quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Análise: CPI e a Auschwitz Prevent

        Desde o seu início, a CPI coletou dados que revelaram as reais intenções do governo na emergência da C19, extensiva a todo o espectro amplo do SUS, em falta de respiradores, testes e medicações e depois, pelos atrasos na vacinação.
        Protocolos do MS criados por gente estranha do gabinete paralelo, negociatas bilionárias com muitos intermediários suspeitos com inexistentes vacinas e muita propina... o maior escândalo imoral da história da República parou na CPI.
        Mas, como se não fosse suficiente, vazaram denúncias de médicos da operadora de plano de saúde Prevent, que chegaram à CPI como dossiê anônimo. O inimaginável (para muitos) seria revelado a público.

Prevent Sênior: ontem e hoje

        A Prevent Sênior é uma das muitas operadoras de plano de saúde surgidas nos anos 1990, fundada em São Paulo pelos irmãos Eduardo e Fernando Parrillo, focando-se na clientela de terceira idade, de início fornecendo ambulâncias e depois, o tratamento médico, com preços mais acessíveis.
        Antes exclusiva em São Paulo, a Prevent Sênior atua hoje em Brasília, Curitiba e Porto Alegre, tendo maior campo de ação. Hoje, dos 456 mil clientes, 346 mil têm mais de 61 anos, e atende os mais jovens, em geral dependentes dos clientes mais antigos. Fatura hoje perto de R$ 4 bilhões.
        Em 2019, a empresa estava em quinto lugar entre as operadoras de plano de saúde destacadas em São Paulo, sede do hospital Sancta Maggiore. Como toda empresa doramo, ela recebe reclames, no Procom ou na Justiça comum. Tudo bem aí, até chegar a sindemia de C19, em 2020.
        Quando a sindemia começou a se agravar, o Sancta Maggiore se tornou uma referência em C19 na saúde privada. Mas, já criticado pelo ex-MS Henrique Mandetta, passou a ser investigado pelo MP-SP por suspeita de omissão de mortes pela C19, em abril de 2020.

        Pedro Benedito Batista Jr.- médico e diretor-executivo da Prevent Sênior, atua na direção do Sancta Maggiore. Por conta da citada investigação e crítica de Mandetta, Pedro alegou falha no acesso ao monitoramento epidemiológico de SP. O inquérito foi arquivado 4 meses depois.
        Em abril, estudo inconcluso na Prevent afirmou que a soma de hidroxicloroquina e azitromicina1 reduziu as internações de suspeitos de C19. Duramente criticado devido aos erros metodológicos e de amostragem, o estudo não foi publicado em nenhuma revista científica, mas foi elogiado por médicos cloroquiners e pelo próprio Bolsonaro.
        Tendo iniciado em março e recebendo autorização da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) em abril, o estudo depois acabaria sendo suspenso pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), alegada fraude científica. 
        Ainda assim, diante do silêncio do CFM, os elogios a este e outros "estudos" desse naipe seriam contínuos, mesmo sem evitar nenhuma morte, e com sequelas medicamentosas graves. Podem saber, de graça esse elogio não é.
        No corrente setembro/2021, Pedro Benedito foi convocado pela CPI para explicar sobre os fatos expostos em dossiê anônimo enviados por ex-profissionais de saúde da Prevent Sênior. Pedro negou sobre a exclusão da C19 em mortes de internados testados com os supramencionados fármacos e outros fatos, mas caiu no cerco de Randolfe Rodrigues.

Fatos que lembram Auschwitz

        O conjunto de fatos mencionados no dossiê, se destacaram trabalho exaustivo sem EPIs, ameaças da direção, hino nazista de banda de rock dos donos da operadora no início do dia, etc. O depoimento da advogada dos denunciantes, Bruna Moratto, revelou detalhes macabros.
        Trabalho sem EPIs- os profissionais de saúde eram obrigados a trabalhar sem EPIs, em contato direto com os doentes de C19. Por conta disso, natualmente muitos deles adoeceram e mesmo doentes eram obrigados a trabalhar arriscando-se a contagiar os colegas e pacientes sãos, devido às ameaças.
        Ameaças- pesadas e com slogans nazistas, como atestam inúmeras mensagens em mensageiros instantâneos como whatsApp e Telegram, as mensagens eram feitas pela direção para os funcionários estentendo-se às famílias dos mesmos, por qualquer motivo, como falta ao trabalho, a suspensão do kit e incluir C19 como causa mortis em vítimas tratadas com o kit.
        A demissão de alguns médicos foi voluntária, motivada pelas ameaças. Estes formaram o grupo que, representado pela advogada Bruna Morato, enviou o dossiê à CPI.
        Testes- cerne da barbárie detalhada no dossiê, os testes não se resumiram à imposição do kit-C19, há outros a serem enumerados aqui. Os testes eram impostos pela direção da direção da operadora, sem autorização dos familiares que, claramente, não recebiam informações sobre os mesmos.
        Kit-C19- inicialmente era somente a soma de cloroquina (e hidroxi-) e azitromicina. A vitamina D e a dipirona, esta ainda usada em dor e febre, vieram depois. No início da C19, o kit foi aceito devido a primeiros estudos com suposta imunomodulação por cloroquina e redução infectiva por azitromicina. Esses resultados foram refutados em repetidos estudos posteriores, publicados em canais científicos.
        Só agora se soube que os estudos da suposta eficácia de cloroquina, ivermectina e azitromicina, propalados pelos cloroquiners na CPI, na verdade, eram os da Prevent Sênior, não publicados, mas usados como referência pelo estranho pessoal do gabinete paralelo.
        Ozonioterapia retal- trata-se de aplicação de doses de ozônio por via retal. Idiotice inventada por prefeito de Itajaí (SC), causou polêmica ao ser assimilada pelo MS, segundo a mídia na época. Parte opcional do kit, seu uso era imposto pela direção da Prevent Sênior. Merece artigo em separado.
        Células-tronco mesenquimais (CTM)- foi usado pela Prevent Senior para tratar casos graves, antes da primeira publicação científica, um ensaio clínico duplo-cego, sobre o CTM pelo Diabetes Research Institute e Universidade de Miami, em junho de 2021. 
        Este ensaio verificou a possibilidade de diminuição de mortes com uso de CTMs para recuperar pulmões seriamente comprometidos pela C19. Autorizado em 2020 para experiência, a pesquisa só foi publicada em 2021. Já o feito da Prevent nunca foi publicado.
        Gabinete paralelo- tema apontado desde o depoimento de Pazuello. Segundo a advogada Bruna Morato, ele surgiu como alternativa à recusa do então MS Mandetta em aceitar médico vinculado à operadora. Citou o dr. Pedro Benedito, diretor-executivo da Prevent, que apresentou os médicos desse gabiente. 
        O gabinete paralelo foi criado pelo virologista Paolo Zanotto, professor da USP licenciado desde junho para o Canadá, estranhamente coincidindo com o vazamento midiático. Outros médicos fazem parte da equipe, entre eles Nise Yamaguchi e Anthony Wuong, vítima fatal da C19.
        Papeis dos médicos- o proctologista Wuong autorizou a ozonioterapia; o virologista Paolo Zanotto informava sobre o Corona e Yamaguchi sobre resposta imune. A Prevent entrou para contribuir nas ações junto a essa equipe.
        Detalhe: a imposição contínua do kit-C19 mesmo após provada ineficácia, ozonioterapia e outros testes já citados, bem como o App extinto TrateCov, foram coisas do gabinete paralelo, que fez a proeza de reduzir o MS a uma espécie de zumbi para formalizar a coisa toda. É macabro.
        O senador petista Rogério Carvalho classificou os testes como "só comparáveis ao visto na II Guerra Mundial", em alusão a testes macabros de Joseph Mengele, em campos de concentração da SS nazista, nos quais mais de 6 milhões de pessoas morreram e os sobreviventes sequelados.
        

