quarta-feira, 7 de junho de 2023

CURTAS 31 - ANÁLISES (arcabouço, Lira)

 

O arcabouço aprovado é outro

                Então candidato, Lula reiterou a revogação do teto da emenda constitucional 55, o teto de gastos criado na era Temer. O teor muito neoliberal do texto serviu de pretexto para todo tipo de desvario com verbas públicas destinadas às áreas sociais essenciais, praticadas pelos governos até findar 2022.
                Eleito, Lula mostrou ao STF e Congresso uma arma: a PEC da transição. Uma arma poderosa: em voto de minerva, Gilmar Mendes a considerou fora do teto. Numa votação, o colegiado matou o teto de Temer, e em outra o orçamento secreto (2019-22) – que ouriçou os pelos de Arthur Lira para pressionar o novo governo.
                2023. Célere, a cúpula do Ministério da Fazenda e Simone Tebet (Planejamento) se fundamentaram em mil estudos e dados sociais do IBGE para elaborar o Arcabouço Fiscal. O texto foi enviado ao Parlamento para avaliação somente após aprove de Lula. Depois, o ministro Fernando Haddad foi convocado para sabatina parlamentar.
                Arcabouço fiscal – É um texto muito complexo e completo que prometia recursos para benefícios sociais e responsabilidade fiscal. Daí a extensa pesquisa prévia. Mas para a oposição bolsonarista isso não interessa, e sim a chance de “comer” Haddad após humilhações por Dino para lacrar na rede.
                Segundo a mídia, a Câmara aprovou o texto-base, sujeito a alterações. O governo comemorou a vitória, mas os servidores não, pois o texto contém regras supostamente inibidoras sobre reajustes salariais, concursos públicos e planos de carreira entre os do Executivo lotados nas áreas essenciais.
                Não é sem razão: a crítica é bem fundamentada na realidade vivida há anos. Após o boom de concursos públicos na primeira era petista, os governos Temer e Bolsonaro inibiram essa política e congelaram salários. O déficit preexistente ficou enorme nas áreas essenciais, especialmente na saúde.
                Alterações – Após a explanação de Haddad, as apreciações se iniciaram. O Psol propôs retirar a regra que controla gastos do governo em relação à meta do resultado primário foi rechaçada no plenário. Após a turbulenta votação do Marco Temporal (PL 490, tema de outro artigo), o trâmite retornou nesse 31/5.
                A tramitação se seguiu nesse 31/5, mas até o momento não foi disponibilizada o novo formato do texto do arcabouço. O interesse é pela votação final para entrar em vigor o mais breve possível.
                Quanto ao resultado, este artigo já deixa claro: se com Haddad já foi alvo de críticas de alguns setores, como os servidores públicos, imagine com as alterações e maquiagens parlamentares para que a sua forma definitiva seja aceita para votação final. Ou seja, bem batizada. Com realismo, sem ilusões.

Para saber mais
https://www.camara.leg.br/noticias/964821-camara-aprova-texto-base-do-projeto-do-arcabouco-fiscal-votacao-prossegue-nesta-quarta-feira 
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O novo monstro da República

