Censura no Brasil e a real
dos EUA
Com
a CF-1988, a nação brasileira finalmente se viu livre de qualquer amarra da
Censura do golpe de 21 anos. O fim da censura também libertou a imprensa. As
pessoas finalmente podem expressar seu pensamento sem temor.
A
liberdade de expressão se revela a partir de um debate de ideias e nas notícias
de escândalos políticos. Matérias do tipo investigativo de bastidores antes
segredados passaram a ser expostos ao público. Mas, não haveria muita garantia,
na prática.
Censura
ilegal – é que logo os primeiros
incomodados dos meios poderosos começaram a se manifestar. Recentemente, a
mídia investigativa Agência Pública sofreu um revés judicial (ilegal) a
mando do poderoso Arthur Lira.
Matérias
denunciando os supostos crimes de Lira foram tiradas do ar sub judice, como a
entrevista da ex-mulher sobre violência doméstica e sexual, e malversações com
recursos públicos em Alagoas. A censura inconstitucional se mantém.
Agora
surge nova trama, com outros personagens.
Elon
Musk x Xandão –
por conta do inquérito das milícias digitais, o trilhardário Elon Musk, dono do
X (ex-Twitter) resolveu interferir nas ações do STF, depois que este mandou
cortar diversos perfis falsos ligados à extrema-direita.
Xandão
endureceu com a interferência ilegal que foi defendida por parlamentares
bolsonaristas e do pastor Malafaia. Enviados de Musk compareceram à Câmara com
mentiras depois desmentidas pelos próprios. E aí entra outro personagem.
Glenn
Greenwald – vivendo entre Brasil e
EUA, Glenn tem um currículo jornalístico invejável. No Intercept Brasil,
ele protagonizou matéria sobre Edward Snowden e a espionagem política dos EUA,
e a nossa Vaza-Jato, que oportunizou a liberdade de Lula. Mas enfrentou
persecução.
A
persecução sofrida pelo Intercept se deveu ao bolsonarismo e não ao STF.
Pelo contrário: os ministros sabem do valor da Vaza-Jato. Hoje Glenn atua em
outras fontes, como a Fox News, a Jovem Pan dos EUA com suas falácias.
E foi
nessas fontes que Glenn passou a negar certas verdades e defendeu Musk acusando
Xandão de censura ao mandar banir perfis do X no país. E, com isso deu munição
aos antigos inimigos: os bolsonaristas.
Bolsonaristas
nos EUA – um grupo de parlamentares
bolsonaristas foi aos EUA para se queixar da “ditadura judiciária de
esquerda” no Brasil. O Pentágono impediu aquele chorume no recinto, e
restou a eles discursar na rua vazia.
Os bizarros
bolsonaristas não se emendam. Com base no caso Julian Assange, criador do site WeakLeaks
preso no Reino Unido, a liberdade de imprensa estadunidense é, no mínimo, bem
contradita. E por um motivo simples.
Sigilo
da fonte e direito de resposta –
com ajuda do hacker Walter Delgatti, a Vaza-Jato do Intercept foi possível
no Brasil bolsonarizado graças a dois princípios constitucionais: o sigilo da
fonte e o direito de resposta.
O sigilo
da fonte é proteção em caso de reportagem investigativa, por exemplo. Ele evita
retaliação de pessoas na trama investigada contra os jornalistas ou a mídia,
que pode usar, sub judice ou não, direito de resposta se necessário.
Com
fins lícitos, o trabalho jornalístico é ferramenta poderosa de informação. Por fim
lícito se entende o objetivo de se obter, desvendar e divulgar informações
sem desqualificar personagens constados nas reportagens obtidas.
O sigilo
da fonte, o direito de resposta e a objetividade lícita são princípios da liberdade
de mídia no Brasil. A nossa lei permite a liberdade responsável de imprensa, em
que há equilíbrio entre os jornalistas e os alvos da reportagem.
