quarta-feira, 23 de novembro de 2022

CURTAS - ANÁLISES RÁPIDAS 11

 
Teto dos Gastos, o natimorto

        As causas da deposição de Dilma Rousseff com base em problemas de seu governo ou na falácia de pedalada fiscal caíram por terra tão logo Michel Temer tomou o cargo de presidente, e fez um dos governos mais antissociais da história da Nova República.
        Nos dois anos e meio da era Temer, três reformas foram propostas, e duas delas foram aprovadas plenamente: a da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a do Teto dos Gastos públicos (EC55).
        Ambas as reformas já foram abordadas no blog, nas suas épocas de publicação e vigor. Mas, dentro da era Bolsonaro, a do teto teve uma abordagem comparativamente mais superficial merecendo, portanto, uma análise reflexiva mais profunda.
        Sabemos que, em tese, a EC55 foi promulgada em 2016 com o objetivo de limitar os gastos públicos em geral dentro da inflação oficial do ano anterior. Com isso, se preconizou cuidado. Mas, sabemos que isso foi só da boca para fora.
        Poucos perceberam que houve aumento salarial acima da inflação para servidores de elite, mas os salários dos estratos medianos e mais baixos, já defasados, foram congelados desde 2016 até hoje. Fora os cortes de verbas dos serviços essenciais e benefícios.
        Mesmo assim, as ultrapassagens aos limites impostos pelo teto foram várias, para cartões corporativos, passaportes diplomáticos, viagens de autoridades públicas, compras de muitos imóveis de luxo, salários surreais de milicos, investimentos indevidos em offshores, orçamento secreto e escândalos em saúde e educação nos dão luz sobre os rombos.
        O próprio Temer fez rombos na EC55, mas a era Bolsonaro a arrombou muito mais, com ao menos 4 arrombamentos, segundo as mídias. Chamam atenção salários dos milicos, torra mensal de R$ 1,2 milhão no cartão corporativo presidencial, orçamento secreto e compra superfaturada de carne, leite condensado e outros mimos aos milicos.
        Agora, a equipe de transição do presidente eleito Lula já discute com o parlamento e juristas sobre a PEC que permite gasto com o novo Bolsa-Família de R$ 600 e beneficio adicional por criança, por 4 anos. Fora do teto e com segurança jurídica.
        Retirando-se essa exceção jurídica da nova PEC de Lula, tudo que foi citado nos leva a recordar da fala de um deputado em 2018: “as leis são como mulheres, são feitas para serem violadas”¹. Só que, bem mais do que violada, a EC do teto dos gastos já nasceu morta.

Nota da autoria
¹ Declaração feita por um deputado na era Temer, sobre as transgressões às leis por políticos (via telejornallístico).

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Na eleição de Lula, a sobrevida da democracia

        A tolerância é harmonia na diferença. Não é apenas um dever moral, como também uma exigência política. A tolerância é a virtude que faz possível a paz e contribui para substituir a cultura da guerra pela cultura da paz”.
       A citação acima foi dita pela presidente do STF Rosa Weber, aludindo à Declaração de Princípios sobre a Tolerância, aprovada em 1995. A declaração foi feita na abertura de nova sessão no Supremo para comemorar no dia 16 o Dia Internacional da Tolerância, proclamada pela UNESCO (órgão da ONU em educação, ciência e cultura).
        O propósito de Weber na fala não se restringiu às referências acima. Ela também associou aos ataques de ódio a colegas do STF em Nova York, por brasileiros bolsominions lá residentes, quando eles iam e saíram de um evento a portas fechadas num hotel.
        Em relação aos bolsominions inconformados com a sua vitória, o eleito Lula também se manifestou. Ele considerou lamentável a manutenção de um protesto por inconformismo inglório ou por um delirante apelo de golpe militar.
        Segundo Lula, “Eles não sabem nem o que pedem. Eu se pudesse dizer para essas pessoas, voltem para casa. Democracia é isso. Uma ganha, outro perde. Um ri, outro chora. Não sejam violentos com quem pensa diferente de vocês. Vamos respeitar quem não gosta do candidato que nós gostamos”.
        Ele ainda completou: “A democracia é isso. É viver na diversidade. Não peço pra ninguém gostar de mim. Só peço que respeitem o resultado eleitoral. Nós vencemos a eleição, vamos recuperar esse país e vou precisar muito de cada um de vocês”.
        A fala de Lula coaduna também com outra fala de Weber: “A democracia, fundada no pluralismo de ideias e opiniões, a legitimar o dissenso, mostra-se absolutamente incompatível com atos de intolerância e violência, inclusive moral, contra qualquer cidadão”.
        Nessas afirmações são perceptíveis dois fundamentos claros. O primeiro retrata o propósito antidemocrata de Bolsonaro em seu ruidoso silêncio; e o outro, o de que a vitória do velho petista representou, além da vontade popular, a sobrevida da democracia face à persistência da extrema-direita.

