Evangelização genocida
A grande rede operacional de Lula
para salvar as comunidades Yanomami afetadas pelo garimpo ilegal nos mostrou a
dimensão assumida pela crise humanitária vivida por esses originários. E ainda
nos leva a inferir sobre outros povos também serem atingidos, de alguma forma,
pelos criminosos ambientais.
Normalmente são apontados como
criminosos ambientais os extratores ilegais de recursos florestais e minerais
das áreas públicas de preservação permanente.
Mas cada vez mais se sabe que, a julgar pela dimensão criminal, inclusive na citada crise humanitária, eles têm contado com ausência da
fiscalização, internet de boa qualidade mesmo em áreas remotas e liberdade excessiva
de grupos missionários evangélicos.
A liberdade excessiva desses grupos de fé tem sido observada na era Bolsonaro, ainda que não se descarte a
historicidade do rolo compressor cristão bem antes da era 2018-22. O ex-governante
tem dado pleno aval para que eles viajem até de helicópteros a
pedido da ex-ministra Damares Alves, à caça de povos isolados.
Como povos isolados se define como
todos aqueles que, mesmo após contato com pessoas brancas, mantêm intactas as
suas organizações sociais e tradições ancestrais, inclusive a relação com o
meio ambiente, a obtenção de alimentos por caça, coleta e roça, e medicamentos
entre a flora. Algumas comunidades Yanomami estão nessa categoria.
No que se refere aos indígenas
Yanomami, temos falado muito nas ações deletérias do garimpo ilegal sobre o
meio ambiente e à sobrevivência dessas comunidades. Mas vale citar, sem medo,
que entre as causas mais comuns a contribuir para a ação genocida do governo
Bolsonaro estão as missões evangelizadoras.
Tais grupos missionários contam com a
ajuda de indígenas cristianizados, que atuam como guias para facilitar a
localização e encontros com as comunidades isoladas, e dar início a contatos
nem sempre pacíficos, pois os visitados tendem a encarar, com razão, as visitas
como invasões - o que não deixa de sê-lo.
Afinal, historicamente a
evangelização de indígenas serviu para pacificar os originários e jogar um
verde para deles roubar seu bem mais valioso: as suas terras. Em mais de 500 anos,
a evangelização abriu as portas da redução da população indígena original de
3,5 milhões para 950 mil pessoas.
Imposta pela evangelização, a perda
de identidade com as tradições ancestrais é primeiro e decisivo caminho para a
perda de vidas, seja por suicídio, doenças ou violência. E dada a plena
liberdade na era Bolsonaro graças às alianças espúrias entre governo e
pastores, as igrejas evangélicas deveriam ser devidamente investigadas e
punidas.
Sim, punidas, pois há uma lei que
coíbe a evangelização dos povos originários com vistas à preservação das
culturas ancestrais e da floresta, contra a qual a bancada evangélica protesta.
Mas tem que coibir, não importa como, e punir os religiosos cúmplices da
política anti-indígena de Bolsonaro.
Para saber mais
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O PT pós-Lula
(reflexão)
A recente declaração da inconsequente
e enrolada deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) sobre Jair Bolsonaro já
pensar em um sucessor “à sua altura” merece a nossa atenção. Pode parecer um absurdo, mas merece, sim,
toda a atenção.
A fala de Zambelli evidencia o
prenúncio já previsível do fim da vida política de Bolsonaro, foragido da
Justiça brasileira desde 30/12 e, segundo noticiosos, oscila entre o retorno em 2026 e a cidadania italiana, fora o escândalo recém-descoberto do contrabando de joias presenteadas pelos árabes após quase dar uma refinaria da Petrobras.
Mas essa vida não deveria preocupar
Zambelli e o resto da caterva. Considerando-se caráter degradado e a fome
de poder, Bolsonaro tem sucessores bem parecidos. Como os seus colegas de Câmara
Arthur Lira (PP-AL) e Valdemar da Costa Neto (PL-SP), por exemplo.
Ex-braço direito de Cunha, o alagoano
Arthur Lira se mostrou aluno tão aplicado que o ofuscou o professor da memória coletiva desde que
se tornou presidente da Câmara e líder supremo do famigerado Centrão. Ao ser
reeleito, ele reagiu com cortante frieza ao desmaio do pai, revelando o caráter
frio, calculista e metódico.
