domingo, 2 de junho de 2024

ANÁLISE: políticos condutopatas

 
       Na série #Curiosidades do blog há artigos sobre dois grupos de transtornos psíquicos: mentais (fazem o portador sofrer, alteram a consciência), e de personalidade (portador transmite sofrimento a outros). Os primeiros são inconscientes e os segundos mantêm a consciência e podem gerar risco social.

Interesse forense – essa distinção contribui para apuração de crimes que repercutem na mídia e na sociedade e a pena adequada ao autor. Destaca-se aqui o transtorno de personalidade antissocial (TPAS), ou psicopatia, termo popular entre nós pela mídia e pela TV e cinema – sinonímia controversa na psiquiatria.
            Alguns alegam que o sujeito TPAS pode amar e é desorganizado e impulsivo em delito; e o psicopata, o contrário. O psiquiatra Guido Palomba diz ser ambos a mesma coisa, mas prefere adequar a nomenclatura.

Condutopatia – é como Guido designa o famoso desvio. Ele explica que psicopatia (de psiché = alma, pathias = doença) é o objeto genérico da Psicopatologia, cerne da Psiquiatria e da Psicologia Clínica. Para o especialista, o termo Sociopatia é a melhor sinonímia.
            O condutopata prejudica outrem por prazer ou domínio. Despreza regras e consequências. Empatia e remorso são fracos ou inexistem. Mente e convence. A maioria trapaceia; os assassinos são, felizmente, minoria.
            O desvio afeta até 4% da patuleia geral e 25% dos presos perigosos. O fator de risco é o transtorno de conduta infantojuvenil, reversível em adultos normais, em tempo variável. Na maioridade, seu diagnóstico ocorre por método específico desenvolvido pelo especialista.
            Intrínseco – o portador já nasce condutopata. O fator pode ser genético, congênito (na gravidez) ou algum trauma de parto.  Eventos estressores externos não causam, mas podem desencadear condutas graves.

Políticos – o interesse forense se estende à classe política: psiquiatras afirmam haver condutopatas na área. Mas é difícil confirmar tal relação, pois variantes como ideologia, visões e ambições pessoais pesam muito.
            No Brasil, a carreira política é atrativa, por oferecer salários e benesses volumosos, foro privilegiado (segurança jurídica) e poder – que, na verdade tem permitido práticas ao arrepio da lei, raramente punidas, mesmo na ciência dos deveres públicos.
            Muitos ambicionam um poder infinito (econômico e/ou político-ideológico), pois significa influência. Influência indica controle coletivo para maximizar o domínio massivo, objetivo-fim do político condutopata. Aí reside o perigo.

Possíveis exemplos – sempre houve crimes políticos: são reflexos naturais de desvios sociais. Um mal humano. Mas é a partir do século XX que podemos observar melhor os que atendem aos requisitos acima descritos.
            Arnon Mello – em 1962, o senador alagoano Arnon Collor matou um colega errado ao querer atingir o seu conterrâneo Góis Monteiro, que supostamente o ameaçou de morte. A vítima fatal foi o acreano José Kairala.
            O crime foi reflexo de disputa de domínio em Alagoas, que ainda vive o coronelato. Mesmo criminoso, Arnon sacramentou os Collor de Mello como uma das famílias de coronéis do Estado, além dos Lira-Pereira e os Calheiros.
            Eduardo Cunha – irascível, ele abriu portas para a extrema-direita à moda do MBL e do bolsonarismo. Pregando moralismo cristão, arquitetou o golpe de 2016 por não ter algumas ambições pessoais atendidas. Terminou cassado, como terminam presos muitos criminosos condutopatas.
            Arthur Lira – da família alagoana Lira-Pereira, ele é um Cunha ao quadrado. Ególatra e agressivo, não aceita críticas nem ser contrariado, impondo derrotas ao governo federal, desprezando as consequências para o país.
            A única diferença dele para Cunha, talvez, seja ele não entrar na modinha de versículos bíblicos. Mas disfarça seu mau humor muito bem, nas entrevistas educadas que concede.
            Ciro Gomes – de uma família política do Ceará, ele é irascível como Lira e Cunha. Seus ataques à honra de alguns o têm posto em maus lençóis, e seu alvo predileto é Lula, o que contribui no fracasso eleitoral em que se encontra.
            Jair Bolsonaro – é quem mais reúne sinais: ambição de poder infinito, empatia e remorso ausentes, desprezo aos flagelados em geral e mentira constante são alguns. Ególatra, vê no outro instrumento de poder. Se perpetua nos filhos, que reproduzem a vida política errática.
            Outros sinais: ilícitos com o erário público (posse de joias destinadas à União, desprezo à lei e ao patrimônio, gastos suspeitos), culpa outros por seus erros, e vingança (contra os juízes que o podaram na presidência, em comícios e marchas cristãs onde é venerado).
            Em referência à pandemia, Guido viu em Bolsonaro “o perigo de se ter uma liderança condutopata para o país”.
            Lula, o controverso – trata-se de uma personalidade rica e complexa. Ex-sindicalista e político experiente, ele tem um invejável carisma de massa, que democraticamente lhe deu a inédita terceira presidência da República.
            Compartilha com a massa a origem popular, a infância difícil, a baixa escolaridade e a lide no trabalho precoce. Na vida sindical nasceu o político vocacionado de discurso fácil que, governante visionário, cria políticas inclusivas.
            Mas a corrupção durante as duas eras pretéritas fez a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa enfaticamente afirmar que “o Lula é psicopata”. O seu carisma único, o discurso sedutor, a inteligência política aguçada e resolutiva e certa egolatria são sugestivos.
            Por outro lado, ao contrário de Bolsonaro, Lula apresenta sentimentos comuns como empatia, alegria, tristeza e até (um pouco rebaixada) autocrítica, o que põe em xeque a afirmativa de Barbosa. E é aí que entra a controvérsia no caso dele.

Fria análise – as atitudes expostas dos políticos exemplificados pressupõem possibilidades de sinais de desvio condutopata. Possibilidades não afirmam, apenas sugerem a partir de dados mais observados do que descritos.
            Além das variantes acima descritas (ideologia, visão e intenções pessoais), a falta de fonte acadêmica acessível sobre o tema intitulado pesa como fator limitante para afirmar quem tem, ou não, algum desvio de personalidade.
            Bolsonaro e Lula são líderes populares e envolventes em seus discursos e objetivos distintos, daí serem citados, por Guido e Ana Beatriz, respectivamente. Mas se opõem em outros traços, indicando as diferenças analíticas dos dois especialistas.
            A extensão de poder de Benedito de Lira ao filho Arthur e Bolsonaro aos três filhos indica tradição familiar, que se verifica também em outros políticos pelo país. Isso não é, necessariamente, traço psiquiátrico de interesse como a condutopatia.
            Enfim, no rol de políticos citados, apenas um deles tem evidência clara de condutopatia, ou algum outro desvio de personalidade. Os demais podem ser excluídos – ou não. Depende da suposta possibilidade de experimentos futuros. 
            Afinal, desvios de personalidade não devem ser midiatizados como modinha, eles têm importância para a ciência: daí valer o olhar para os políticos, que definem o futuro do nosso país.

Para saber mais
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