Na série #Curiosidades
do blog há artigos sobre dois grupos de transtornos psíquicos: mentais
(fazem o portador sofrer, alteram a consciência), e de personalidade
(portador transmite sofrimento a outros). Os primeiros são inconscientes e os
segundos mantêm a consciência e podem gerar risco social.
Interesse forense – essa distinção contribui para apuração de crimes
que repercutem na mídia e na sociedade e a pena adequada ao autor. Destaca-se
aqui o transtorno de personalidade antissocial (TPAS), ou psicopatia,
termo popular entre nós pela mídia e pela TV e cinema – sinonímia controversa
na psiquiatria.
Alguns alegam que o sujeito
TPAS pode amar e é desorganizado e impulsivo em delito; e o psicopata, o
contrário. O psiquiatra Guido Palomba diz ser ambos a mesma coisa, mas prefere
adequar a nomenclatura.
Condutopatia – é como Guido designa o famoso desvio. Ele explica
que psicopatia (de psiché = alma, pathias = doença) é o
objeto genérico da Psicopatologia, cerne da Psiquiatria e da Psicologia
Clínica. Para o especialista, o termo Sociopatia é a melhor sinonímia.
O condutopata prejudica
outrem por prazer ou domínio. Despreza regras e consequências. Empatia e
remorso são fracos ou inexistem. Mente e convence. A maioria trapaceia; os
assassinos são, felizmente, minoria.
O desvio afeta até 4% da patuleia
geral e 25% dos presos perigosos. O fator de risco é o transtorno de conduta
infantojuvenil, reversível em adultos normais, em tempo variável. Na
maioridade, seu diagnóstico ocorre por método específico desenvolvido pelo especialista.
Intrínseco – o portador já nasce condutopata. O fator pode ser
genético, congênito (na gravidez) ou algum trauma de parto. Eventos estressores externos não causam, mas podem
desencadear condutas graves.
Políticos – o interesse forense se estende à classe política: psiquiatras
afirmam haver condutopatas na área. Mas é difícil confirmar tal relação, pois
variantes como ideologia, visões e ambições pessoais pesam muito.
No Brasil, a carreira
política é atrativa, por oferecer salários e benesses volumosos, foro
privilegiado (segurança jurídica) e poder – que, na verdade tem
permitido práticas ao arrepio da lei, raramente punidas, mesmo na ciência dos
deveres públicos.
Muitos ambicionam um poder infinito
(econômico e/ou político-ideológico), pois significa influência. Influência indica
controle coletivo para maximizar o domínio massivo, objetivo-fim do político
condutopata. Aí reside o perigo.
Possíveis exemplos – sempre houve crimes políticos: são reflexos
naturais de desvios sociais. Um mal humano. Mas é a partir do século XX que
podemos observar melhor os que atendem aos requisitos acima descritos.
Arnon Mello – em 1962, o senador alagoano Arnon Collor matou um
colega errado ao querer atingir o seu conterrâneo Góis Monteiro, que
supostamente o ameaçou de morte. A vítima fatal foi o acreano José Kairala.
O crime foi reflexo de
disputa de domínio em Alagoas, que ainda vive o coronelato. Mesmo criminoso,
Arnon sacramentou os Collor de Mello como uma das famílias de coronéis do
Estado, além dos Lira-Pereira e os Calheiros.
Eduardo Cunha – irascível, ele abriu portas para a extrema-direita à
moda do MBL e do bolsonarismo. Pregando moralismo cristão, arquitetou o golpe
de 2016 por não ter algumas ambições pessoais atendidas. Terminou cassado, como
terminam presos muitos criminosos condutopatas.
Arthur Lira – da família alagoana Lira-Pereira, ele é um Cunha ao
quadrado. Ególatra e agressivo, não aceita críticas nem ser contrariado, impondo
derrotas ao governo federal, desprezando as consequências para o país.
A única diferença dele para Cunha, talvez, seja ele não entrar na modinha de versículos bíblicos. Mas disfarça seu mau humor muito bem, nas entrevistas educadas que concede.
Ciro Gomes – de uma família política do Ceará, ele é irascível como
Lira e Cunha. Seus ataques à honra de alguns o têm posto em maus lençóis, e seu
alvo predileto é Lula, o que contribui no fracasso eleitoral em que se encontra.
Jair Bolsonaro – é quem mais reúne sinais: ambição de poder infinito,
empatia e remorso ausentes, desprezo aos flagelados em geral e mentira constante
são alguns. Ególatra, vê no outro instrumento de poder. Se perpetua nos filhos,
que reproduzem a vida política errática.
Outros sinais: ilícitos com
o erário público (posse de joias destinadas à União, desprezo à lei e ao
patrimônio, gastos suspeitos), culpa outros por seus erros, e vingança (contra os
juízes que o podaram na presidência, em comícios e marchas cristãs onde é
venerado).
Em referência à pandemia, Guido
viu em Bolsonaro “o perigo de se ter uma liderança condutopata para o país”.
Lula, o controverso – trata-se de uma personalidade rica e complexa. Ex-sindicalista
e político experiente, ele tem um invejável carisma de massa, que
democraticamente lhe deu a inédita terceira presidência da República.
Compartilha com a massa a
origem popular, a infância difícil, a baixa escolaridade e a lide no trabalho
precoce. Na vida sindical nasceu o político vocacionado de discurso fácil que,
governante visionário, cria políticas inclusivas.
Mas a corrupção durante as duas
eras pretéritas fez a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa enfaticamente afirmar que “o Lula é
psicopata”. O seu carisma único, o discurso sedutor, a inteligência
política aguçada e resolutiva e certa egolatria são sugestivos.
Por outro lado, ao contrário
de Bolsonaro, Lula apresenta sentimentos comuns como empatia, alegria, tristeza
e até (um pouco rebaixada) autocrítica, o que põe em xeque a afirmativa de
Barbosa. E é aí que entra a controvérsia no caso dele.
Fria análise – as atitudes expostas dos políticos exemplificados pressupõem
possibilidades de sinais de desvio condutopata. Possibilidades não afirmam,
apenas sugerem a partir de dados mais observados do que descritos.
Além das variantes acima
descritas (ideologia, visão e intenções pessoais), a falta de fonte acadêmica acessível
sobre o tema intitulado pesa como fator limitante para afirmar quem tem, ou
não, algum desvio de personalidade.
Bolsonaro e Lula são líderes
populares e envolventes em seus discursos e objetivos distintos, daí serem citados,
por Guido e Ana Beatriz, respectivamente. Mas se opõem em outros traços, indicando as diferenças analíticas
dos dois especialistas.
A extensão de poder de
Benedito de Lira ao filho Arthur e Bolsonaro aos três filhos indica tradição
familiar, que se verifica também em outros políticos pelo país. Isso não é,
necessariamente, traço psiquiátrico de interesse como a condutopatia.
Enfim, no rol de políticos
citados, apenas um deles tem evidência clara de condutopatia, ou algum outro desvio de personalidade. Os demais podem
ser excluídos – ou não. Depende da suposta possibilidade de experimentos
futuros.
Afinal, desvios de personalidade não devem ser midiatizados como modinha, eles têm importância para a ciência: daí valer o olhar para os políticos, que definem o futuro do nosso país.
Para saber mais
----
Nenhum comentário:
Postar um comentário