segunda-feira, 19 de junho de 2023

CURTAS 34 - Análises(PL 2720-23, fé no ódio, STF pós-Weber)

 

O PL dos politicamente expostos

                Na era petista pré-Temer, o debate público sobre a discriminação a minorias no Brasil teve relevância suficiente para suscitar discussões entre os membros dos poderes judiciário, legislativo e executivo. O ex-deputado psolista (hoje PT) Jean Wyllys falava muito do PLC 122/2006.
                Escrito pela ex-deputada do PT Iara Bernardi, o PLC 122/2006 propôs criminalizar a homofobia como ocorre ao racismo. Mas a bancada da bíblia fez barulho e o PLC foi arquivado. Em plena era Bolsonaro, o STF o reviveu indiretamente ao votar na criminalização da homofobia e mais além.
                O STF criminalizou também ataque a transgêneros, mulheres e profissionais do sexo, cumprindo o que o Congresso não fez. Mas inspirou Dani Cunha, filha do cassado Eduardo Cunha, a elaborar o PL 2720/2023, que penaliza possíveis discriminações aos politicamente expostos¹.
                Segundo esse PL, os politicamente expostos são: políticos e respectivos designados no Legislativo e Executivo; membros do Judiciário (tribunais superiores federais e regionais, TCU, CNMP, MP, PGR, presidentes e tesoureiros partidários, etc.), estendendo-se aos familiares.
                Antigo – O tema do PL 2720/2023 não é novidade. Em 2016, Eduardo Cunha quis criar um PL para calar quem falasse mal de políticos. Se escreveu algo, seu teor nunca foi divulgado.
                O teor do PL 2720/23 traça a discriminação a políticos no sentido do preconceito comum da cultura popular. Como, por exemplo, discriminar o político por sua orientação ou identidade sexual, cor de pele, corrente ideológica e/ou por ser uma persona estereotipada².
                O PL 2720/23 prevê 4 anos prisão a quem discriminar os expostos e seus familiares. Foi aprovada por 252 a 163, com 3 abstenções. O fator de aprove foi subjetivo e não ideológico, mas partidos como Novo, Rede e PSOL foram contrários ao texto.
                Contradições – O PL propõe blindar pessoas públicas contra as críticas discriminatórias que porventura possam ameaçar sua integridade e seu futuro eletivo. E parece mais soar como aviso à opinião pública sobre atos possivelmente suspeitos dessas pessoas.
                Acontece que os maiores discriminadores aos contemplados são os próprios políticos. Que o digam Eduardo Bolsonaro contra os pró-governo Lula, e Nikolas Ferreira contra mulheres e LGBTQIAP+, entre outros casos.
                Contradições atingem tanto os que votaram contra quanto os favoráveis. Ideologicamente os favoráveis ao PL fariam um favor aos seus próprios oponentes além de si próprios. E quem foi contra o texto passaram a impressão de que admitem a discriminação como normal.
                No contexto de democracia em restauração, a Câmara passou a impressão de ter apreço pela antidemocracia, pois foi essa a impressão repassada pelo texto: o povo crítico (cartunistas, humoristas e intelectuais) se sentiu estranhamente exposto a processos em possíveis críticas futuras.
                O fim – Em meio a esse clima apreensivo que repercutiu na mídia, o texto aprovado foi enviado ao Senado. Em rápida entrevista, o presidente Rodrigo Pacheco garantiu não ter “como aprova-lo” por “haver inconstitucionalidade”, que de fato existe.
                Embora os bancos possam negar crédito a casos específicos³, os politicamente expostos do texto não são abrangidos, pois são estratos de uma classe heterogênea que abrange até servidores públicos pelo fato de executarem políticas públicas politicamente previstas na Constituição e criadas politicamente.
                Graças a tudo isso – e pela repercussão de um recado implícito ao povo crítico –, o Senado reprovou o PL, encurtando o caminho para o fim, que será o fundo da gaveta do esquecimento, o mesmo destino que sonhamos para o Marco Temporal. Que assim continue.

