domingo, 23 de junho de 2024

CURTAS 78 - ANÁLISES (Moraes e mídia; atual chão de fábrica)

 

Moraes x Lira: perigo no ar?

            Arthur Lira assumiu “poder extraordinário” ao se tornar presidente da Câmara e se manter. Entre 2019-22, ele praticamente governou com Paulo Guedes no lugar de Bolsonaro. Com Lula 3, ele mostra que não pretende abdicar do poder.
            Em 2021, à Folha de S. Paulo, a ex-esposa Julyenne Lins o acusou de violência doméstica e fazê-la de laranja. Outras mídias (Terra, Brasil de Fato, Mídia Ninja, Agência Pública) também publicaram a matéria. Mas tiveram troco.
            Censura – Lira acionou censura judicial às matérias comprometedoras. A Agência Pública foi condenada também em outra entrevista na qual Julyenne revelou que foi estuprada por ele. E tudo chegou ao STF.
            O relator Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Toffoli e outros colegas deram votos favoráveis a Lira o absolvendo de todas as denúncias, inclusa a de envolvimento no caso kits de robótica que seriam destinados a escolas de Alagoas.
            Recuo seletivo – em 20/6, em nova decisão, Moraes recuou da censura às publicações feitas nos jornalões. Mas a mantém sobre as mídias alternativas. Não se sabe, porém, se foi alegada distorção.
            Pioneira na entrevista (2021), a Folha de S. Paulo cedeu a matéria para as demais, que resenharam, mas seguem censuradas – o que poderia revelar na conduta de Moraes um problemático compadrio empresarial e político.
            Impeachment – segundo o jurista Walter Maierovitch, a seletividade de Xandão o coloca em sério risco de impeachment. Político, esse processo cerimonioso é realizado pelo mesmo Senado que sabatina ministros e PGRs indicados pelo presidente da República.
            Os princípios de impessoalidade e publicidade do art. 37 da Constituição permitem à imprensa expor atos institucionais e de autoridades ao conhecimento público, garantindo a liberdade de imprensa reforçada pelo sigilo da fonte quando necessário.
            Tal liberdade não permite especificação de veículos garantidos em direito, pois é democrática, salvo em conteúdos provadamente inverídicos, os quais chamam os veículos responsáveis à responsabilidade prevista em lei.
            Fria análise – os informes de Julyenne Lins e o caso dos kits educativos de robótica vieram a público pelo jornalismo investigativo. No primeiro, o mérito é da Folha, e os demais são da Agência Pública – ainda condenada pelo TJ-DF ao fechar de olhos do STF.
            Agência Pública e Intercept Brasil têm grande mérito investigativo, bem como De Olho nos Ruralistas, premiada pelos dossiês sobre empreendimentos agrários de Lira em 115 fazendas, várias delas não declaradas ao TSE no pós-reeleição, e algumas ocupando parte de terra indígena homologada por Lula.
            Apesar de seu mérito, essas mídias são independentes, subsistindo de assinaturas pagas dos leitores, e mais sujeitas à ofuscação pelos jornalões e/ou pela Justiça, em nome de interesses particulares que violam os citados princípios constitucionais.
            Sabemos que muito dificilmente Moraes será destituído de seu cargo no STF. Sua ação sobre a intentona do 8/1 o coloca em alta conta aos olhos de políticos e mesmo da imprensa. Mas seu risco rudimentar sumirá de vez quando for democratizar a informação, por mais comprometedora a alguém que esta seja.

Para saber mais
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O chão de fábrica da era digital