Alinhamento com Ministério da Economia
        A advogada Bruna Morato revelou que o gabinete paralelo "é totalmente alinhado ao ministério da Economia", bem como à Prevent e ao ideal de Bolsonaro contra o isolamento social: "essa aliança tinha um nome: hidroxicloroquina".
        Muito dinheiro foi investido nessa história. A Prevent Sênior foi bem paga para contribuir com a equipe do gabinete paralelo contra o necessário lockdown, usado por muitos países para conter o espalhe da pandemia. A fonte do pagamento, muito possivelmente, foi o BNDES.
        "Segundo informações, o dr. Pedro2 foi informado que existia um grupo de médicos assessorando o governo federal e que esse conjunto estaria totalmente alinhado ao ministério da Economia", disse. Ainda emendou que, para Bolsonaro e Luciano Hang, "eleições primeiro, a vida a gente vê depois".
        A última frase também chama a atenção pelo fato de comprovar que Hang vem atuando, junto a grupos aliados paralelos, em incentivo à intensa campanha de reeleição que marca o governo desde, pelo menos, as primeiras mortes pela sindemia ainda concentrada no Sudeste, em 2020.
        O alinhamento de toda essa gente ao ministério da Economia revela o quão explosivo se mostra o depoimento de Bruna Morato. E tão arriscado também: ela contou que o escritório dela foi arrombado na procura do dossiê desde as primeiras denúncias, e acredita ser gente da Prevent Sênior. Daí ela ter solicitado ao Senado segurança por sua vida e de sua família.

Reflexão final
        Diante de tanta coisa exposta pela advogada Bruna Morato, representante dos denunciantes contra a Prevent Sênior, o dossiê é encarado com extremo carinho e cuidado pela cúpula da CPI, que em sua fase final, sob intensa pressão, se endurece em busca de mais detalhes.
        Vários pontos tornam o depoimento de Morato tão valioso quanto explosivo: revelou a face mais escrota e decrépita dos protagonistas nas empresas e nos ministérios da Saúde e Economia. E, claro, do Palácio do Planalto.
        O depoimento de Morato sobre o alinhamento nefasto do gabinete paralelo com a Economia de Paulo Guedes se deve à extrema prioridade focada na sustentação do anarcocapitalismo.
        Se Rogério Carvalho comparou apropriadamente os testes da Prevent Sênior aos testes macabros de Mengele, a conjuntura dos fatos, a saber pela intenção, caráter e alinhamento ideológico dos atores ao bel-prazer nazifascista de Bolsonaro, sobrevém a pergunta: o campo de concentração se limita às unidades da Prevent Sênior, ou o Brasil inteiro virou um campo de Auschwitz?

----
Imagem: Google

Notas da autoria
1. Os fármacos passaram a compor, com dipirona e vitamina D, o famigerado kit-C19, comprovadamente ineficaz contra a virose, mas usado para promover a mortandade como tampão dos interesses escusos.
2. Pedro Benedito Batista Jr., médico e diretor-executivo da Prevent Sênior, citado em artigo anterior.

Para saber mais
https://pt.wikipedia.org/wiki/Prevent_Senior
- https://g1.globo.com/politica/cpi-da-covid/playlist/videos-cpi-da-covid-ouve-pedro-benedito-batista-junior-diretor-da-prevent-senior.ghtml
- https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/09/28/advogada-aponta-pacto-da-prevent-senior-com-gabinete-paralelo-para-evitar-lockdown
https://brasil.elpais.com/brasil/2021-09-28/abismo-da-prevent-senior-se-amplia-com-depoimento-de-advogada-a-cpi-e-ameaca-tragar-governo-bolsonaro.html
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4952234-advogada-prevent-senior-obrigava-medicos-a-cantarem-hino-da-empresa.html
- https://saude.abril.com.br/medicina/ozonioterapia-pode-tratar-covid-19-entenda-a-polemica/
- https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/01/05/celulas-tronco-pode-reduzir-o-risco-de-morte-por-covid-19-diz-estudo.htm
- https://www.cnnbrasil.com.br/saude/celula-tronco-e-usada-contra-covid-19-mas-especialistas-fazem-alerta/
- https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/06/09/virologista-que-teria-integrado-gabinete-paralelo-do-ministerio-da-saude-recebe-autorizacao-da-usp-para-morar-no-canada.ghtml
- https://revistaforum.com.br/politica/advogada-de-medicos-detalha-gabinete-paralelo-que-agia-totalmente-alinhado-ao-ministerio-da-economia/
https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/09/analise-odio-desafio-da-cpi.html

sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Análise: ódio, desafio da CPI

