Uma limpeza difícil
Lula disse que, “se
eleito, farei o governo da minha vida”. Não há como saber de início, mas já
sabemos que ele terá desafios que talvez nunca tenha enfrentado em toda a sua experiência
política. E o que vimos nesse tempo nos dá uma mostra de sua relevância.
Na reascensão da extrema-direita na segunda metade dos
anos 2010, o pleito de 2018 revelou tipos “delegados” e militares como cabos, majores,
sargentos, que engordaram bancadas reacionárias no Congresso. Todos da esteira
de Jair Bolsonaro.
No pesadelo de 4 anos, esses personagens se juntaram
ao Centrão na boquinha do orçamento secreto, na aprovação de diversos
retrocessos e na disseminação de fake news
para turbinar suas campanhas como Bolsonaro. Alguns se desfizeram do governo, e
outros morreram de C19 ou devido a repentes estranhos, por serem teoricamente
sadios.
Mas, a partir de 2023, a tropa de choque bolsonarista
promete ser desafiadora para Lula. Nas negociações para consertar parte dos
estragos de Bolsonaro, ela poderá impor percalços, e Arthur Lira pode
condicionar as aprovações progressistas no apoio à sua campanha de reeleição na
Câmara.
Com a derrota eleitoral de Bolsonaro, muitos
imaginarão os bolsonaristas fraquejados, mas pode ser enganoso: ele ainda está
presidente até o fim do fogaréu em 31/12. Se a transição mostra já ser difícil,
imagine o quão espinhosa será a limpeza da maior parte do lixo bolsonarista no
governo.
Fonte: interpretação baseada em observação dos fatos políticos em diversas fontes.
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Se houve fraude, não foi nas urnas
Na véspera do 2º turno, pastores gospels advertiram
mais aos fiéis e empresários chantagearam empregados, para votarem em Bolsonaro,
enquanto mais mentiras eram disseminadas nas redes sociais por influencers e
eleitores bolsonaristas.
Ao vivo, foi ao ar um flagra de fraude eleitoral prévia
no interior, por uma equipe comandada por Caco Barcellos, do bom Profissão
Repórter, da Globo, que contribui para a formação de novas gerações de jornalistas.
A equipe se dividiu em três, para regiões distintas do
interior brazuca: Ouricuri (PE), Indaial (SC) e Coronel Sapucaia (MS). Em respectivo,
no 1º turno, deu 84% Lula, 72% Bolsonaro e empate. No 2º turno, em Sapucaia, Bolsonaro
venceu significativamente.
Em Sapucaia flagraram reunião da Prefeitura com
populares em 29/10. Funcionários anotavam nomes e documentos dos inscritos. Foi
possível identificar o ganho do Auxílio Brasil condicionado ao voto em
Bolsonaro, cujos registros seriam encaminhados ao MDS¹.
Quando indagados sobre o fato, o prefeito e funcionários
hostilizaram os repórteres, enquanto os populares optaram por se silenciar. O problema
é que, na prática, isso revela o caráter fraudulento do esquema, ao
invés de escondê-lo.
Durante o pleito, as polícias abusaram. Nas estradas nordestinas
a PRF desrespeitou a norma do TSE com blitzes demoradas, enquanto PMs atacavam
eleitores de vermelho em seções eleitorais em várias cidades. Em ambos os fatos
há vídeos e relatos.
Com Lula eleito, bolsonaristas protestaram interditando
rodovias por dias, cancelando viagens e tocando bizarrices com apoio das
polícias. Quem resolveu o problema foram torcidas organizadas que afugentaram a
geral e atemorizaram motoristas inocentes.
Em futuro próximo tais fatos serão esquecidos pela
geral, mas politicamente não. Eles são a prova viva de que só a segurança das
urnas não impede a fraude e induz a estatísticas artificiais. A maior insegurança
está nas pessoas e não nas máquinas.
Nota da autoria:
¹ Antigo
Ministério do Desenvolvimento Social, hoje secretaria na pasta da Cidadania por
Bolsonaro.
Para saber mais
- https://www.brasildefato.com.br/2022/11/02/suspeita-de-fraude-eleitoral-envolve-bolsonaro-em-denuncia-divulgada-na-globo-veja-repercussao----
O trabalhador e o
vagabundo
Após
a condenação e consequente prisão de Lula, a eleição de Jair Bolsonaro se deu,
além das pautas já abordadas no blog, também por suposta vidência mística de
que ele “é o cara que rumaria o país para
o desenvolvimento social e econômico”.
