Pacote fiscal: uma bronca
aos críticos
Como soubemos publicamente,
o pacote Haddad teve o teor socializante na tributação relacionada ao poder de
renda (os do topo. Mas também prevê valorização menor do salário mínimo (sm) e
dos benefícios sociais a ele vinculados.
Por pegar também na base da
pirâmide, o pacote Haddad sofreu fortes críticas da maior parte dos grupos de
esquerda. Não sem razão, claro. Até porque essa frenagem foi facilmente
aprovada pelo Congresso, com uma tesourada a mais.
A crítica residiu principalmente
na restrição de requisitos para obtenção do direito ao benefício de
prestação continuada (BPC). Ela foi explorada por parlamentares
bolsonaristas para desinformar o povo sobre a real intenção do governo.
Foi um sacrifício convencer
os desinformados da realidade. Na prática, a intenção era restringir o direito
ao BPC a pessoas com 25% do SM ou menos, e portadores de deficiências ou
necessidades especiais de fato incapacitantes para o trabalho.
Somando-se todas as deficiências
e necessidades especiais na população geral, se estima que até 36 milhões tenham
algo. E destes, 18,6 milhões (8,9% da população geral) são, de fato, incapazes de
trabalhar necessitando, assim, do BPC.
Portanto, a parcela com deficiências
e/ou necessidades especiais leves têm capacidade para ocupar cargos compatíveis
com a sua condição individual. As cotas de concursos públicos e vestibulares preveem
essa compatibilidade.
A afirmação acima não é uma
ideologia capacitista, nem identitária. Se a educação e, principalmente
trabalho já preveem, por lei, meios inclusivos, vale frisar que a mesma afirmação
é, na verdade, uma injeção de autoconfiança aos portadores.
Isso não invalida de todo a
crítica da patuleia esquerdista à menor valorização dos ganhos no andar de
baixo. Mas vale a bronca por não criticarem duramente o Congresso de ter deixado
os super ricos incólumes à benemérita tributação.
Quando Lula foi declarado
eleito pelo TSE, a margem apertada fez muitos pensarem que a vitória só foi possível
graças à lábia da Frente Ampla. Com certa razão, pois Bolsonaro só ficou no
governo pagando muito caro ao Congresso de forma ilícita.
Por isso, Lula teve que maximizar
o esforço de refinar a sua velha sagacidade política para obter o apoio da ampla
rede partidária da Frente Ampla, com o fim de derrotar Bolsonaro. Entre a lábia
e o dinheiro, a competição foi acirrada.
Antes de tomar posse, Lula
teve que governar por fora, na PEC da transição, pela qual conseguiu recursos
para recuperar o país do desastre. E desde já, ele recebeu olhares hostis, que
se rebelariam de verdade após a posse.
Seu ministério foi como a
propaganda do desodorante Rexona: sempre cabe mais um. Pela frente ampla, Lula
distribuiu alguns ministérios ao conjunto partidário do Centrão, e nomeou um
aliado de Arthur Lira para tomar frente na Caixa.
Acontece que isso não
diminuiu a hostilidade do Congresso, por sua composição de centrão e
extremistas à direita nas bancadas da bala, da bíblia e do boi, todas
controladas também por uma força maior e unida: o mercado.
Para se manter, o governo
teve que ceder em muita coisa: não conseguiu a desejada justiça tributária na
PEC da reforma nem no novo pacote; viu a pirotecnia agrobolsonarista durante a
seca; e enfrenta um problema especulativo de juros e dólar altos, de difícil controle.
Mesmo assim, houve algumas
vitórias, mesmo amargas, para cumprir muitas das promessas de campanha. E agora,
a restrição de emendas, determinada pelo STf, pode ser mais um desafio imposto pelo Congresso contra a sua governabilidade frente às adversidades.
Enquanto há rumor de Lira
ministro da saúde em 2025, Lula 3 avalia como agirá a partir de janeiro. Mas é
certo que, com “tesão de jovem de 18 anos”, ele conclua o governo com chance de
tentar se reeleger. E a guerra mercadológica certamente continuará.
Embora se espalhe em todo o
território nacional, a saúde federal operada por servidores diretamente vinculados
ao Ministério da Saúde (MS) tem, ao menos, 70% de sua concentração de instituições
e trabalhadores na cidade do Rio de Janeiro.
Herança dos tempos de
capital federal, essa concentração tem 6 hospitais federais (HFs) de
controle pelo DGH (Departamento de Gestão Hospitalar), e 3 institutos
nacionais (INs) de serviço hospitalar e suporte de ensino e ciência e
tecnologia.
Iniciada há mais de 70 anos,
essa rede é operada principalmente por trabalhadores efetivos do Ministério da
Saúde (RJU-MS), que paulatinamente perdem espaço para os temporários da União
(CTUs) por falta de concursos públicos.
Até aí temos aguentado. Mas
a coisa piorou desde 2023, quando o MS declarou “impossibilidade” de continuar
gerindo toda a rede no RJ, durante uma negociação. E desde então, os servidores
vivem uma guerra hercúlea com Brasília.
O motivo da guerra é o fatiamento:
a Ebserh (que controla os HUs) pegou um HF; o município, dois outros HFs até o
momento; e o até então obscuro Grupo Hospitalar Conceição (GHC) pegou outro.