        Enquanto o presidente Jair Bolsonaro passa reveses raivosos em Nova Iorque por conta do Encontro anual da ONU e Paulo Guedes continua na surdina acompanhando a votação das suas sonhadas propostas de desmonte estatal, a CPI da C19 continua a todo vapor.
        A todo vapor mesmo, tanto pela vontade da cúpula da comissão, que deseja consertar seus próprios deslizes em novos depoimentos via reconvocação de depoentes que negaram colaborar, quanto dos abusos de depoentes pelo direito ao silêncio e ameaças dos Bolsonaro.
        Tendo retornado após o recesso de julho, senadores da CPI ainda deparam com a continuidade da série de abusos já conhecida deles, em especial o do silêncio concedido parcialmente1 pela justiça e numerosas mentiras e distorções.
        Percebe-se que certa impaciêcia na tribuna diante dos abusos, mas ninguém quer arregar. E estão certos, uma vez que desejam ir a fundo para mais provas além do volume já recolhido pelo relator Renan Calheiros - mais disposto do que nunca a desmascarar os próximos abusadores.
        Mas, agora, os senadores envolvidos diretamente com a CPI estão diante de mais um abuso: as ameaças e afrontas diretas.

Afrontas e ameaças dos Bolsonaro

        A CPI tem sido afrontada desde o seu início, nem sempre de forma direta. E os seus principais autores são, diretamente, os Bolsonaro. O presidente tentou desmoralizá-la para seu fã-clube. Eduardo fazia o mesmo na Câmara, Carlos mexia com fake news e Flávio tem tumultuado.
        Por ser senador, Flávio foi direto, com tumulto, olhar intimidador e até ameaças veladas. Depoentes mais dispostos a falar sofreram. Carlos Wizard se viu tão intimidado que se silenciou bem e fez verborreia com sermões bíblicos, que foram explorados por Simone Tebet para desarmá-lo. 
        Na sua segunda aparição na CPI, o ex-MS Pazuello abusou da mentira. Além de servir para sair da reta, serviu para acalmar Flávio, que tumultuava o tempo todo, ao ponto de Renan interferir para ser chamado de vagabundo, e responder à altura, calando o colega. Renan era o alvo dileto do abuso.
        Flávio usou o tumulto quando a intimidação com o olhar não era exitosa o bastante. Mas a sua verborreia foi por vezes calada, pelos sermões de Omar Aziz, presidente da CPI, ou por outros colegas impacientes e cientes das suas intenções. 
        Mas dois depoentes foram indigestos para Flávio: os ex-aliados e agora desafetos deputado Luiz Miranda, e ex-governador do RJ Wilson Witzel. Sem se intimidarem, foram peças-chave em jogarem muito dejeto no ventilador, inclusive envolvendo diretamente os Bolsonaro nas tramoias.
        Witzel chegou a desafiar Flávio na tribuna durante tumulto. Após depoimento público, explorado neste blog, expôs mais coisas em reservado e ainda solicitou aos senadores proteção para si e sua família, pois conhece bem as influências da família.
        Jair Renan- o filho 04 do presidente da República tem sido alvo de olhares investigativos devido às ações empresariais para lá de suspeitas. A começar pelo número de empreendimentos, superior à sua própria idade, conforme revelado pelo canal Meteoro Brasil, no Youtube.
        Daí se compreender por que ele é investigado por tráfico de influência. E, como se não bastasse, o próprio postou vídeo à vontade em seu quarto, mostrando uma maleta com armas dirigindo-se para a CPI, com um sorriso cínico. Foi claramente uma ameaça.
        Diante dessa afronta, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) protocolou convocação de Jair Renan para depor na CPI. Ele é apontado em alguns depoimentos já relatados como estando por trás de empresas partícipes de negócios obscuros com o MS. 
        Bem, se ele foi convocado para se explicar sobre tais participações, ou por causa da ameaça clara por conta do vídeo, ou ainda, por ambos os temas, ainda não sabemos muito bem.