Na transição,
Bolsonaro passou a impressão de que seria um governo bem ativo, dada a forte movimentação
de textos dos muitos textos de decretos e medidas provisórias que marcaram o
seu governo desde após a cerimônia de posse.
Mas
a atividade depende dos protagonistas. Enquanto Guedes, Lira e Pacheco tocaram
no capital anárquico, Bolsonaro tocou o terror em festivas aglomerações,
motociatas, censura e o desprezo à dor de centenas de milhares de famílias das
vítimas de seu governo.
Ao
final do pesadelo de 4 anos, Lula volta a ser presidente pela 3ª vez, pela
escolha do povo. E agora, mal acabada a festa popular, ele já tece a teia de governo
e, convidado para a CPO27 no Egito, bota Alckmin para agir internamente, em um
governo pré-posse.
O septuagenário
petista demonstra o seu “tesão de 20 anos” em trabalho, enquanto os filhos do
inconformado Bolsonaro correm para ter passaporte de cidadania italiana. Com isso,
vale a reflexão final de que retiramos um vagabundo pondo de volta um trabalhador.
Até porque Lula disse que "este será o governo da minha vida". Que desejemos sorte, sabedoria e sagacidade para lidar com tantas situações espinhosas pela frente.
Fonte: análise
reflexiva a partir da leitura de matérias do momento de várias mídias.
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Bolsominions: a cada meme, a má educação
Com a derrota de Bolsonaro, os bolsominions (termo para apontar os fanáticos pelo extremista) reagiram muito mal. Para compensar o peso do luto seguido de revolta, vinha em momentos a euforia alegre a cada mentira propalada.
Com essa derrota incontestável veio outra compensação psicológica além das mentiras: o apelo por intervenção federal, eufemismo que designa o golpe militar, pois querem "um Brasil melhor", para "afastar o comunismo", sem saberem informar o que é isso.
Sinalizando o sequestro mental do bolsonarismo, os bordões se somam a bizarrices atitudinais tornadas memes virais nas redes a repercutir internacionalmente. Mas nem todos riem dessa soma de coisas, que gerou reflexões sobre a gravidade sociopolítica do país.
Para João Cezar Rocha, especialista em extremismo, essa conjuntura bizarra nos dá a mostra do Brasil como zona fértil para criar realidade paralela. EUA e países do Leste europeu (Polônia, Hungria e Ucrânia) estão parecidos, após o clássico exemplo alemão dos anos 1930.
Rocha aponta a ligação de forte religiosidade popular, militarismo, educação acrítica e política mercantilista como criadora da conspiratória "guerra cultural". Foi assim que a Alemanha nazista, a nossa ditadura e os três do Leste europeu criminalizaram o impraticável comunismo.
Autodeclarados antissistema, os atuais governos do Brasil e o Leste europeu entregam nações ao anarcocapitalismo, o capital ilimitado e mais perverso que sacrifica pobres, minorias socioculturais e o meio ambiente para impedir o mais utópico e sonhado dos sistemas.
Nesse paralelismo alienado conspiratório, as bizarrices distorcem ou invertem valores, o "herói político" envolvido é o endeusado combatente do "demoníaco" comunismo que, no Brasil, se vê em Lula e nas esquerdas em geral, e até em alguns adversários na direita política.
Para se chegar a esse quadro, foi preciso deteriorar a política educacional. Depreende-se, portanto, a urgência do seu resgate e o seu consequente aprimoramento. Ainda assim, o tempo demandado para algum efeito será longo para mitigar os danos. Mas, antes isso do que continuar do jeito que está.
É notório que, para se chegar a esse estado de coisas, foi preciso deteriorar a educação como política. Portanto, a cada meme há deseducação e entende-se que urge e ruge o seu resgate e consequente melhora. O que significará resgatar também muito dessa turma abilolada.
E mais: tal resgate só terá efetividade se houver educação política. Mesmo que saibamos ser esse o temor dos poderosos, ela é imprescindível para mitigar os danos mentais tornados memes. E olha que o efeito tomará muito tempo. Mas não importa: antes tarde do que nunca.
Fonte: análise reflexiva sobre leituras de matérias e vídeos de várias mídias.
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Lula chora e mercado surta
Eleito presidente, Lula já começou arregaçando as mangas e botando seu vice Alckmin também para trabalhar, na montagem da equipe de transição e nas conversas com o parlamento sobre a PEC que não só promete impulsionar o Auxílio Brasil, como também ressuscitar o Bolsa Família.