            A 2ª fase industrial (séc. XIX) se caracterizou pela manufatura a vapor e carvão, cuja produção massiva extenuava os trabalhadores hiperexplorados, que dormiam entre as máquinas no local. Surge aí o chão de fábrica, expressão de Marx e Engels, conscientizadores de classe.
            Na 3ª fase industrial (séc. XX), a divisão em turnos propiciou mais empregos e os capitalistas então criticaram a antiga expressão, e ainda o temo burguesia, que passou a ser visto como ofensa aos segmentos sociais mais abastados, “que geram empregos e riqueza”.
            Mas, mesmo agora na 4ª fase (era digital), as duas expressões sobrevivem e continuam virais entre os esquerdistas. Como não se dorme mais nas fábricas, elas realmente parecem estranhas, mas os militantes revelam como o próprio capital mantém seu sentido.
            Trabalho remoto – no atual estágio, o trabalho online à distância virou realidade, tanto para os chefes quanto para os subordinados em muitas profissões. Aufere mais conforto ao dar maior contato com os familiares. Só que ele tem os seus custos, e custos nada alvissareiros.
            Por exemplo, funcionários de TICs sabem do início, mas não do fim de sua jornada de trabalho. Eles já sabem que ela poderá durar muito mais horas, se a empresa exigir. A jornada longa pode não ser problema, mas sim o nível de compensação.
            Muito bom – o emprego de desenvolvedor de TI explora o poder criativo do profissional, pode ser executado à distância e os salários em geral são altos. Mas pode ser efêmero: muitos profissionais são free lancers.
            A compensação destes depende do empregador e da tarefa executada. Pois aquele pode não cumprir a palavra, e esta última ser antiética ou ilegal, como a criação de desinformação (notícias falsas e conspirações)., hoje bastante comum no ciberespaço, com exemplos conhecidos.
            Ódio ideológico – o Google banca plataformas especializadas em divulgar desinformação. Pertencente ao Facebook, a Meta recruta operadores para treinar IA na abordagem de temas sensíveis ou chatos, verídicos ou distorcidos.
            Contratada por Tarcísio de Freitas (SP) para “ensinar” em escolas periféricas, a plataforma Brasil Paralelo hoje é referência na formação de historiadores no Centro Universitário Ítalo-Brasileiro, e mira os cursos de Geografia e Ciências Sociais, que também poderão ser coordenados por Rafael Nogueira.
            Monarquista-bolsonarista, Nogueira presidiu a Biblioteca Nacional entre 2019-22. A referência à plataforma conspiratória no curso de História foi apagada após reportagem investigativa da Agência Pública. O que, esclarecemos, não significa um fim de contrato.
            Centavos – para essas tarefas, os ganhos variam muito. Os citados contratados da Meta recebem centavos por sua produção, não importa o tempo e a criatividade despendidos. Situação parecida possivelmente ocorre em outras plataformas.
            Fria análise – os robôs da indústria digital substituem com vantagem a antiga força bruta humana com autonomia programada por comandos operados pelos humanos. Mas, por trás desse aparente contexto de conforto, nem tudo são flores.
            Por trás do conforto, trabalhadores remotos ganham salário 25% menor, impactando aqueles de menores ganhos, sem influenciar na jornada de trabalho constada em contrato. Aliás, até pelo contrário.
            Com a nova CLT (reforma trabalhista), o contexto trabalhista brasileiro ficou instável: terceirizados temporários substituem aos poucos os trabalhadores estáveis, com direitos subtraídos. Muitos nem sabem disso: trabalhadores por aplicativo acreditam ser empreendedores, por influência dos jornalões.
            Por isso tudo podemos dizer que o contexto tecnológico e local do mundo trabalhista apenas transforma o entendimento da expressão “chão de fábrica”. E, em nome do capital, em relação ao patronato, o termo burguesia permanece exatamente o mesmo de 170 anos atrás.

Para saber mais
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sábado, 22 de junho de 2024

CURTAS 77 - ANÁLISES (mídia e governo, PL do aborto)

 