Afrontas de depoentes

        Alguns depoentes também deixaram marcas tumultuadas na CPI, com direito a sessões encerradas para reconvocação posterior. O pico de calor veio no depoimento do jovem CGU Wagner Rosário, cuja arrogância só mostrou a escolha a dedo por Jair Bolsonaro. É um determinado bolsonarista.
        Rosário teve na afronta o meio de enrolar nas respostas, gerando muitos momentos tensos. Aziz o reprimia o tempo todo, mas não adiantava muito. Depois de afrontar Randolfe, desrespeietou  Simone Tebet, no clímax do dia, ao ponto da maioria dos senadores solidarizar-se com a emedebista.
        Tudo porque, tal como Randolfe, Simone Tebet mostra sua abordagem fecha-cerco, com mostras de documentos e outras imagens reveladoras dos crimes tratados. A agressividade de Rosário com ela derivou do xeque-mate de Tebet ao questionar a atuação dele como CGU.
        Nesse dia 21/9 foi a vez de Pedro Benedito Batista Jr., diretor executivo da Prevent Senior, que prestou testes com tratamento com kit-C19 solicitados conforme protocolos descritos pelo então MS Pazuello, cujas evidências revelaram intenções análogas às dos nazistas.
        As evidências foram laudos de morte excluindo C19, contendo descrição do tratamento precoce preconizado pelo ex-MS Pazuello, bem como denúncias de ex-médicos de ameaças a proceder tal tratamento e excluir a C19 (e sequelas do próprio tratamento errado persistido) como causas mortis.
        Entre documentos de vítimas mostrados a pedido de Randolfe Rodrigues, estavam o dr. Wuong (o "dr. Cloroquina") e Regina Hang, mãe do nefasto Luciano Hang, que foi chamado de "desalmado" por Otto Alencar, graças à propaganda e campanha de promoção do kit-C19.
        O citado diretor foi esquivo quando conveniente, e sorria com deboche. Negava a sua atuação apesar das evidências, para responder "não posso falar sem autorização..." terceirizando a sua própria responsabilidade pelos danos. Foi quando Aziz o comparou aos peixes muito lisos.
        Neste 23/9 foi o empresário Danilo Trento a depor, abusando do direito de silêncio ao ponto de a CPI querer dialogar com o STF sobre isso. Sobre a relação de Trento com os Bolsonaro, a afirmação veio na trocentésima vez, perguntada por Randolfe. Nesse ponto a CPI venceu pelo cansaço.
        Danilo Trento está envolvido até o pescoço em várias "empresas de prateleira" especializadas em lavagem de grandes somas de dinheiro público. Como finalizou o senador Fabiano Contarato, Trento é "o lavador geral da República", por conta da atuação dessas empresas, incluínda a Precisa. 

Reflexões finais
        As mentiras reiteradas, abusos no direito de silêncio, deboches fazem parte do pacote ideológico do bolsonarismo, pois vale tudo para que tenha caminho de se esgueirar nas inquirições da CPI. Isso além da afronta agressiva, ameaças e olhares intimidadores, cortinas de fumaça e tumultos.
        Essa diversidade de meios de enfrentar o interrogatório da CPI é usada para desviar, depreciar, tripudiar, enganar. distrair ou desconcentrar, tentar vencer pelo cansaço. São as armas do pacote, de acordo com o temperamento e as preferências de cada depoente envolvido com os Bolsonaro.
        Tudo isso revela o cerne da retórica bolsonarista: o ódio. Por tantos meios de se desmonstrar tal sentimento, não é por acaso que o ódio é o maior dos desafios da CPI. Ainda que tenha colhido alguns bons frutos, valiosas provas que, quiçá, possam levar o feitiço voltrar-se contra o feiticeiro.
        Quem sobreviver, verá.

----
Imagens: Google 

Notas da autoria
1. A concessão em permanecer em silêncio só se permite em indagações sobre fatos a comprometer o depoente solicitante, não cabendo a qualquer fato abordado no interrogatório.

Para saber mais
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/06/analise-cpi-witzel-e-merda-no.html
- https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/07/4937694-tebet-aponta-flavio-bolsonaro-ele-nao-tem-coragem-de-falar-o-que-me-disse.html
- https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/09/21/em-depoimento-tenso-wagner-rosario-nega-omissao-da-cgu-no-caso-covaxin
- https://g1.globo.com/politica/cpi-da-covid/noticia/2021/09/21/ministro-da-cgu-nega-prevaricacao-e-diz-que-nao-teve-acesso-a-informacoes-sobre-lobista-na-saude.ghtml
- https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/cpi-da-covid-depoimento-ministro-cgu-wagner-rosario
- https://congressoemfoco.uol.com.br/legislativo/cpi-da-covid/apontado-por-prevaricacao-ministro-da-cgu-depoe-a-cpi-da-covid/

 

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

#Curiosidade: Cumbre Vieja e o Brasil

        Não basta a sucessão de notícias explosivas nos bastidores da política envolvendo o governo Bolsonaro, que surge uma novidade a causar impacto na mente e nas emoções dos brazucas: o alerta de erupção de um vulcão no outro lado do Atlântico que poderia lançar tsunamis para nós.
        Emitida por várias mídias, a notícia explodiu nas redes, chamando a atenção da comunidade geológica, que se preocupou com a possível onda de fake news e teorias da conspiração que sempre surgem com fatos importantes para a vida pública. Mas, faz sentido tanta preocupação? 
        São verdadeiros os alertas? A resposta virá a seguir.

Ilhas Canárias e La Palma: aspectos físicos


        A notícia vem das Canárias, arquipélago autônomo da Espanha situado a noroeste do litoral africano, na altura de Marrocos (ao lado). Junto às ilhas portuguesas dos Açores e da Madeira, e as de Cabo Verde, Canárias compõem o grupo Macaronésia. São todas ilhas de origem vulcânica.
        Essa origem da Macaronésia se liga à pressão do encontro das placas tectônicas da Eurásia e África a formar ampla linha de falha horizontal no Mediterrâneo, sendo uma região geologicamente ativa. A subducção1 da planície da Ferradura, no extremo sul português, ocorre nesse alinhamento.
        La Palma- no extremo oeste das Canárias, La Palma é a mais ativa, com seus vulcões alinhados norte-sul. Praias e clima mediterrâneo subúmido têm uma beleza que encanta turistas. É nessa ilha que se localiza o vulcão desse momento: o Cumbre Vieja, num parque do mesmo nome. 
        Cumbre Vieja- localiza-se no centro-sul de La Palma (detalhe ao lado). É o mais ativo da ilha hoje. Para alguém familiarizado, ele não aparenta ser temível, mas engana. Ele lembra os havaiano, com erupção fissural, comum em ilhas oceânicas, com risco de desastre no lado oeste.
         Em 19/9, entrou em erupção após 50 anos quieto, ejetando lava mais líquida e poucas nuvens. O seu poder de fogo está sob atenção dos pesquisadores, por conta do alto risco de deslizamento de seu flanco oeste para o mar, podendo causar tsunamis.
        Tsunami- termo japonês que se traduz conotativamente "onda do porto" ou "de costão", em alusão ao violento quebrar das ondas sísmicas ou de fortes ventos ciclônicos contra estruturas portuárias ou costões rochosos íngremes.
        Também chamada de maremoto (mar em movimento, em latim), a tsunami se alinha longamente em mar aberto, onde atinge até 900 km/h, um Boeing, até alcançar a rasa plataforma continental, onde perde velocidade e ganha altura passível de ter dezenas de metros.
        O primeiro relacionar tsunamis a sismos foi o historiador grego Tucídides, séculos a.C., mas só no século XX tal relação se confirma em definitivo, sendo seu mecanismo ainda objeto de estudo.

