segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

CURTAS 12 - ANÁLISES RÁPIDAS

 
Internacional
Na Fifa, direitos humanos é falácia

        Para a realização de Copas do Mundo, a Fifa põe em votação uma série de países candidatos a sede, com anos de antecedência. Antes da copa da Rússia (2018), uma nova sede já havia sido eleita para sediar a versão 2022: o minúsculo Catar.
        O Catar está em projeção natural a leste da península Arábica, no sudoeste asiático. Ao sul faz fronteira com a Arábia Saudita e nos demais pontos, com o Golfo Pérsico. É uma planície arenosa mais elevada no centro, e clima árido com verões a 50ºC.
        O subsolo petrolífero responde pela maior renda per capita do mundo capitalista, e pela maioria imigrante (indianos, nepaleses, filipinos, bengalis, cingaleses e paquistaneses). 75% são homens.
        Na religião, 67,7% são islâmicos (oficial), 13,8% cristãos, hindus idem, e as demais, 10%. A língua oficial é o árabe. Imigrantes usam idiomas nativos além do árabe e inglês. O regime político é monarquia absolutista, e a Constituição se baseia na sharia (lei islâmica).
        Essa configuração se liga ao boom do petróleo a partir dos anos 2000, quando surgiu uma geração de magnatas que investiu em urbanização, tecnologia de ponta e turismo abrindo portas para imigração. Mas, por trás de tanta riqueza, há flagelos graves.
        Tudo porque o Catar chama atenção global quanto à violação de direitos humanos. As denúncias são várias, desde a restrição sobre mulheres a regime de escravidão imposto aos operários imigrantes de ramos diversos, entre estes a construção civil.
        A Fifa se revela incoerente ao se dizer pró-direitos humanos: já fez copas em outras sedes violadoras. Como o já denunciado Brasil, por escravismo em muitos ramos urbanos e rurais, trabalho infantil, expulsão de comunidades tradicionais e nova persecução política.
        No Catar morreram entre 6500 e 15000 operários da construção civil. No Brasil os dados são obscuros, mas é líder global em acidentes de trabalho neste setor. Mais de 30 morreram nas bilionárias reformas dos estádios de futebol. E com as reformas trabalhistas, o escravismo é o mesmo.
        Na Fifa, direitos humanos se reduzem a uma expressão publicitária, o que acontece aos sem privilégios não interessa, é falácia. O que vale mesmo é dinheiro circulando. Padrão Fifa.

Para saber mais
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Catar, o polêmico

        Do Catar já falamos: uma projeção encravada na península arábica, cercado quase todo pelo Golfo Pérsico e temperaturas que derretem geral. E também, lotado pelas polêmicas, o que levou muitos a criticarem a escolha do país pela Fifa ainda em 2010.
        Antes do primeiro jogo do Brasil, um jornalista pernambucano teve a bandeira de seu Estado tomada e pisoteada por locais. O motivo: um arco-íris desenhado. Em inglês fluente, o jornalista resolveu a treta, e os cataris se desculparam e devolveram a bandeira.
        Mais recentemente, duas ocorrências. Um torcedor italiano invadiu o campo durante um jogo empunhando a bandeira LGBTQIA+. Foi contido pela polícia e levado à delegacia, onde assinou um termo de responsa de que não deveria repetir o ato para escapar à punição.
        A outra foi a interferência da Fifa, a pedido do Catar, para proibir torcedores ingleses de usar fantasia de guerreiros das cruzadas medievais, sendo chamados de "cruzados" pelos locais muçulmanos. Essa polêmica faz sentido e vale explicar.
        Segundo relatos escritos tanto por cristãos quanto por islâmicos, os soldados cristãos em Jerusalém e outras cidades da região desobedeceram à ordem de controle do comando e foram para cima dos muçulmanos fazendo um massacre - com canibalismo no final.
        Sabe-se que os cristãos canibalizaram por falta de víveres. Os relatos ainda contam que os corpos eram cozidos numa espécie de pira, e que crianças e mulheres eram empaladas antes. Um trauma histórico para os sobreviventes, que repassaram os fatos de geração a geração.
        É por esse detalhe histórico nas Cruzadas, frequentemente ocultado nas escolas daqui em função do rolo compressor religioso, que o termo "cruzado" assumiu tom jocoso entre os islâmicos fundamentalistas ao se referirem ao Ocidente cristão de espírito imperial.
        Para evitar julgar esse ranço e a sharia, devemos olhar criticamente os feitos ocidentais. O laicismo tirou das igrejas o poder do Islã moderno, mas não quitou o débito das cruzadas. Os papas João Paulo II e Francisco pediram desculpas. Antes tarde do que nunca.
        Se bem que muitos islâmicos veem as diferenças com relativa tolerância, como muitos cristãos. E isso os une - como uniram os fatos da Igreja medieval com os do Islã atual.

