quarta-feira, 9 de agosto de 2023

CURTAS 40 - ANÁLISES (PEC32 volta à cena; mais uma de Campos Neto)

 

Lira e a mídia pela volta do pesadelo

            Enquanto Lula ainda luta para consertar o país do desastre do governo anterior, a maior parte dos servidores públicos novamente se aturde com a velha novidade: o presidente da Câmara Arthur Lira quer o retorno urgente da votação da PEC 32/2019, elaborada pelo ex-ministro Paulo Guedes.
                A PEC se baseia no modelo chileno de Estado. Guedes chegou a publicizar suas “maravilhas” escondendo as consequências na realidade popular, como aumento da pobreza e muita dificuldade para ter serviço público básico. Coisas que a grande mídia silencia e turistas não veem.
                Ressuscitando mitos – a propaganda da PEC por Guedes foi muito sustentada na época pela grande mídia, que ressucitou velhos mitos que cercam os serviços públicos brasileiros: o da ineficiência, o do Estado inchado e de “servidores ricos que nada fazem”, alimentando o ódio popular à categoria.
                Propósito da PEC – no blog há artigos sobre o mecanismo da PEC em substituir servidores concursados por contratados temporários de OSs¹ privadas, retirar a estabilidade e facilitar demissões ou aposentadorias de antigos concursados, aumentar o poder do Executivo em cargos de demissão, etc.
                Na época, tanto o governo anterior quanto a grande mídia propalaram que a PEC prevê o “fim de privilégios dos servidores, com excessos de gastos com pessoal e moderniza a máquina pública”. Até que nas redes sociais se divulgou intensivamente a realidade do povo chileno e os gastos do Estado com pessoal terceirizado.
                Desmistificando – 12% dos 95 milhões do povo ativo no Brasil são servidores públicos (os concursados e os temporários). Percentual bem abaixo da média OCDE de 23%. Os três países de maior IDH do mundo (Noruega, Dinamarca e Austrália) têm 30% de servidores entre as populações ativas.
                Há outros mitos propalados pela grande mídia, como a suposta economia de gastos públicos, em especial com pessoal; aquisições mais rápidas de tecnologias; e serviços de qualidade maior ao público.
                Grana – a contratação de terceirizados já ocorre em áreas essenciais mais carentes (saúde, educação básica) por falta de concursos públicos. Os profissionais recebem salários menores, mas a empresa contratada ganha 4, 5 vezes o valor salarial de cada um. Com servidores efetivos, o pagamento é o mesmo constado no contracheque.
                Pior: a depender da OS¹ ou empresa contratada, pode ocorrer de o salário não sair, como às vezes ocorre com profissionais da RioSaúde. Ainda há altíssima rotatividade e as renovações contratuais ou trocas de terceirizadas se arriscam deixar os funcionários sem férias ou sem salários.
                Ao contrário do que se midiatiza, a suposta economia de gastos públicos é apenas no salário aos terceirizados: a contratada retém para si 4 a 5 vezes mais. E, pior, nem se garantirá recebimento em dia. E, também, não implica em melhor qualidade dos serviços, devido à tendência à alta rotatividade.
                Vale mencionar que, se aprovada, a reforma alvejará os servidores abaixo da elite, ou seja, a grossa maioria, que está nos baixos e médios degraus das faixas salariais. Militares (polícias e Forças Armadas), procuradores, magistrados, auditores fiscais da Receita e classe política escapam, e ainda podem receber mais privilégios.
                A prometida modernização institucional pode não ocorrer. A alta rotatividade de profissionais pode causar desuso ou obsolescência das tecnologias investidas, o que, em saúde, se torna mais nevrálgico ao Estado em prejuízo financeiro e riscos de irregularidades diversas.
                Em resumo, o gasto público com tudo isso será muito maior arriscando ao fracasso do sistema e maior abandono da população hipossuficiente em pagar pelo atendimento.
                Indicações políticas e comissionados – a vigente lei 8.112/1990 (Estatuto do servidor) recomenda um limite numérico de comissionados, que só podem ser servidores efetivos. A PEC propõe o relaxamento dos requisitos dando mais poder ao presidente da República nomear alguém de sua confiança sem ser servidor, mas qualificado para a área.
                Nesse ponto também se abre muito risco de nomear pessoas suspeitas de ações criminais. A depender do governo de ocasião.
                Desbolsonarização – Lira enfrenta dois principais desafios nessa ambição. Um é o governo já ter se declarado contrário à PEC32. Sentimento este compartilhado por grande parte do Centrão, parte das bancadas temáticas e por toda a esquerda, o que se torna o seu segundo desafio.
                Diante da baixa adesão dos colegas à PEC motivada por questão eleitoral, Lira já pensa em conversar com colegas do congresso sobre mudanças nas proposições – ou seja, desbolsonarizar o texto. O problema é driblar a clareza dos objetivos descritos, com os quais o alagoano concorda.
                O que faz sentido, afinal ele sempre teve interesse em ocupar o ministério da saúde na reforma ministerial de Lula. Mas este já negou a saída de Nísia Trindade, atrapalhando as ambições do deputado.
                Contrapartida – Lira soube da sanção da instrução normativa (IN) 24//2023 pelo governo, pela qual servidores passarão do ponto eletrônico para o PGD², que avalia a produtividade mensal dos servidores. A IN foi vista por grande parcela da categoria como um equivalente à reforma administrativa no sentido de avaliação.
                Recentemente houve nova medida provisória do governo que visa extinguir 13 mil cargos vagos de nível médio, pouco mais de 4000 de agente administrativo, a carreira mais fragilizada e alvo da terceirização. Segundo a ministra da Inovação Esther Dweck, a tendência é mudar para 9  mil quadros de nível superior na esfera federal.
                O que reforça a luta dos servidores que ocupam hoje cargos de nível médio, que temem pelo risco de serem descartados pela transformação pretendida, por um plano de cargos e carreiras e avaliação de títulos, pois a maioria dos concursados tem hoje alguma formação superior.
                Sigamos. Que no fim dessa batalha o vencedor seja o Estado.

