terça-feira, 26 de outubro de 2021

Análise: Brasil Paralelo e a captura ideológica nas periferias

 

        Recentemente, mídias grandes como as paulistas Folha e Estadão reportaram, em tom otimista, sobre uma suposta ação social de amplo alcance a ser empreendida em cerca de 300 comunidades pobres urbanas. Além de doações, essa ação também contaria com eventos culturais e curiosidades. Bem, a princípio todo otimismo tem sentido quando se trata de solidariedade.
        Mas, quando os atores são identificados, toda reserva se faz necessária. Afinal, escaldado pelo sofrimento histórico, o povo já sabe: "o milagre quando é muito até o santo desconfia". Ainda mais num país como o Brasil, onde os mais ricos sugam dos mais pobres até as últimas gotas. Daí, algumas mídias independentes têm lançado nota desconfiada acerca desse lance.
        Na imprensa on-line, uma que se destaca é o Diário do Centro do Mundo, conhecida mídia de esquerda, e alguns canais disponíveis em redes sociais.
        Entre os canais do Youtube, um dos que se destaca é O Historiador, apresentado pelo sergipano Carlito Neto, historiador e filósofo cursando sua terceira faculdade (Direito) e especialista em Ciência Política. 
        No citado canal ele expõe suas análises políticas, e num de seus vídeos ele identifica os atores da elogiada ação, em tom de denúncia: são o Brasil Paralelo e a G10. Para ele, por trás dessa generosidade de grande porte há duas intenções, o lucro e outra mais profunda, uma vez que o Brasil Paralelo é bem conhecido no Youtube.

G10 e Brasil Paralelo

        Segundo as mídias, a G10 é uma organização social (OS) tida como “filantrópica”, por seus gestores que, quando indagados sobre se juntar ao Brasil Paralelo, se limitaram a dizer que era “pra difusão informativa e cultural aos jovens carentes”. A emenda saiu pior do que o soneto.
        Pois bem, na saúde elas atuam como fornecedoras terceirizadas de recursos humanos qualificados. Mas, também são citadas em várias denúncias de irregularidades financeiras, pois seus gestores são políticos e/ou empresários, em geral estreitamente ligados a políticos. Todos compartilham ética bem duvidosa.
        Como a Associação Filantrópica Nova Esperança, uma das Oss em saúde no Rio, cuja receita quintuplicou em 2 anos, e seus gestores têm estreita relação com o senador Flávio Bolsonaro, por sua vez acusado de comandar “rachadinhas” (peculato, corrupção) com assessores, e sabidamente ligado a milicianos. E, também, ligado à cúpula da G10 e, claro, do Brasil Paralelo.
        O Brasil Paralelo é um canal conhecido no Youtube há anos, mas também atua em outras redes sociais como Twitter e o Instagram. Com efeitos audiovisuais, tem narrativa com lógica própria e afirmações e negações categóricas sobre fatos e pessoas sem permitir margem a dúvidas e questionamentos.
        Apresentado pelo astrólogo vidaloka Olavo de Carvalho e outros, o canal exalta figuras, ditadoras ou não, da direita capitalista, e deprecia fatos e nomes tidos como de esquerda ou comunistas pela grande mídia. Há um cristocentrismo notório e desprezo à diversidade. E, detalhe, Olavo é guru da família Bolsonaro.
        Confusão mental- Considerando-se essa soma de característica, o Brasil Paralelo é tratado pelo filósofo e youtuber Paulo Ghiraldelli como meio de disseminação de confusão mental, que ele chama de DCP, ou deficiência cognitiva programada, como resultado da intencional desconstrução da veracidade dos fatos sociopolíticos.
        Ghiraldelli assinala que o canal traz desinformação anticientífica (terraplanismo, C19 não existe, discurso antivacina e pró-tabaco[1]), e violência ideológica, disseminando falácias como “ditadura comunista” do PT, chip chinês comunista e “globalismo marxista”, tudo isso usado em fake news que ajudaram a eleger Bolsonaro.