              Eleito, Lula passou por todo o cerimonial de praxe – das informais felicitações de políticos e juristas até os passos da posse do cargo que assume pela terceira vez. Pelo menos a partir da diplomação, os espectadores devem ter percebido uma cara de bunda: a de Arthur Lira (PP-AL), presidente reeleito da Câmara dos Deputados.
                 Não surpreende: ele raramente deve sorrir mesmo, apenas, talvez, quando suas caras "gorjetas" chegam ao seu cofre, por exemplo. Fora isso, a seriedade deve ser uma constante, e tão fria quanto o tom de aço ao identificar o senhor que desmaiara ao saber de sua reeleição à presidência da Câmara: "ah, é o meu pai". Com expressão vazia.
                Mas, o que explicaria tamanha frieza de alguém que tem contribuído para os fatos que abalaram os alicerces republicanos e desperta grande antipatia entre a patuleia que assiste às movimentações parlamentares?
                Nos fins deste maio, o governo Lula 3 enfrentou o ápice de tensão na relação com a Câmara presidida pelo obscuro personagem em tela. Mesmo após favorecer o caos no país com sua indiferença aos mais de 150 pedidos de impeachment sobre Bolsonaro, nas redes se pergunta: afinal, por que os alagoanos o reelegeram de novo?
                Antes de mais nada, o poder econômico influi  - pelo menos significativamente  em parte - nos destinos de uma  eleição. Reitero, em parte: Bolsonaro gastou muito mais na campanha do que Lula, com direito a violações da lei eleitoral com um programa efêmero, e mesmo assim perdeu as eleições.
                A mídia em geral divulgava que Lira foi audacioso com o presidente Lula ao ponto de exigir dele rompimento com o senador Renan Calheiros e cedesse os ministérios ocupados pelo União Brasil ao PP, bem como as pastas da Saúde de Nísia Trindade e a dos Transportes do emedebista Renan Filho, em troca do aprove de suas propostas.
                A maior temperatura atingida ocorreu por conta da MP ¹ 1154, da estrutura de governo, que ameaçou não ser aprovada na Câmara, na qual a oposição de direita plena e extrema-direita queria o retorno da estrutura operante na era de 2019-22. Para amaciar a duríssima carne de pescoço, o governo cedeu R$ 1,7 bilhão em emendas.
                A criação do monstro - Arthur Lira sempre se identificou na direita do capital livre, a essência do Centrão. Passou pelo extinto PFL, no PSDB privatista, e há alguns anos está no atual PP. Nesta sigla foi suplente de Eduardo Cunha cindo substitui-lo devido à cassação pela Justiça. Então se mostraria o aluno bem aplicado que foi de Cunha.
                Mas foi na era Bolsonaro que o caráter de Lira se escancarou, indo tão longe quanto Cunha - e tem tudo para ir além do "professor", que arquitetou todo o plano que levou à deposição de Dilma Rousseff. Com Bolsonaro, o suplente sai da discrição para escancarar o monstro dentro de si.
                Bolsonaro aperfeiçoou o monstro Lira ao alimentá-lo na gana por poder e dinheiro, este último reforçado com o orçamento secreto. Graças a este, o Centrão de Lira passou a ter um domínio financeiro superior ao destinado para a pasta da Defesa, em plena era militaresca de 2019-22. Vão vendo.
                Novo foco - O dominante Lira se enfureceu com o consenso Pacheco-Lula e deparou com o aprove da MP estrutural do governo Lula 3, na madrugada. Frustrou-se, mas não vergou: agora mira a grana que pode render entre R$ 20 e 30 trilhões se a Petrobras tiver licença ambiental para extrair óleo na bacia da Foz do Amazonas. Mas nesse tempo surge o impensado.
                Imprevisto - O ministro Dias Toffoli (STF) liberou, para julgamento em 2 turmas em 1/6, recurso referente a um processo de 2012, que versa sobre acusação de propina recebida por Lira em Alagoas. Se for condenado, o deputado pode perder a presidência da Câmara e tem o próprio mandato sob risco.
                Em paralelo, uma operação da PF descobriu cofre com R$ 4,5 milhões em dinheiro vivo, supostamente referentes à negociação irregular (não licitada) de kits de robótica destinados a escolas do interior, e caixas de Viagra. 70% do valor seriam para Alagoas através de aliados de Lira - o que ainda carece de comprovação.
                Se for aprovada a ligação, somada à possível condenação no citado julgamento no STF, Lira vê como certa a cassação de seu mandato, e mesmo a inelegibilidade. Mas, enquanto não há desfecho, segue o jogo com o governo Lula, pois ainda há propostas em trâmite no Parlamento, dependendo de novas negociações, claro.
                Em meio a isso, o deputado demite assessor supostamente envolvido nesse caso, despertando conjecturas de que o objetivo seja para livrar a própria barra afastando a chance de cassação.
                Se manter seu mandato, Arthur Lira ainda assombrará muito o governo Lula. Se for cassado, a sua influência já sólida em Alagoas se mantém. Mas, mesmo cassado, poderá haver uma certeza, a de que, tal como Cunha, Lira deixará marca indelével na memória da casa e do povo: o monstro da República, jamais será esquecido.

Imagens: Google (edições pela autoria do blog)

Nota da autoria
¹ Em artigo de publicação anterior foi posto Decreto, o que está errado. O certo é medida provisória (MP).

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=boUGeV2CWro (Plantão Brasil, BR acha R$ 30 tri e Arthur Lira prepara golpe em Lula)
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