quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

CURTAS 56 - ANÁLISES (Dia da Infâmia, Lula e pentecostais)

 

8/1, o nosso Dia da Infâmia

     Brasília, 8/1/2023: sem encontrar resistência da PMDF e precedida de homens mascarados, uma imensa horda de verde-amarelo correu na direção dos prédios da Praça dos Três Poderes e cometeu um terrorismo golpista contra o governo eleito. A tentativa de golpe foi frustrada pela ação tardia da PMDF e da Força Nacional.
            Já sabemos também da reação do governo federal e das duas CPIs, uma distrital e outra no Congresso, para elucidar os mandates e os financiadores. E também de algumas dezenas de radicais condenados pelo STF, alguns a 17 anos. Só que se deu a entender de uma perda do fio da meada, devido a trocas no Judiciário.
            Dino no STF – no STF, Rosa Weber participou de alguns julgamentos de terroristas no colegiado. Com a sua aposentadoria, a cadeira será de Flávio Dino, que passa a ter em mãos os inquéritos criminais de Bolsonaro e seu séquito.
            Na PGR, Paulo Gonet substitui Augusto Aras, e no TSE o ministro do STJ Benedito Gonçalves deu lugar à ministra Isabel Gallotti, também do STJ. No TSE, os cargos são temporários (2 anos), e por nomeação do presidente da República.
            Julgamentos – é possível que Gonet tenha conduta coerente com as atuações do STF e do TSE em julgar crimes de bolsonaristas radicais e mesmo o ex-presidente e seu séquito. No STF, Dino não os anistiará nos julgamentos colegiados.
            Quanto à Isabel Gallotti, talvez ela concorde em reforçar a inelegibilidade de Bolsonaro e Braga Neto ao julgar ações ainda pendentes. E Lula já deu o tom ao negar indulto natalino aos réus do 8/1., gerando reação de certos jornalões.
            O Estadão defende anistia a réus que tenham cometido “crime menor”, como os “senhores com bíblias rezando”, já que o momento agora “está pacificado” e “não há mais clima para golpe”. Mas os vídeos não mostram inocência assim.
            Políticos bolsonaristas – correm risco de cassação, caso se confirmem incentivos ao terror em dezembro de 2022 e em 8/1. Vídeos em redes sociais porventura apagados são inescapáveis à inteligência das instituições investigativas.
            Talvez por isso tenhamos visto explosões raivosas de alguns deles contra colegas e populares em fins de 2023. O que pode piorar. Há exemplos já queimados judicialmente, como Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer, que já sinalizaram ter incentivado os ataques.
            A decisão de Lula e as recentes investigações e decisões judiciais envolvendo populares, empresários e políticos bolsonaristas sinalizam pela historicização do 8/1 como Dia da Infâmia, em referência aos  "dias da infâmia" de Pearl Harbor na II Guerra e da invasão do Capitólio por fanáticos trompistas em 2021, pouco antes da posse do eleito Joe Biden.
            E todos os citados envolvidos no 8/1 – políticos incentivadores, empresários financiadores, Bolsonaro mentor e os populares e militares partícipes – caso sejam condenados pela Justiça, serão designados nos livros de História futuros como os grandes infames contra a democracia.
            Enfim, que venha o justo e devido desfecho, para a moralização sociopolítica.

Sal Ross
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Lula vencerá o ódio evangélico?

