sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

CURTAS 85 - ANÁLISES (ultradireita na rede e correlatos)

 

Governo: o outro papel de Nikolas

         Como vimos nessa semana que se finda, Nikolas Ferreira postou um vídeo de mais de 5 minutos distorcendo totalmente a medida governamental de ampliar a fiscalização das transações financeiras informadas pelos bancos ao Pix. Algo que sempre aconteceu.
        Mas o objetivo deste artigo não é discutir o teor da fala do deputado da ultradireita no vídeo, nem a polêmica disso. É, sim, avaliar como a publicação – sabidamente enganosa e moralmente hipócrita e execrável – atingiu tanto o governo quanto o seio da classe trabalhadora.
        Efeito coletivo imediato – tão logo os jornalões, forte referência para a patuleia, anunciaram a inclusão do pix como movimento financeiro na lista da fiscalização a partir de R$ 5 mil, o vídeo de 6 minutos de Nikolas invadiu e viralizou nas redes sociais acessadas nos celulares.
        A viralização ocorreu no disparo em massa – a mesma estratégia que germinou e alimentou o antipetismo e elegeu Bolsonaro em 2018 e que quase impediu Lula em 2022. O vídeo chegou para a geral antes do anúncio oficial feito pelo governo federal sobre a ampliação da medida.
        Esse disparo atingiu fácil o Brasil profundo, parcela mais interior da população, mais crédula e acrítica, que usa o pix como meio gratuito. Houve forte temor de perda de dinheiro em suposta taxação na ferramenta. Esse sentimento tomou de assalto milhares de usuários populares.
        Uma inflação suspeita– segundo fontes, o vídeo de Nikolas teria alcançado até 280 milhões de visualizações em 48 horas – número superior ao da população total levantada pelo IBGE em 2022. Logo veio a suspeita de inflação algorítmica pelas big techs ou uso de perfis de falecidos por familiares.
        Enquanto os jornalões se centravam nos erros do governo após a distorção do tema no vídeo, mídias alternativas se atentaram na suspeita despertada por um número tão recorde. Não há dúvidas de que houve engajamento recorde do vídeo, mas a quantidade acima citada é suspeita.
        Reação lenta e recuo fiscal – impactado pela credulidade coletiva gerada pela mentira, o governo desistiu da fiscalização do pix. Sentindo-se vitorioso, Nikolas foi rapidinho à CNN Brasil e respondeu a uma pergunta com outra: “se eu menti, por que então o governo desistiu de taxar o pix?”.
        Talvez sem querer, Nikolas materializou a mais famosa propaganda ideológica de Hitler de que “uma mentira contada mil vezes vira verdade”. Pois pareceu mesmo ter “virado verdade” quando o governo decidiu revogar a extensão fiscal da Receita às movimentações do pix.
        A agilidade especialista na antiética de Nikolas contrastou com a lentidão aparente dos reflexos da esquipe de governo que, ciente do baixo alcance de suas publicações, pareceu anestesiado pelo sentimento de impotência. De todos, só duas mentes foram ágeis: as de Lula e Haddad.
        A volta por cima e Erika Hilton em cena – mesmo reconhecendo o mau planejamento comunicativo apesar de ter nomeado um comunicador, Lula mostrou que não tem sangue tão de barata. O presidente se manifestou nas mídias sobre as consequências negativas da divulgação massiva de mentiras.
        Na CNN Brasil para uma entrevista, o ministro da Fazenda Fernando Haddad não deixou barato. Reagiu com precisa assertividade às jogadas da âncora. Acusou os jornalões de não alertarem o povo sobre o vídeo e afirmou que “Bolsonaro está por trás” referindo-se ao marqueteiro de Bolsonaro em 2018, responsável pela postagem.
        Instituições ligadas à Justiça entraram na dança. Assim como a AGU, a PGR de Gonet e a PF de Andrei foram acionadas. Alguns nomes do Congresso se solidarizaram com o governo. Os deputados André Janones (governista) e Erika Hilton, e o senador Rodrigo Pacheco são exemplos.
        Com a mesma estética de Nikolas e visual chamativo, Erika postou um vídeo educativo que ganhou quase 100 milhões de vistas em 19/1. Janones protocolou uma CPI para incriminar o bolsonarista por crime contra a economia popular. Pacheco criticou colegas que “só fazem vídeo”.
        Chama a atenção o fato de protocolar uma CPI para julgar a possibilidade de cassar um parlamentar. Mas Janones tem sua razão. Afinal, Nikolas já cometeu indecoros mais do que o suficiente para ter sido cassado. E, junto ao manifesto de Lula 3 sobre o tema, tudo gerou efeito.
        Reação de Nikolas – a manifestação de Lula 3 sobre o tema coincidiu, nas redes, com a divulgação de matérias jornalísticas sobre o acionar das instituições judiciárias e as auxiliares à Justiça para investigar os envolvidos na publicação, disseminação e inflação do engajamento do vídeo de Nikolas.
        Segundo algumas fontes, Nikolas pareceu desesperado com a reação legalista do governo, das instituições e dos colegas. O engajamento do vídeo da deputada também impactou, como um antídoto ao veneno: no mesmo dia, a postagem dela ultrapassou 80 milhões de vistas, hoje são mais de 100 milhões.
        O engajamento alcançado por Erika revela o grande acerto da deputada. Como Nikolas, ela pode ter lido o teleprompt, mas isso não importa. O valor está no poder dialético de sua mensagem, que refletiu seu raciocínio veloz. Pelo combo de engajamento, estética e efeito da mensagem, ela recebe ameaça de morte e já acionou a PF para rastrear.
        A ameaça de morte desperta em alguns suspeita imediata sobre Nikolas. Mas a prova de seu protagonismo só virá em laudo da investigação em andamento. O fato é que, tendo ela recebido ameaça de morte, se consolida ainda mais a evidência de que a ultradireita é uma ideologia criminosa que deve ser combatida
        Para tanto, o governo federal tem que modificar sua estratégia. Nikolas é um exemplo da eficiência comunicativa da ultradireita. Nesse sentido, vale muito contratar pessoas capazes de viralizar em massa vídeos em linguagem popular. Já falei do bom André Janones. Agora é Erika Hilton. Imagine essa dobradinha!