Notas da autoria
¹ União, Estados e Municípios.
² com traços singulares de personagem-tipo (como Arthur do Val se dizer da Swat, por exemplo).
³ devedores grandes ou sistemáticos, beneficiários de programas assistenciais temporários de renda abaixo do SM, ou casos criminais determinados em jurisprudência.

Para saber mais
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Mais uma vez, a fé ao ódio
 
   
            
No púlpito da Câmara, ao vestir a peruca e discursar um insulto reduzindo transgêneros a “homens que querem ser mulheres”, e mulheres a meros úteros a serviço da sociedade, Nikolas Ferreira não só expressou o nazifascismo bolsonarista. Ele expressou a sua fé no combustível do ódio.
                Pois, por mais absurdo que pareça, ele teve aprove de uma penca de colegas que não só defenderam a sua fala como comprovação dos ideais ultraconservadores do bolsonarismo, como também uma expressão mais moderna daquilo “que está escrito na bíblia sagrada”.
                Após intensa pressão da bancada feminina, o caso foi levado ao Conselho de Ética da casa. Enquanto este não resolve, o STF está de olho em Nikolas e outros suspeitos de incentivar o terrorismo bolsonarista após as eleições e na barbárie final de 8/1. A batata está esquentando.
                Vídeo polêmico – Neste junho, em paralelo à suspensão das redes do influencer Monark determinada por Alexandre de Moraes, outro vídeo repercutiu em vários canais de mídia¹: é um podcast publicado no canal do pastor Anderson Silva, no Youtube.
                Ao lado de Nikolas, o pastor disse ser preciso “orar ao senhor para quebrar a mandíbula do Lula”, bem como “prostrar doenças nos ministros do STF”.  O deputado reforçou a fala com polêmicas como “necessário derrotar o inimigo” (Lula e o STF) para “não irmos pro inferno”.
                Não é surpresa a fala do deputado, dado o perfil de que já sabemos. Já o pastor Anderson, embora inicialmente pudesse surpreender quem não o conheça, também clarifica a sua ideologia extremista aparecendo em fotos junto ao ex-presidente e filiando-se ao PL.
                A fé pelo ódio – Embora saibamos da heterogeneidade da fé evangélica brasileira, mesmo que as igrejas se convirjam para Cristo (o Deus encarnado) seja a mesma, Anderson e Nikolas são dois exemplos que convergem sua fé em outra versão, baseada no ódio.
                Se para os cristãos e não-cristãos apolíticos ou progressistas há a convergência para a diversidade como parte do desprendimento divino com a própria criação, para os evangélicos ideológicos Anderson e Nikolas, entre outros, a convergência no ódio se justifica na homogeneização social.
                Essa convergência nos leva a entender a aversão de pessoas como Anderson, Nikolas e outros por homossexuais “pecadores”, os marxistas que “divergem pessoas e corroem a moral”, o feminismo que “impede a mulher de ser mãe” e a aceitação da diversidade de fé que "causa ausência religiosa"².
                É esse ódio que movimenta essas pessoas para homogeneização social pela eliminação do “fora da curva” do que consideram normal e verdadeiro na sua fé medievalizada. Pois para eles, o diferente é diabólico e precisa ser “exorcizado” através de seu extermínio.
                Prisão – Segundo o historiador e cientista político Carlito Neto, a fala do pastor Anderson pode leva-lo à prisão por pregar a violência e a discórdia direcionadas aos ministros do STF, pela incitação ao crime (contra a paz pública, pela animosidade entre os poderes).
                A menção ameaçadora a Lula é um agravante, pelo fato de Lula ser a principal pessoa pública, o presidente da República eleito pela maioria do povo, apesar das tentativas de sabotagem eleitoral já abordadas no blog.
                Em fria análise, a fala de Carlito pode ser extensiva a Nikolas, enquanto pessoa pública a dinamizar a interpretação deturpada de Anderson a ser estendida pela coletividade como um todo para se investir contra a diversidade representada por um suposto inimigo.
                Se ocorrer, a prisão servirá para que os dois entendam que religião não deve ser usada para a intolerância religiosa, uma vez que não existe religião falsa ou verdadeira, nem ninguém errado por suas singularidades. Intolerância religiosa é crime e deve ser penalizada.

