quarta-feira, 14 de junho de 2023

CURTAS 32 - Análises (comunicação, bolsonarismo resiste, traição ao governo, ditadura dos EUA)

 

Nazifascismo resiste ao inelegível

                Nesse presente junho, o ex-presidente Bolsonaro já jogou a toalha reconhecendo-se no hall da inelegibilidade. Ou seja, ele perderá os direitos políticos. Para alguns, a inelegibilidade pode ser o caminho tão esperado para que, pelo menos em longo prazo, não haja mais um novo Bolsonaro para terminar de destruir o que resta.
                Em outras palavras, o mais esperado é que, com esse ostracismo tão esperado, o bolsonarismo, essa versão brazuca e cheia de peculiaridades do nazifascismo tradicional, possa entrar finalmente em dormência. Ou seja, ele não resistiria ao impacto desse afastamento político decidido juridicamente.
                Acontece que o termo dormência não significa a morte do nazifascismo bolsonarista. Nem cabe hipótese plausível aí. Jair Bolsonaro está inevitavelmente fora, pois o TSE está muito bem articulado para que o desejo popular de 8 anos de ostracismo político seja finalmente realizado. Mas devemos nos lembrar de que, mesmo fora de cena, Bolsonaro deixa rastros.
                Esses rastros muito vivos são capitaneados pelos três filhos mais velhos do ex-presidente. Cada um ao seu modo particular, eles manterão vivo na memória popular o legado do personagem político que foi o seu pai. Fora os aliados que, na atual legislatura, desde a sua posse em 1/2/23 vão cumprindo a sua prometida guerra contra Lula 3.
                Graças aos bolsonaristas, em parte – a outra parte tão importante quanto é Arthur Lira, o capitão do centrão e monstro da República – que Lula 3 já enfrenta as primeiras derrotas, mesmo tendo realizado 1/3 das promessas de campanha com a coragem e determinação que lhe são peculiares e sustentam sua popularidade.
                Como já publicado no blog desde o ano passado, Lula 3 se determinou no risco de derrotar Bolsonaro para reconstruir o que foi destruído. Mas o maior de todos os seus desafios será o braço de ferro com o bolsonarismo. Lula certamente governará até o fim, muita coisa realizará, mas terá o bolsonarismo de nefasta companhia até o apagar das luzes.

Sal Ross
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Comunicação mede popularidade

                Durante a corrida eleitoral, Lula enfrentou embate ferrenho. Não com os demais candidatos que, ainda no 1º turno, o “socavam” com a requentadíssima tese da “corrupção petista” que sustentou a Lava Jato, mas sim com um Jair Bolsonaro ainda muito popular apesar de tantos escândalos sobre si.
                Inicialmente, os escândalos de corrupção e outros crimes de Bolsonaro na presidência deram a Lula a disparada liderança na pré-campanha e no início da corrida eleitoral. Mas a distância diminuiu aos poucos entre eles, até chegar a menos de 10 pontos. Havia algo errado aí, mas o que era?
                A equipe de jornalismo do PT notou um problema comunicacional, se empenhou, mas não foi bem. Os youtubers de esquerda apontaram que se deve investir em comunicação popular em redes sociais. Lula correu atrás da Frente Ampla para derrotar Bolsonaro, e se aproximou de André Janones.
                Em entrevistas a telejornais, Lula foi bem e ainda ajudou a melhorar a imagem do MST entre a grande mídia. Diferente de Bolsonaro, que sustentou mentiras e distorções e, para segurança própria, os jornalistas evitaram perguntas referentes aos escândalos de corrupção e crimes durante o governo.
                Chamado para integrar a frente de apoio, André Janones lançou a sua proposta de comunicação popular em redes sociais (avisadas pelos influenciadores) que o PT acatou. A solução: Janones popularizou mais a campanha petista em rede desmentindo fakes dos bolsonaristas, facilitando a eleição de Lula.
                Janones foi essencial à eleição de Lula e contribuiu para desmascarar Bolsonaro para a Justiça. Mas infelizmente ele não foi aproveitado, pois Lula cedeu à exigência do União Brasil pelo ministério das Comunicações, daí a nomeação do pífio Juscelino Filho como ministro.
                É possível que Juscelino Filho não tenha sido o dileto de Lula, mas o UB justificou “idoneidade”. Enquanto isso, Janones segue como comunicador extraoficial do governo anunciando os feitos do governo com a eficiência que falta ao ministro, e com ajuda de Paulo Pimenta da Secom.
                Um dos feitos foi a conclusão da Ferrovia Norte-Sul, que promete reduzir em 40% o valor do frete no país. E apenas a mídia alternativa explica que o petismo foi quem mais investiu na obra que foi iniciada há 36 anos, na era Sarney.
                A ineficiência comunicacional oficial talvez esteja por trás da ligeira redução da popularidade do governo. Como, segundo o Ipec, a base mais pobre tenha apresentado maior contundência nessa queda, o baixo nível de acesso às redes do governo por esse grupo social pode explicar o fenômeno.
                Isso indica que a ação extraoficial de Janones não substitui a capilaridade da grande mídia e dos órgãos oficiais de comunicação do governo. Não é ineficiência da atuação do deputado, mas a falta de investimento no seu potencial para integrar a equipe do governo no setor. 
                Vale lembrar, a comunicação e a popularidade andam de mãos dadas.