Liberdade
nos EUA –
é aí que mora a diferença de conceito de liberdade entre o Brasil e os EUA. A legislação
de lá não reconhece o sigilo da fonte e o direito de resposta. E aí podemos
entender melhor o caso WekLeaks.
Do jornalista
Julian Assange, o WeakLeaks é como o Intercept: o mundo soube das
más intenções da política externa dos EUA ao descobrir documentos secretos. Preso
no Reino Unido, Assange pode ser extraditado aos EUA, onde será punido com a perpétua.
Ao não
reconhecer os dois princípios citados, a legislação dos EUA já cerceou várias
atividades jornalísticas locais. O conceito de liberdade de mídia lá não reconhece,
de certa forma, o direito de resposta. Daí haver alguns fatos polêmicos.
Como
o manifesto de neonazistas em guetos de judeus por lá. O que, na lógica
histórica é uma contradição. Diferente daqui, lá o nazismo não é crime – até por
coerência com a intolerância étnica e religiosa ainda forte por lá.
Devido
a isso, nos parece incompreensível o conceito de liberdade responsável de expressão
nos EUA: um parece ter mais poder em detrimento do outro. Na prática, é exatamente
essa realidade de lá que o Brasil bolsonarizado entende como liberdade.
Para
saber mais
-----
Já
repararam que, no tribunal ou no Congresso, juízes e presidentes sempre pedem
ordem quando há conflitos nos respectivos recintos? Pois é. Essa ordem que eles
pedem é o que se chama de decoro.
Ele
designa uma atitude civilizada e respeitosa que devemos um com o outro em
ambientes sociais, não importando, assim, quaisquer tipos de diferenças
individuais, culturais e políticas. No congresso é o decoro parlamentar.
Quem
testemunhou a Constituinte de 1988 percebeu o nível de civilidade dos
parlamentares de variadas escolaridades e ideologias. Foi o Congresso mais
adequado para o mais alto feito para a consolidação democrática.
Não
que a paz fosse absoluta naquela legislatura. Mas os conflitos eram bem mais
civilizados do que vemos hoje.
Queda
do decoro – foi a partir dos anos
2010 que percebemos uma queda mais sensível do decoro parlamentar, com um
estranho viés. Após 3 décadas vimos o retorno da extrema-direita a atacar a
centro-esquerda democrática (2003-2016).
A partir
de 2014 vimos o cristofascismo e a escatologia agressiva na legislatura. Com Bolsonaro
na presidência, o Congresso atingiu a atual fase civilizatória abaixo da
crítica. Nem nomes da direita democrática escapam às agressões.
Alguns
parlamentares de esquerda passaram a responder à altura, mas sem perder o
decoro. Como o pastor Henrique Vieira (PSol-RJ), que usa filosoficamente o
cristianismo para justificar seu viés progressista que o destaca da bancada
bíblica.
Glauber
x bolsonaristas –
com seu poder reativo, a minoria governista de esquerda busca compensar a
desvantagem numérica em relação aos bolsonaristas, de distintas formas. Se
petistas debocham, psolistas usam o bom combate.
O maior
exemplo é Glauber Braga (PSOL-RJ). Ele tem vários PLs de autoria única, que indicam boa
produção parlamentar. Mas a sua persona combativa gerou muitos desafetos, como
os extremistas e o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).
Não
por acaso, ele é um dos vários nomes da esquerda com processos no Conselho de
Ética da Câmara. Agora, ele responde a novo processo. Só que, antes de entrar nele,
vale relembrar o protagonismo de Eduardo Bolsonaro.
Baixaria
na sessão – em meados de 2023 ocorreu
uma sessão num dos auditórios da Câmara. Ressoou, inaudível, uma fala do deputado
Marcon (PT-RS), que despertou Eduardo Bolsonaro (PL-SP), a três fileiras de
cadeiras atrás.
A reação
de Eduardo já foi grosseira antes de ir para cima de Marcon: “vou te pegar no teu saco!”. Foi então que Marcon teria dito “facada fake”, em alusão à controvérsia
do fato com Bolsonaro de 2018. Aí o bicho pegou.