Congressista veterano, Valdemar tem
um histórico mais conhecido por seus crimes de corrupção e lavagem de dinheiro que o condenaram na
era petista (mensalão) do que por qualquer PL que tenha elaborado. Fora a sua
possível vida extraconjugal comumente apontada, vindos dos porões da fofoca que
têm a ex-esposa como âncora.
Há outros que seguem a mesma linha, como o senador Magno Malta (PL-ES). Além de ser pastor, ele tem o puxa-saquismo que Bolsonaro gosta.
Como se vê, a direita com viés
extremista já apresenta nomes à altura do psicopático ex-presidente. E olha que
são apenas dois exemplos, pois há mais, que vocês podem especular à vontade.
Enquanto isso, do lado oposto, as perguntas dominam o cenário.
Lacuna na esquerda- pela
esquerda as coisas parecem mais difíceis. Fora as profundas divergências internas
a marcarem debates, há outro tema que, mesmo já conversado, já sinaliza
preocupação: a busca de um sucessor à altura do atual presidente, Luiz Inácio
Lula da Silva, figura histórica por sua vida
política incomum.
O próprio retorno de Lula ao cenário
político após a prisão tornada injusta por comprovação de crime judicial anulado
pelo STF foi uma grata surpresa para as lideranças de esquerda, abalando a base bolsonarista da extrema-direita. Desde então Lula avisou: não concorrerá à reeleição,
alertando os seus próximos e sua base.
Por causa disso, a procura de um bom
sucessor já deveria sair dos repetitivos discursos de tribuna para acontecer na
prática. E é bom aproveitar agora, que estão aparecendo alguns nomes factíveis.
Na pretensão de sair da vida pública de vez em 2026, o próprio Lula já pensa em
um sucessor confiável.
Entre as bases espera-se que o sucessor
ideal de Lula seria alguém com a mesma habilidade política, sagacidade, conduta
pragmática, objetivo de dar continuidade ao projeto de reconstrução iniciado
pelo petista e, quando possível, trocar afagos com populares. Mas Lula sabe, e nós também, que ninguém é
igual a ninguém.
A preocupação de Lula com 2026é razoável: ele sabe que Bolsonaro se aproveita da condição de foragido para tentar voltar ao poder, por ter ainda
bom potencial de voto. Nesse sentido, ele quer selecionar nomes da atual
geração para superar esse potencial eleitoral do extremista.
Daí a busca preocupada dentro e fora
do PT por nomes qualificados e de confiança de Lula. Dentro do partido, Haddad,
Mercadante e Gleisi, mais jovens, têm chances à frente. Idosos, Roberto Requião
e Jacques Wagner focam governos regionais ou o parlamento. Dilma Rousseff não
dá pistas de voltar a suceder a Lula.
Já fora do PT há boas opções cogitáveis:
Guilherme Boulos (PSOL-SP), muito popular e de boa astúcia política; Randolfe
Rodrigues (Rede-AP) que coordenou a campanha de Lula e de pulso firme; e André
Janones (Avante-MG), que ajudou muito na comunicação da campanha e permanece ao lado de Lula.
Os nomes acima podem estar entre as
cartas a serem lançadas na mesa. Enquanto segue o governo Lula entre tantos
problemas a resolver, o baralho político está a postos na mesa. É jogar pesado
e direto para que a esquerda permaneça forte na corrida eleitoral de 2026 e reconquiste
o poder para afastar o bolsonarismo de vez.
Para saber mais
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Caso Marielle: fortes
indícios, muitas lacunas
Rio, 14/3/2018: há
exatamente 5 anos atrás, numa noite na Lapa, a vereadora Marielle Franco (PSOL)
e sua assessora saíram de uma reunião com mulheres periféricas e entraram no
carro. Na rua seguinte, o carro foi barbaramente alvejado por tiros de fuzil.
Marielle e seu motorista Anderson morreram. A assessora escapou.
A saraivada de tiros
interrompeu o silêncio noturno e na manhã seguinte o crime já era notícia nas
mídias Brasil afora. Com a repercussão internacional imediata, a PC iniciou as
primeiras investigações que rechearam os principais telejornais do país durante
meses, até virem os primeiros indícios de motivação política.
Indícios- antes da paralisação por Brasília, a investigação do
caso levantou dois inquéritos: para se descobrir os assassinos, e para rastrear
se foi encomenda de gente poderosa. O indício de crime político veio com o
depoimento do ex-governador Wilson Witzel durante a CPI da C19, com o andamento
do 2º inquérito.