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Lula e o governo indigenista

        Os povos originários das colônias do supercontinente América perceberam outra afinidade além da de serem indígenas: a de que foram alvos de massacres colonizatórios e das eternas disputas de terras e seus recursos, bem como a invisibilidade étnica.
        Em meio a essas afinidades desagradáveis, a situação dos originários brasileiros é mais grave, em comparação com seus colegas da América do Norte e bem similar à de alguns povos indígenas dos vizinhos latino-americanos.
        Os princípios republicanos não findaram os homicídios de indígenas no Brasil, com picos em eras autoritárias. Na ditadura¹, 8300 pessoas foram mortas, segundo a comissão da verdade em 2014. Em regimes democráticos houve queda da frequência desses crimes.
        Além do aumento dos tiroteios letais, que culminaram com as mortes de Bruno, Dom e outras lideranças, a C19 foi outra arma mortal. Há relatos de expulsões ilegais por invasores de terras com incêndio e/ou tiros, raptos de meninas e mulheres para servidão sexual e crianças pequenas mortas por dragas de garimpo.
        Em meio a isso, no STF está pausado o julgamento do Marco Temporal bolsonarista sobre terras indígenas. Toda essa conjuntura virou uma reivindicação silente, mas oportuna e expressiva, pronunciada nas aldeias indígenas através do voto.
        A escolha praticamente unânime a Lula em aleias indígenas é o retrato do voto de sobrevivência, mais válido do que o falado voto útil. Agora, na equipe de transição, Lula escala lideranças indígenas, e uma delas será ministra.
        Ao escalar a sua equipe de transição, o petista justificou a inclusão de indígenas como caminho “para cumprir a obrigação de fazer reparação”. A afirmação faz sentido e, críticas à parte por parte do mercado nervosinho, este poderá ser o primeiro governo indigenista da história da nossa República.
        Mas, vale uma ressalva de grande importância. A inclusão de representantes originários no governo não significa a prática de eliminação de povos da floresta. A morte continuará a rondar silente as aldeias, alimentada pelo bolsonarismo. Repousa, no coração dos originários, a esperança pelo respiro de alívio de melhora.

Nota da autoria
¹ A ditadura militar de 1964-85.

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O chilique ideológico do mercado

        Antes de viajar para o Egito, Lula se apresentou em discursos pós-eleição, como o ocorrido no Centro Cultural Banco do Brasil, em que o eleito se emocionou ao tratar sobre a sua maior ambição de governo: acabar com a fome e a miséria no país.
        Coincidência ou não, a mídia divulgou que nesse mesmo dia houve uma queda nas bolsas de valores e uma subida cambial no valor do dólar em relação ao real, resultando no chilique do mercado. Daí a geral considerou um absurdo o mercado se enervar com o fim da fome.
        Embora errada como fato em si, essa interpretação faz sentido. O capital se mantém graças aos muitos meios inibidores de ascensão social das camadas populares, vivem mais do estritamente necessário para a sobrevivência. Mas, o motivo fático mesmo foi outro.
        É que os cabeças do mercado interpretaram o objetivo social de Lula ao risco de perda da famosa responsabilidade fiscal que essa objetividade social centrada na PEC da transição poderia representar, por estar fora de outro item famoso e ligado, o teto dos gastos.
        Já foi explicado que a PEC social de Lula será paralela ao teto de gastos e conta com segurança jurídica baseada nos princípios cidadãos da Constituição. E aí o mercado vem com outro pretexto, já revelado antes: a suposta revogação da reforma trabalhista por Lula.
        A questão trabalhista também não justifica a ira. Até porque Lula sabe que revogação é praticamente impossível, mas sim a sua revisão e mudança. Ele propõe uma lei que regule os direitos dos trabalhadores-parceiros de aplicativos, para que eles tenham direitos.
        O capital reagiu parecido antes da eleição, quando Lula já candidato revelou discordar das perdas de direitos com a reforma trabalhista e pretende revisá-la para regulamentar os direitos dos chamados parceiros (por aplicativos), como motoristas e entregadores.
        Muitos discordam: “o contexto mudou”. Mas, ontem e hoje, o calor econômico sempre dependeu das chances de consumo de bens e serviços pelas classes populares. Inclusive o valor das ações na bolsa: o exemplo da BR está na carestia dos preços dos combustíveis.
        Portanto, tudo aponta que o chilique mercantil tem caráter político-ideológico. Pois nem nem a mídia hegemônica noticiou o rombo de quase R$ 1 tri no teto de gastos por Bolsonaro-Guedes. O mercado se considera antônimo de socialismo, ou de Lula, por sua origem popular e nordestina, mesmo acenando para os liberais.