O filho
do ex-presidente avançou até a fileira de Marcon e foi contido pelos presentes para
não ir às vias de fato. Ele depreciou o petista com exclamações ameaçadoras e
homofóbicas, e palavrões urogenitais impublicáveis aqui.
Caso
Costenaro – se a franqueza aberta
marca os psolistas em geral, Glauber vai para cima. Ele protagonizou a cena
recente de expulsar da Câmara um rapaz branco, alto e bem vestido de nome
Gabriel Costenaro.
Mídias
como Revista Oeste, Veja e O Antagonista tentaram vilanizar o deputado,
incentivando a demanda do PL e do líder do MBL¹ na Câmara Kim Kataguiri (UB-SP)
no protocolo do processo contra o psolista fluminense.
A
vilanização foi criada por edição do vídeo em que os dois personagens
se confrontam, envoltos pela pequena multidão de servidores da casa, assessores e
parlamentares. Mas, quem é Gabriel Costenaro?
Influencer
violento – paulista, Gabriel
Costenaro de Sousa é um influencer militante do MBL, do qual vieram à vida
política Kim Kataguiri, Guto Zacarias, Artur do Val, Renan Santos, Fernando
Holiday e Diogo Garcia.
Assim
como Renan (fundador do MBL), Gabriel Costenaro é influencer de
extrema-direita com milhares de seguidores. Ele não tem carreira política, mas
é filiado ao partido Novo de Romeu Zema e Marcel Van Hatten.
Seu
estilo lembra o de Wilker Leão por abordar os políticos. Mas se Leão se valeu
de certo toque memético, Costenaro é mais agressivo e direto. Foi dessa forma
algo violenta que se desenrolou o confronto entre ele e Glauber.
Confrontos com Glauber – embora
o vídeo viralizado pela grande mídia só mostre o deputado mais nervoso e expulsando Gabriel , a verdade pode não ser exatamente essa. O contexto do vídeo deve
ser entendido na história do MBL.
O
MBL já praticou ataques moralistas a diversos manifestos artísticos e
culturais fechados e abertos, alegando cunho religioso e “contra a
família”. Podcasts de influencers banidos por ordem do STF, como Monark, já revelam o caráter
agressivo e extremista do movimento.
Glauber conta que ele e um militante do Psol foram antes assediados por Costenaro numa rua do Rio, com ameaças contra suas respectivas mães, e acrescenta que o mesmo tem processos por agressão a uma estudante e uma funcionária da UFPR, e violência doméstica. De fato há links disponíveis no Google.
Fria
análise – vale ressaltar, antes de
tudo, que este artigo só pretende pôr a balança em prática. As condutas de Glauber e Eduardo foram infelizes, mas a daquele teve legitimidade. E só Glauber está respondendo a processo por indecoro.
Esse "2 pesos, 2 medidas" se explica. Glauber incomoda gente do Centrão e da extrema-direita. Arthur Lira é desafeto dele e vê o momento como oportuno para enfraquecer o governo Lula ao tirar um líder governista.
Mas ele dificilmente será cassado, por risco institucional. A patuleia já percebeu as injustiças no Legislativo, e outros parlamentares podem compensar expondo as más intenções do Centrão e dos bolsonaristas.
O decoro parlamentar deixou de ser questão de civilidade para virar pretexto ideológico, não só para voltar o bolsonarismo ao poder, mas também para desestabilizar o governo vigente ao ponto de impeachment. O buraco é mais embaixo do que pensamos.
Nota da autoria
¹ Movimento Brasil Livre, de viés cristofascista, criado por jovens paulistanos de classe média-alta.
Para saber mais
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leticia-casado/2024/04/16/glauber-braga-confusao-mbl-camara.htm
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2023/04/curtas-26-analises-munduruku-dino.html (Curtas 26, com o último artigo sobre o caso Dudu Bolsonaro).
-----
Nenhum comentário:
Postar um comentário