Esquema em favelas: reflexões
        A denúncia de Carlito Neto em seu vídeo concorda com a narrativa de Ghiraldelli sobre a ideologia e conteúdo do canal Brasil Paralelo, revelando a intenção de doutrinar ideologicamente os favelados, usando a ação caritativa da G10 para angariar confiança e consequente aceitação das desinformações.
        Carlito Neto ainda deixa evidente que canais de esquerda como Henry Bugalho, Plantão Brasil e outros em conjunto já ajudam os favelados. Se sabe que até Felipe Neto, que não é esquerda, faz suas ações sociais. Todos sem alarde e sem promessas vãs.
        Carlito menciona que cerca de 300 favelas estejam nos planos de alcance da dupla, mas sem especificar cidade ou região. Vale conferir isso, pois a julgar pela teia de ligações políticas, as maiores favelas dos principais redutos bolsonaristas do país podem ser os alvos diletos dos operadores.
        Nisso, se chega à ideia de que, de todos os redutos bolsonaristas, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina se tornam os pontos cruciais a partir dos quais os tentáculos se espalhariam para as demais regiões. No Rio, milicianos podem dar uma forcinha extra na jogada, nas grandes e populosas áreas de domínio.
        Já operante- como demonstram as matérias das mídias paulistas, é possível que a dupla já esteja em ação, sem aviso para não dar alarde. Talvez por isso, curiosamente, alguns líderes locais não saibam. É o que veio mostrar a matéria do Diário do Centro do Mundo, na qual, indagado sobre o tema, o líder da Associação dos Moradores de Paraisópolis, em Sampa. Estranhou: “quem é esse Olavo?”.
        Esse desconhecimento pode parecer estranho, mas faz sentido pleno, uma vez que evidencia a natureza insidiosa da atividade e as segundas intenções por trás do slogan caritativo e socializante que publiciza a ação da dupla G10-Brasil Paralelo sobre os jovens mais carentes e religiosos, a parcela mais impressionável das patuleias faveladas.

        Verificando-se o encaixe das diferentes fontes informativas, inclusive dentro do próprio Youtube, onde inúmeros vídeos do canal Brasil Paralelo ainda estão disponíveis, é fácil concluir que tanto Ghiraldelli quanto Carlito Neto têm razão sobre a orientação e as reais intenções da dupla com as populações periféricas.
        E a ação da dupla pode ser apenas um reforço de peso: em palestra, o autor da Teologia da Libertação Leonardo Boff disse que foi nas esquinas das periferias que as bases do bolsonarismo encontraram os pontos mais férteis para crescer e se consolidar. Sim, faz sentido.
        Não que os cidadãos favelados apoiem a associação entre entes tão distintos quanto os religiosos, outros filantrópicos, empresas e políticos por uma ideologia violenta e destrutiva como o bolsonarismo e correlatos. Mas sim, que os mais carentes são mais crédulos e vivem sob pressão do crime organizado que se liga a tal movimento.
        As favelas, portanto, são os postos-chave de disseminação de ideologias. E, não por acaso, ante o avanço de Lula na liderança das expectativas para 2022, que o Brasil Paralelo e o G10 vão disseminar novos delírios para a captura das periferias contra a volta da “esquerda”.


[1] Para Olavo, o prejuízo clínico pelo tabaco é uma mentira para desacreditar a indústria e o produto, apesar do próprio sofrer de DPOC devido ao vício.


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Imagem: Google

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=w8pm1ITix6o (denúncia de Carlito Neto, O Historiador)
- https://www1.folha.uol.com.br/colunas/gabriel-kanner/2021/10/parceria-entre-brasil-paralelo-e-g10-favelas-une-propositos-e-desperta-esperanca.shtml
- https://www.diariodocentrodomundo.com.br/olavo-paraisopolis-brasil-paralelo/

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