sexta-feira, 25 de julho de 2025

ANÁLISE: Político não monetiza: questão de ética

 
          Iniciadas nos primeiros mensageiros instantâneos como ICQ e MSN Messenger e partindo na primeira plataforma de interface moderna de amizades em comunidades (Orkut), as redes sociais oportunizaram mais do que amizades sem fronteiras. Elas têm bolhas (comunidades) limitadas por algoritmos.

Algoritmo e monetização  
                Algoritmo é a direção de uma postagem para pessoas ou grupos específicos de posições afins.  Se a postagem aprovada pela plataforma tem um bom apoio financeiro, ela gera lucro ao influenciador, ou seja, é monetizada. Não são monetizadas postagens sem apoio financeiro suficiente.
                O influenciador é mais do que um simples divulgador ou analista de conteúdo digital de qualquer teor. No contexto capitalista, ele só é digno desse nome quando lucra com conteúdo direto de boa capilaridade entre os internautas – mesmo se for inverídico.  E inverdades é o que mais foi espalhada na internet nos últimos 8 anos.
                Já abordadas no blog por suas implicações nefastas, as inverdades representam apenas um detalhe, mas importante, de um problema muito maior, de profunda importância pública: a monetização de conteúdos por agentes públicos ativos. Sua legalidade – ou não – é assunto em trâmite no Congresso nesse momento.
                
Agentes públicos 
                Pessoas que ocupam qualquer cargo público definido em lei. São: servidores (estáveis ou temporários), de comissão  (temporário, nomeação política, por lei deve ser servidor), empregados públicos (de estatais de capital fechado ou misto), e políticos (eletivos, exercem profissão política nos poderes Executivo e Legislativo).
                Exceto os empregados públicos, (CLT), os demais têm outros vínculos trabalhistas. Recebem salários normalmente, mesmo em férias ou licença. Não é raro governantes nomearem comissionados vindos da iniciativa privada, o que faz muita gente se perguntar: é incompatível conjugar atividade privada e a pública?
                
Restrições
                Via de regra, os agentes públicos têm restrições específicas. Acúmulo de cargos é legal entre profissionais de saúde (duplo vínculo), desde que não coincidam dias e horários e não ultrapasse a soma de 60 horas semanais. Servidores públicos não podem ter negócio em seu nome, para evitar ganhos extras de qualquer natureza.
                Diferente dos servidores, muitos políticos são empresários. E, em linhas gerais, agentes públicos podem ser influenciadores? Ainda não há uma definição legal muito clara, mas vamos lá: muitos influenciadores têm na monetização de seus conteúdos como sua única fonte de renda e são pejotizados (com CNPJ) por exigência das plataformas.
                Os trabalhadores pejotizados são microempreendedores individuais (MEIs): têm negócio em seu nome, mesmo sendo trabalhadores.  E como lei geral agentes públicos não devem ter negócio em seu nome, a monetização de conteúdos – cuja massificação é parte do objetivo de lucro – merece toda a atenção. Daí tramitar uma nova PL no Congresso.
                