Para saber mais
https://www.socioeco.org/bdf_axe-8_pt.html (políticas públicas são necessárias para dar gás à economia)
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Lula tomba dólar, petróleo e bolsa!

        Caros leitores, não se assustem com o teor que o título sugere. Não nego que é um doce sabor da ironia, não resisti. Mas tudo tem a ver com a notícia da Folha de São Paulo, transcrita pelo portal MSN.
        Tudo porque, em sua passagem pela COP27, Lula disse ter ciência da responsa fiscal, que o controle é fundamental. Mas sustenta que "pode gastar para fazer alguma coisa que tenha rentabilidade, para fazer o país crescer, melhorar". O mercado entrou em polvorosa.
        Segundo a mídia, a fala de Lula teve um efeito incomum: caiu o valor do dólar frente ao real, e também o preço do barril de petróleo tipo Brent-EUA, referência para a política de preços da Petrobrás aqui no Brasil, graças ao PPI que dolariza o valor dos combustíveis.
        Na verdade, a queda do dólar corresponde a um escorregão leve na casca de banana. O tombo do preço do barril de petróleo, porém, parece ter sido um pouco mais forte, refletindo na queda da Ibovespa, a nossa bolsa, em 0,13%, pouco mais de 108.700 pontos.
        A grande mídia ajuda ao agregar oscilações capitais às falas de Lula. Até a camisa de R$ 2580 de Janja entra. Concordo, é exagero. Mas não é nada, face ao escandaloso prejuízo fiscal de Bolsonaro, Guedes, samangos, pastores e caterva que não enervou mercado nem grande mídia.
        O maior efeito de Lula é priorizar os 160 milhões de estômagos famintos ou inseguros de ter comida. O sacrifício desses estômagos é interessante ao mercado, pois sinaliza os lucros escorchantes que a grande mídia divulga em alegres títulos garrafais de capa. 
        Alguns leitores podem até considerar esse pequeno texto um deboche. É deboche sim, mas contra os inimigos certos, que adoram uma crise como meio oportuno de lucrar mais.

Para saber mais
https://www.msn.com/pt-br/dinheiro/economia-e-negocios/d%C3%B3lar-cai-ap%C3%B3s-tom-conciliador-de-lula-mas-tombo-do-petr%C3%B3leo-faz-bolsa-cair/ar-AA14mZv7?ocid=mailsignout&pc=U591&cvid=8cc7f0cccc0d456c8813b143d16e328d (via Folha de SP)
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Nardes, mais um canalha

        Após Alexandre Marques, presidente do TSE, mandar cortar as redes sociais dos 43 financiadores das manifestações pró-golpe que retornam às estradas com mais força, um áudio foi vazado das dependências do TCU. O dono da voz foi identificado: Augusto Nardes.
        Antes presidente, Augusto Nardes é ministro do TCU indicado por Bolsonaro antes do pleito-2022. Tem ficado fora dos holofotes midiáticos desde então, mas bastaram os fatos do pós-eleição para ele aparecer, já se percebendo mal na fita por causa do áudio.
        O áudio em tela se refere às manifestações como parte de plano de golpe de Estado da turma de empresários, militares e políticos incluindo s Bolsonaro, à suposta agitação nos quarteis em Brasília e, pior, ele próprio se coloca favorável ao golpe.
        Não era para surpreender. Nardes iniciou sua carreira política pela Arena, a facção da ditadura militar, quase no fim dos anos 1970. Daí Bolsonaro gostar dele. Na democracia teve conduta discreta, como deputado e como ministro de Temer e de Bolsonaro, se sujando agora.
        Sim, se sujou. Afinal, entrou na lista de denunciados do presidente do TSE Alexandre de Moraes. Dada a sua posição, foi intimado a se manifestar publicamente, e se contradisse ao se dizer ser contrário ao golpe. Não deu certo, e agora ocorre que ele “adoeceu”.
        O que se torna minimamente “estranho”. Pois até onde sabemos, Nardes sempre nos pareceu bem de saúde, e o tom do áudio era de boa disposição. E, do nada, “adoece”, se afasta.
        Hospitalizações têm sido boas válvulas de escape para os Bolsonaro e sua caterva, sempre que surgia algo a arrochá-los na parede. O presidente é exemplo notório, alegando dores da suposta facada ou algum camarão comuna ferrando seus intestinos há anos em cacarecos.
        Agora é a vez de Augusto Nardes. A sua carreira pregressa já dava indicações de que ele não é mesmo flor que se cheire. Agora tão alinhado a Bolsonaro e fugindo da responsabilidade, entra na funesta e imensa lista definitiva de canalhas do presidente.
        
