Patativa
do Assaré, uma reflexão à esquerda
Patativa do Assaré
(1909-2002) foi um poeta popular e repentista cearense. Ícone da cultura
sertaneja, ele imprimiu uma beleza que lhe valeu a alcunha Patativa, em
referência tupi a um pássaro nativo de belo e complexo canto.
Em 2002 ele se foi sem, talvez, ter
conhecido a internet. Mas foi imortalizado nela graças às suas frases diretas e
contundentes sobre os fatos políticos. Mas, será que todos entendem as suas
intenções?
Palanques virtuais – as redes sociais se tornaram verdadeiros palanques
políticos, com a vantagem da capilaridade de amplo alcance entre o público, e
vídeos transmitidos em tempo real.
Vantagens à parte, os
palanques virtuais não substituem os tradicionais comícios físicos: uma massa
variável comparece para acompanhar de perto as falas políticas. O que é
excelente para alguns.
Dominância à direita – as redes sociais são o espaço preferido dos
partidários da extrema-direita. Neles, eles podem desferir sua fala raivosa e
garantir a atenção imediata às necessidades do povo.
Nesse sentido, sem a
necessária criticidade, a patuleia cansada de tanta espera tem a impressão de
que “eles nos entendem”. É como se fosse estabelecido um respeito mútuo, na
verdade não real.
O proveito do valor da
verticalidade hierárquica pela extrema-direita abriu portas para a
desinformação sistemática, que se torna “lei” se criada pelos “de cima” (os
políticos ou quem os financia).
Desempenho da esquerda – no heterogêneo campo da esquerda, militância,
políticos e partidos também criaram perfis nas redes sociais, visando maior
alcance público. Mas surgiu um problema.
O número de seguidores de
perfis de esquerda é hoje menor do que os da direita e extrema-direita. A
influência do bolsonarismo é apenas um dos fatores do mau desempenho da esquerda
online.
Outros predisponentes para
o seu menor desempenho nas redes são: mudança de perfil sociopolítico, e
conduta/linguagem.
Mudança no perfil sociopolítico- no fim dos anos 1990, internet e neoliberalismo
implicaram mudanças sociais em educação, ciência, tecnologias, mentalidade
geral, religiosidade, etc.
A rede modificou as interações,
e o neoliberalismo diluiu a consciência de classe, a definição funcional essencial de
Estado enquanto necessário, e confundiram definições de direita e esquerda. A sapiência ficou mais
confusa.
Conduta/linguagem- a esquerda só chegou a governar sob a conciliação
classista de Lula. Na política social, ela deixou reflexos tão profundos que
sobreviveram ao ataque bolsonarista. Daí Lula se manter popular e estar no 3º
governo.
Mensageiros online como ICQ
já existiam quando Lula tomou posse. Mais tarde, a direita se apropriou do MSN,
do Facebook e do X (o antigo Twitter). O discurso popular de Lula procrastinou
a esquerda online.
Os perfis de esquerda nas
redes inicialmente bombaram, com muitos seguidores em pouco tempo. Mas depois o
clima mudou. E a culpa por isso é dos próprios autores dos perfis – inclusos os
oficiais do governo.
Embora a essência
ideológica popular permaneça, a linguagem ficou acadêmica a partir dos anos
1960, na conquista das classes médias, que ainda dominam as universidades
públicas.
Por conta disso, a extrema-direita que se autodenomina antissistema se apropriou das palavras-chave da esquerda com distorções de sua essência, capturando o apoio popular com maestria.
Fria análise final - embora a essência popular da esquerda permaneça, a
linguagem ficou acadêmica a partir dos anos 1960, na conquista das classes
médias, que ainda dominam as universidades públicas.
Uma escrita acadêmica
reflete, em primeiro lugar, a distância entre governos e o povo. As propostas
postadas podem ser pró populares, mas o povo as ignora ou despreza, em clara indicação de que a linguagem das postagens deve ser... popular.
É aí que cabe muito bem a lição de
Patativa do Assaré: “É melhor escrever errado a coisa certa, do que escrever
certo a coisa errada”. Afinal, “o poder do povo é enorme”. Esquerda,
reaproxime-se das classes populares e reassuma a sua essência, nas ruas e nas redes.