PL 1674/2022
                De Chico Alencar (Psol-RJ), o texto altera a Lei de Improbidade-2020, que coíbe o lucro de deputados por vídeos no Youtube. Na verdade, ele pretende preencher lacunas na lei vigente, ao propor vetar agentes públicos de obter vantagem financeira de qualquer natureza, tipificando a infração como improbidade administrativa. Tornou-se conhecida no jornalismo como PL anti-Nikolas.
                A alcunha se refere ao deputado federal mineiro Nikolas Ferreira, famoso por monetizar seus conteúdos em redes como Instagram, no qual tem conteúdo exclusivo para assinantes, no TikTok e no X. Foram descobertos também ganhos em seu negócio de mentoria Caixa Preta, para treinar futuros pretendentes à carreira política, com professores políticos bolsonaristas.
                Os "professores" em questão são: Cleitinho, Magno Malta, Eduardo Bolsonaro, André Fernandes, Ana Campagnolo, Coronel Zucco, e Bia Kicis, todos eles parlamentares bolsonaristas famosos por seus currículos de indecoros, mentiras e cristofascismo (se bem que Malta tem se encharcado mais do que pregado).
                No Youtube, outros políticos monetizadores, que tiveram reembolsos vetados foram Carla Zambelli, Joice Hasselmann, Bia Kicis, Otoni de Paula, e Flordelis, esta última cassada e folclorizada após ser condenada à prisão por ter matado o ex-marido. O único não bolsonarista também afetado foi o petista Paulo Pimenta.
                Vale citar nesse rol o colega bolsonarista Gustavo Gayer. Ele também tem lucrado com monetização nas redes. Além de conteúdo exclusivo para seus assinantes, ele possui loja virtual que vende o livro A mentalidade conservadora, do filósofo estadunidense Russel Kirk, a mais de R$ 150.
                Os exemplos acima revelam que, mesmo não totalmente proibida, a atividade liberal por agentes públicos é permissível a irregularidades. Por isso, o PL anti-Nikolas avançou com aprove pela Comissão de Administração e Serviço Público da Câmara. Mas, se avançar em comissões maiores, não sabemos.
                
E as postagens dos perfis oficiais?
                Em linhas gerais, hoje todos os políticos têm perfis nas redes sociais. É o marketing político atual. Mas não são monetizáveis, mesmo com milhares de seguidores. São perfis oficiais, criados por suas respectivas assessorias de comunicação, para divulgar seus respectivos feitos. Portanto, eles operam dentro da legalidade vigente.
                Mas os perfis oficiais dos políticos dentro da lei enfrentam um problema: baixo alcance entre a população internauta. Como somos influenciados pelo apelo visual ou audiovisual, o caleidoscópio chamativo de cores conjugado com o tom sensacionalista dos áudios fomenta a viralização massiva das postagens.  É aí que entram os perfis oficiosos, de natureza pessoal, mas para fins ideológicos. É neles que políticos lucram com monetização.

Fria análise
                 O novo texto elaborado por Chico Alencar é bem vindo nesse contexto de engavetamento da PL2630 da regulação das redes. Mas enfrentará barreira da oposição no Congresso. Não só pela autoria ser de esquerda, mas também pelo lobby político de Nikolas Ferreira e outros bolsonaristas junto às big techs no projeto de poder com inverdades. Falar que é inveja do alcance de Nikolas é fácil, mas sabemos que é uma questão de regulação.
                Além desse lucro compartilhado, o núcleo Lira-Motta no Congresso também guerreia contra o governo. O arquivamento da PL 2630 é só um detalhe. A dupla chefe do centrão tem amansado os bolsonaristas revogando os vetos de Lula 3 para proteger a elite econômica da justiça social tributária, incluindo aí aqueles por trás das gigantes big techs.
                Enquanto o STF julga a regulação das redes e a PL anti-Nikolas tramita a passos de tartaruga e esquecida pela grande mídia, duas lutas devem ocorrer: um abaixo-assinado pelo aprove da dita proposta, e o perfil oficial do governo lançar mão de conteúdos chamativos, com o presidente falando, no seu perfil oficial. Afinal, os bolsonaristas têm projeto de poder para 2026. E o templo passa rápido até as eleições.
Nota: [1] exceto em alguns casos, como licença para concorrer à profissão política.
Para saber mais
- Intercept Brasil - Lei anti-Nikolas é aprovada em comissão após reportagem do Intercept e pode vetar deputados-influencers. (newsletter por e-mail).
- Meteoro Brasilo que é o projeto de lei anti-Nikolas, aprovado em comissão no Senado. https://www.youtube.com/watch?v=FytmegSQ5Ag
- https://nikolasferreira.com/caixa-preta/ (treino para ser político)
----


