sábado, 2 de março de 2024

CURTAS 67 - ANÁLISES (sociopolítica brasileira)

 

Um ato contra institucional

            São Paulo, 25/2/24: uma entusiasmada galera verde-amarela aproveitou o bloqueio recreativo da Av. Paulista para voltear com os trios elétricos. À frente do MASP, o trio principal tinha figuras políticas (governadores e parlamentares), o pastor Silas Malafaia e o ex-presidente Bolsonaro.
            O ex-presidente convocou os apoiadores em vídeo a partir de janeiro, recomendado que fosse “um grande evento por anistia para os que foram a Brasília em 8/1”, e que fosse “pacífico”, sem nenhuma fala de ordem contra as instituições.
            A ideia de exigir “pacifismo” para a anistia a terroristas do 8/1 foi estratégica. “Presenças importantes” compareceram para dar força ao bolsonarismo e contar com um público massivo de 1 milhão, mas que foi de 180 mil fantasiados de Brasil e Israel, contados com metodologia de contar gado – daí a alcunha CarnaGado ao manifesto.
            Pacífico? – o ex-presidente recomendou “evitar faixas de ataque às instituições”, para ele “não complicar judicialmente”. Não foi à toa: Xandão deixou aviso do que iria acontecer se houvesse hostilidades às instituições e a jornalistas.
            A recomendação não impediu a cautelosa cobertura da “mídia oficial”: dominaram fotos e vídeos aéreos. Entrevistas foram raras, mas as de influenciadores de canais como Brasil 247 e Patriotas de Humor captaram boas pérolas, até quase serem agredidos.
            Protagonismo de Malafaia – os fantasiados verde-amarelos viram seu mito de fato mais contido, com poucos discursos eufóricos, e os berros de sermões distorcidos de Magno Malta (ele estava bebum? Não sei).
            Se o ex-presidente se precaveu de não atacar as instituições, o mesmo não se pode dizer de Silas Malafaia, que protagonizou os discursos mais agressivos do evento. Mas ele não agrediu o STF diretamente, e sim a conduta dele ao condenar “famílias inteiras com crianças” pelo terror no 8/1.
            Ele se sentiu à vontade para agredir na sua condição de líder religioso. A maior parte de seu discurso se direcionou na ideologização da fé, ao defender abertamente o massacre de Israel sobre Gaza e relativizar nisso o poder do cristianismo, surgido no Oriente Médio.
            Manifestantes pela anistia – desfilando com bandeiras do Brasil e de Israel, os manifestantes verbalizaram a miscelânea de pérolas pegas pelos influenciadores. Como a de “somos cristãos como Israel”, “Israel está se defendendo, pois o Hamas mutilou e assou crianças no forno”, e “Israel não é terrorista, não é socialista”.
            Tais pérolas indicam, sobretudo, ignorância sobre a realidade da guerra Israel-Palestina, o judaísmo e não associação de terrorismo com todas as atuações destrutivas dos bolsonaristas ensinadas pelos milicos nos quarteis desde dezembro/2022 até o ápice em 8/1/2023.
            Fria análise – o CarnaGado foi uma distração aos populares em relação à vilania israelense e à intenção golpista iminente. Nos EUA, o deputado Eduardo Bolsonaro foi entrevistado pela Fox News (a Jovem Pan de lá). Ele difamou a Justiça brasileira e as eleições e ainda acusou o governo de censura à tal liberdade de expressão.
            Nesses termos, as lideranças veem o sucesso da aliança político-religiosa como plano de resgate do poder perdido na derrota eleitoral de 2022. Afinal, 88% dos bolsonaristas entrevistados no CarnaGado não acreditam que Lula venceu no voto, mas pelo tapetão do STF.
            O sucesso político de Bolsonaro não é na competência de governo, e sim na ideologização da fé dos líderes cristãos interessados e na ligação com a ditadura militar que jorrou sangue e lágrimas em 21 anos. E março já traz a expectativa de nova comemoração do golpe de 1964 pelos militares.
            E como o legado nazista de Hitler, o bolsonarismo permanecerá como sombra indelével na materialidade democrática durante muito tempo. É a lição, mesmo nefasta, de que os terroristas e seus indutores políticos, militares e religiosos jamais podem ser anistiados pela Justiça.
            Por memória, justiça e verdade, não à anistia, vale a vergonha na cara institucional pelo valor da nação.