Para saber mais
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Vem aí nova lei do impeachment

        Enquanto a patuleia assiste preocupada o transcorrer dos fatos relativos ao plano de golpe e a suposta erisipela do presidente Jair Bolsonaro, o Supremo Tribunal Federal julga um novo texto que visa alterar a lei do impeachment.
        Ao que tudo indica, o relator do julgamento dessa proposta é Ricardo Lewandowsky, um dos ministros do Supremo. “Vamos apresentar um texto denso, robusto, atualizado, que faz com que a lei incorpore as previsões da Constituição”, disse ele a parlamentares.
        De fato, já estava além da hora de elaborar uma nova proposta de lei relativa aos crimes de responsabilidade, categoria criminal que motiva o processo de impeachment de presidentes, parlamentares e ministros em geral. O texto em vigor é de 1950.
        Impeachment não é recurso tradicional na história política brasileira. Já começa por ser termo inglês para designar “impedimento” ou, na prática, “interrupção”. Desde Collor todos foram alvos de pedidos, mas o recorde superior a 150 pedidos alvejou Bolsonaro.
        Ainda assim, o presidente da Câmara Arthur Lira sentou sobre todos, se vendendo a Bolsonaro a preço altíssimo. A quantidade de pedidos de impeachment é proporcional ao volume de crimes de responsabilidade de Bolsonaro – e faltou incluir ameaças de golpe.
        Já estava quite entre os ministros do STF atualizar o texto conforme a Constituição, devido às mudanças legais. Mas a coleção de crimes de responsabilidade de Bolsonaro, culminando com apologia antidemocrática, pode tê-los impulsionado a um texto melhor.
        O texto da nova lei de impeachment foi elaborado, analisado e aprovado por juristas, e é possível que já valha no mandato de Lula, que já governará sob pressão do parlamento conservador, da mídia e da elite econômica mimada por Paulo Guedes nesses anos.
        Se bem que, acenando para os liberais, Lula certamente escapa do impeachment, e se tiver desempenho próximo dos dois governos passados, poderá até se reeleger. Mas governará sob a sombra do impeachment. E disso ele já sabe.

Para saber mais
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Para alimentar falácias vale tudo

        Antes das eleições, o presidente Jair Bolsonaro e samangos da sua caterva tentaram de tudo para desqualificar a segurança da votação eletrônica.
        Mesmo que o próprio clã tenha sido todo eleito por essa via, Bolsonaro clamava pelo voto impresso. Quem vota no RJ deveria se lembrar de que, em 1994, Jair tentou fraudar o número de votos na zona oeste carioca dominada por milícias. E era voto impresso.
        Veio o pleito que elegeu Lula por margem muito apertada graças ao voto de cabresto imposto por pastores, empresários e latifundiários pró-Bolsonaro. E soltaram as manadas humanas nas estradas tão logo o TSE selou resultado oficial na noite de 30/10.
        Na transição, o PL de Valdemar da Costa Neto repetiu o feito do Ministério da Defesa antes do pleito. Vergonha: Alexandre de Moraes o emparedou exigindo provas do 1º turno, pois nos dois turnos todas as urnas foram exatamente as mesmas.
        Lula chorou sobre a fome e mercado deu piti sobre o fisco. Lula voou de jato alugado de empresário para COP27 e imprensa deu chilique. Lula falou da PEC fora do teto e o capital e a grande mídia quase tiveram colapso nervoso.
        Mercado, grande mídia, parlamentares bolsonaristas e milicos vigiam cada passo e fala do velho petista novamente eleito. O cara nem tomou posse ainda e já estão criando pedido de impeachment.
        A princípio desfeitas, as manifestações nas estradas retornaram com mais violência e ódio, expressando seguidas frustrações pelas fake news desmentidas. Novas fake news já surgem desmentidas: evita-se que os gados amaluquem mais ainda.
        A mais insistente é a do uso “ilegal” do jatinho particular para Lula voar ao Egito. Já foram indagados sobre qual lei, eles nem sabem responder. Já veio ferrada, pois autoridades competentes têm toda a papelada ok em mãos.
        Fala-se muito do silêncio deprimido de Bolsonaro que foi a hospital militar para tratar a erisipela. Silêncio mais ensurdecedor do que britadeira no asfalto: seus gados geram mais caos, revolta, tristeza, destruição, saques e prejuízos.
        O teor das falácias vale tudo para gerar dor de cabeça nos líderes das instituições e no eleito Lula. E não tem nada que indique seu fim após a posse do petista. Para isso servem as falácias: para desestabilizar. É de firmeza na guerra que Lula precisará para governar.

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