Tsunamis do Cumbre Vieja no Brasil: é possível?

        Os brazucas têm razão de seu temor e estranheza. Afinal, como atestam os geólogos, o Atlântico manifesta seu mau humor em furacões e ciclones dignos de nota. Mas não as tsunamis, tão conhecidas e temidas no Índico e Pacífico.
        Num país situado longe dos limites de placas tectônicas, seria de fato estranho haver tais ondas sísmicas. Mas isso não significa que o litoral brasileiro seja imune ao fenômeno, com dois registros, um em 1666 devido a terremoto na Dorsal Atlântica, e outro em 1755, este do outro lado do oceano.
        Em 1755, moradores de vilas litorâneas nordestinas viram enormes ondas sem motivo aparente se quebrando e invadindo ruas próximas. Eles notaram que o vento não era suficientemente forte para gerá-las. Então, o que as teria gerado?
        A resposta veio algum tempo depois: as ondas apareceram após um terremoto de 8,7 magnitudes Richter que devastou Lisboa, seguido de réplicas. Elas atingiram o litora oeste e sul lusitanos, e costas próximas do sul da Europa e norte e noroeste da África.
        Os registros da época apontaram em torno de 10 vítimas fatais, mas hoje se estima em até 100 mil nas áreas atingidas, devido à dimensão do abalo principal, suas réplicas e tsunamis.
        A origem do sismo de 1755 foi na zona de subducção da citada planície da Ferradura na linha de falha do Mediterrâneo. Devido a esse processo, Lisboa foi novamente sacudida em 1969, atestando a importância geológica local em vidas.
        As ondas sísmicas de 1666 e 1755 foram fatos isolados no Brasil, que por outro lado costuma ser atingido pelas meteotsunamis, grandes ondas de ressaca ligadas a ventos ciclônicos extratropicais e tropicais, de menor dimensão em tamanho e potencial de danos e vidas, mas grandes fatores erosivos.
        Potencial do Cumbre Vieja- em tese, o Cumbre Vieja tem potencial de gerar reflexos à distância, dados os fatores determinantes de seu nascimento e natureza. Até iniciar a sua erupção, milhares de tremores foram detectados na região.
        Segundo o Instituto Geográfico Nacional (IGN) da Espanha, os tremores se ligam à pressão na câmara magmática, daí o alerta então amarelo divulgado (e sensacionalizado) pela mídia brasileira, antes da erupção. O alerta amarelo é nível 2 na escala internacional de gravidade no vulcanismo.
        Em velada "remissão de pecado" para acalmar geral, as mídias brasileiras informaram ser "remota a possibilidade de tsunamis no Brasil", afirmativa endossada pela nota técnica da Sociedade Brasileira de Geologia (SBG), com explicações:
        Deslizamento- o IGN aponta não ser a erupção fonte de tsunamis, e sim o deslizamento da vertente oeste do vulcão, de extensão máxima a até 25 km na base. Mas o volume de terra tem que ser suficiente para tanto. Mas até o momento, isso é quase impossível.
        Nesse fenômeno, devemos considerar não só a potência eruptiva. Entram aí a frequência dos tremores e a interferência climática na vertente, como fatores contributivos do volume de terra predisponente a deslizar para o mar.
        Física das ondas- se ocorrerem, as tsunamis levarão até 7 horas para chegar ao Brasil, tempo suficiente para evacuar os moradores, e também para elas perderem força na travessia, chegando à costa como quebras e avanços de maré maiores.
        Isso não nega a possibilidade de tsunamis, apenas afirma uma chance extremamente remota, pois a erupção ainda não é suficiente para desabar tanta terra. Para comparação, vale citar o célebre desastre do estratovulcão2 Krakatoa, no estreito de Sunda, Indonésia, em 1883.
        Da tripla cratera do Krakatoa saiu a maior explosão registrada. A nuvem atingiu 30 km de altura, espalhando cinzas e tefra3. A grande nuvem piroclástica atingiu ilhas próximas. Tsunamis de até 45m varreram vilas inteiras. Saldo: 36 mil mortos; número ignorado de desaparecidos.
        Ao fim da coisa, se descobriu que da ilha Krakatoa só restou um paredão vertical. Em 1927, no mesmo estreito, nasceu explosivamente Anak Krakatoa, o "filho do Krakatoa" no dialeto local. Essa montanha, um estratovulcão, é tão ativa que cresce até 4 m por ano.

        Em matéria de catastrofismo e letalidade, vulcões como o Cumbre Vieja não chegam aos pés dos estratovulcões. Mas o problema é poder gerar estragos maiores se suas erupções forem duradouras e intensas o suficiente, somadas a outras características geológicas e geográficas. O IGN está atento ao Cumbre Vieja devido a novas crateras desde o início da erupção.
        Após a nuvem inicial, as lavas escorrem pelas vertentes, ocasionando a evacuação de moradores de várias vilas próximas, o que pode se estender a toda a ilha se a atividade se intensificar. Incêndios em florestas e danos materiais e imobiliários pelas lavas já ocorrem.
        Mas, até o fim deste artigo, não há ainda novos informes sobre o estado do flanco oeste do vulcão. Ou seja, como já previsto, os brasileiros podem ficar tranquilos. Mas vamos seguindo, pois estamos na dependência das informações do IGN.