Sal Ross
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Traição à vista?

                Apesar de ter cumprido algumas de suas promessas de campanha, o governo Lula tem tido muita dificuldade na sua relação com o Congresso, em especial a Câmara de Deputados de Arthur Lira.
                Como temos visto, o mais poderoso nome do PP no Congresso tem influenciado negativamente no destino de algumas pautas do governo. A vitória inicial do Marco Temporal e o protelamento de votações importantes pioram a tensão, que para alguns, pode destravar apreciação de pedidos de impeachment.
                E é justamente em pedidos de impeachment, parece surpreender que um governo de apenas 5 meses completos de idade já seja alvo de alguns pedidos para a deposição. Especialistas veem nisso uma nova forma de golpe parlamentar, mas o pior disso é saber que há governistas entre os assinantes.
                Sim. Segundo as mídias, pelo menos 4 governistas assinaram a favor da deposição do presidente. Para as mídias mais à esquerda, esses nomes, de partidos de ministros de Lula, representam uma atitude desleal, de traição ao governo após a frente ampla formada para uma vitória eleitoral difícil em 2022.
                Há quem antes pergunte por que eles assinaram esse atestado de deslealdade, se certamente até em campanha eleitoral devem ter se manifestado favoráveis a Lula, dentro da pauta central da reconstrução nacional.
                Embora saibamos que todo julgamento primário seja uma precipitação, não há como não avaliar a atitude desses nomes. Eles devem ser cobrados por sua inesperada atitude num momento tão crucial para a viabilidade governamental.
                Mas a possibilidade real de impeachment fica remota se compararmos aspectos econômicos do período 2015-16, de inflação alta e aumento do desemprego, e o atual momento de inflação e dólar em queda que facilita o mercado interno. Mas vale apontar outras possibilidades de incômodo.
                Lula disse que não pretende privatizar nada. Já tirou quatro estatais da lista da privataria, e outras podem sair também. Lira ambiciona tomar a pasta da Saúde e parlamentares do UB e PSDB querem a privatização do SUS e dirigir a ANS. É nesse setor tão nevrálgico que Lula mantém resistência.
                Ainda assim, a questão da privataria ainda é motivo sem peso relevante para movimentar processo de impeachment. Os interesses de maior relevância se ligam à grana mais gorda de emendas, e a fúria de Lira tem a ver com o remexer de seus vários processos na Justiça em mãos do STF.
                Resta mesmo a cobrança aos parlamentares – os governistas que já assinaram e outros que porventura assinem depois – a explicar seu favorecimento à deposição forçada de Lula. Ou seja, por que eles traíram a confiança do velho petista. A nossa cultura política tem seus meandros, mas estes devem ser explicados.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=MgCWy9QNkg8 (O Historiador – partidos de ministros de Lula têm traído o governo e até assinado pedidos de impeachment).
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A ditadura por trás das narrativas