Para saber mais
- https://www.youtube.com/watch?v=4fwGAHW4gm4. (TV Forum, um dos cortes da entrevista com André Janones)
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Ideologia na rede e no pix: desafio educativo

        Em 2023, o então ministro da justiça Flávio Dino se reuniu com representantes das grandes plataformas. A reunião na época se deu sob uma tensão crescente de famílias e comunidades escolares em relação a uma febre de ataques perpetrados por estudantes em escolas em vários Estados.
        A resposta parece ter surtido efeito após a reunião: aquela febre de ataques foi parando aos poucos. Mas não cessou totalmente. Hoje eles são quase isolados. Isso se deve à dura ação do STF (Alexandre de Moraes) de mandar suspender os perfis disseminadores de ódio nas redes.
        Agora, após a justiça impedir o influenciador Monark de ter redes sociais por defender um partido nazista, os CEOs Elon Musk (X), Mark Zuckerberg (Meta) e o advogado e jornalista Glenn Greenwald se manifestaram contra a tal “censura do judiciário”, gritada pelos bolsonaristas
        Sabemos que só há uma frenagem contra “mentiras que colam”. A tal “taxação de Pix até R$5 mil” surgiu para atacar o governo, mas gera medo desnecessário aos incautos. As 100 milhões de visualizações (quantidade mais realista) no vídeo criminoso de Nikolas Ferreira revelam a extensão desse temor.
        Vale lembrar que quem realmente quis taxar o pix foi o ministro bolsonarista Paulo Guedes, impondo alíquota entre 0,2 e 0,5% sobre o valor movimentado, sem especificação de limite mínimo. E foi o mesmo Guedes o responsável pela taxa de valor fixo sobre a TED (transferência eletrônica direta) em R$ 10,45.
        Assim como a TED, o pix é instantâneo e prático, com a principal vantagem de ser livre de taxação e mais simples. Ele foi usado na transação sem transparência das emendas no Congresso, bloqueadas pelo STF. Isso propiciou a nova medida que amplia a fiscalização pela Receita ao pix, de R$ 5 mil para cima.
        A publicação enganosa de Nikolas tem que ser considerada estratégia de golpe, tal como a intentona de 8/1 e a forja de incêndios pelo país em 2024, pela intenção de inviabilizar o governo frente ao povo e aos jornalões. Muito parecida com a conjuntura que decorreu no golpe de 2016.
        Daí a sua urgente tipificação penal com tal, com pena endurecida. Mas, para a sua efetividade, toda seletividade deve ser evitada para punir os autores. E, para combater os excessos no futuro, duas instituições delicadas e poderosas entram como partícipes: a escola e a família.
        Se a família já educa moralmente, a escola educa pela informação extensível às famílias em reuniões extraclasse, em linguagem acessível e tom assertivo para desmentir as falácias. Mas... mesmo que demande um longo prazo para os primeiros resultados, essa educação é imprescindível e urgente. O que, claro, tem um desafio imenso.
        A escola ainda não tem tradição de educação política – mesmo sendo a própria educação um ato político. E, com o beneplácito de organizações com muito dinheiro, pessoas e grupos extremistas invadem escolas e seduzem docentes e administradores, o que implica em preparo dos futuros docentes na sua formação.
        Todavia, diante do impacto dos fatos recentes e a crescente munição online profissional dos extremistas, não há mais como adiar a implantação da educação política. A plataforma Brasil Paralelo já age em escolas periféricas visando desinformar os alunos. Não há outro meio mais eficiente para mitigar a desinformação.
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Ultradireita contra a educação popular