Pois bem. Acompanhado de Alckmin, Janja e de parte de sua equipe de transição, Lula discursou no Centro Cultural Banco do Brasil há 2 dias. No discurso tratou de diversos temas que despertam interesse na sociedade sobre seu governo. E não podia faltar um tema: o social.
Nesse tema, alvo da PEC do novo Bolsa Família, não tinha como escapar um assunto que permeia o político: a fome. Ele criticou a era pós-Dilma no que se refere ao desprezo pelo social: "depois do que fizemos, eu não imaginava que a fome pudesse voltar nesse país".
A clareza da crítica nos retrocessos do pós-Dilma no social residiu principalmente em não entender a incoerência do agronegócio. E revelou seu apelo: "no dia em que cada brasileiro estiver comendo eu terei cumprido a minha missão". E chorou, aplaudido de pé pelos presentes.
Foi aí que as grandes mídias divulgaram a queda nas bolsas de valores e a forte subida do dólar frente ao real, e com isso o mercado deu chilique. Não surpreende, pois não é a primeira vez que a grande mídia usa o apelo social de Lula para explicar a reação mercadológica.
O mercado surta com esse apelo porque é justamente de dividendos oriundos da grana pública que ele vive e se deixa viver, na roda do chamado capital improdutivo, que se caracteriza por lucrar mais pelo que o povo paga de impostos do que pela própria capacidade produtiva.
Em verdade, isso é uma estratégia capitalista por excelência. Ele se vale do sacrifício das classes menos favorecidas, tal como um predador mata a sua presa para se nutrir. Como disse Eduardo Moreira, "desumanizar o debate político é estratégia fundamental do capitalismo".
A fala de Moreira demonstra que a emoção de Lula não só extravasa o trauma famélico do qual o próprio petista já foi vítima; revela também que o chilique mercadológico vê na política social, humanista, comunista, o seu maior inimigo.
Para saber mais
- https://www.youtube.com/watch?v=MN6uXIPgr-g (Meteoro Brasil- Lula chora diante de auditório lotado).
- https://www.youtube.com/watch?v=MwrANBANAco (Eduardo Moreira, corte de entrevista)
- https://www.youtube.com/watch?v=ZkxgYkgjoao&pp=wgIGCgQQAhgB (o mesmo ao vivo)
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Pânico moral em homenagem a Gal
No último dia 9 morreu Gal Costa, aos 77 anos, em Sampa. Uma das vozes mais icônicas da MPB, ela veio ao sucesso na Tropicália, movimento artístico baiano de jeito hippie e rebelde que tinha também Caetano, Maria Bethânia, Gil e Ednardo¹. Sua marca registrada foi a voz de suave agudo.
Sempre emprestando a sua voz, Gal se inspirava em nomes como os da também baiana família Caymmi e outros ainda mais antigos, bem como inspirou artistas mais jovens, como o já finado Cazuza. Respeitada pela crítica e de público fiel, ela se foi realizada.
Foram várias homenagens a ela nas falas de colegas que testemunharam sua carreira, com direito a minuto de silêncio no fim dos telejornais na Globo. E na esteira das homenagens entra Mauricio de Sousa, criador da eterna Turma da Mônica, através de um desenho (ao lado).
Observa-se a clássica pose da cantora jovem a cantar Chuva de Prata (1972). A princípio parece evocar inocência, até reverberar em redes como o Twitter, no qual internautas respondiam sugerindo apagar a figura. O motivo é o suposto duplo sentido da letra da canção.
E aqui segue a minha crítica. Não ao desenho, mas ao pânico moral que mais revela a incoerência dos moralistas que fecham os olhos para os reais flagelos morais que aviltam a sociedade: deseducação, desemprego, miséria, fome, desabrigo, desigualdade, violência.
Pois os que condenam a letra bem disfarçada pelo talento linguístico de outrora são os mesmos que, em nome do conforto próprio, negam aos pobres os preceitos do bem-estar social: educação, qualificação, emprego, salário, comida, habitação, inclusão e ascensão social.
A 'moral sexual' é a falácia dos mentirosos ou dos sexualmente frustrados. Se artistas, suas letras são tão explicitamente escatológicas quanto o linguajar do bolsonarismo. Se pode a violência escatológica, por que não pode haver a doçura de uma sexualidade saudável?
Que caia uma chuva de prata nos pseudomoralistas. Sem parar.
Nota da autoria:
¹ Compositor e cantor nordestino de Pavão Misterioso, sucesso de abertura da novela Saramandaia (1976) e também de caráter político.
Fonte da figura e da análise:
- https://www.metropoles.com/entretenimento/homenagem-da-turma-da-monica-a-gal-costa-escandaliza-web-apaguem
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