Bônus - O DESESPERO DE UM INFLUENCER

                Como todo mundo já sabe de sobejo, o deputado federal Nikolas Ferreira teve o seu recorde de votos - em torno de 1,5 milhão - graças à sua influência nas redes sociais. Ele conseguiu esse número graças ao engajamento da galera mais jovem, entre os 16 e 20 anos de idade, nas redes sociais, o seu grande refúgio e seu meio primário antes da eleição.
                Enquanto festejava nas redes a sua vitória eleitoral, ele assistiu a derrota do candidato a presidente com quem sempre se identificou: Jair Bolsonaro. E, em 2023, antes da posse da nova legislatura em fevereiro, ele amargou ao ver a cena de Lula subir a rampa com um grupo de representantes de parte da diversidade social.
                Como Nikolas já demonstrou tantas vezes, não podemos de forma alguma subestimá-lo. A começar pela sua eficiência comunicativa e por ter influência financeira através da comunicação online. Mesmo o apelidando como Chupetinha, o adversário André Janones já advertiu o governo e o STF sobre o real perigo que ele carrega.
                Desespero- mas,  o avançar dos novos depoimentos no julgamento da intentona de 8/1  pelo STF com prisão de vários réus tem ocasionado um clima de tensão entre os parlamentares bolsonaristas. Pesam suspeitas de que eles tenham incentivado daquele vandalismo, ainda em investigação sigilosa da PF.
                É nessa hora que, a despeito de toda a sua autoconfiança na sua capacidade de engajar, Nikolas revela suas fraquezas, como todo mundo que se forma em encrenca. Ele viu a prisão preventiva de réus graúdos, generais de quatro estrelas, e Bolsonaro, seu esteio político, na iminência desse caminho com uma tornozeleira eletrônica.
                E olha que a Justiça está sendo uma verdadeira mãe com o ex-presidente!
                Primeiro fracasso - com Bolsonaro advertido por Xandão de não postar entrevistas nas redes sociais e não ultrapassar os limites de horários fora de casa, Nikolas e seus colegas ideológicos criaram um cenário para entrevista coletiva ao ex-presidente, que deu bolo. Disfarçando, ele mentiu descarado: "Moraes o proibiu de dar entrevista".
                O recuo de Bolsonaro - que chorou durante pregação de Michele em culto - pode ter sido acertado. Mesmo em obediência, ele poderia ser filmado por alguém infiltrado em meio à plateia jornalística que poderia postar em possível perfil falso nas redes sociais, tornando sua prisão inevitável. E a mentira de Nikolas pode reforçar a suspeita entre o STF.
                Cenário ridículo- atrás da mesa dos líderes na tribuna, um grupo de parlamentares bolsonaristas esticou uma bandeira azul com a inscrição "Trump: make America great again". Foi uma homenagem ao presidente dos EUA por enfrentar as autoridades brasileira. Além de patética, a cena revelou o antipatriotismo dos partícipes. 
                Um dos partícipes, Nikolas mantém a mesma consonância ideológica com o seu quase desafeto Eduardo Bolsonaro. Dias antes, ele homenageou o estadunidense na tribuna. Janones tentou filmá-lo como antipátria, mas foi impedido por outros bolsonaristas com socos, pontapés e uma aparente apalpada na genitália.
                Queda possível- como dizem os antigos, quanto mais alta a montanha, mais profundo é o precipício. A carreira meteórica de Nikolas com recorde de votos para deputado pode redundar, nas eleições seguintes, em um recorde negativo. E talvez não seja difícil explicar por que.
                O primeiro sinal veio quando a patuleia enfim entendeu que ele votou a favor de pautas impopulares como taxa das blusinhas, aumento de deputados com ganhos redobrados e contra a tributação de grandes rendas. Ele reagiu ameaçando o governo pelo efeito das campanhas de IA pela IRRF maior para os mais ricos.
                O outro sinal é a denúncia recebida do Ministério Público Eleitoral de MG (MPE-MG),  acolhida pela Justiça Eleitoral mineira. Segundo o texto, Nikolas é acusado de caluniar o então candidato Fuad Noman à reeleição de 2024 em BH. Outro denunciado é o ex-candidato bolsonarista Bruno Engler. Noman morreu em 2025.
                O juiz da 29ª Zona Eleitoral de BH Marcos Antônio da Silva deu 10 dias para os dois apresentarem as suas defesas. Se condenados, Nikolas e Bruno terão que indenizar a família de Noman. O deputado e o vereador ainda podem ser cassados e tornados inelegíveis por 8 anos.
                A condenação também pode ser parcial, limitando-se a um dos dois vereditos acima citados. No momento nada se descarta, ainda que a punição completa seja a mais correta. Não só daria razão ao ditado, como também poderá iniciar a tão sonhada limpeza moral no parlamento, a começar pelo Congresso.
                É aí que mais se centra o desespero de Nikolas. As três condenações indicam que ele não é 100% gênio. Agora o desafio judicial é maior e bem mais robusto: a questão está na lei e não na moral que se se pretende impor.
Para saber mais