            Em 2003, em seu primeiro mandato, Lula sancionou a lei que regulamenta a plena liberdade religiosa já prevista pela Constituição. Reeleito, em 2009 sanciona lei que reconhece o popular evento evangélico Marcha para Jesus.
            Criada por líderes pentecostais britânicos, a Marcha para Jesus foi importada pelo casal Hernandez para captar novos convertidos em locais públicos e, claro, mais grana. Famosos como Silas Malafaia e correlatos entraram no bolo popularizando o evento. Então, nos anos 2010 sopraram novos e sinistros ventos.
            Extrema-direita cristã – na era Dilma, a extrema-direita ganha espaço progressivo na política e se capilariza entre os cristãos. O mais atingido pela sua lábia foi o majoritário povo gospel pentecostal e neopentecostal, na figura de Jair Bolsonaro.
            Com pautas moralistas e “armas para os de bem” para “conter a criminalidade”, o bolsonarismo caiu na graça dos neopentecostais e pentecostais. As citadas Marchas ficariam mais populares, e também agressivas, elitistas e antipetistas.
            Nos preparativos, os sem-teto tinham seus parcos pertences tomados pelos PMs e guardas municipais, e eram expulsos para “dar passagem ao Cristo”, como diziam os fardados. A cena reportada na época revoltou diferentes grupos religiosos e sociais, inclusive evangélicos, e agora foi esquecida.
            Marchas “armadas” e cultos a Bolsonaro – no período 2019-22, as marchas gospels atraíram bolsonaristas de índole e ética duvidosas. Numa delas, estava o ex-presidente com pastores trilhardários num trio elétrico com uma gigantesca arma esculpida.
            A mensagem dessas marchas carnavalescas era clara: “armai-vos uns aos outros, como a ti mesmo”. Evangélico de esquerda possivelmente sofreria risco de vida nessas multidões enfurecidas.  Quiçá, até Jesus.
            Na corrida do 2º turno, pôsteres gigantes infestavam as paredes laterais, ou um telão no altar – com o rosto de Bolsonaro em algumas igrejas pentecostais e neopentecostais. Seus pastores até ameaçavam fiéis de expulsão ou praga se votassem em Lula.
            Em meio às orações, os pastores clamavam para votarem em candidatos bolsonaristas ao Congresso. Nas rezas, Bolsonaro era “o mito”. Foi como se ele tivesse pedido licença a Deus para ser louvado até a reeleição.
            Mas, tanto louvor de nada adiantou: Bolsonaro perdeu a eleição mesmo com as tentativas de fraude expostas no blog. Lula foi eleito e retorna ao poder após 13 anos afastado da atuação política.
            Reflexos na nova era Lula – Lula volta ao poder em meio ao clima de ódio bolsonarista, somado ao temor dos evangélicos com o “risco de as igrejas serem fechadas”, uma fake news criada durante a corrida eleitoral.  1 ano depois, Lula não fechou igrejas e estendeu a isenção tributária às instituições filantrópicas.
            Ainda assim, mesmo melhor doque Bolsonaro nas pesquisas de popularidade, ele permanece ruim ou péssimo para a maioria pentecostal e neopentecostal. Mas, vale saber um pouco da história anterior ao ódio bolsonarista.
            Ressentimento antigo – é fato que o bolsonarismo plantou no coração das gerações mais jovens do citado povo gospel. Mas nas já havia um compreensível ressentimento das gerações mais velhas com movimentos de esquerda.
            Criados por alianças de intelectuais, artistas e militantes católicos progressistas, os grupos da esquerda tradicional se afastaram aos poucos da base popular mais simples que acabou captada por evangelizadores pentecostais que atendiam às suas necessidades. 
            Claro que, ao menos em parte, tais evangelizadores tinham mesmo a intenção de crescer seu rebanho humano, seja por mera concorrência com a Igreja Católica, seja para ter poder econômico e político, o que acabou paulatinamente se sobressaindo nas últimas quatro décadas.
            Por outro lado, nem sempre a evangelização foi fácil, dada a intolerância e o dogmatismo de alguns, que causou a resistividade em parte do povo assistido, que se assumiria evangélico tempos mais tarde ou se manteria em outras fés.
            Intenção de Lula e PT – no novo contexto, Lula fez as primeiras tentativas de reaproximação com a galera gospel cooptada pelo bolsonarismo. Para tanto, pretende dissolver de vez as mentiras implantadas naquele ambiente, mas sabe que não será nada fácil lidar com uma galera tão grande.
            Essa galera é o único segmento dominante que ainda vê Lula negativamente. E para reverter o quadro, o presidente terá que planejar uma estratégia comunicativa tão eficiente quanto a criada pelos adversários. E há um nome governista que entende bem: André Janones, no momento suspeito de praticar "rachadinha".
            É possível que Lula esteja acompanhando a investigação do caso Janones, para que possa utilizá-lo no futuro na comunicação, caso o deputado consiga provar sua inocência. Agora é arriscado, devido ao estigma de corrupto – que levou o parlamentar ao Conselho de Ética,  que já não é lá confiável.
            Evangélico, Janones poderá ser a ponte ideal não só para dissolver o ódio que afasta um segmento  tão importante não só socialmente, o é também para o fortalecimento do futuro político da esquerda.

Para saber mais
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