domingo, 1 de junho de 2025

CURTAS 90 - ANÁLISES (Milicos réus, Marina Silva)

 

MARINA HUMILHOU O SENADO

                A Nova República é considerada na historiografia atual como importante marco histórico. E, em contextos mais específicos, a ultradireita do MBL e do bolsonarismo também entra personificada em numerosos nomes, que mais se esmeram na arte das propostas sem fundamento e em ofensas pessoais.
                As instituições dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – possuem seus canais respectivos de TV: Secom, TV Câmara/Senado e TV Justiça. A TV Senado transmitiu, em 27-5, a audiência da Comissão de Infraestrutura, com depoimentos da ministra do meio Ambiente e Mudanças Climáticas Marina Silva.
                Um vergonhoso climão marcou a audiência de mais de 3 horas, acompanhada por diversas mídias, as quais criaram cortes focalizando o fato que vitimou a ministra com desligamento de microfone e dedos em riste durante a sua fala muito interpelada. E, quem diria, quem iniciou a verborreia agressiva foi um governista.
                Show de horror – segundo cortes de vídeos de várias mídias, Omar Aziz iniciou enaltecendo, em tom agressivo, que é “uma pessoa ética”. Seguiu que a BR 319, aberta e abandonada nos anos 1970 para ligar Porto Velho a Manaus segue parada, e que “morreram 15 mil por Covid por causa dela”, culpando a política ambiental atual.
                Mesmo interpelada pelo presidente da Comissão, o bolsonarista Marcos Rogério, Marina respondeu que a inconclusão da estrada é antiga e que, após tantos anos e a paralisia por Bolsonaro, agora ela passa por análise técnica, uma vez que ela atravessa mais de 100 áreas públicas preservadas (47 parques nacionais e 69 terras indígenas).
                Omar ainda reforçou que ela “nunca sentou para dialogar com empresários e com o agro”. Marina discordou, interpelada. Em seguida, os vídeos mostram Marcos Rogério desligando várias vezes o microfone de Marina sempre que ela falava e a interrompendo. Em, enfim, ele desaforou: “ministra, se ponha no seu lugar”.
                A fala desaforada causou tumulto no plenário, em que se ouviu a crítica da senadora Eliziane Gama, também governista, que o criticou. Marcos se voltou para interpela-la, enquanto a ministra, ao seu lado, lhe apontava o dedo respondendo: “meu lugar é no ministério do meio ambiente, e não sou mulher submissa!”.
                Novo corte de edição focalizou, dessa vez, o senador tucano amazonense Plínio Valério, que reforçou Aziz ao dizer que “as pessoas querem passear na 319” e, depois “eu respeito a mulher, mas não respeito a ministra”. Marina rebateu mesmo interpelada: “o senhor está falando com as duas [...] e deve pedir desculpas. Se não pedir, eu saio”.
                E foi o que ela fez, após ouvir de Valério que não pediria desculpas pelas falas, inclusive a anterior, na CPI das ONGs, referindo-se a "enforcar Marina" após ouvi-la por mais de 6 horas.
                Fria análise – as falas foram machistas? Segundo uma ou outra fonte noticiosa, “não”. Mas o teor das frases de Marcos Rogério e Plínio é claro. Mas cabe aqui uma visão cria. Os bolsonaristas são machistas e sexistas por necessidade de autoafirmação. Já Omar Aziz não foi machista, e sim agressivo, e antiético ao distorcer papeis sobre a BR-319.
                E mais: ele teve conduta infantil ao rebelar agressivamente que “a PL (2159/2021) vai passar, sim, e o STF não vai impedir, e vamos mudar a Constituição!”. O STF vai impedir, sim, se necessário, dado que o colega Fabiano Contarato apontou inconstitucionalidade em muitos artigos da proposta. E vale citar mais sobre Aziz.
                Aziz tem influência no setor de agronegócio no Amazonas. Ajudou a colpasar a CPI da C19 ao presidi-la, ao absolver Pazuello no MS com 400 mil mortes em curso, das quais 15 mil em Manaus por falta do oxigênio, porque a logística do ex-ministro “deu erro de cálculo”. O problema só foi resolvido por intervenção de Nicolás Maduro
                Não bastando não mais admitir a má gestão do MS na época como causa daquelas mortes, Aziz ainda elogiou Airton Soligo, vulgo Cascavel, que atuou como testa de ferro de Pazu no MS e foi estuprador da própria neta. A alcunha já nos sugere o currículo do sujeito. Portanto, ele tornou piada o indiciamento de Bolsonaro na CPI.
                Valério – segundo a investigativa De Olho nos Ruralistas, ele tem uma propriedade ilegal tipo chalé construída em área preservada pública, constada no site Airbnb com diárias de quase R$ 1500. Ele presidiu a fracassada CPI das ONGs posicionando-se contra a saída de fazendeiros da homologada, mas já degradada terra indígena Apitewera, por ordem judicial.
                Sua família tem influência na cidade natal de Eirunepé, às margens do Juruá. E sua influência se estende a canais de TV, como a afiliada local do SBT. Um dos irmãos de Valério, que chegou a fazer carreira política na cidade, hoje é um dos sócios na empresa, e está envolvido no escândalo que faliu o Banco PanAmericano.
                Sobre esse distinto senador destaco que, da minha parte, a recíproca seria verdadeira, e mais ainda: não só o parlamentar, mas também o homem não merece respeito. E se sua mulher o expulsaria de casa caso pedisse as desculpas a Marina, então ela vendeu a sua própria dignidade como mulher.
                Marcos Rogério – sobre ele não há muito o que se falar. Formado em jornalismo e Direito, com voz grave e forte, o rondoniano de Ji-Paraná foi radialista antes da carreira política, em que foi vereador e deputado estadual e federal. Sua eleição ao senado em 2018, na esteira da ultradireita bolsonarista explica, em parte, a sua conduta com a ministra.
                A outra parte a explicar o teor sexista e machista de suas falas – que distorcem o papel da bancada feminina do senado quanto ao climão – é ele fazer parte dos Legendários, um grupo fundamentalista cristão que prega a autossuperação dos limites desafiando a natureza em exercícios de força, para alcançar uma virilidade alfa irreal.
                O que mais importa nesse acontecido é que os maiores desequilibrados mesmo são os homens – e os bolsonaristas se desesperam com a chance de a PF bater em suas portas numa manhã qualquer, pois as investigações da intentona golpista não terminaram nos grupos de comando e nos “bagrinhos” condenados por 5 crimes relacionados.
                Desconhecemos indícios de desvios administrativos de Marcos, só o seu narcisismo de macheza impossível traduzido em misoginia. E a crítica se estende a governistas como Jaques Wagner, que soltou um risinho ridículo (não mostrado) e nem entrou no coro dos manifestos tardios da bancada feminina e dos demais em defesa de Marina.
                Embora não saibamos de nenhum indício, tento imaginar se, como legendário, por vezes o senador não entre em conflito íntimo relativo a esse processo da intentona. E não fiquemos só nos agressores: o governista Jaques Wagner fez um risinho, e os demais senadores foram tardios em suas manifestações em defesa da ministra.
                Além de baixo e decrépito, o show de ataques à ministra revela uma turma totalmente desequilibrada em nome do capital que deprecia o ambiente conservado, mas dele depende para seguir. E revela os agressores como incapazes: eles não são um décimo de Marina. A grandeza de Marina humilhou a pequenez dos senadores.
Para saber mais
- https://www.bbc.com/portuguese/articles/ceqg02g3z8po. (o que motivou ofensas a Marina Silva)
- https://www.youtube.com/watch?v=j7gxZ6ST5z4 (Folha Democrata – sobre a realidade da hostilidade de Aziz a Marina Silva)
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MILICOS RÉUS, NOVA HISTÓRIA