                
                













domingo, 6 de julho de 2025

CURTAS 97 - ANÁLISES (IURD na PMSP, censura a Jorge Amado)

 

IURD NA PM: EFEITOS EM SP

                Anos 1960: missionários cristãos a mando do governo dos EUA entram na América Latina para impor a fé anticomunista. Anos 1980: atletas de Cristo entram no mundo esportivo profissional regado a música, bebida e amores. Anos 1990: a bancada da bíblia surge no Congresso e o pastor Marcos Pereira entra em presídios. Desde 2012, Guerreiros de Jesus depredam terreiros afro-brasileiros em favelas e expulsam fiéis. Desde 2016, grupos de PMs de Cristo são vistos rezando antes de iniciar suas rondas.
                Em si, a evangelização é considerada normal, com história secular para nós. Mas não a sua fascistização, que se traduz na intolerância dos traficantes evangélicos contra as fés afro-brasileiras, e também no acirramento da guerra urbana por trás das mais perigosas operações policiais nas periferias de muitas cidades.
                Evangelização nas polícias? Sim. Não seria para melhorar a relação entre PMs e pobres? Deveria, mas só que não.
                IURD fundada por Edir Macedo no fim dos anos 1970, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD ou Universal) é pioneira do neopentecostalismo, dissidência pentecostal que não só promete fazer vencer a pobreza, como entra em vários mundos. O partido político Republicanos foi fundado por bispos da IURD.
                A criação de um partido político por uma igreja não só revela uma brecha na lei. Revela também como a IURD entra e se organiza nos espaços públicos laicos. Portanto, não é surpresa ela ter iniciado a evangelização dos reservados espaços das PMs Brasil afora. Em São Paulo, então...
                PM universal não é de hoje que o jornalismo investigativo tem reparado no porte e no poder da IURD. Mas só as reportagens mais recentes revelam como e o quanto esta organização empresarial-religiosa penetrou no mundo privado de cada policial militar e mais ainda, como tomou os quarteis da PM-SP.
                Foi tudo muito sutil. É totalmente plausível que as promessas fantásticas da IURD e aas revelações de seus pastores bem treinados atraíram de famílias a multidões pelo país. E se torna óbvio que, entre a crescente população fiel estejam soldados e/ou alguns oficiais PMs próximos a secretários estaduais de segurança. É só especulação.
                O que importa é que, para se chegar ao status atual nos quarteis paulistas, com direito a cultos e solenidades comemorativas organizadas pela IURD com presença do Secretário e do governador em pelo menos 10 Estados, algo deve ter começado lá de baixo para não chamar a atenção pública.
                Ferramentas possíveis fundado em 2005, o então Partido Municipalista Renovador (PMR), depois Republicano Brasileiro (PRB), atual Republicanos, tinha somente políticos fiéis. Mas liberou geral após o finado vice-presidente da República José de Alencar se filiar. Hoje ele integra o centrão e o liga à ultradireita.
                O PR foi a primeira evidência do projeto de poder de Macedo. Quando do flagra dos PMs rezando em 2016, a IURD já havia criado a organização Gladiadores do Altar, uma milícia paramilitar treinada com táticas militares para penetrar em recantos de difícil acesso do país e alcançar comunidades isoladas.
                Como as milícias que dominam favelas e bairros da zona metropolitana do RJ, a Gladiadores do Altar tem PMs nas fileiras ou é treinada por PMs ou militares das Forças Armadas para a citada penetração. Mas, quiçá, ela pode ter sido usada para adentrar nos espaços mais reservados da caserna da PM.
                Hoje hoje, a IURD formou 20 mil capelãos nas PMs estaduais em todo o Brasil. Em todos os quarteis paulistas há a Universal nas Forças Policiais (UFP) reúne capelãos para organizar vários eventos, como o aniversário da PM-SP e as cerimônias de formação de novos quadros de PMs aprovados em concurso.
                Sempre lotados, os cultos e eventos são realizados no salão de eventos do maior quartel da PM-SP ou no imenso Templo de Salomão. Em um culto no portentoso Templo, o coronel João Alves Cangerana Jr disse aos PMs a “necessidade” de “louvar os templos”, pois “os valores da PM coadunam com os da religião. Portanto, também considero importante para a saúde espiritual”.
                Só resta saber que valores são esses. Afinal, a PM contaminada pela IURD é a mesma que acumula recordes de letalidade nas periferias das cidades paulistas, inclusive na capital. É a mesma que recentemente tentou remover, com muita violência, moradores da Favela do Moinho, a última do centro da capital.
Para saber mais
-----


