Haiti 1: no caos, o clamor de soberania
Haiti e República
Dominicana estão em pequena ilha caribenha de clima tropical sujeita a furacões
e uma geologia com sismos relevantes. Mas, diferente da vizinha, o Haiti perdeu
90% de seu ambiente nativo, por exploração intensa. O solo nu aprofunda os
estragos impostos pelos citados fenômenos.
São muito restritas as regiões em estado natural e a maioria das áreas tem segurança privada, só permitindo acesso aos da elite e aos turistas em cruzeiros de luxo.
Dados gerais – os 11 milhões de haitianos são bilíngues: o francês
é língua oficial, mas o crioulo (mistura de francês com dialeto afro) é a fala
cotidiana. 85% são católicos e 15% protestantes, mas se pratica vodu, uma
versão local do nosso quimbanda. Mais de 80% da população são de origem
africana.
A economia nacional é mais
agrícola, produzindo principalmente açúcar. Mas não há destaque no cenário
global. A alta densidade demográfica (229/km²) exauriu os recursos naturais
arruinando o setor. Dois terços do povo ativo estão sem emprego formal e moram
acampados nas ruas. 40% da população passam fome.
Breve histórico – ex-colônia francesa, o Haiti puxou a fileira das
independências na América. Em 1804 foi selada a independência após aguerrida
insurreição popular contra abusos da Coroa no escravismo e na espoliação de
recursos. O país independente adotou regime político presidencialista,
parlamentarista e agora semipresidencialista.
Daí o Haiti teria que
conviver com a instabilidade sociopolítica.
Uma crise sociopolítica
constante – antes, durante e após a ditadura dinástica
dos Duvalier, o Haiti vive profunda instabilidade sociopolítica. Parlamento e
tribunais superiores não funcionam. Desde a morte do presidente Jovenel Moïse
em 2021, o país procura um sucessor, com o primeiro-ministro Ariel Henry de
tapa-buraco.
Henry é criticado por
ativistas populares, que supõem ter ele sido nomeado pelo Core Group
(Grupo Central) de representantes da ONU e da OEA e embaixadores de Brasil,
Espanha, França, Canadá e União Europeia – uma das muitas intervenções das
forças da ONU no país desde meados do século XX, que os ativistas rejeitam.
O povo vive o caos: a incipiência
dos serviços públicos essenciais permite altas taxas de analfabetismo e de
criminalidade, bem como a fome que afeta 40% da população. A crise habitacional
é agravada por gangues que tomam as comunas e expulsam famílias, que terminam
morando em acampamentos nas ruas das cidades.
Segundo sempre divulgado na
mídia, a crise humanitária do Haiti é o motivo das intervenções da ONU, mas as
forças não têm prestado as soluções necessárias para aliviar o sofrimento
social.
Um clamor de soberania no
caos – os haitianos rejeitam as intervenções estrangeiras
em seu território. Desejam um governante eleito por eles e têm esperança em
possível colaboração do Sul Global para um acordo por um governo de transição
capaz de abrir caminhos para a reconstrução do país.
Para os haitianos, Henry
simboliza o mando estrangeiro no país. Para eles, a resolução da crise
humanitária é só pretexto a mascarar o intento de impedir que algum político
local simpático ao modelo castrista cubano suba ao poder. Mesmo que não
tenhamos como aprovar, a crença dos ativistas haitianos faz pleno sentido.
Enquanto não sabemos qual é
o perfil ideológico considerado adequado pelos ativistas para reconstruir o
país, o certo é que, em meio ao caos grita o sentimento de soberania no coração
que bate poderosamente no peito do Haiti.
Para saber mais
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Haiti 2: o suspeito Braga Neto
O general Walter Braga Neto
se notabilizou em duas intervenções militares: a primeira pela ONU no Haiti em
2006; e a segunda como comandante do reforço de segurança no Rio de Janeiro em
2018, diante da explosão de guerra urbana na capital fluminense. Embora
popularmente criticadas, as frentes brilharam os olhos de Jair Bolsonaro.
O presidente eleito em 2018
chamou Braga Neto para fazer parte de sua equipe de governo e, na corrida de
2022, o chamou para compor a chapa para reeleição. Só que Lula ganhou e, então,
o general passou a insuflar os fãs bolsonaristas a manterem protestos,
injetando neles falsas esperanças.
Passado um tempo longe dos
holofotes, Braga Neto voltou a ser notícia para ser convocado pela CPMI do 8/1.
E foi nesse ínterim que foi noticiada a descoberta de seu envolvimento em
negócio suspeito iniciado em 2018 e continuado em 2019¹, entre militares junto
à GIF-RJ e uma empresa de material militar dos EUA.
Coletes balísticos – a PF quebrou o sigilo telemático de Braga Neto. Entre
as muitas mensagens de 2018, algumas que tratavam sobre a compra de coletes
balísticos, alegando necessária segurança do seu contingente na guerra urbana. As
mensagens exigiam produtos importados e fora de licitação.
Superfaturamento – nas mensagens ele esclarece sua preferência para
evitar demora na entrega e a suposta carestia dos nacionais. Mas a compra foi
superfaturada, indicando fraude. Isso foi descoberto por autoridades do HSI
(agência investigativa interna dos EUA), que informaram à Embaixada dos EUA em
Brasília.
O informe foi repassado ao
TCU e à PF, que comprovou o valor acima de R$ 30 milhões. Em 2022, a equipe do
HSI descobriu que o assassinato do presidente do Haiti Jovenel Moïse em julho
de 2021 teve apoio militar da CTU Secutiry LLC – a mesma empresa que
forneceu os coletes a pedido de Braga Neto.
A descoberta – a CTU Security LLC fabrica e fornece material
militar, e tem histórico de contratações com outras empresas. A descoberta do
HSI levou os investigadores à suspeita da formação de cartel entre a CTU
Secutiry LLC e o Gabinete de Intervenção Federal (GIF) no RJ. A PF saiu com
16 mandados de busca e apreensão.
Entre a PF e o HSI existe a
suspeita de possível envolvimento de Braga Neto nesse cartel. O pagamento do
valor supracitado da compra está atualmente interrompido, mas desse dinheiro o
TCU verifica agora o tamanho da propina para militares, que foi recorde em todas as
instâncias na era Bolsonaro.
Ainda não há qualquer evidência
a ligar Braga Netto ao citado assassinato. Mas, para o povo do Haiti, isso não
tem importância: o que importa mesmo é que o país não tenha mais intervenções
estrangeiras e possa ter um líder compromissado em reconstruir a nação e
auferir a sonhada qualidade de vida. E, claro, a paz.
Nota da autoria
¹ Braga Neto já estava como
ministro da Casa Civil de Bolsonaro.
Para saber mais
- https://www.youtube.com/watch?v=mw72YUHiZsU (Plantão Brasil, PF consegue prova para
prender Braga Neto)
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