Grande mídia vs Lula

          Lula 3 vive sob tensão e pressão desde o início. Congresso hostil, bolsonaristas nos espaços de poder, um país destruído pelo governo anterior e, agora, ameaças do Centrão e reivindicações de servidores públicos. Para tanto, há um fomentador.
            Mídia – a mídia hegemônica presta importante papel nessa pressão heterogênea e constante. Ela estabelece verdadeiro embate com o governo em searas diferentes, desde a saúde, as relações institucionais, a comunicação e a economia.
            Saúde federal – já nasceu subinvestida, mas só agora a mídia a cobre, como novidade. Defasagem de pessoal (70% são inativos), desvalorização da carreira e piora das condições de trabalho são relatos comuns. E aí veio a ministra Nísia Trindade.
            Ela ouviu servidores cansados de serem acusados da crise. Mas os deixou de lado, pressionada por gestores e jornalões sobre a “melhora” da rede federal, revoltando quem trabalha. E agora, parte do INCA está na integração público-privada.
            Relações institucionais – a pasta responsável pela articulação política do governo com o Congresso e Judiciário tem à frente Alexandre Padilha, desafeto de Arthur Lira – relação explorada pela grande mídia, que apoia o Centrão privatista.
            Comunicação – o ministro do setor mais fraco do governo é Juscelino Filho, ferrado de escândalos financeiros. Lula conversou com o UB, que disse “não ter outro”. Daí o petista mantê-lo a contragosto. Mas os jornalões não o perdoam.
            Economia – é onde a mídia mais se apraz em maldizer do governo. Melhores índices socioeconômicos, a mídia acusa “sorte de Lula”, subestimando a competência da sua equipe econômica. E insatisfeita, ela ainda inverte valores.
            Os jornalões chamam de “gastos” os investimentos em serviços públicos essenciais, e de “investimentos” os subsídios para empresas e bancos – uma visão mercantilista na qual surgiu o arcabouço fiscal.
            Este é na prática um teto de gasto mais qualificado, que só passou no Congresso após sujeitar serviços públicos essenciais a cortes para suprir “as necessidades do mercado”, para evitar “excessos nas despesas com serviços públicos”.
            Outro texto modificado pelo Congresso, a reforma tributária visava mitigar a carga das classes populares e tributar a elite. A mudança aprovada mais moderniza a distribuição tributária vigente do que diminui a carga na patuleia.
            Não bastassem as isenções tributárias, o agronegócio foi contemplado com o plano Safra de R$ 450 bilhões e a alta do dólar gera mais lucro nas exportações. Mas a galera do agro é gulosa.
            Haddad na berlinda – mesmo com os investimentos, Lula e Haddad estão sob pressão máxima. Sabemos que o capital é o fator real das oscilações econômicas, mas, a mando do mercado, a grande mídia acusa uma fala de Lula ou do ministro.
            O representante da elite do agro prometeu um “tratoraço” a Brasília, dizendo que “esse governo não serve mais” – apesar do Plano Safra recorde acima de R$ 400 bilhões. Com toda a sua inteligência e competência, Haddad está na berlinda.
            A ameaça de deposição é uma aposta da grande mídia com o capital financeiro desde sempre. Nenhum governo no pós-ditadura escapou desse gesto seletivamente maior para a centro-esquerda do que para neoliberais como FHC e Bolsonaro.
            A recente alta do dólar que mantém juros a 10,5% anuais para controlar a inflação piorou o clima. Tramitam nos corredores a PL da anistia do 8/1, e o AI-5 de Lira que pode suspender arbitrariamente os mandatos de governistas para atingir Lula.
            Isso tudo pode destruir o fogo amigo necessário à blindagem de Haddad. Sem o ministro, o governo Lula pode perder a solidez ainda vigente e até ser deposto, e os jornalões estão de olho: o capital tem seus líderes – nada alvissareiros para a nação.

Para saber mais
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Uma perigosa cortina de fumaça