CONTRA BRIGAS, NÃO A JORGE AMADO

                Como já abordado em vários artigos, o Brasil elegeu Lula de volta após 4 anos de pesadelo. Mas, junto às heranças malditas na governança, se segue forte o pânico moral criado pela fascistização da fé com o bolsonarismo. E, claro, a saudade dos mais velhos dos “gloriosos” tempos da ditadura militar.
                Tudo que se refere a gênero, sexo e sexualidade é alvo conhecido do pânico moral. Vemos várias expressões homotransfóbicas de Nikolas Ferreira e a insistência do pastor Sargento Isidório em não reconhecer a identidade sexual da colega Erika Hilton ao chama-la de “meu amigo”, mesmo respeitosamente.
                Em matéria de infância, os bolsonaristas falam muito de protege-las da sexualização. E em matéria de violência infantil? A vereadora bolsonarista Jéssica Lemonie, de Itapoá (SC) disse ter a solução para contra os problemas infantis: censurar a “literatura violenta” na rede de ensino básico.
                Censura a Jorge Amado – a riqueza literária brasileira tem sido explorada em cursos preparatórios para concursos públicos e ENEM. Entre os grandes escritores, em geral críticos da sociedade, se destaca para este artigo o saudoso baiano Jorge Amado – o meu escritor favorito.
                De Itabuna (1912), Jorge Amado foi advogado, jornalista e político. Mas seu reconhecimento global é o de um dos maiores escritores de todos os tempos. Modernista, sua obra é riquíssima, recheada de crítica à moral de costumes, luta de classes e ritos de candomblé, e a mais adaptada para TV e cinema.
                A zona rural do Cacau o inspirou a escrever Tocaia Grande, Tieta do Agreste, Gabriela, cravo e canela e Pastores da noite. Já Salvador chancelou mais títulos: Jubiabá, Capitães da Areia, Dona Flor e seus dois maridos, Tenda dos Milagres e a menos conhecida e hilária O sumiço da santa: uma história de feitiçaria.
                Capitães da Areia – o alvo literário de Jéssica é Capitães da Areia. Adaptada na TV e no cinema, a obra foca um grupo de meninos de rua que vivem os efeitos do abandono como exposição à violência e a vícios, rejeição, sexo e desigualdade. Cada menino trilha caminhos singulares redundando em diferentes finais.
                Para Jéssica, a obra “promove a marginalização infantil” e tem trechos com “violência e criminalidade”. Disse que a idade estimada pelas bibliotecas para sua leitura é de 18 anos. E ainda depreciou o escritor por ter sido comunista considerando a inclusão de sua obra uma “infiltração da esquerda nas escolas pela literatura”.
                Até o momento, a Câmara de Itapoá não apreciou o texto. As Secretarias de Educação (municipal e estadual) não se pronunciaram.
                Contradição e bizarrices - os bolsonaristas se dizem defensores da ideologia biológica binária de gênero e heteronormatividade de mando masculino. Por outro lado, são contraditórios entre defender o armamentismo civil e reprovar a violência infantil, entre ser pró-vida (antiaborto) e ser indiferente ao abandono infantil.
                Nunca vimos políticos bolsonaristas defenderem a infância periférica e não-branca, mais exposta à violência que dizem condenar. E são indiferentes à letalidade policial sobre menores inocentes pelas ditas “operações de guerra ao tráfico”, no jargão das polícias. Ou seja, simplesmente os consideram criminosos.
                Daí serem bizarros seus projetos de lei. Como a Lei da Calcinha, que condena exposição corporal em eventos públicos e noivas sem calcinha desde 2013 em Vila Velha (ES); a bolsa-estupro que prevê bolsa para a vítima grávida para não abortar; e a PL da prisão da vítima que abortar gravidez resultante de estupro.
                Exceto a de Vila Velha, que é municipal e está válida, demais bizarrices ainda tramitam no Congresso, com chances remotíssimas de aprovação. Todas resultam da fascistização religiosa, já abordada no blog. A proposta da vereadora catarinense é apenas mais uma que entra no estranho rol de bizarrices.
Para saber mais
----


