----
Imagens: Google (montagens: autoria do artigo)

Notas da autoria
1. Mergulho de uma placa tectônica mais densa nas profundezas da Terra no encontro com outra placa menos densa.
2. Tipo clássico de vulcão, de ação brusca e explosiva, com lava viscosa, nuvem abundante de cinzas, piroclástos de vários tamanhos e grande poder destrutivo.
3. Material vulcânico composto de cinzas, bombas (pedaços de lava viscosa), piroclastos (rochas em brasa) e pedras-pomes.

Para saber mais
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cumbre_Vieja
https://pt.wikipedia.org/wiki/Fluxo_pirocl%C3%A1stico
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Krakatoa


sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Análise: opções e desafios da esquerda em 2022

        A sequência de ataques verbais de Bolsonaro rendeu tiro no pé: iniciada nos bastidores, a debandada já atinge parte dos apoiadores que, e 8/9, se sentiu traída pelo "mito". O que o mantém funcional mesmo zumbi são a condução de governo por Paulo Guedes e a recusa de Arthur Lira em atender ao apelo popular e de colegas pelo impeachment.
        Em verdade desejando presidir a República, Lira quer a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, em análise pelo TSE das várias evidências criminais. Por enquanto Bolsonaro segue camuflando o desmonte estatal com suas besteiras.
        Em paralelo, a oposição se mexe nos bastidores, impulsionada pelo reacender das manifestações populares e pela liderança eletiva de Lula em 2022, conforme várias pesquisas de cenários simulados efetuadas por institutos e fundações destinados a esse fim.
        As principais siglas de centro-esquerda e esquerda já articulam pré-candidaturas para 2022. Há alguns nomes confirmados, mas há muita água para rolar, permitindo análises sobre quais combinações formariam chapas mais confiáveis para um público eleitor cada vez mais arredio.
        Tal análise de simulações usando nomes já citados ou cotados é o objetivo deste artigo.

Simulações de chapas - das menos às mais sólidas chances

        As simulações a seguir serão divididas em duas referências, uma de centro-esquerda e outra de centro-direita, combinando confirmados e os cotados (não confirmados), sem considerar influências externas. Os cotados são Alessandro Vieira, Marina Silva (centro-esquerda), Flávio Dino (esquerda), Sérgio Moro (centro-direita) e João Amoedo (direita).
        Alessandro Vieira (Cidadania)- cotado graças ao destaque na CPI da C19. Em 12/9 esteve com Doria e Ciro na passeata do MBL na Paulista. A seguir, chapas simuladas com Vieira:
        Doria- : chapa difícil, pois Doria é um populista impulsivo e privatista. Mas o comedimento de Vieira pode ser positivo, possibilitando equilíbrio. Afinidade pelo incentivo à ciência e tecnologia.
        Mandetta- : médico ex-MS e delegado numa chapa de centro-direita. A saúde pública pode ganhar, já que Mandetta viu na C19 o valor do SUS público.
        Moro- : chapa centrista de juristas. Talvez atualização no CP e investimento em educação. Mas a imagem de Moro ainda segue manchada após crime jurídico para condenar Lula.
        Ciro- : chapa centrista desenvolvimentista com visão possível em C&T e infraestrutura, se o experiente Ciro for o presidente. 
        Dino- : chapa de centro-esquerda. O experiente Dino é pragmático, requisito presidenciável esperado pelo eleitor. Melhor margem para educação, saúde, C&T e infraestrutura.
        Haddad/Lula- : chapa de centro-esquerda, melhor se Vieira for presidente. A influência de Haddad pode ser positiva para ensino, extensão, C&T, mas outros benefícios são presumíveis. Com Lula à frente pode ter resultado semelhante.
        Marina- : centro-esquerda. Meio ambiente pode se destacar por influência da ex-MMA, com ajuda educativa, não importando se Marina seja presidente ou vice. Outras políticas podem ser alvos.
        Lula e Haddad (PT)- Lula é político inteligente e hábil, e tem carisma e popularidade imbatíveis. Haddad é respeitado professor, ex-prefeito paulistano e ex-MEC; bom ouvinte, só lhe falta pulso de líder. Mas continua no páreo como segunda opção1 petista à presidência.
        *A seguir, simulações de chapa com Lula (na presidência, claro) e Haddad:
        Doria- : oposição maior com Lula devido a têmperas parecidas; com Haddad, a influência tucana dominaria a condução de governo, em viés mais centro-direita.
        Mandetta- : mesmo próximo de Doria, seria mais maleável; seria vice de Lula e presidente com Haddad. Investimentos maiores em saúde e C&T.
        Moro- : praticamente impossível.
        Ciro- : fora a briga pela ponta, ações desenvolvimentistas planejadas seriam bem positivas. Com Haddad de vice, a chapa seria mais estável e educação seria mais investida.
        Dino- : chapas mais à esquerda. Problema: paranoia ideológica do mercado, mas menor com Lula.
        Marina- : seria parecida com Lula-Dino, porém mais resistente às pressões externas.
        Vieira- : mesmo com Haddad de vice, haveria influência deste nas políticas de educação, saúde, C&T e outras. Com Lula seria igual. Seriam chapa de centro-esquerda.

