Análise: Agricultor à moda Bolsonaro
Um costume comum em países como o Brasil é o de se escolher um dia especifico para homenagear diferentes tipos de profissionais, como o do professor, da secretária, do servidor público, do médico e assim por diante. Não saiu diferente para o agricultor, cujo dia se comemora em 28 de julho.
A Secretaria de Comunicação do governo Bolsonaro então publicou a sua homenagem ao produtor rural com direito a um discurso do presidente. Em seguida, o presidente postou essa publicação no seu Twitter, logo chamando a atenção da geral, pela ilustração do vulto de homem de perfil portando um rifle.
Essa ilustração foi o bastante para causar repercussão nas redes sociais a partir do próprio Twitter, depois no Instagram e no Facebook. Foi uma saraivada de comentários críticos porque a figura em si não retrata necessariamente um agricultor. "É um jagunço", revelaram alguns internautas.Olhares da repercussão
As críticas se seguiram por dois motivos básicos. O primeiro foi mais óbvio, em que a ilustração não correspondia à de ambiente agrícola; e o segundo, por motivações basicamente políticas. Também se pode mencionar uma terceira vertente, que pode ser explicada na linha psicológica. Vamos falar de cada um.
Na escola aprendemos que Agricultura é atividade econômica abrangendo a lavoura (plantação) e pecuária (criação de gado, piscicultura, carcinocultura1, etc.), pelos latifundiários (de grande porte), cooperativas diversas2, e médios e pequenos produtores.
Reflexo histórico da colonização nos ciclos de cana-de-açúcar, café e criação de gado, o latifúndio hoje produz para exportação soja, milho, café, proteína animal, cana-de-açúcar e outros, e é poupado de impostos pelo governo via Lei Kandir3. A exportação o torna alvo da apologia midiática e política.
Cerca de 70% dos alimentos provêm de produtores familiares, cooperativados ou não. E a maior produção de orgânicos da América Latina é do malvisto MST, o resto por cooperativas sustentáveis. O que a geral desconhece devido à politicagem estendida aos grandes grupos midiáticos e varejistas. Os orgânicos tão caros nos supermercados provêm das cooperativas.
Em 2018, a Câmara aprovou a PL que restringe a venda de orgânicos no varejo por produtor rural cadastrado pelo governo, ainda não sancionada. Detalhe: a maioria dos MST é cadastrada, mas vende seus produtos apenas a pequenos varejistas específicos e feiras próprias, por pressão política.
Bolsonaro endossou a politicagem contra o MST ao cortar recursos destinados a eles, alegando que "a propriedade privada é sagrada" e "acabará com as invasões". Aliás, ele estagnou a reforma agrária. O autor daquela PL nem precisa se preocupar mais.
A psicologia explica a ilustração: reflexões finais
A ilustração do homem segurando o rifle na homenagem do governo gerou muitas especulações no campo psicológico. Campo esse que pode ser explicado no cunho sexual, como Freud já abordou em suas teorias, ou então na demonstração de poder dominante em dado local ou setor.
Freud disse que objetos cilíndricos e alongados, como bengala, cabo de guarda-chuva ou cano da arma de fogo, repassam uma perspectiva sexual simbólica. Faz sentido. Se o cabo do guarda-chuva e a bengala lembram pela forma, o cano da arma já relaciona fisiologicamente ao "ejacular" a bala, tal como o "disparo" do esperma.
A conotação com a demonstração de virilidade e de poder se revela também no comportamento de se colocar a arma na cintura, por exemplo, e sempre a mostrar o coldre aparente em certos momentos. Essa conduta é, aliás, muito observada na família Bolsonaro, em andanças nos corredores públicos.
Aliás, em se tratando de Bolsonaro, a relação simbólica da arma de fogo com a virilidade se viu no casamento do 03 Eduardo: ele ostentava presilha de gravata em forma de fuzil, além do coldre aparente na cintura. Estranhamente, a alegação de ser delegado da PF - função nunca exercida na prática - não colou.
Outro sentido empregado na figura do "agricultor" com rifle foi analisada por Paulo Ghiraldelli como de poder e domínio, para eliminar indesejados (indígenas, MST e outros posseiros). A arma vira instrumento de não-reconhecimento do outro e mais um símbolo negativo do agro que mata com bala e veneno.
Esse "agricultor" armado, que caça e mata para se apossar e dominar a área, se configura como outra definição talvez narcísica dos Bolsonaro, pois se revela tal como a extrojeção da própria imagem que a família faz de si, a partir da sua mórbida fixação quase sexual por armas.
Enfim, nessa publicação, finalmente excluída após a saraivada de críticas e chacotas, os Bolsonaro se revelaram na sua psique mórbida e caótica, passada de pai para os filhos. Uma psique marcada por narcisismo que chega ao orgasmo através da instalação do caos. A partir da arma, por qualquer um, em qualquer lugar.
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Imagens: Google (montagem: autoria do artigo)
Notas da autoria
1. Criação de camarão.
2. São áreas de produção diversa criadas por vários produtores. Podem ser patrocinadas por empresas agrárias ou não, ou por união de pequenos produtores que reúnem suas produções. As sustentáveis produzem orgânicos.
3. Lei aprovada e vigorada pelo governo FHC em 1996. É muito criticada por não abranger demais produtores até hoje.
Para saber mais
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2018/08/mst-e-crise-agricultura-organica.html
- https://ocorreio.com.br/em-decreto-bolsonaro-muda-a-definicao-de-agricultor-familiar/
- http://www.justificando.com/2018/07/04/camara-aprova-pl-da-restricao-de-organicos/#:~:text=O%20texto%20do%20PL%20da,agricultor%20familiar%20cadastrado%20pelo%20governo.&text=Atualmente%2C%20a%20venda%20pode%20ser,mercadoria%20tenha%20o%20selo%20SisOrg.
- https://economia.ig.com.br/2021-05-10/bolsonaro-verba-mst.html
- https://www.youtube.com/watch?v=feRQGgP-XOk (Bolsonaro escancara a ordem de matar - Paulo Ghialdelli)