PERIGO! ULTRADIREITA NO SENADO
Já sabemos que a
ultradireita bolsonarista ocupa um espaço bastante significativo no Congresso,
ofuscando a centro-esquerda governista e a esquerda que por vezes aprova
projetos do Executivo. Isso porque vários nomes das bancadas temáticas BBB¹ são
bolsonaristas.
Essa imensa oposição ao
governo Lula 3 é mais pronunciada na Câmara dos Deputados, que tem bem mais
gente por ser classificada como casa do povo pela Carta Magna, enquanto que o
Senado representa os Estados (cada Estado elege três senadores para mandatos de
8 anos).
Mas, diante da iminente
condenação de Jair Bolsonaro à prisão e da possível apreensão dos passaportes
de Eduardo Bolsonaro e Marcos do Val pela Justiça, a ala bolsonarista assume
publicamente sem ponderação sobre seus crimes, de dominar o Senado como já tenta
na Câmara.
Como que numa tradição, a
relação entre o governo federal e a Câmara sempre foi mais difícil. Talvez seja
a oposição mais numerosa e, por isso, mais agressiva em chance. O Senado tem
sido menos difícil, talvez por lideranças mais ponderadas. Mas agora a coisa
pode mudar.
Isso, se Davi Alcolumbre,
que retorna à presidência do Senado após dois mandatos de Rodrigo Pacheco, se
deixar levar. Legítimo Centrão, Alcolumbre, do União Brasil, se relaciona bem
com governos federais ideologicamente díspares – desde que bem remunerado,
claro.
Mas agora reina um novo
clima. Devido ao rigor com que o STF mantém retidas as emendas de origem
irregular e sem transparência, os bolsonaristas e o Centrão se aliançam num só
objetivo: criar medidas que inibem a “interferência autoritária” do STF na questão
das emendas.
Há outro perigo. É a turba
bolsonarista querer, a todo custo, se tornar maioria no Senado para deter o
poder depositado hoje no Centrão. O ataque ao poder de polícia constitucional
do STF com impeachment de ministros se acompanha do desmonte final do governo
Lula 3 para a retomada da ultradireita no poder.
Nota: ¹ BBB-bala, bíblia e boi
Para saber mais
O empresário Romeu Zema (já
abordado aqui) foi eleito governador de MG pela 1ª vez, aproveitando a modinha do
bolsonarismo tão em voga. Mesmo tendo contribuído com o Nordeste para o retorno
de Lula, a maioria dos mineiros reelegeu “inexplicavelmente” o bolsonarista.
Sim, “inexplicável” – entre
aspas mesmo. A contradição ideológica aí é só um detalhe. O principal pormenor
midiático foi o aprove de contas pela ALMG. Sendo Zema queridinho dos jornalões
de massa por sua política privatizante, seus outros feitos foram cuidadosamente
segredados.
Malfeitos em 2019-22 –
Zema triplicou salários: seu e de seus próximos. Desviou parte dos recursos
federais para rodovias estaduais na estrada de acesso ao sítio Zema; foi
denunciado, mas MP-MG arquivou. Trocou 11 vezes a chefia de fiscalização
ambiental para facilitar a mineração em áreas proibidas.
Entregou à ALMG projetos de
privatização da Cemig (energia), Copasa (saneamento) e no fim, o da nevrálgica
Federação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig). Entregou a gestão das APAs
estaduais à iniciativa privada. E criou persecução política a servidores críticos
ao seu governo.
Malfeitos atuais –
novamente triplicou os salários. Enquanto seguem análises dos projetos
privatistas pela ALMG (por compra de votos), a proposta de federalização da
Cemig por Lula para pagar a dívida estadual de R$ 160 bi (80 bi só no governo
Zema) segue sem resposta de MG.
Em 2023, Zema encerrou a
instituição que qualificava empregados públicos ativos e aprovados em concurso
da Cemig. Deseducado, saiu “à francesa” da reunião de governadores com Lula em
Brasília, e continua ruim de conversa. E ainda insiste em alterar a Constituição mineira para retirar a
consulta popular.
