segunda-feira, 8 de março de 2021

O morticínio de Bolsonaro: reflexão

     Enquanto o mundo começa a sentir a remissão dos números da sindemia de C19, o Brasil assume a frente do avanço da maré. Entre preocupado e indignado, o mundo assiste às cenas de cemitérios que não param de crescer, e a dor dos que ficam a digladiar com a insensibilidade do governo.
     
A foto ao lado mostra um cemitério urbano a se expandir entre cercas de mato em alguma cidade brasileira qualquer. à esquerda da foto, já aparece outra ala do cemitério. Vejam essa foto para se ter ideia do seu tamanho, e para mostrar que algo está anormal por aqui. E segue assim.
     Não é de se admirar que toda essa miscelânea paradoxal ecoe forte na mídia internacional, com riqueza de detalhes dos quais possivelmente os europeus e estadunidenses saibam mais do que nós, brazucas, do que ocorre aqui. 
     Nessa mistura paradoxal de fatos um personagem invisível se protagoniza: a diversidade do vírus da C19. Diversidade esta que acrescenta mais spoilers de reflexão neste artigo.

-> Aglomerações fatais

     A cada mais de 1000 mortes diárias, sem considerar as muitas subnotificações, ocorre um evento popular em que a figura central é Bolsonaro. Ele está lá, sem máscara para dar seu exemplo e incentivar mais aglomerações ao debochar dos que lutam para se cuidar e viver para tocar o país.
     Nesses eventos festivos se opera discurso de palanque- característica notória da cultura política do Brasil desde sempre. Mas, para Bolsonaro, da boca para fora, há um motivo, como mostra Leonardo Sakamoto, em artigo da blogosfera do UOL em 2/3:

"Ele acredita que a melhor forma de passarmos pela pandemia é todo mundo ir para a rua e se expor ao coronavírus para adquirir a imunidade de rebanho. E os mortos e feridos que deixaríamos com essa tática suicida? Como ele mesmo disse, todo mundo morre um dia. Quer dizer, dane-se".

     Nessa citação se evidenciam dois pontos consideráveis, um deles a ignorância sobre a imunidade de rebanho, e a estarrecedora insensibilidade com os sentimentos dos outros em relação à morte, que tem vergonhosa repercussão global.
     É normal que a vida nos traga maturidade psicológica suficiente para encararmos a morte de forma bem realista, mas sempre choraremos a perda de nossos entes queridos. Mas Bolsonaro é um caso à parte, nada normal. É possível que, se um de seus filhos morrer, ele reaja com frieza.
     A frieza com outrem já foi tratada neste blog, sobre a alta chance de personalidade antissocial e/ou psicopatia. Bolsonaro se alega na carreira militar, mas a sua afirmativa é desmentida pelo seu laudo psicológico feito por psicólogo do Exército, que consta diagnóstico de "agressivo, antissocial e inapto para a vida militar".
     Já a imunidade de rebanho é pouco compreendida mesmo. Essa resistência adquirida por exposição contínua e secular a determinado patógeno existe, surge via evolução por seleção natural de indução à memória imunológica. Para se ter uma ideia, 520 anos depois, ainda há indígena morrendo por gripe comum no Brasil.
     Amarrando a explanação acima, pode-se dizer que, por sua capacidade manipuladora, o presidente induz aos populares em geral a seguir a vida pré-C19, um caminho ao abatedouro, invocando pelas aglomerações fatais no sórdido mote de salvar a economia.

-> Sindemia a serviço de Bolsonaro ou coincidência? Reflexão final

     Que a C19 é uma sindemia a encontrar nas condições socioambientais, sanitárias e políticas terreno fértil para a sua disseminação; que o seu vírus é transmissível e a cada mutante, mais agressivo, disso não se tem mais dúvidas. O que não se esperava era deparar com governos favoráveis ao flagelo. Como Bolsonaro.
     Neste âmbito, não podemos descartar que o aparecimento da C19 em plena era Bolsonaro seja, de fato, uma forte (e péssima) coincidência. Afinal, é uma força da natureza, mesmo que os fatores para a sua disseminação tenham sido antrópicos - ainda mais no comportamento desse governante.
     Não seria de se surpreender, se a galera se lembrasse de que o Brasil já teve governantes relapsos antes, como os da ditadura militar, que demoraram a agir contra a também sindemia de meningite que assolou o país em 19743-4. Seria algo a ser lembrado, mas, enfim, são outros tempos.
     Mas, mesmo sendo a era Bolsonaro um contexto diferente da do regime militar, alguns aspectos históricos se repetem, como o viés autoritário e a prioridade em satisfazer interesses de grandes grupos privados na hiperexploração das classes populares e o desprezo aos serviços públicos essenciais.
     É certo que Bolsonaro já se prestava com retrocessos ainda em 2019, mas o seu encontro com a C19 apressou ainda mais as coisas. O descontrole da C19 evidencia esse retrocesso de 50 anos em 2 anos, pois lembra o comportamento inicial do surto da meningite há 37 anos.
     Nesse encontro, Bolsonaro conseguiu vislumbrar e fazer valer o bolsovírus, resultado da fusão do líder com o vírus. O Corona é natural, mas não o bolsovírus, e é este o mais agressivo e contagiante, abrindo as porteiras e pavimentando a avenida para o abatedouro coletivo, onde passa a sua boiada.
     É a partir desse encontro, ocorrido há um ano e hoje mutante e mais agressivo, que o bolsovírus mostra não ser uma coincidência, e sim um produto premeditado de um plano cruel e desumano, que revela a concepção distorcida de Bolsonaro sobre o povo como descartável após satisfazer seus desejos. 
     Mas, o bolsovírus não pensa amplamente: com o fim de quem ele mais oprime, ele próprio terá o seu fim. Um fim que tem tudo para ser tão trágico quanto o das centenas de milhares que matou. Com uma diferença ainda mais amarga: no seu próprio leito de morte, não verá uma lágrima de condolência.
      
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Imagem: Google

Notas da autoria
1. 

Para saber mais
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/03/03/bolsonaro-sabota-medida-capaz-de-frear-covid-e-ritmo-das-mortes-acelera.htm
https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/03/02/bolsonaro-ve-mortos-da-covid-como-peoes-descartaveis-no-xadrez-da-reeleicao.htm
- https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2020/04/14/juiz-manda-bolsonaro-excluir-igrejas-da-lista-de-servicos-essenciais.htm
- https://www.viomundo.com.br/politica/miola-pazuello-e-bolsonaro-tem-que-ser-julgados-por-genocidio-morticinio-arruina-imagem-das-forcas-armadas.html

     

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