         Enquanto jornalistas se acotovelavam para pegar o melhor ângulo da cerimônia de posse de Trump, a mesma turminha parlamentar bolsonarista foi lá babar ovo do cara, torrando nosso suado dinheiro. Participaram de uma festa, mas foram ignorados pelo presidente.
        Agora, enquanto ainda estamos discutindo o gesto nazista de Musk – que mais revelou a face autoritária estadunidense do que outra coisa – surgiu uma estranha novidade: a verba de R$ 6,5 bilhões do Programa Pé-de-Meia estudantil foi bloqueada pelo TCU do ministro Augusto Nardes.
        Programa pé-de-meia – é uma iniciativa do governo federal para auferir ajuda de custo de R% 200 por 10 meses a estudantes da faixa etária de 14-17 anos de famílias de baixa renda, de escolas públicas e cadastrados no CadÚnico. Para serem contemplados, eles devem ter frequência escolar mínima de 80%.
        O objetivo do programa é combater a evasão escolar desencadeada por motivos como desistência própria ou trabalho para ajudar a família. Problema crônico ainda muito comum no Brasil e outros países emergentes, a evasão se torna irreversível quando o motivo é a necessidade de trabalho.
        Desse modo, o programa age como um tampão parcial no atual status de desigualdade socioeducativa, aprofundado entre 2017-22 por cortes de verbas nos setores sociais. A primeira parcela seria paga agora em janeiro, e o citado bloqueio pode impactar fortemente as expectativas dos contemplados.
        Motivação oficial – segundo o TCU, o Fundo de Garantia de Operações de Crédito Educativo (Fgeduc) não pode bancar o programa. Pela lei aprovada, a verba deve vir do próprio Orçamento, sem repasse de terceiros. Na Lei Orçamentária deveria ser referida uma fonte específica da verba.
        Faz sentido, pois se trata de dinheiro do Tesouro público. Mas, dado que a votação da LOA só correrá após o recesso, o governo pareceu querer dar um jeitinho para não prejudicar os estudantes. E também, para cumprir o acordo com servidores públicos federais, com retroativo devido ao atraso.
        Outra motivação – mas cabe ressaltar outro motivo para o bloqueio: Augusto Nardes. Ele foi ministro da AGU no governo anterior, e deixou rastros de sua favorabilidade ao plano de golpe de Estado arquitetado pelo elemento então presidente e seus apaniguados militares.
        Data vênia, por que Lula não nomeou alguém na AGU? Porque, assim como no Banco Central e na PGR, o cargo máximo tem duração mínima definida. O presidente da República indica o nome, mas este, aprovado no Senado, só toma posse após o prazo mínimo cumprido pelo antecessor.
        Dado tudo isso, nos cabe esperar para ver o resolver do imbróglio. Se o Congresso aprovar a LOA, será que Nardes autorizará liberação da verba? Como a ultradireita põe a ideologia anarcocapitalista à frente, nos resta ficar de olho em Nardes. Que ele não crie motivo para mais fake news golpista.

Para saber mais
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