           Enquanto Lula teve uma passagem no exterior em novas costuras, o Congresso tocou o terror. No Senado, um teatro de terror, e na Câmara, a truculência bolsonarista se revelava na Comissão de Direitos Humanos.
           Apelidada de PL antiaborto ou do estuprador, a PL 1409/2024 capitaneada por Sóstenes Cavalcante já foi abordada no blog. Mas surge uma pergunta nos canais da esquerda: o debate dessa proposta veio mesmo em momento oportuno?
            Limites – o código penal de 1940 já legalizava interrupção da gravidez a qualquer tempo em caso de risco à vida da mãe e estupro. O STF incluiu a anencefalia fetal após debate com obstetras, psicólogos, psiquiatras, enfermeiros e outros.
            O risco à vida materna tem fatores internos (patologia em que a gravidez fornece risco ou cause expulsão do embrião ou morte fetal), e/ou externos (trauma mecânico, ambiente de radiação ionizante, ingestão química indevida).
            O projeto propõe criminalizar a interrupção de vida viável punindo vítimas adultas a até 20 anos de prisão, e menores à medida socioeducativa (nome belo de uma prática horrível) até completar 18 anos. É uma anistia ao crime sexual.
            A interrupção sem motivo comprovado em laudo ou B.O é crime de até 3 anos de prisão. Aí, o Brasil é mais limitante do que Cuba, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa (legislação da França), Uruguai e Argentina. México discute liberar.
            Tais limites se ligariam a fatores cultural-religiosos. Mas as nações citadas também surgiram em contexto parecido. O que nos diferencia delas é como investimos na educação sexual – pauta para outro artigo, pois o problema aqui é outro.
            Oportunismo político – a PL do aborto surgiu num contexto em que outras propostas de maior interesse estão em discussão. Ambas têm caráter essencialmente político e, se aprovadas, sua prática impactará muito a nação.
            Resolução 09/2024 – apelidada de AI-5 do Lira, ela propõe suspensão temporária de mandatos por indecoro pela mesa diretora da Câmara sem passar no Conselho de Ética. Risco: pode alvejar governistas para atingir o governo Lula.
            PL 5064/2023 – propõe anistiar acusados e condenados por atentado ao Estado democrático de direito (art. 359-L) e golpe de Estado (359-M do código penal de 1940). Risco: retorno político de Jair Bolsonaro e de futuro mais sombrio.
            Mas, o que tem a PL do aborto com isso? Muito. Como as bancadas do boi e da bala, a bíblica é bolsonarista e joga os evangélicos contra Lula com fake news. Vota contra medidas progressistas e se aproxima de Arthur Lira por privilégios.
            Fria análise final – a PL do estuprador surgiu em meio ao debate público invocado pela viralização do vídeo de alerta do deputado Glauber Braga (Psol-RJ) sobre os perigos subjacentes à proposta de Arthur Lira e a de anistia. Foi ele quem apelidou a primeira de “AI-5 do Lira”.
            Embora restrita à Câmara (regimental), a proposta de Arthur Lira poderá impactar a política nacional. O risco ao selecionar alvos governistas reside na relação tensa entre Lira e os ministros Haddad e Padilha.
            Antes da tensão com ministros, Lira pareceu ameaçar o governo ao exigir “mais respeito à Câmara”, em outras palavras. Sentindo nisso ameaça de deposição, Lula respondeu: “não sou Dilma”, se referindo à falta de malícia da ex-presidenta.
            Nesse ambiente político, a PL do estuprador virou uma cortina de fumaça para que oportunistas ajam nas sombras até a sonhada queda de Lula a partir da saída de Haddad. E na possível era de direita liberal ou extremista, grávidas por estupro poderão ser penalizadas.

Para saber mais
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quinta-feira, 13 de junho de 2024

CURTAS 76 - ANÁLISES (as várias mordaças)

 

Mordaças escolares

            Quando não foi mais possível apoiar Bolsonaro com tanta evidência criminal, governadores bolsonaristas do Sudeste, Sul e Centro-Oeste preferiram ter prudência na proximidade com o ex-presidente, que luta na justiça pela reelegibilidade.
            Alguns se aproximam da mídia neoliberal posando-se de moderados, como Tarcísio, convidado por Luciano Huck a jantar com Campos Neto. Mas algumas condutas os condenam, como inimigos dos servidores públicos.
            Vigilância – a onda de ataques de ódio (2023) foi o mote político dos governadores estaduais para lançar suas medidas de segurança nas sedes de ensino. Vieram 3 delas: PMs armados, ferramentas de IA e sedes cívico-militares.
            Temporariamente, a segurança policial e a IA de reconhecimento facial são medidas válidas. Além de afastar gente mal-intencionada, as medidas, porém, se tornaram importantes em revelar outras intenções dos governadores.
            Emoções vigiadas – a escola é um espaço onde relações diversas vazam reações que variam desde o calmo bate-papo ao exaspero emocional em diálogos conflitivos relativos, por exemplo, a condições de trabalho e salário. Até aí, normal.
            Mas alguns governos resolveram intervir ao verem reações de professores e alunos monitoradas por câmeras com IA. Tarcísio (AP) decretou aulas por ChatGPT, e Ratinho Jr (PR) manda a PMPR descer o cacete no lombo dos grevistas.
            Caiado (GO) decretou censura de acesso a informações sobre ilícitos ambientais do agro para impedir debates nas aulas. Zema (MG) usa reconhecimento facial e “X9” de confiança para impedir críticas ao seu governo.
            Sedes cívico-militares – a conversão em escolas cívico-militares ocorre em sedes consideradas modelos. Sua intenção não é melhorar o ensino, e sim, a imposição de uma disciplina mais rígida, ao estilo militar, a toda a comunidade escolar.
            Além de docentes, alunos, funcionários e corpo gestor, comunidade escolar abrange as famílias dos alunos e o bairro onde a sede se insere. Os governantes sabem disso, daí a militarização escolar poder monitorar toda a comunidade.
            Fria análise – a “segurança para melhor ensino” não passa de engodo dos mandatários para, na verdade, mordaçar. O melhor ensino é aquele que permite a informação verdadeira e ampla, algo evitado pelos políticos e pelo capital.
            Limites ao conhecimento sempre houveram, o que muda são os meios. As redes sociais e IA são novos reforços. Até a multiplicidade de informações disponíveis na internet se sujeita a limitações pelas big techs. Isso 
não importa, se é na democracia ou num regime totalitário qualquer.
            O ChatGPT paulista e o reconhecimento facial são meios pelos quais o ensino é forçosamente reduzido a informações sem o democrático debate crítico, em como para persecução política de servidores como em MG, GO, PR e SC.
            Militar e/ou tecnológica, a atual mordaça reflete o ideológico Escola sem Partido, reduzindo a escola a ambiente que, ao invés de propiciar novas experiências, poderá retomar a velha e difícil evasão epidêmica, que pode minar perspectivas futuras para milhares de jovens pelo Brasil.

