Recrutar jovens: militarismo ou milicianismo?
A política armamentista já era promessa de campanha de Bolsonaro, para chamar o apoio de classes médias desgostosas com a histórica ineficácia no combate à violência urbana. Como se isso não fosse um problema dos Estados.Além de associar a vergonha ao PT, os asseclas do bolsonarismo (alguns na mira da PF por ordem do STF) prometeu militarizar as escolas públicas no mote de "salvar as jovens gerações pela disciplina". Tanto é que, antes do Corona, as redes sociais eram lotadas de fotos, vídeos e notícias sobre esse tema. Claro, alguns desmentidos.
Passada a eleição e 2019, nada. Estamos em meio de 2020 e nada. Mídias oposicionistas tiveram tempo de sobra para desmistificar essa política, e agora em maio, um evento revelaria segredos ligados à militarização das escolas. Com a ajudinha do Corona.
Em 22/4 ocorreu a reunião ministerial. Mas nunca foi noticiada, até ser revelada em rede de massa em 22/5, após o vídeo parar no STF, que recebeu denúncias de irregularidades e pegou para analisar. Quem analisou? Celso de Mello, o mesmo que está com pedido de impeachment de Bolsonaro em mãos.
O vídeo não mostrou o que deveria ser uma reunião de governo, mas de mafiosos.
Em cena, Guedes deu sugestão daquelas: recrutar 1 milhão de jovens nas FFAA, em forma de "primeiro emprego" remunerado em R$ 200 mensais, via alistamento e seleção normais.
A princípio, a geral engoliu como dar forma à política armamentista genérica defendida por Bolsonaro. Faz sentido. Só que há outra, subjacente e tão perigosa quanto, se revelando a partir do imenso contingente de ingressados, bem maior do que o normal.
Por trás dessa beleza de segurança há uma feiura. Segundo Guedes, eles passariam 1 ano treinando usos de armas diversas e... como não há garantia de progressão em carreira militar, mesmo se houver interesse, sobraria que opção? É só pensar.
A ideia absurda bate com a defesa de Bolsonaro da milícia legalizada como uma segurança alternativa em periferias pobres urbanas, como "reforço" às PMs estaduais. Por terem posse e porte de armas, os jovens já qualificados "protegeriam suas famílias".
A família Bolsonaro, incluindo o presidente, defende as milícias há muito tempo, mesmo se esquivando das sucessivas investigações das mortes de Marielle Franco e de duas juízas que, antes, condenaram milicianos por outros crimes.
O presidente negou intenção de golpe apesar de admitir "ser muito fácil" no momento. Mas, como diz o professor Paulo Ghiraldelli no youtube e em seu blog, ele quer a democracia não por gostar, mas porque as milícias "gostam da democracia", e ele se aproveita esgarçando os limites da lei.
O apontamento de Ghiraldelli bate com a minha observação de que a sobrevalorização das milícias se iguala ao mesmo gesto sobre as igrejas evangélicas como substitutas do Estado em atenção pública, mesmo sem qualificação para tal.
Além de formar um tripé formado por famílias armadas, milícias com PMs e s igrejas, essa política explica também as alianças sinistras das igrejas com o tráfico em algumas favelas, um fenômeno, o narcopentecostalismo, já estudado desde 2013.
Em comunidades dominadas pelas milícias, aliança idêntica se verifica, mas desta vez com esta organização criminosa. Esse fenômeno, mais sutil, pode ser observado localmente. E se concretizar a sugestão de Guedes, será desses locais a maior parte desses jovens nas FFAA.
E assim, se formaria um governo que, ao prezar o militarismo, mas defender a segurança paralela, cuja principal atividade, na prática, será reforçar a política de extermínio de todos os incômodos: políticos opositores, movimentos sociais e minorias em geral, fundará o novo fenômeno militar: o milicianismo.
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Youtube Paulo Ghiraldelli: https://www.youtube.com/channel/UCBMKrkHv07GoYb5ITLt0sYQ/videos