Foi durante o curto governo
Witzel que foram achados e presos os autores da execução, sendo Ronnie Lessa o
atirador, na companhia de Élcio de Queiroz, que dirigia o carro em que eles
estavam. Assim como o miliciano Adriano da Nóbrega, o também miliciano Ronnie
foi condecorado por Flávio Bolsonaro.
No seu depoimento na CPI da
C19, Witzel disse que a confusão com hospitais de campanha em 2020 serviu para
encobrir o real motivo de seu impeachment: a prisão dos executores
e revelar a influência de Flávio Bolsonaro nas direções da rede de saúde
federal no RJ. Foi acusado pelo senador de “ingratidão”. Ou, quem sabe, traição.
Lacunas- antes da política, Witzel foi juiz federal em
diferentes varas cíveis no RJ e ES, o que o teria permitido acessar, com
certeza, documentos de grande interesse, mas não divulgados na mídia por
precaução.
Segundo o líder dos policiais
antifascistas do RJ, Orlando Zaccone, o importante depoimento de Witzel – que o
levou a pedir à cúpula da CPI posterior proteção à família – era para ter levado a PC-RJ a chama-lo
para auferir mais detalhes para a investigação. Mas não o chamou, “o que é muito
estranho”, disse.
Em 2020, antes da interferência
do governo Bolsonaro, no 2º inquérito consta o depoimento do então porteiro do condomínio
de luxo Vivendas da Barra, Ronnie e um comparsa procuraram o “seu Jair”, do n.
58, e alguém o atendeu no interfone. Depois, o porteiro simplesmente
desapareceu. O destino é ignorado até hoje.
O depoimento do porteiro
foi estranhamente “desmentido”. Mas, se houve confusão ou mentira da parte dele,
por que então ninguém o encontra? Um porteiro em função não mente, mas pode
fazê-lo por ordem expressada pelo condômino – o que não se deu porque o então presidente estava em Brasília
A interferência do governo
Bolsonaro na investigação se deu em trocas de chefias da PF da central em
Brasília e no RJ. Nisso, Adriano da Nóbrega, já refugiado em fazenda no
interior da Bahia, foi executado por gente da PM-BA três dias após o deputado
federal Eduardo Bolsonaro ir lá para “tratar de negócios”. Depois, a
investigação foi paralisada.
Cinco anos depois- cinco anos depois, o caso Marielle ainda tem muitas
lacunas a serem resolvidas. É sabido que Ronnie Lessa mora nas Vivendas da
Barra, um imóvel cujo valor é incompatível com a renda que ele arregimentou
quando policial, evidenciando seus ganhos extras com a milícia.
Sobre esse comparsa, de
nome Anderson (apenas um xará do motorista de Marielle), não se sabe se ele procurou
Ronnie para a empreitada, ou se era para outros objetivos. Mas seu nome consta
na investigação para se saber de sua participação.
Orlando Zaccone discorda
que a PC-RJ e o MP tenham falhado no trâmite da investigação. Talvez seja por
ser policial, ou ponto de vista pessoal mesmo. Mas, assim como abundam lacunas,
o mesmo ocorre com os indícios que envolvem direta ou indiretamente os
Bolsonaro no vespeiro.
Como vereadora, Marielle
Franco não só atuou em prol dos invisíveis sociais. Ela dava apoio a famílias
de policiais de histórico limpo mortos em rotinas de trabalho. Teve seu futuro
política interrompido de forma brusca, mas sua marca permanece indelével. Até virou
logradouro em Paris.
A natureza bárbara a evidenciar
claramente a execução da vereadora ainda tem muita lacuna para ser preenchida. Sem
Bolsonaro para impedir, o momento oportuno para continuar e fechar as
investigações com chave de ouro é agora – e pode arranhar ainda mais o bolsonarismo. Basta
retomar.
Para saber mais
- https://www.brasildefato.com.br/2023/03/14/entrada-da-pf-no-caso-marielle-mostra-fracasso-da-pc-rj-diz-chefe-dos-policiais-antifascismo
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Wilson_Witzel#:~:text=Wilson%20Witzel%20em%202019%20como%20Governador.&text=Foi%20juiz%20federal%20entre%202001,de%20Eduardo%20Paes%20(DEM).
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