Para saber mais
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Mordaça midiática

            A ditadura empresarial militar foi nefasta na nossa República. Até elogios o povo temia fazer, por medo de represália, pois era proibido comentar sobre política. A imprensa “oficial” era sujeita ao crivo constante dos censores.
            Para a imprensa, a redemocratização foi um alento, pois poderia ir além de receitas culinárias, fofocas de celebridades e tantas páginas de classificados e esportes pouco populares na época. Mas ainda faltaria alguma coisa.
            O que se pode dizer – a vigente Constituição federal-1988 ainda prevê a liberdade plena de imprensa com proibição da censura aplicada na ditadura. Mas, ao menos no Brasil, ainda verificamos uma mídia hegemônica que ofusca as demais.
            O motivo mais compreensível dessa ofuscação é o temor de concorrência: com a internet, fontes alternativas estão mais acessíveis pelo grande público. Talvez seja também a perda de domínio, pela diferença de versão de um fato.
            A desigualdade entre mídia hegemônica e alternativa no conhecimento público motivou petistas a propor regulação da imprensa, no intuito de democratizar a informação para combater desinformação. Mas a grande mídia a vende como censura, ideia negada pelo PT.
            Mas há um problema maior no nosso jornalismo. Enquanto algumas fontes alternativas vivem de doação pública e outras se ligam a meios políticos, a grande mídia se domina pelo mercado, que determina o teor das matérias.
            Vale citar dois grandes exemplos na grande mídia: as críticas a governos petistas em temas sociais e econômicos; e o apoio (agora velado) a Israel e à Ucrânia nas vigentes guerras no Oriente médio e na guerra russo-ucraniana, respectivamente.
            As posições da grande mídia refletem a dos grandes capitalistas que a controlam, assim como acontecem com fontes ligadas a partidos políticos, que reportam sem ferir os desígnios destes. Isso é democrático? Não como desejaríamos.
            Mordaça invisível – a nossa legislação democrática garante a liberdade de imprensa e nos propicia uma aproximação virtual com o mundo político. Mas alguns políticos usam a justiça para censurar matérias capazes de melindrar o seu poder. E vale dizer: isso pode não ser iniciativa deles.
            Fenômeno global, o sufoco da mídia alternativa pela hegemônica se liga mais ao interesse capital do que ao temor de concorrência. Mesmo a alternativa afim, de fácil acesso online, sofre sufoco metódico para manter o domínio capital e controlar o teor das mentiras.
            Tal domínio afeta até como agências de comunicação da ONU reportam as restrições à liberdade de imprensa pelo mundo. Talvez nem regimes totalitários escapam dessa mordaça invisível que nos revela ser o pior desafio para o nosso governo pela sonhada democratização das mídias.

Referência
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Mordaça ideológica

