o espírito estadista com inegável poder popular e de oratória as ofuscou. 
     A internet mostrou maior intensidade reativa da geral após o discurso de Lula. Memes explodiram constrangendo ainda mais a ala bolsonarista, que sem argumento contra o discurso se limitou a atacá-lo de "ladrão", "o maior corrupto da história", e outras ladainhas já batidas. 
     Devastado, Bolsonaro sancionou decreto de incentivo à vacinação, e discursou com máscara a favor da vacina. Seu filho Flávio tuitou uma defesa à vacina, após muito achincalhá-la. Antes de anunciar a saída de Pazuello pelo médico e deputado do centrão Luizinho, no MS.
     Acusado de atraso no cronograma de vacinação, o MS já anunciou a compra de mais de 30 milhões de doses da vacina AstraZeneca, e outro lote de doses da russa Sputinik V - últimas ações de Pazuello.
     Após "causar" com vídeo curto enquanto dirigia, criticando a mídia sobre a campanha preventiva da C19 e sugerindo colocar máscara no furévis, Eduardo Bolsonaro finalmente tuíta defendendo uso de máscara e a vacinação com o ZéGotinha empunhando uma seringa improvisada em fuzil.
     Para finalizar este item: o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, cutuca Bolsonaro com elogios ao discurso de Lula reconhecendo-lhe a vocação estadista, apesar das nítidas diferenças políticas. Depois de sair pela porta dos fundos sem acenar ao clamor popular, tudo vale, não é? 

-> Reflexão final

     Em todos os aspectos acima, Lula deu uma reviravolta no status quo bolsonarista. Pelo menos na cena externa aos bastidores, aos olhos do público - o que merece reflexão se foi mesmo efeito de um encurralamento pelo efeito lulista, ou se foi mera conveniência da família e sua caterva. 
     Encurralado devido à súbita mudança de conduta e a expressão abatida do presidente. Conveniência por surgir tal mudança em momento crucial de sindemia da C19 e planejamento pré-eleitoral. Nesse caso se configura uma manobra grosseira, demagógica e mentirosa dos Bolsonaro, que não convence.
     Mas, segue a caravana aos trancos e barrancos. A substituição de general de intendência que falhou na sua especialidade logística, por médico no MS, aparentou ser positiva. Mas, em se tratando da era Bolsonaro, vale uma boa checada no histórico deste Luizinho como gestor em saúde.
     A tuitada de Eduardo Bolsonaro com o Zé Gotinha armado como descrito acima demonstra não só o mau gosto pela violência, como a tendência delituosa implícita em personalidades antissociais forjadas na má educação. A frase de Flávio reflete o seu tradicional cinismo. Válido refletir.
     Para finalizar, o próprio Lula. Ele mostra que se movimenta bem além das preocupações internas em seu partido: antes da entrevista coletiva, ele se reunira com o pessoal de um fundo russo e escreveu uma carta para o líder da China, Xi Jimping. O objetivo convergente é a aquisição de mais vacinas. 
     Mostra ele não só astúcia, tem inteligência política. Deu uma dura lição de ação e diplomacia, além de oratória e elegância com os jornalistas, sem perder apelo popular. 
     Por isso, se pode finalizar aqui que, enquanto Bolsonaro é o presidente oficial, em voto e burocracia, Lula é o estadista ex-oficio. Um é o corpo que carrega a faixa presidencial, mas o outro é a sombra que tende a pôr as coisas em movimento, o que se espera de um líder da nação.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. Programa de Aceleração do Crescimento, conjunto de tarefas de infraestrutura e desenvolvimento em PPP (participação público-privada) nos governos Lula com casas populares, ampliação de acesso à água e eletricidade, crédito popular, etc. 

Para saber mais
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/03/10/com-discurso-de-estadista-lula-se-torna-a-gastrite-de-bolsonaro-ate-2022.htm
- https://www.agazeta.com.br/brasil/lula-afirma-em-discurso-que-pt-nao-pode-ter-medo-de-polarizar-0321
- https://g1.globo.com/politica/blog/andreia-sadi/post/2021/03/11/nos-bastidores-governo-admite-que-queria-polarizacao-com-pt-mas-nao-com-lula.ghtml
- https://ricardoantunes.com.br/exclusivo-bolsonaro-troca-pazuello-pelo-deputado-luizinho-na-saude-e-reforca-apoio-do-centrao1/
- https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-03/ao-congresso-pazuello-nega-atraso-em-cronograma-de-vacinacao
- https://blogs.oglobo.globo.com/bela-megale/post/lula-e-vacina-reuniao-com-fundo-russo-sobre-sputnik-v-e-carta-para-xi-jinping.html




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