Dois HFs ainda estão sem futuro definido.
Tudo isso acima é repetido,
para informar os que ainda estão por fora dos acontecimentos, sem ciência das
consequências de todo esse processo – que já se concretizam, por trás da promessa
de um SUS mais amplo e completo.
Desde que tomou controle
dos HUs, a Ebserh acabou com a reabilitação cardíaca no HUAP da UFF-Niterói; e na
última semana de 2024, o GHC simplesmente “matou” a referência nacional em Nefrologia
no HF de Bonsucesso, no Rio.
Mais um passo, para que o
SUS seja fragmentado até a completa dissolução de seu princípio maior: o de ser
para todos. Triste será ver nos jornais futuros: “O lucro bilionário do SUS
(leia-se empresas) é o resultado de um acerto do governo”.
Quando Lula disse, ainda
preso na PF em Curitiba, que “não abre mão da dignidade para ter liberdade”,
Lula oportunizou uma observação interessante sobre as possibilidades de haver dignidade
na política.
Isso porque a política se tornou
mais do que uma ciência da diplomacia em nome da ordem nacional a partir da
governança. Ela se revela um termômetro onde os princípios éticos são
constantemente testados na guerra dos discursos.
A política é mais do que um
octógono do MBA. É um campo minado onde impera a guerra ideológica – na qual o
mercado marca presença quase constante – em que diferentes figuras se notabilizam
em matéria de dignidade, ideológica ou ética.
Guilherme Boulos: fez boas observações nos Conselhos de Ética da
Câmara. Graças às suas análises, André Janones foi absolvido da acusação de
rachadinha, e o risco de cassação de Glauber Braga foi enfraquecido ao expor a
tática do MBL.
Glauber Braga: presidente da Comissão de Gestão participativa, não
se intimidou com o poder de Arthur Lira ao expor acusações sobre este. Enfrenta
processo no Conselho de Ética por ter expulsado um cara do MBL e expor a aliança
do movimento com o neonazismo.
Alexandre de Moraes: num dos cargos mais desafiadores, mostrou-se pleno
legalista contra os abusos golpistas do ex-presidente Bolsonaro, e como relator
do inquérito da intentona de 8/1/23, com numerosas condenações. E preside inquérito dos cabeças do golpe.
Flávio Dino: após dar um banho nos bolsonaristas em 2023, com
tiradas de simpático cinismo, ele se tornou o terror da turma de Lira ao reter
R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão de transação ilícita, das quais liberou
R$ 370 milhões para manter o piso da saúde pública.
Esses foram os campeões de
dignidade em 2024 em relação à condução política – mesmo que, para tantos casos tenha sido necessária a intervenção da justiça.
O que esperar em 2025
Enquanto milhões de pessoas
se aglomeram nos principais pontos de referência para assistir ao colorido
espocar de fogos e música pelo Brasil afora, aqui em Juiz de Fora, MG, a virada
é ribombada por um raio. E em Brasília? Não sei, não assisti à TV.
Mas imagino como deve ter
sido. Para os moradores da capital brasileira, um breve momento de descanso
decorre após tanto movimento no ano que mal acabou de morrer. E, pasmem, muitos
fatos ainda continuarão em 2025. Exemplos a seguir:
No STF, Dino reterá as
emendas restantes até que seja elucidada a sua transação; e Xandão continuará
relator dos inquéritos das fake news (iniciado na era Bolsonaro) e da intentona
de 8/1/23, acrescida com o plano de matar Lula, Alckmin e ele próprio.
Na Câmara, Glauber Braga
ainda aguarda a continuidade do julgamento, pelo Conselho de Ética, do processo
relativo à guerra ideológica implantada pelo MBL, e por estar à frente da
Comissão de Legislação Participativa, que visa a participação social.
A decadência de Bolsonaro gerará
rebuliço no PL, compossível evasão de alguns nomes para partidos do Centrão ou mudança
de apoio para o próprio Lula. É uma indicação de que o extremismo de Bolsonaro não
faz mais sentido de manter.
Pensando em seu futuro, a
esquerda se divide entre pauta identitária e políticas sociais. Ante um
eleitorado conservador, o pragmatismo das políticas públicas deve ser posto em
1º plano, deixando o identitarismo como consequência natural.
Torçamos para que
dispositivos como a PL da Anistia e os retrocessos nos direitos fundamentais
tenham como destino a poeira da gaveta do arquivo. A primeira envergonhará a
República, e as demais são socialmente inviáveis.
Espero que haja consciência
de se ter mais escolas e hospitais do que templos religiosos arrecadatórios. E que
o SUS permaneça na Adm Pública regido por servidores estáveis, e não caia mais na
rede empresarial de direito privado.
Que o sol da mudança
climática rache as cabeças dos poderosos para tomar ciência de maximizar a
mitigação da destruição ambiental, para preservar as áreas socioambientais remanescentes
e a capacidade produtiva do próprio agro e da indústria!
Não quero muito. O que
escrevi acima não é milagre. É o suficiente que possamos todos fazer para um futuro
melhor. Quem torna melhor o mundo não é o novo ano, e sim a nossa sabedoria e humildade
de fazê-lo.
------
Nenhum comentário:
Postar um comentário