Nota da autoria
¹ UOL, DCM, TV 247 e outros canais midiáticos
² se refere aos ateus e agnósticos.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=pzWrYS6FAiE (O Historiador – pastor bolsonarista pode ser preso)
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STF após Rosa Weber

                A indicação de Cristiano Zanin por Lula para o STF causou burburinho midiático. A grande mídia criticou Lula pela escolha por confiança, e foi retaliada nas redes pelos que relembraram o mesmo motivo para FHC indicar Gilmar Mendes e Temer com o Xandão.
                Após a saída de Lewandowski – nome de Lula nos anos 2000 – a próxima aposentadoria será a de Rosa Weber, estimada para outubro, quando a mesma fará 75 anos. Isso, caso não se antecipe como fez o ex-colega. Ela é a presidente atual do STF e se aposentará nessa condição.
                Já se opera um certo clima de pesar por sua saída inevitável. É um dos nomes de maior respeito na instituição, por sua firmeza de opiniões. Além disso, será uma mulher a menos, pois sua vaga será ocupada por Zanin. E sairá o nome representante da justiça do trabalho.
                Rosa Weber é branca de traços claramente europeus. E cederá lugar a mais um homem branco, sobrando apenas Carmen Lúcia como mulher entre 10 homens. Mas o povo segue na torcida por uma mulher negra ser o próximo nome de Lula, a substituir Luiz Fux.
                Breve biografia – Rosa Maria Pires Weber nasceu em Porto Alegre (1948). Formou-se em Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1971. Foi magistrada na área trabalhista no Tribunal Superior do Trabalho (TST), e em 2011 foi para o STF indicada por Dilma Rousseff.
                Nesses 12 anos, Rosa Weber tem se apresentado com firmeza de posição durante julgamentos de vários dispositivos legais,  Votou pela inconstitucionalidade de alguns casos como o Decreto de Bolsonaro que propôs desmonte na educação regular inclusiva e opinava o mesmo sobre o Marco Temporal.
                Carência no trabalhismo– Embora o STF não exija pós-graduação como comprovação de alto saber jurídico e condição ilibada, condições para as votações de dispositivos legais em relação à CF-1988, a aposentadoria de Weber implicará em uma lacuna no setor trabalhista.
                Pois, além de Weber, apenas o jurista Marco Aurélio tem formação na área trabalhista, e já se aposentou do STF há algum tempo. E, mesmo assim, durante o período em que atuaram juntos nas votações em dispositivos ligados à área, ambos tinham suas discordâncias.
                Após a saída de Weber, a área trabalhista não terá representantes, pelo menos até Lula indicar o próximo nome. Será um período difícil para Lula acompanhar julgamento da revisão da reforma de Temer para fortalecer um setor cada vez mais carente e tão caro para o presidente em toda a sua biografia.
                Garantia – Mas nem tudo talvez esteja perdido. Além de Zanin, Lula terá Dias Toffoli¹ e Gilmar Mendes, conhecidos magistrados garantistas. E quiçá outros. Foi de Mendes o voto de minerva que retirou do hoje extinto teto de gastos de Temer a PEC da transição ainda em vigor.
                Que a próxima indicação possa cobrir a área trabalhista. E, quiçá, a da representatividade social e mesmo ambiental, outros temas tão caros ao velho petista que deseja fazer o esperado “governo de sua vida” – não importando tamanha dificuldade em relação com parte do Congresso.

Nota da autoria
¹ Toffoli causou mágoa no petista devido ao lance que levou à sua condenação sem provas em 2018. Agora ele tenta reaproximar-se do presidente.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=g61M0IYC8I4 (Meteoro Brasil – adv Bruno Silvestre fala sobre enfraquecimento da justiça do trabalho no STF)
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Rosa_Weber 
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