        Doria e Mandetta- são de centro-direita. O governador paulista tucano e o médico (DEM) têm nas vacinas anti-C19 como seu mote eleitoral. Embora sejam de diferentes partidos, suas visões econômicas são bem parecidas. *As simulações com Doria seriam assim:
        Mandetta- : chapa de centro-direita. Maior investimento em ciência, pesquisa e produção de vacinas e medicamentos. 
        Moro- : não deve ser muito diferente da chapa acima.
        Dino- : há oposição, mas a experiência e a boa imagem de Dino podem ser salutares.
        Ciro- : aposta em ações desenvolvimentistas e certo populismo; com Mandetta parece haver mais solidez.
        Marina- : chapa mais centrista, com foco em ações ambientais, C&T e saúde.
        Vieira- : chapa centrista, políticas parecidas, talvez, com as das chapas com Marina.
        João Amoedo (Novo): o nome mas neoliberal da 3ª via, ainda não se confirmou na corrida, mas vale simular as combinações fictícias a seguir.
        Doria- : com ideais econômicos quase idênticos, essa chapa priorizaria privatizar as estatais restantes, talvez ao ponto de secundarizar investimentos em serviços essenciais.
        Mandetta- : parecida com a chapa acima, mas talvez sem subestimar demais o social.
        Moro- : imaginação difícil, mas entre si a relação seria tranquila.
        Ciro- : possíveis atritos na área econômica, e Amoedo iria impor sua influência de banqueiro.
        Dino- : tão opostos quanto Lula x Doria, por exemplo. Talvez pior.
        Lula/Haddad- : com Lula, possíveis atritos sobre prioridades políticas. Com Haddad, Amoedo se aproveitaria para impor sua influência.
        Marina- : também uma dupla difícil.
        Vieira- : Talvez Vieira o manipule para financiar certas políticas de interesse público. Talvez.

Reflexões finais

        A, combinações foram apenas fictícias, a partir do que se sabe dos perfis políticos e têmperas de cada um, pois foram retiradas as influências de partidos e de seus caciques, apenas a relação com o público eleitor.
        Nelas se destacam nomes de centro-esquerda em propostas de políticas públicas, e de economia entre os de centro-direita.
        Nomes emergentes- o uso de nomes emergentes responde em parte pelo caráter ficcional dessas chapas, dada a indefinição de planos de governo. Antes cotado, Luciano Hulk foi desconsiderado aqui por ter desistido de concorrer à carreira política, ao menos nesse momento.
        Entre os nomes emergentes acima citados, se destacam Dino, Marina e Vieira.
        Apesar de ainda não totalmente confirmado, Alessandro Vieira se vê aposta centrista da 3ª via. Já Marina (REDE) é possível de se anunciar já candidata na disputa no ano que vem.
        Outro tido como 3ª via, Amoedo ainda vai se confirmar. Percebe certa antipatia popular por ser empresário e banqueiro, com prioridades neoliberais a invisibilizar as políticas realmente prioritárias.
        Experiente e popular governador do Maranhão, com ações na educação e saúde, Flávio Dino migrou ao PSB para ser presidenciável. Por ainda enfrentar históricas mazelas sociais locais, vê na presidência oportunidade para mais investimento em seu Estado.
        A dificuldade de imaginar o perfil de chapa com Moro se deve à indecisão do mesmo quanto ao cargo eletivo a concorrer (governador, presidente ou deputado). e à falta de políticas prioritárias em fontes. Está ainda sem partido, mas é muito provável que vire tucano.
        Ciro, Lula e Haddad- após findar críticas a Lula, Ciro melhorou sua elegibilidade, como mostram as últimas pesquisas de potencial de voto. Talvez seja uma estratégia de seu marqueteiro João Santana. Se vai se reaproximar do petista, só o tempo e as circunstâncias dirão.
        Se Lula tem no pragmatismo o grande triunfo nas benfeitorias de seu governo, Haddad o tem nas ideias inovadoras: se eleito no lugar do titular, poderá revitalizar os feitos passados e, se não houver muitos empecilhos2. aplicar inovações na educação, saúde e C&T, revogando os emperramentos da era Bolsonaro.
        Aliás, o maior desafio a ser enfrentado por qualquer das chapas eleita à presidência em 2022 será, além de toda sorte de estragos invocados no governo Bolsonaro, a agressividade do bolsonarismo. Pois o "mito" irá embora, mas os bolsominions não. Inteligente será quem pacificá-los. Se conseguir.

----
Imagem:  Google

Notas da autoria:
1. Em caso (muito provável) de Lula sofrer revés impeditivo à candidatura, como processo judicial ou atentado.
2. Vetos do Congresso (ou do judiciário) a importantes propostas de governo.
*MJ = ministério da justiça; MS = ministério da saúde; MMA = ministério do meio ambiente; MEC = ministério da educação; CP = código penal; C&T= ciência e tecnologia.

Para saber mais
- https://www.jornalcontabil.com.br/conheca-possiveis-candidatos-a-presidencia-da-republica-para-o-ano-que-vem/
- https://www.poder360.com.br/governo/lancado-pelo-cidadania-vieira-se-diz-pre-candidato-essencialmente-de-3a-via/
- https://oglobo.globo.com/politica/pandemia-impulsiona-candidaturas-de-nomes-ligados-saude-nas-eleicoes-de-2022-25116236



segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Análise: 12/9, o passeio da terceira via

        As turbulências no dia da Independência, por conta da intensificação da crise entre os poderes invocada por Jair Bolsonaro, geraram ecos. Após o maior manifesto bolsominion da era atual, ao lado das de oposição, surge outra linha de manifesto popular.
        Apesar de contrária a Bolsonaro, esta linha não é a oposição de esquerda, apesar de algumas siglas terem dado apoio. As lideranças de 12/9 são aquelas que impulsionaram o fim da era petista em 2016, e abriram caminhos plenos ao bolsonarismo.
        Será que essa linha pode impulsionar o enterro da era Bolsonaro? Uma pergunta difícil essa, mas plausível de suposições.