quarta-feira, 2 de julho de 2025

CURTAS 96 - ANÁLISES (CPMI do INSS; Centrão x Lula)

 


CPMI DO INSS: POSSÍVEL TRIUNFO DE LULA?

                Neste explosivo 2025, Lula 3 enfrenta pressões crescentes, que redundam em baixas inéditas nas pesquisas de sua popularidade. Em paralelo a boas notícias de crescimento econômico interno, a ultradireita no congresso se aproveita de sua eficiência comunicativa em propagar inverdades que culpabilizam o presidente.
                Agora, a nova pressão sofrida pelo governo é o vazamento de um escândalo de corrupção no seio do INSS. Em investigação pela PF, o crime se relaciona aos descontos indevidos em proventos de beneficiários por associações. Essa nova notícia mexeu no vespeiro da ultradireita, que criou uma nova bomba de inverdades.
                Efeitos e reais culpados – já sabemos que as inverdades transferem a culpa a Lula pelo escândalo do INSS. Lula pessoalmente não se ofendeu, mas foi obrigado a demitir o velho aliado Carlos Lupi (PDT) do ministério da Previdência, o que causou racha entre PT e PDT. Lula correu atrás para cicatrizar a ferida.
                Lula botou o pedetista Wolney Queiroz na pasta, e nomeou o procurador federal Gilberto Waller Jr para presidir o INSS, conseguindo acalmar os ânimos. Teve apoio dos parlamentares governistas e de esquerda que esclareceram na tribuna a cronologia do escândalo desde 2019, envolvendo entidades então criadas.
                Senadores da direita convidaram Queiroz para explicar os fatos em audiência. O minstro confirmou as principais entidades beneficiadas com os descontos as criadas desde 2019, na era Bolsonaro. E que foi decretado impedimento ao bloqueio dos descontos indevidos em 2020, sem citar nomes dos envolvidos.
                A investigação da PF cita a maior parte do rombo bilionário foi para entidades criadas a partir de 2019, e pessoalmente envolve nomes como Onyx Lorenzoni (ex-ministro do Trabalho de Bolsonaro), o ex-presidente do INSS Carlos Antônio Antunes (careca do INSS, também naquele governo) e o ex-assessor de Hugo Motta Arlindo da Silva Jr (Junior do Peixe).
                Durante a era Bolsonaro, Júnior do Peixe presidiu a Conafer, (confederação de trabalhadores do campo), uma das entidades beneficiadas no esquema. Essa entidade avisou o governo anterior em 2022 e o atual em 2024. O governo demorou a reagir, mas liberou a investigação do escândalo pela PF.
                CPMI do INSS – derrotados pela falta de provas na audiência com o ministro Queiroz, a direita parlamentar liderada pelos bolsonaristas protocolou a criação da CPMI do INSS para investigar o caso. De acordo com a mídia, a ideia teria incomodado o governo Lula 3. Uma reação natural inicialmente inevitável que depois acalmou.
                O objetivo central dos parlamentares bolsonaristas é fragilizar ainda mais o governo Lula com a repetição da velha tecla da acusação de corrupção: afinal, na mente deles, Lula é ladrão e ponto final. Ou seja, na real, a realização dessa CPMI é o avanço no caminho do projeto de poder de domínio completo da governança.
                Triunfo de Lula? – o objetivo da oposição motivou a reação inciial do governo e dos parlamentares governistas. Mas, muita calma nessa hora: a cúpula ainda não foi confirmada. Os governistas querem o senador Omar Aziz na presidência e a deputada Tábata Amaral na relatoria, enfraquecendo o poder da oposição.
                Segundo o líder do PT e do governo no Senado, Randolfe Rodrigues, a oposição esteve no seu direito ao protocolar a CPMI, mas a investida governista pelas duas posições na cúpula respeita os tamanhos das bancadas. No Senado há mais equilíbrio entre as bancadas da situação e da oposição do que na Câmara, dominada pela soma do centrão com a oposição.
                Caso Aziz e Tábata sejam confirmados na ocupação dos respectivos postos – afinal, eles são, na prática, de centro-direita – a CPMI do INSS pode, até certo ponto, ser um triunfo para o governo. A começar pelas evidências levantadas até agora pela investigação da PF atingirem nomes e entidades ligados à era anterior.
                Mas isso não significa facilidade na condução da CPMI. A oposição fará tudo o que estiver ao seu alcance para tumultuar sessões e conseguir, de alguma forma, incluir o governo Lula 3 no escândalo – talvez através de algum nome petista próximo a alguém já envolvido no esquema. No mundo paralelo da ultradireita, tudo é possível.
                Isso, sem falar na própria tensão entre o governo federal e o Centrão em relação ao decreto do IOF: dado o caráter cada vez mais abusivo do Congresso, para Motta e Lira se unirem para eleger uma cúpula bolsonarista de comando da CPMI, pouco custa.
                De qualquer forma, a CPMI do INSS será outro detalhe da disputa da queda de braço criada pelo centrão que agora atua de oposição a Lula 3. Por isso podemos apostar que Lula 3 poderá findar este mandato com a imagem chamuscada, mesmo tendo público fiel. Não pela reputação de ladrão que insistem em carimbar. Mas por suas derrotas impostas à força pelo Legislativo. Mas, sim, o triunfo na CPMI é possível.
Para saber mais
-----
                