Para saber mais
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Março pelas instituições

            Neste ano bissexto, o mês de fevereiro findou pouco tempo após a manifestação bolsonarista pela anistia aos terroristas que atuaram desde o pós-eleição, a partir de protestos dispersos nas estradas e depois concentrados em quarteis das Forças Armadas.
            Alguns julgaram o manifesto bolsonarista como um erro de data, mas vale salientar a importância do fato como um preparativo de avaliação da massa para uma possível nova intentona-surpresa no fim de março ou 1º de abril, período correspondente ao do golpe de 1964.
            Comemorando a necropolítica – em março de 2019, o ex-presidente Bolsonaro instituiu uma espécie de “Ordem do Dia”, através da qual foi permitida a comemoração do golpe de 1964, considerado “revolução” pelos milicos e “contrarrevolução” pela esquerda.
            A tal “ordem do dia” chegou a ser questionada por parlamentares da oposição na época, mas a Justiça deu aval para a comemoração, talvez em consideração do magistrado aos privilégios presidenciais então gozados. Mais uma vez triunfou a nefasta cultura de privilégios.
            A nostalgia não é de todo um defeito de personalidade, levando-se em conta os fatos positivos pretéritos atualmente perdidos. Mas entre os milicos a nostalgia recai na necropolítica da ditadura de 1964-85, cujo saldo fatal ainda não é preciso, mas se sabe ser acima de 8700 mortos, em sua grossa maioria de indígenas.
            A necropolítica daquele tempo inspirou Bolsonaro, que bateu o recorde daquele tempo matando mais de 700 mil vidas só pela promoção da epidemia de C19 durante o surto pandêmico, principalmente no período 2020-21. E talvez isso tenha entusiasmado uma grande quantidade de milicos nos quarteis.
            Movimento anti-extremista – a resistência final da delicada democracia via retorno de Lula foi um revés para os militares. A batalha contra o bolsonarismo nos poderes públicos se deu com revogações de decretos cabulosos e da Ordem do Dia, e uma limpeza institucional com exoneração de muitos envolvidos em crimes bolsonaristas.
            No Congresso, o bolsonarismo enfrenta a PL de Janones que o criminaliza, as muitas investigações e prisões de apoiadores, de militares e de financiadores do terror golpista, e a recente ação do PSOL ao STF sobre o desproporcional aumento de gastos públicos das casas, requeridos por parlamentares que foram ao CarnaGado.
            Fora do ambiente político profissional, alguns movimentos sociais organizados preparam uma série de manifestos contra a possível comemoração do golpe de 1964, bem como homenagens a Marielle Franco e outras mulheres no Dia Internacional da Mulher, e contra o genocídio palestino.
            O bolsonarismo resiste o quanto pode ao remar contra a maré antifascista que contra-ataca em várias frentes. Ele demonstra ser forte ao angariar e manter um público fiel, o que exige cuidado da parte dos democratas, que sabem do poder da aliança político-religiosa historicamente nazifascista.
            Se politicamente a “direita democrática” que ajudou na eleição de Lula tem oscilado por interesses fáceis que pressionam o governo de plantão, os socialdemocratas têm como triunfo a maior parte da patuleia não tolerar os crimes dos nazifascistas de plantão, que têm se mostrado mais graves do que os cometidos durante os governos anteriores.
            Ainda assim, eles sabem que lidar com esse povo exige jogo de cintura em assuntos espinhosos, como as questões de gênero, direitos reprodutivos femininos e trans e descriminalização dos usuários de drogas ilícitas. Vale restaurar a confiança nas instituições.
            Nessa restauração entra a luta contra a criminalidade política, como as denúncias já feitas por siglas partidárias adversarias para as instituições judiciárias, e criar proposições que garantam bem-estar e promovam os direitos fundamentais da sociedade. Isso é defender as instituições democráticas. O resto é consequência.

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