segunda-feira, 20 de março de 2023

ANÁLISE: MST e MTST, invasões necessárias

 

                A grande mídia foi nostálgica ao noticiar as “invasões” do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), principalmente em terras do sul baiano, atualmente de suposta propriedade da Suzano, empresa brasileira de papel, celulose e eucaliptocultura fundada em 1924.
                Ao mexer com a opinião pública, que desconhece os objetivos do MST e da versão urbana MTST, vem a tese falaciosa de que são movimentos “invasores criminosos de propriedades privadas”.
                Há outros movimentos menores e quase desconhecidos: os rurais MLST (L de libertário), MRC (RC de resistência camponesa) e outros, que têm atenção midiática muito rara. Protagonista de uma barbárie em Brasília, o primeiro piorou a imagem do MST devido à confusão pública.
                Para justificar a sua liberdade de expressão, a patuleia bolsonarista comumente cita o art. 5º da CF 1988, que versa sobre as garantias e direitos fundamentais. Mas desconhece as dimensões e limites dessas liberdades, estendendo-se ao direito à propriedade privada.

                Constituição- alcunhada “constituição cidadã”, a CF/1988 marca o retorno da democracia e estabelece direitos e garantias civis e coletivas, vários deles pétreos como os direitos a trabalho seguro, lazer, previdência, alimentação, vestuário, habitação, etc. E também alguns pétreos deveres.
                O art 5º prevê direito à propriedade privada urbana e rural, mas com função social, pois a lei apregoa o bem coletivo. O art 182 trata de imóvel urbano e o 186, do rural. O art. 184 diz sobre desapropriação de imóveis em situação irregular e inspirou o Estatuto da Terra¹.
                
                Ocupações- mesmo que a grande mídia seja incisiva ao tratar como invasões, as ocupações seguem temas de exaustivos debates, com discordâncias contínuas. Até que ponto uma ocupação pode ser encarada como invasão sem o risco de acusar injustamente os movimentos em tela?
                Nas cidades há milhares de imóveis abandonados, muitos deles prédios de vários andares e, em menor quantidade, casas e casarões seculares. Alguns dos prédios eram incialmente públicos, mas por vários motivos não continuaram a ser usados ou simplesmente nunca foram totalmente acabados.
                Alguns viraram moradas improvisadas para a galera sem-teto, que explodiu nos últimos 4 anos tendo como perversas companhias a fome, sede, exposição à violência, ação climática e doenças. Um flagelo social a revelar outra crise histórica: a habitacional.
                Mas a miséria não é a única causa da crise: via especulação imobiliária, classes mais abastadas adentram áreas florestais e de comunidades populares promovendo crescentes remoções com ajuda da PM, e políticas habitacionais compensatórias não contemplam todas as famílias atingidas.
                Com forte impacto na nossa economia, o agronegócio é visto positivamente pela grande mídia. Quem não sabe do “agro é tech, agro é pop, agro é tudo”, publicidade criticada pela esquerda?
                Antes de se julgar a esquerda como ignorante sobre o valor econômico do grande agro, vale considerar que ela aponta irregularidades, como não respeitar os limites impostos pelo código florestal, invadir terras públicas protegidas além dos limites do terreno e recusar o uso social – como nas cidades.

                Invasão ou ocupação?- os artigos daCF referentes à função dos imóveis urbanos e rurais subsidiam nossa compreensão sobre a conduta dos movimentos sociais e dos empreendimentos – bem como a dos meios midiáticos sobre o tema, principalmente a troca da verdade por eufemismos.
                Ocasionalmente se reporta sobre monoculturas irregulares em terras indígenas (TI) centrando-se em conflitos agrários; e sobre imóveis de luxo em áreas urbanas proibidas. Mesmo reconhecidos como afrontas, os casos não são tidos como invasões, ao contrário do que ocorre sobre MST e MTST.
                No âmbito jurídico existem processos cujos veredictos condenam o MST, e já foram publicados em portais midiáticos e em portais de tribunais. A dúvida sobre a veracidade se deve aos interesses que favorecem, nesses casos, os donos das terras, mesmo com estes em dívida com o fisco e com a lei.
                Já na seara urbana, as condenações de investidores imobiliários pelas irregularidades provadas se relacionam quase totalmente a áreas de proteção ambiental (APAs). Ainda assim, nem sempre os réus cumprem as penalidades impostas em veredictos, dada a certeza de recursos reversivos e impunidade.
                É válido ressaltar que, seja na cidade ou no campo, o imóvel vazio ou improdutivo e sem resolução a ser definida pelos proprietários devem, sim, ser entregues para uso social pelos sem-teto e sem-terra. A luta pela justiça social deve ser constante e resistente, “hasta la vitória!”.

Nota da autoria
¹ Trata do uso social e ecologicamente correto da terra.

Para saber mais
----





Nenhum comentário:

Postar um comentário

CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...