O CORONELATO DO CENTRÃO

                Há até 40 anos atrás existia, na rede de ensino básico, a disciplina Organização Social e política do Brasil (OSPB). Ela falava da organização da República brasileira e dos três poderes: Legislativo, Judiciário e Executivo, e suas funções. Próprias. Achávamos que sabíamos tudo, até termos noção de política como ela é.
                Entre o conteúdo da OSPB e a realidade da vida política há diferenças abismais. Imagino o choque de um incauto eleito entrando na carreira política. Pois é no ambiente político que a pessoa se depara com o viés de interesses ideológicos, pessoais e mercadológicos sobre as funções precípuas dos poderes.
                O mais complexo é o Legislativo, criador das leis. Ele se compõe de vereadores municipais, deputados estaduais, e o Congresso bicameral de senadores e deputados federais. Em suas ações, todos se movem mais pelos combustíveis ideológicos e financeiros do que para satisfazer as necessidades populares.
                Daí se percebe um fenômeno. Há 40 anos, Sarney inaugurou o pós-ditadura. No Congresso surgiu um grupo informal de autodeclarados centristas do então poderoso PMDB de Sarney. Seu objetivo era influenciar a direção do Congresso e infiltrar seus interesses nos rumos dos governos federais: é o Centrão.
                Os novos coronéis – em 1990, os jornalões diziam que as eleições presidenciais de 1989 (estendidas a deputados estaduais e federais e senadores) findaram o coronelismo, fenômeno de opressão social imposto por certas elites familiares de poder político local no vasto interior brasileiro. Na verdade, o fim foi só impressão.
                No Maranhão domina a família Sarney na região de Imperatriz. Collor, Calheiros e Pereira Lira disputam Alagoas. Em Pernambuco, são os Campos e Arraes. Na Bahia, os Magalhães. Em Goiás, os Caiado são os poderosos. Todos indicam seus candidatos para as eleições. E Brasília? Bem, essa tem o Centrão.
                No sentido francamente objetivo, o centrão pode ser afirmado como um novo coronelato, cuja diversidade de origens se reflete na cosmopolita capital da República. Essa afirmação é plena quando vemos o quanto sua influência se impõe sobre os governos federais, especialmente a partir do golpe de 2016.
                Traição – a briga que observamos entre STF, Lula 3 e Centrão em relação às emendas parlamentares tem origem mais antiga. Em 2016, Eduardo Cunha arquitetou a deposição de Dilma Rousseff por falta de acordo sobre o valor das emendas e outros motivos. Mas agora a massa cresceu, somada à ultradireita.
                Agora, a infiltração do Centrão na governança alcança seu ápice sobre Lula 3. Além revogar vários vetos do presidente e guardar o PL da isenção do IRRF, Hugo Motta e Davi Alcolumbre o traem de madrugada reprovando o decreto do IOF após acordo tratado durante o dia – para blindar ricaços. Mesmo já bem pagos com emendas!
