sábado, 21 de agosto de 2021

Análise: nova ameaça aos servidores?


        Com o avanço da análise do texto da PEC32 na Câmara dos Deputados na consciência, frente de servidores públicos concursados organizou o #18A, importante manifesto que reuniu não só a classe especificada, como também muitos colegas temporários (também servidores), familiares e populares simpatizantes.
        A PEC32 já foi abordada neste blog em alguns artigos, em seus significados em variantes como o futuro do serviço público com o fim da Lei 8112/1990 (estatuto do servidor), a liberdade de indicações políticas e outros pontos inerentes à proposta. Mas, nova luz amarela de alerta já pisca, indicando outra ameaça ao funcionalismo: a PEC dos precatórios.
        O texto foi enviado ao Congresso, para apreciação pelos parlamentares, no dia 8/8, sem nenhum alarde sobre isso. Mas, o que são precatórios? O que essa PEC propõe? Em que sentido ela ameaça os servidores públicos?

Precatórios, na Constituição hoje e na PEC

        Precatórios: tema frequentemente espinhoso nos corredores da política. Talvez por isso mesmo ninguém teve interesse de modificar a legislação pertinente ao assunto. Agora, na era Bolsonaro, o ministro-polvo Guedes surge com uma nova PEC: a dos precatórios.
        Antes de abordar sobre ela, vale deixar definição de precatórios: são ordens de pagamento acima de 60 salários-mínimos a serem pagos por ente público, determinadas pela Justiça após condenação. As partes autoras do processo judicial podem ser tanto pessoas físicas quanto jurídicas.
        Parece positivo, pois possibilita imaginar uma categoria de servidores financeiramente prejudicada reivindicando indenização na Justiça com possível causa ganha. Calma: nem tudo são flores.
        Hoje, a Constituição estabelece vários critérios sobre precatórios, como categorização de débitos, beneficiários, os prioritários, e também sobre os limites, formas e fontes de pagamentos. Essas e outras providências estão dispostas em vários artigos no Título IV e Capítulo III, a partir do art. 100.
        Visando alterar vários artigos deste trecho citado, a PEC dos precatórios tem nortes dignos de ver. Além do fim dos "esqueletos" (despesas a alguém, ente ou programa já extinto), ela propõe se adequar à EC do teto dos gastos, buscar a sonhada eficiência pública e a redução do tamanho estatal.
        A criticada EC do teto dos gastos e o mito do Estado inchado têm sido as justificativas de Guedes (e da mídia da casa grande) para a aprovação de suas sonhadas reformas. Apelidado de "PEC fim do mundo" na época do trâmite, o teto dos gastos congelou gastos das áreas essenciais, sem atingir a elite.
        Guedes afirma que o pagamento pode ser acelerado usando privataria como "moeda de troca" para criar um fundo patrimonial. "Se tem fundos do setor privado que compram títulos das dívidas, se alavanca a transformação do Estado", diz, em eufemismo a disfarçar o mito do "estado inchado".
        Garantias- Segundo Guedes, a PEC preveria o pagamento imediato e integral de valores de até R$ 66 mil, e parcelamento para valores maiores. Para os superprecatórios (acima de R$ 66 milhões), se propõe entrada de 15% e 9 prestações iguais anuais. Guedes ainda garante que "não haverá calote", e "os mais vulneráveis serão totalmente preservados".
        A julgar pelo desempenho do ministro desde o início do governo, resta saber se vai cumprir.

PEC e servidores - reflexões finais

        Ao entregar o documento com o texto da PEC ao Congresso, Guedes afirmou veemente defesa da proposta, que por seus princípios visa o adiamento do pagamento do volume de precatórios somados em R$ 89,1 bilhões para 2022. 
        Como os precatórios significam pagamento obrigatório sem caber mais recurso, adiar se torna um calote ou pedalada - o que já torna a PEC polêmica. Guedes justifica os R$ 89,1 bilhões como "quantia inesperada, muito acima dos R$ 57,8 bilhões estimados".
        Por isso, a estratégia de parcelamento na proposta e de adiamento de pagamentos para evitar uma iminência de calote. E, para completar, Guedes ainda emendou que, se não houver aprovação da PEC pelos parlamentares, "os servidores ficarão sem salários em 2022".
        A declaração pareceu soar como uma ameaça. Ou chantagem, como soou entre parlamentares. Um destes, Marcelo Ramos (PL-AM), respondeu que "ele já deveria ter aprendido que a Câmara não se submete a [...] chantagem barata", sugerindo ainda um diálogo "com termos sérios e técnicos".
        Entre servidores públicos se acendeu o alerta amarelo, com razão: a geral já está ligada à PEC da reforma administrativa, que prevê uma verdadeira dissolução da atuação do Estado no atendimento à população, uma cópia fiel do ocorrido no Chile de Pinochet, por autoria do próprio Guedes.
        Como se sabe que Guedes é hostil ao desprendimento estatal a serviços públicos essenciais como saúde, educação, saneamento, segurança e previdência, os servidores atentos tendem a reagir à fala acima citada como uma ameaça clara, não importando as garantias.
        Em se tratando de garantias, aliás, vale se atentar à intensa possibilidade de que, por trás daquela fala macia que publiciza suas propostas como salvadoras da Pátria, ele é uma faca de dois gumes: a depender do desempenho nos rumos econômicos, a PEC é uma fumaça tão escura quanto a daqueles tanques militares.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. 

Para saber mais
- https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2021/08/pec-dos-precatorios-e-enviada-ao-congresso-nacional
https://precato.com.br/precatorio/?keyword=o%20que%20%C3%A9%20precat%C3%B3ria&pht=50461610108740194&utm_source=google&utm_medium=cpc&utm_term=o%20que%20%C3%A9%20precat%C3%B3ria&utm_campaign=%5BAcesso%5D+Pesquisa+Precato+Brasil+%5BTopo+Funil%5D&hsa_acc=4710453419&hsa_cam=12420203175&hsa_grp=117071660046&hsa_ad=500939397497&hsa_src=g&hsa_tgt=kwd-309694783913&hsa_kw=o%20que%20%C3%A9%20precat%C3%B3ria&hsa_mt=b&hsa_net=adwords&hsa_ver=3&gclid=Cj0KCQjwpf2IBhDkARIsAGVo0D0JGw-Gm6yfP9lkAqg-i0q5ae4bbjFBKMypVA7dK70XV5lT3b2MVv0aApZ8EALw_wcB
- https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_08.09.2016/art_100_.asp
- https://www.gov.br/economia/pt-br/centrais-de-conteudo/apresentacoes/2021/agosto/pec-precatorios.pdf
- https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/08/13/pec-dos-precatorios-preve-parcelamento-e-muda-indice-de-correcao
- https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2021-08/pec-dos-precatorios-preve-parcelamento-de-dividas-acima-de-r-66-mi
- https://blogs.correiobraziliense.com.br/vicente/guedes-diz-que-sem-pec-de-precatorios-nao-vai-dar-para-pagar-salarios/
- https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/08/4944833-guedes-defende-pec-dos-precatorios-com-ameaca-ao-salario-do-funcionalismo.html
- https://www.poder360.com.br/congresso/marcelo-ramos-fala-em-chantagem-de-guedes-por-pec-dos-precatorios/
- https://odia.ig.com.br/colunas/servidor/2021/08/6216947-ameaca-de-guedes-para-aprovar-pec-dos-precatorios-nao-deve-surtir-efeito-diz-representante-de-servidores.html
- https://www.poder360.com.br/congresso/marcelo-ramos-fala-em-chantagem-de-guedes-por-pec-dos-precatorios/

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