Fonte: avaliações de matérias sobre as polêmicas do Catar na Copa, de várias fontes.
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O silencioso império estadunidense na Venezuela

        Hugo Chávez governou a Venezuela com mão de ferro contra opositores e como um pai dos pobres. Mesmo sem conseguir resolver alguns problemas sociais, Chávez morreu com altos índices de popularidade, graças ao seu carisma. Nesse cenário entra o vice Nicolás Maduro. 
        Substituto natural, Maduro assegurou a continuidade do chavismo. Mesmo não tendo o mesmo carisma, apostou na popularidade. De fato, ele tem sido leal ao ideal chavista, mas com um detalhe particular: seu governo tem se apresentado um tanto autoritário.
        É inegável que a têmpera de Maduro é mais autoritária do que a de seu antecessor. Os muitos manifestos populares tomaram as ruas, mas ele seguiu reeleito, sem prova de fraude e contrariando a grande mídia que interpretou os manifestos como favoráveis ao líder opositor Juan Guaidó.
        O contexto disso é complexo, mas explicável nas tentativas de golpe pela oposição com apoio dos EUA, e no embargo econômico estadunidense imposto após os golpes fracassados. O país passou a ter carências severas, forçando milhares a emigrar para os países vizinhos.
        A imprensa brazuca explora as carências como resultado da política de Maduro e não do embargo econômico imposto pelos EUA. O que geral não sabe é que o autoproclamado líder nacional Guaidó queria permitir a irrestrita exploração do petróleo venezuelano pelos EUA.
        Mas as mídias noticiaram, em 28/11, sobre um acordo assinado entre representantes de Maduro e os da oposição, durante mesa de negociação no México. O acordo libera o retorno da exploração petrolífera pela gigante Chevron (EUA) no subsolo venezuelano. A notícia foi dada pelo Depto do Tesouro estadunidense.
        Para o acordo, Maduro exigiu o fim do embargo para melhorar a vida da população. Mas não sabemos se isso ocorrerá, como não sabemos da reação dos chavistas clássicos. Mas já percebemos o avanço imperial silencioso dos EUA sobre o último reduto de resistência na AL.

Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/12/01/maduro-celebra-acordo-com-oposicao-e-pede-fim-das-sancoes-antes-da-eleicao-presidencial 
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Brasil
O samba como resistência