                Lula sentiu a traição. O Psol sentiu as dores e enviou ação cautelar ao STF para julgar a derrubada do decreto do IOF do governo. Barroso elegeu Xandão como relator do caso. Encarando tudo como ofensiva do governo, Hugo Motta o chantageou prometendo Nikolas Ferreira para comandar a relatoria da CPMI do INSS.
                Além disso, Hugo Motta ainda foi a um jantar com João Dória e uma trupe de empresários em SP, onde aprofunda conversas para emparedar Lula 3 ainda mais, ao ponto de impedir a sua governança minimamente normal.
                Maximizando a ganância – a traição citada revela a autenticidade do caráter do coronelato do Centrão, agora aliado à ultradireita para alcançar um projeto de poder. E por trás dessa ambição reside outro plano: a maximização do poder financeiro e da captura das atribuições do Executivo (presidente da República).
                A ambição se concretiza em nova interferência em ato executivo: para 2026, o Congresso já projeta definir total de R$ 106 bilhões, R4 52 bi só com emendas parlamentares. Os demais R$ 54 bilhões se dividem em outras despesas. Esse total poderá brecar a intenção do governo em administrar recursos de políticas públicas.
                Anomalia financeira – em audiência pública do STF, um consultor aposentado do Legislativo apontou ao menos 2 distorções do Congresso. A interferência nos atributos do Executivo não só revela a pressão extrema sobre o governo, como viola o princípio constitucional da independência entre os poderes.
                Em relação à definição de valores das emendas e outras despesas incluindo privilégios, ele aponta o objetivo de inflar benefícios políticos próprios, além, claro, de os valores estipulados revelarem uma anomalia financeira – que já era presente naquele orçamento secreto instituído no governo anterior.
                Em fria análise final, os coronéis do Centrão têm o mesmo caráter dos antigos coronéis da elite rural sertaneja: o de impor uma ditadura parlamentarista, desde que comandada pelo Centrão – que hoje é um grupo bastante numeroso e ideologicamente mais fisiológico e impositivo. Mesmo não sendo bolsonarista, ele chega ao extremo, se assim decidir.
Para saber mais
- Eduardo MoreiraHugo Motta derruba reajuste do IOF para obrigar governo a cortar recursos, 27-6-2025. https://www.youtube.com/watch?v=qd5Wh0u2UBY
- O HistoriadorLula manda recado ao Congresso: “já chega!”, /28-6-2025, em https://www.youtube.com/watch?v=65By8ZHqPE0
- ClaysonBrasil em perigo! Senador revela o segredo por trás do Congresso apavorado contra Dino e Lula, 30-6-2025, in https://www.youtube.com/watch?v=18bjSNCROAk
- Mídia Ninja – Consultor da Câmara mostra anomalia orçamentária (emenda beneficia políticos), 30-6-2025, em https://www.youtube.com/watch?v=hoRo8jm73ok
-----
















CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...