                Ao receber a visita do líder venezuelano Nicolás Maduro, Lula fez discurso hospitaleiro no qual disse que as acusações de ditadura eram “narrativas depreciativas” (de adversários e da mídia). A grande mídia se rendeu em detalhismo crítico ao discurso.
                O chamado de Lula era para conversar sobre a extensão do Mercosul para todos os países da América Latina ou da América do Sul, integrando a Venezuela. A conversa ainda está em curso, pois parece haver restrição por parte de alguns governos sul-americanos e europeus.
                Líder polêmico – Vice-presidente por vários anos, Nicolás Maduro só aparecia na mídia quando o titular Hugo Chávez se ausentava por problemas de saúde ou em viagem internacional.
                Hugo Chávez fundou uma versão singular e personalista de socialismo, o chavismo, e mudou o nome oficial do país para República Bolivariana da Venezuela, em referência ao bolivarianismo, um ideal simbólico de liberdade relacionado às amarras diplomáticas dos EUA por motivos econômicos.
                Chávez foi tão carismático entre os venezuelanos quanto Lula é para os brasileiros pobres, pelo potencial político e governamental. Chávez imortalizou a paráfrase “Socialismo o muerte”, em referência à “Independência ou morte!” atribuída ao nosso D. Pedro I.
                Em seus dois mandatos (1999-2013), Chávez melhorou a vida socioeconômica do seu povo e a qualidade dos serviços públicos essenciais, a despeito das denúncias de corrupção e antidemocracia. Morreu de câncer em 2013, dando lugar a Nicolás Maduro, que prometeu continuar o seu legado.
                Mas Maduro logo imprimiu estilo próprio. Foi acusado pelos EUA e outros governos liberais de aparelhamento institucional, prisão de opositores e censura à imprensa. Principal sustentáculo dessas acusações, os EUA impuseram sanção econômica à Venezuela, e daí, severas carências internas.
                Carências essas que continuam mesmo que os EUA comprem o petróleo, segundo discursou recentemente o duvidoso Donald Trump, em cuja pessoa já deveríamos aprender a não confiar.
                Sanção– A sanção econômica é uma tática da política externa dos EUA, seguida por vários países alinhados, para enfraquecer politicamente o governo “inimigo da hegemonia econômica” liderada, claro, pelo dólar estadunidense.
                Ao abordar o tema, a grande mídia brazuca não fala do estado de carência generalizada interna que explode em fome e conflitos sociopolíticos – os “culpados” pelas carências e a emigração em massa dos venezuelanos para os países vizinhos.
                Agora, o Brasil pode ser o próximo alvo. Pois propõe expandir o Mercosul a todos os países sul-americanos para livre transação com moeda uníssona própria e fazer algo análogo com os BRICS. Um senador republicano dos EUA alardeou a proposta de sanção ao Brasil pela independência ao dólar.
                O governo Maduro merece críticas ao obscurecer sua realidade ao mundo, alimentando a tese de ditadura – a qual sempre associamos ao sovietismo e seus derivados, ou a governos militares de extrema-direita como os da América Latina nos anos 1960-80. Uma noção reduzida e enganosa.
                Um governo civil eleito autoproclamado democrático pode ser, sim, autoritário e autocrático. Ao aplicar sanção econômica a algum país, o governo dos EUA interfere na multipolaridade da democracia econômica em escala global, interferindo na autodeterminação e equilíbrio social dos povos.
                Os iludidos pelos EUA podem achar sandice nossa observar o governo estadunidense como ditatorial. Mas isso é uma realidade inapagável, pois gerou consequências nefastas a outros povos pelas sanções e pelas deposições de governos à força pela guerra direta. Os EUA têm postura ditatorial.
               A fala de Trump sobre a compra do petróleo da Venezuela intentou culpar a corrupção de Maduro para explicar a carência interna do povo venezuelano, ou seja, mente ao excluir a sanção de que todos sabem devido ao seu caráter global.
               Só que o mundo responde a essa postura: as citadas propostas do Brasil sobre BRICS e Mercosul mais amplos e sem dólar são recados de que no mundo multipolar não há mais lugar para um país mandar nos demais. E isso é bom – só que os EUA não vão deixar isso barato. É a ditadura do capital, a pior de todas.

Para saber mais
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