Notas da autoria
¹ Organizações Sociais, terceirizadas de direito privado financiadas por grana pública, já atuantes na saúde estadual e municipal.
² Programa de Gestão de Desempenho, que avaliará o quantum de produção mensal dos servidores.

Para saber mais
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Campos Neto e a suspeita provada

               Indicado a dedo pelo ex-ministro Paulo Guedes (Bolsonaro), o presidente do Banco Central Campos Neto conseguiu cultivar uma animosidade com Lula por manter os juros mais altos do mundo à revelia da melhora da economia e das proposições sociais do governo.
                Essa animosidade existe desde o pleito do 2º turno, quando Campos Neto foi votar de camisa amarela da CBF. Mas somente em 2023 ela seria liberada. Mas, Lula tem motivos a mais na sua posição em relação ao presidente do BC. Sigamos.
                Além dos juros – além dos juros, há outros fatos já expostos pela mídia, como a investida em sua offshore em paraíso fiscal sendo agente público ativo, e o aval para exportar ouro do garimpo ilegal mantido por políticos e militares na Amazônia, para destinatários como H. Stern e correlatos na Europa.
                A investigação do TCU foi mais além: agora descobre que Campos Neto patrocinou pesquisas eleitorais que orientaram a campanha de Jair Bolsonaro, o que esbarra em polêmica surgida na corrida eleitoral.
                Institutos de pesquisa – muitos institutos de pesquisas acompanharam a campanha eleitoral de 2022, revelando ligeira diferença nos números apesar da tendência comum. Herança da ditadura, a desconfiança de muitos eleitores nas fontes piorou quando houve uns dados discrepantes da maioria.
                Conhecedores dessa desconfiança, nomes famosos do bolsonarismo, como os pastores evangélicos André Valadão e Silas Malafaia, convenciam os eleitores de Jair Bolsonaro de que “só dois institutos seguem o datapovo”. Eram o Brasmarket e o Paraná Pesquisas, que viraram referências entre os bolsonaristas.
                Brasmarket e Paraná Pesquisasfundado em Barueri (SP), o Brasmarket foi criado por José Carlos Nogueira Cademartori e Felipe de Castro Cademartori. Sócio-diretor, o paraibano Bruno Agra Ferreira é o  responsável pelas estatística. De Curitiba, o Paraná inicialmente fazia pesquisas restritas ao Estado, lançando-se nacionalmente em 2022.
                Destoantes – enquanto Ipec, BTG Pactual, Quaest, PoderData, DataFolha e outros viam Lula à frente de Bolsonaro, os dois citados apresentavam dados diferentes. Paraná Pesquisas pautava empate técnico, e Brasmarket mostrou mais ousadia chegando a colocar Bolsonaro sempre à frente de Lula.
                Não por acaso o senador Flávio Bolsonaro defendia a Brasmarket das críticas e da suspeita da maior parte do público e da mídia sobre suposto pagamento de serviços de fake news de intenção eleitoral. A empresa nega, mas também nunca explicou a metodologia utilizada para a obtenção dos seus dados.
                Evidências – a suspeita virou confirmação quando foi divulgado que o Paraná Pesquisas recebeu R$ 2,7 milhões para transmitir dados favoráveis a Bolsonaro. Já o proprietário da Brasmarket negou a propina, mas alardeava "como certa a reeleição de Bolsonaro”. Certo mesmo deve ter sido um ganho por baixo.
                Como o ilegal na era Bolsonaro era legal, é quase certo que Campos Neto tenha orientado as empresas. Mas ainda falta correr atrás de material que comprove essa conduta. Se comprovada, o presidente do BC se comprova como um cúmplice de peso da quadrilha bolsonarista. E sua saída pela porta dos fundos será certíssima.

Para saber mais
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