            2016. Uma série de entreveros políticos e judiciais mordaçou o governo Dilma Rousseff  num golpe parlamentar e levou ao sucesso do crime judiciário da Lava-Jato que levou Lula à prisão. Nessa esteira, o bolsonarismo se fortaleceu e foi eleito em 2018 para presidir o país.
            Em 2023, o bolsonarismo fez escola. Mídias independentes de jornalismo investigativo tiveram que apagar matérias comprometedoras à imagem de políticos e religiosos poderosos. E agora, a escola está indo mais fundo nos corredores do Congresso, com indecoros históricos.
           Seletividade – os bolsonaristas lideram as piores baixezas no Congresso, mas os mais processados no Conselho de Ética têm sido os governistas, como as seis deputadas da esquerda, Glauber Braga e André Janones.
            Parte da patuleia já percebeu essa seletividade. Mesmo minoritários, parlamentares de esquerda compensam com o bom combate incomodando o mesmo mercado que financia e controla os da direita e extrema-direita, e a grande mídia.
            O exemplo mais recente de incômodo na bolha envolveu um governista em julgamento final de processo.
            Janones – na legislatura passada, um ex-assessor de André Janones o denunciou por suposta rachadinha. O governista se defendeu com evidências de má-fé do denunciante e, após fala de Boulos, foi absolvido por votos da maioria presente.
            Os bolsonaristas Nikolas Ferreira, Zé Trovão e Éder Mauro partiram para cima de Janones com gritos em fúria. Na saída, a Polícia Legislativa Federal (PLF) foi acionada e conteve Janones e Nikolas, que iam se estapear.
            Os bolsonaristas tinham visto na denúncia a oportunidade para queimar mais um governista, mas se ferraram. Antes de Janones, as deputadas contrárias ao Marco temporal foram absolvidas uma a uma. Falta Glauber ser absolvido no caso Costenaro.
            Propostas ideológicas – há também exemplos que desejam calar as posições contrárias através de propostas de lei.
            PL andi-delação – propõe impedir delação premiada de presos. Mas, segundo o texto, ela não afeta as delações já homologadas, consideradas provas materiais contra pessoas delatadas. Ainda aguarda votação na Câmara.
            PL 1409/24 – a legislação vigente considera estupro, risco à vida da mãe e teratogenia letal como motivos para aborto legal. A ‘PL do estupro’ compara aborto a homicídio e prevê prisão de até 20 anos para quem abortar. Foi aprovada a urgência para votação.
            AI-5 de Lira – dá ao presidente da Casa poder de suspender em até 6 meses mandatos por indecoro, sem passar pelo Conselho de Ética. Apelidado de AI-5 de Lira pelo contrário Glauber Braga, a pauta teve aprove relâmpago em duas votações, inclusive de parte da esquerda.
            PEC das Praias – teve amplo primário na Câmara, inclusive com orientação de alguns partidos de esquerda, alcançando 377 votos, mais do que os 308 mínimos. Essa PEC já foi abordada em artigo já publicado aqui.
            Fria análise – a agressividade é a frustração dos bolsonaristas com a absolvição dos governistas no Conselho de Ética. Mas agora eles acenam ao projeto de Lira, cuja urgência teve aprove relâmpago, com ajuda de muitos nomes da esquerda.
            Como Braga pontuou, a crença em possível freio à violência é ilusória: Lira poderá usá-la contra adversários governistas para ferrar Lula e favorecer Bolsonaro – exatamente como o real AI-5 empoderou generais e endureceu o terror.
            Se delação é essencial no combate à impunidade, a PL anti-delação é uma afronta a essa segurança que já não é 100%, a julgar pelos interesses de alguns. Lira a defende, no intento de beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro para o retorno da extrema-direita no Executivo.
            A PL do estupro pretende reforçar a blindagem comum ao crime repassando às vítimas a carga da culpa que não é sua. Nisso reside o interesse de reacionários que possivelmente fizeram algo similar na vida pregressa. Mas, muita calma nessa hora.
            Há inconstitucionalidades na maioria destas e outras pautas dos congressistas neoliberais, muitos destes reacionários. A proposta antiaborto e a anti-delação são as de mais difícil aprove final. Diante da ameaça global no momento, cabe ao STF, como guardião constitucional, evitar a pior mordaça ideológica do pós-ditadura.

Para saber mais
- https://www.youtube.com/watch?v=OH0C1SoB5r4 (O Historiador – PL de Lira para facilitar golpe contra Lula)
- https://www.youtube.com/watch?v=wm_O6_5UESA (Mídia Ninja – Lira infla seu próprio poder, legislações e outras propostas debatidas na Câmara)
- https://www.youtube.com/watch?v=j1WISy66SB0 (UOL – Maierovich : “delação é fundamental para combater impunidade:”)
- https://www.youtube.com/watch?v=dgw_S1RcrMo (Meteoro Brasil – aprovada na Câmara urgência de projeto que suspende mandato por indecoro)
- https://www.youtube.com/watch?v=C4uJDSxo4xY (MyNews e O Historiador – entenda a proposta de resolução com urgência aprovada na Câmara)
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CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...