Para saber mais
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Inaugurada com a emissora
Tupi em 1950 no Brasil numa residência abastada, a televisão, ou simplesmente
TV, se popularizou rápido. No interior, famílias se reuniam em praças para ver
a TV à noite.
Foi nesse contexto que
programas de auditório e novelas competiam pela audiência popular. Surgida em
1965, a emissora Globo comprou a Tupi e a programação dominical foi dominada
por uma figura: Silvio Santos.
A figura – Senor
Abravanel era carioca, filho primogênito de imigrantes judeus sefarditas.
Iniciou sua vida como camelô e vendedor esbanjando seu talento de comunicação
fluida e simpática atraindo os consumidores.
Ele virou referência
popular, e foi chamado para apresentar anúncios e programas no rádio. Uma porta
aberta para a TV, em São Paulo, na qual entraria assumindo o nome artístico
Silvio Santos, no início dos anos 1960.
A carreira – ele
iniciou apresentando “Vamos brincar de forca”, na extinta TV Paulista. Depois
foi para a TV Globo, onde apresentou o diversificado e popular dominical Programa
Silvio Santos, que durava até a noite. Um suce$$o.
Em meados dos anos 1970,
ele saiu da Globo e criou o Grupo Silvio Santos, depois Sistema
Brasileiro de Televisão (SBT), no qual criou dominical no molde do global,
porém mais curto, para diversificar a programação e atrair mais audiência.
No mudo dos programas de
auditório, ele tinha mais audiência do que os outros apresentadores mais novos
no SBT. O seu carisma era incontestável e pode não ser facilmente substituído.
O fim – Silvio
atuou por mais de 60 anos na TV. Afastou-se ao contrair gripe H1N1, complicada
em broncopneumonia, falecendo aos 93 anos. Deixou a esposa Íris, e 6 filhas, 14
netos e 4 bisnetos.
Além de todo o negócio a
ser tocado pelas filhas, ele deixou uma fortuna em espécie avaliada em mais de
R$ 3, 4 bilhoes.
O Legado – no
país dos “Q.Is.”, Silvio Santos pode ser considerado uma exceção notável de
sucesso profissional e social por mérito próprio. Claro que, não fosse o povo
do rádio, ele talvez não chegasse aonde chegou.
Foi bem premiado e
homenageado, e também premiou e homenageou gente da TV. Inspirou novos
apresentadores como Gugu Liberato, Celso Portiolli, Fausto Silva, Luciano Huck
e outros. E ainda tentou outro caminho.
A política – talento
e carisma fizeram de Silvio Santos uma das figuras mais populares da história
da TV brasileira. A Globo aproveitou essas qualidades para escapar à pesada
censura da ditadura, e manter a audiência no Fantástico à noite.
Popularidade e premiações
na época aproximaram Silvio da política. Em 1988 se filiou ao extinto PFL, para
concorrer à prefeitura de São Paulo, sem sucesso. Em 1989 se filiou ao nanico e
extinto PMB para tentar a presidência.
Liderou nas pesquisas de
intenção de voto. Mas, segundo a mídia, sua candidatura foi cassada pelo TSE
devido a uma irregularidade do PMB acusada em ação de Eduardo Cunha. E desde
então, Silvio não tentou mais a carreira política.
Entretanto, por interesse
empresarial, a sua proximidade com representantes políticos da direita
permaneceu. Ele pulou para o Democratas (hoje União Brasil), onde se manteve
até o fim de sua vida.
Fria análise –
no âmbito político, a aventura de Silvio Santos a partir do pós-ditadura fez a geral
considera-lo um democrata. Só que não: ele era próximo dos militares, como
Ernesto Geisel e João Figueiredo.
Em 1975, o ministro da
Comunicação Euclides Quandt de Oliveira avalizou a licença funcional de canal
de TV aberta, com a segunda maior concessão pública, atrás apenas da eterna
líder Globo.
O tom ameno do
telejornalismo do SBT denunciava concordância com o regime, para que os seus
negócios televisivos não sofressem censura e seu prestígio junto à sociedade
não fosse arranhado.
A aproximação com Lula não
tornou Silvio um empresário socialdemocrata. Com o mesmo carisma do presidente,
ele permaneceu como sempre, à direita – e se foi deixando como legado o carinho
popular que Roberto Marinho ou Humberto Saad (Band) não tiveram.
Para saber mais
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