                Se existe uma classe social merecedora de privilégios específicos desde os primórdios civilizatórios, essa é a classe militar. Suas funções sempre foram, basicamente, defesa e segurança das nações. Nações vieram e se foram séculos depois, mas sobreviveram em seus tempos históricos graças aos militares.
                Daí entendermos por que nomes destacados da nossa história receberam condecorações militares por bravura ou outras correlatas. Como Borba Gato, famoso por ter escravizado centenas de indígenas raptados em busca de minerais preciosos; Domingos Jorge Velho, que desmantelou Palmares matando Zumbi e retomando escravos refugiados; Duque de Caxias, o dito patrono das Forças Armadas.
                Entendemos o papel das nossas Forças Armadas me seu papel constitucional de garantir a defesa e segurança do território nacional contra inimigos externos, mas sem o poder moderador tão desejado e tentado, traduzido em regimes autoritários na história da República brasileira – e de forma ilícita no governo civil de Bolsonaro (2019-22), culminado na intentona do 8/1.
                A volta de Lula 3 significou o retorno à liberdade funcional das instituições investigativas. Assim, a PF levantou o inquérito da intentona golpista que culminou com barbárie em 8/1/23, com centenas de “bagrinhos” verde-amarelos condenados. E levanta, agora, nova fase da operação Contragolpe que fez o STF tornar réus os núcleos golpistas repletos de importantes militares.
                É uma revelação assaz importante, que chama a atenção desde que o general Braga Neto foi tornado inelegível em 2023, logo depois do ex-milico e ex-presidente Jair Bolsonaro. E está preso há um bom tempo, com pedidos de soltura já negados. Após os 6 militares tornados réus no julgamento do primeiro grupo comandante, agora são dezenas deles de 3 núcleos.
                Significado histórico – apesar de suas prerrogativas nacionais previstas em lei, os militares traçam um mundo de perfil fechado, de ensimesmados. Tradicionalmente, o Supremo Tribunal Militar (STM) pune atitudes de natureza disciplinar, nos quais os alvos majoritários costumam ser soldados rasos ou de patentes oficiais mais baixas, como cabos e sargentos.
                É claro que crimes de outra natureza, como os políticos, podem ser cabíveis de punição. Desde a redemocratização, passou a valer um código segundo o qual os militares na ativa não podem se manifestar na política. Para tanto, devem ser postos na reserva ou abandonar a carreira militar. Mas a tradição militarista tem passado panos quentes, pois não são democratas.
                Portanto, a participação inequívoca de milicos de alta patente no comando da intentona golpista, conforme as investigações da operação Contragolpe da PF, se revela uma guinada interessante na história da República brasileira. É a primeira vez na nossa história que a população pode ver militares sendo tornados réus por crimes de natureza política.
                E o ponto mais alto desse momento interessante é que essa guinada institucional acontece justamente num governo cujo presidente da República é um histórico inimigo da ditadura militar. Tal inimizade não faria mais sentido, se não fosse a cultura tipicamente fascista e antidemocrática na formação militar, e o caráter conciliador de Lula 3, um governo de frente ampla. Bem...azar o deles!
                E – em paralelo – nosso também, pois ninguém pensa que o militarismo é o que precisa ser combatido para que tanto a patuleia quanto as Forças Armadas possam aprender que é possível viver em harmonia entre as diferenças numa nação democrática.
Para saber mais
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