Em 2025, os projetos de
privatização – incluso o da Fhemig – avançam na ALMG gerando apreensão nos
servidores e empregados públicos e nova onda de críticas. E, sem qualquer
consulta pública, Zema vende as hidrelétricas da Cemig, em método de venda
fracionada de ativos da empresa.
Fria análise –
na verdade, nada disso surpreende. Como muitos empresários, Zema enxerga o
Estado como uma empresa diferenciada a ser gerida como meio privado. Mas os
empresários sabem que, embora lucrativas, as empresas estatais contribuem
gerando divisas para o erário público.
Privatizar Cemig não é
novidade. Os tucanos Eduardo Azeredo, Aécio Neves e Antônio Anastasia quiseram
vende-la, mas a pressão popular os impediu. Só que Zema vai além deles,
lançando a Fhemig e tendo a maior parte da ALMG relativamente refém dele. Tanto
que a proposta avança na Casa.
Parte dos servidores da
saúde federal do RJ poderia imaginar Zema a imitar a empreitada de Lula 3 com
entrega de três dos hospitais federais a empresas públicas. Mas é diferente:
ele quer vender tudo para a iniciativa privada, o que é bem pior. Aí depende de
os mineiros saberem e partirem em massa contra.
Para saber mais
Nos anos 1990,
parlamentares da bancada da bíblia – composta principalmente de
lideranças evangélicas neopentecostais – tomou corpo no Congresso. Mas foi a
partir do século XXI que ela cresceu exponencialmente, chegando aos 300
deputados e senadores entre 2014-22.
A bancada é conhecida por
suas pautas naturalmente ultraconservadoras na complexa seara dos costumes. Ao
trazer, ainda na primeira era Dilma, as pautas moralistas de costumes do MBL e
o armamentismo de Bolsonaro, a ultradireita capturou a maior parte da
bancada bíblica.
A influência das lideranças
bolsonaristas sobre as igrejas bastou para que a maior parte do povo fiel fosse
cair na lábia. Observamos, então, maior nível de intolerância a minorias
religiosas, étnicas e sexuais, mais proselitismo, fanatismo e violência – a aliança
neoevangélica¹-bolsonarista.
A aliança
neoevangélica-bolsonarista fez desenvolver uma bizarra ligação desse
cristianismo com Israel (vide Complexo de Israel liderado por um
pastor-traficante, mesmo que judeus sejam descrentes em Jesus como Messias), e
a visão de Jair Bolsonaro como um enviado divino.
Não surpreende: mesmo no
Brasil laico, a religião tem laço com a política, laço tornado nó na citada
aliança. Nesse raciocínio, o deputado pastor Henrique Vieira (Psol-RJ) concedeu
entrevista ao podcast Brasil de Fato para responder: é possível humanizar a
população evangélica atual?
Em sua resposta, Henrique
ressaltou um ponto importante: “os evangélicos não são apenas religiosos, eles
são pessoas humanas, com suas singularidades”. Nesse raciocínio,
ele explica que a bolsonarização transformou a religião num “dispositivo de ódio”,
propondo ser necessária a campanha de humanização.
Essa campanha leva a rememorar
a política de desnazificação em massa do povo alemão no pós-II guerra juntando-se
massivamente reeducação, Tribunal de Nuremberg e a criminalização legal do
nazismo. Há grupos neonazistas, mas a Alemanha de hoje não é como a Alemanha daquele
tempo obscuro.
É quase certo que Henrique
Vieira tenha se baseado no caso alemão para propor a humanização desses
evangélicos Mas, num país sem tradição em educação cidadã, esse projeto hoje
pode ser inócuo, se não investir também contra o ódio online nem responsabilizar
judicialmente os líderes cristãos.
Nota: ¹neologismo para definir o evangelismo bolsonarizado.
Para saber mais
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