        Aprendemos em História oficial que a nação brasileira é "fruto da miscigenação do europeu com indígenas e africanos". Sim, isso é verdade. Mas não sem conflitos no cerne dos valores em que, como nas demais colônias, o branco se arroga de se impor sobre os demais.
        Com pele branca do colonizador, o branco tornou o cristianismo fé dominante, a língua portuguesa universal no território e ainda quase totaliza a elite econômica e política. Para isso, dizimou muitos indígenas e escravizou os afros. Ainda assim, o Brasil não ficou muito branco.
        Como indígenas nas cerradas florestas, os negros nas senzalas mantiveram identidade ancestral: na fé o sincretismo gerou candomblé e umbanda; na música, a percussão sincopada saiu do terreiro para o lundu ocupar campos e senzalas e virar samba nas ruas das cidades.
        Contagiante, o samba virou sinônimo de boemia e entrou nos prostíbulos e botecos nas vielas urbanas, varando a madrugada regado a bebida, canto, dança e alegria. Virou um símbolo musical dos boêmios de terno e chapéu brancos identificados com os 'malandros' da umbanda.
        No ritmo sincopado do samba eram encaixadas poesias que evocavam a luta do povo negro por justiça social e pela paz: como havia acesso fácil às áreas abastadas, a polícia fazia operações "contra vadios e bandidos", e o samba foi associado a estes por causa da boemia.
        A criminalização do samba veio com o surgir das primeiras favelas, redutos de libertos antes moradores de rua e de seus descendentes. E como já se associava o negro ao banditismo devido à pobreza, de imediato o samba, música negra, entrou nessa nefasta associação.
        Também negros e da mesma época, o maxixe e o chorinho não atiçaram sentimentos ruins. A malemolência do primeiro e o romantismo do segundo atraíram jovens boêmios de classe média e serviram, assim, para acalmar as relações entre a polícia e os negros da favela.
        Chorinho e maxixe deram carona ao samba para conquistar a boemia de classes média. Não foi simples, levou tempo e luta. Os primeiros sambistas brancos ajudaram na conquista. Antes rejeitado, o samba virou o maior símbolo da MPB, para nunca ser destronado.
        
Para saber mais
https://www.brasildefato.com.br/2022/12/02/dia-nacional-do-samba-bambas-nao-fogem-ao-legado-de-luta-por-direitos-de-sambistas-do-passado 
- https://www.bbc.com/portuguese/brasil-51580785 (quando tocar samba dava cadeia no Brasil, 2020)
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Violações do aparelhamento institucional

        Reportagem da Brasil de Fato revela que o BNDES financiou caminhões de empresa investigada por financiamento de ato bolsonarista em R$ 22 milhões. Outra, da Rede Brasil Atual, tem o print de um ofício que trata sobre nomeação de diretor obscuro, mas alinhado a Bolsonaro, no Museu Emílio Goeldi, em Belém do Pará.
        A ministra da Agricultura Maria Teresa aguarda votação no Senado da proposta de lei popularmente conhecida como PL do Veneno, que facilita o registro e liberação de agroquímicos, não importando o grau de toxidade.
        O senador Humberto Costa (PT) revela preocupação da transição com possível novo apagão na Saúde, devido ao corte severo de verbas, à vacinação ineficiente para crianças e adultos e ao risco de fechamento de hospitais importantes, entre outros.
        Esses casos não deveriam surpreender ninguém. São apenas exemplos mais recentes de uma marca registrada tipicamente autoritária: o aparelhamento institucional.
        O prevaricador-geral da República Augusto Aras, que paralisou o MPF; as trocas de 20 delegados e diretores na PF; Salles que ferrou o Ibama; o nazista Pazuello e o negacionista Queiroga na Saúde; Guedes que botou o Brasil faminto e de pires na mão; o MEC transformado em propinoduto de pastores corruptos, etc.
        Nem o setor privado escapou de interferências: houve forte alinhamento patronal em emissoras de TV, profusão de assédios eleitorais e, na Eletrobrás, operários descobriram que a direção quer aumentar os próprios salários acima de 3500%, desconsiderando todas as categorias subordinadas.
        Os criminosos que obstruem rodovias causando prejuízos econômicos, materiais e à dignidade humana são reflexos do aparelhamento das FFAA e do BNDES patrocinador de coisas tão ilícitas quanto as golpetas bolsonaristas.
        O aparelhamento institucional revela o caráter altamente personalista e autoritário da era Bolsonaro, na qual a liberdade de expressão só vale se for alinhada à dele. A liberdade que cala e agride ao invés de libertar.
        Os efeitos nefastos que vimos são violações à República, à democracia, à pátria e à nação. Quanto a esta última, são aviltados os direitos humanos, a identidade cultural, os povos originários e tradicionais, o meio ambiente e a dignidade humana.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=_RjVSeP1KRY (Tarcísio SP promete novas escolas, mas não diz de onde virão novos docentes)
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