Breve compilado histórico da "nova" direita

        A petista Dilma Rousseff foi reeleita por décimos de porcentagem, por decisão final dos mineiros marcados pelas sucessivas más atuações de Aécio e Anastasia à frente do Estado. O segundo mandato de Dilma foi tão turbulento que foi praticamente impossível governar. E isso foi premeditado.
        Com sede de vingança, Aécio prometeu impedir a governança de Dilma, que mesmo assim atingiu as menores taxas de inflação, desemprego e desigualdade socioeconômica. O presidente da Câmara era o cristofascista Eduardo Cunha (MDB-RJ), hoje cassado por corrupção e lavagem de dinheiro.
        Em 2013 estouram as suprapartidárias Jornadas de Junho, enquanto Dilma recebia reivindicações de aumentos salariais da elite do funcionalismo público e interesses estritos do Centrão liderado por Cunha, Aécio, Romero Jucá, Arthur Lira e outros. A então presidente se recusava a negociar.
        Tal resistência fez com que os nomes do Centrão acima e o vice-presidente Michel Temer, junto a outros incomodados com a operação da PF, arquitetassem o processo de impeachment, em um "grande acordo, com Supremo, com tudo", como dissera Jucá, em áudio gravado e vazado.
        Nessa altura, manifestos organizados em redes sociais por movimentos como Vem pra Rua e MBL (Movimento Brasil Livre), entre outros, pipocaram a partir de 2015, reivindicando o fim da era petista, mostrando um caráter ideológico muito mais estrito.
        A maioria dos manifestantes era de classe média cooptada pela elite em bairros nobres, já usando a camisa da CBF para simbolizar a contrariedade com o que se imaginava do petismo: "nossa bandeira jamais será vermelha". É a nova face da direita, na qual Bolsonaro pega carona e se elege. O resto já sabemos e sofremos.

O passeio da terceira via e reflexões finais

        Passado o tempo, eleição de Bolsonaro e suas curriolas sendo aos poucos reveladas em diversas fontes, bem exploradas neste blog, surge a opção por uma "terceira via" para mudar o cenário eleitoral de 2022 que já movimenta nos bastidores, fortemente marcada nos polos Bolsonaro e Lula.
        Também já explorada aqui, a terceira via surgiu como expressão criada pelo grupo do parlamentar Kim Kataguiri (DEM-SP), um dos líderes do MBL e confesso eleitor de Bolsonaro no 2º turno contra o petista Fernando Haddad, e hoje rompido com o governo.
        A defesa da bancada de Kim à terceira via faz sentido: ela é representada por nomes da direita democrática liberal elitista, como João Doria, João Amoedo e Luiz Henrique Mandetta. Estranho no ninho, Ciro Gomes é o único desenvolvimentista. Hoje, o grupo parece dissolvido.
        Mesmo contando com apoio de algum setor de esquerda, esse evento de 12/9 se evidenciou para renovar a visibilidade pública da terceira via, mas a adesão popular foi bem menor do que a vista nos manifestos de esquerda no dia 7. Pelo visto, a estrela não brilhou o suficiente.
        Mas, mesmo sem tanta adesão, o evento viria a se confirmar como, pelo menos, o grande passeio da terceira via, pelos asfaltos mais seus, as avenidas Paulista em São Paulo e a Atlântica no bairro de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro. Vale tudo para impedir Lula ou Bolsonaro em 2022.

----
Imagem: Google

Notas da autoria
1. 

Para saber mais
- https://www.opovo.com.br/noticias/politica/2021/07/08/mbl-e-vem-pra-rua-organizam-super-protesto-contra-bolsonaro-para-o-dia-12-de-setembro.html



domingo, 12 de setembro de 2021

Análise: a culpa do voto identitário

 
        Os fatos ocorridos desde o início do governo Bolsonaro, em especial no que se refere àqueles identificados com a ideologia bolsonarista, têm chamado novas atenções dos antropólogos sociais que discutem muito sobre a formação das tribos urbanas.
        As tribos urbanas se distinguem em especificidades como etnia, cultura, fé, gênero musical, vestuário, sexualidade, etc., e se formam pelo que os estudiosos chamam de inserção por identidade: por afinidade ou familiaridade afetiva.
        Processo de fundo biológico culturalmente moldável, a identidade sempre se recicla ao longo da vida, pois o meio urbano se modifica, e procuramos nos adaptar às mudanças para sobreviver.
        Mas, pelo menos a partir da era tardia, com intensidade crescente, se descobre uma nova face do fenômeno de identidade grupal: o fator político-ideológico. Não que seja em si uma novidade, mas se observa uma linha comportamental nova, que passaria a ser chamada de identitarismo.

Identitarismo

        Se a identidade é o processo que leva à inserção em grupo social específico através de afinidade ou familiaridade, guiado pelo instinto gregário do homem, o identitarismo é a derivação mais profunda da identidade, que pode assumir um caráter político-ideológico. Vamos a um exemplo.
        No censo demográfico brasileiro, a população de pele escura é definida como preta. Por sua vez, o termo negro, que significa negro enquanto cor, passa a simbolizar a identidade histórica e cultural da população descendente dos africanos escravizados. Daí o movimento negro.
        A pessoa preta consciente da sua ascendência étnica-cultural africana assume a identidade negra, enquanto o identitarismo negro é a politização dessa identidade, para fim educativo ou de luta contra o status quo de desigualdade. 
        Aliás, o identitarismo negro tem sido alvo de debates, em especial sobre a designação de objetos (p. e., criado-mudo1) e o uso negativo do termo negro (humor negro, denegrir, etc.). O indígena pode entrar nesse terreno, na intenção de destruir a má associação com a indolência (aversão ao trabalho).
        O identitarismo é polêmico. Alguns nomes o veem como contraponto à imposição da referência branca, masculina e cristã no Ocidente, na intenção de mostrar que ela é majoritária, e não a única a caracterizar uma sociedade ou civilização inteira.
        Mas há nomes que o veem negativamente, como o professor e influencer Paulo Ghiraldelli, que condena o frequente caráter autoritário e radical, portanto, mais próximo da direita fascista do que propriamente da esquerda democrática, contrariando a identidade política das lideranças radicais.
        A lógica de Ghiraldelli se liga na sensação de patrulha que pode ser observada, por exemplo, nas correções das lideranças dos movimentos negros nos fatos supracitados, ou na indignação feminista a julgar como assédio certas cantadas elogiosas dos homens.
        A patrulha se concretiza a partir do momento em que tolhe a liberdade de alguém ou de um grupo. Os exemplos supramencionados revelam o tipo linguístico, que é o mais comum e tende a reduzir a já empobrecida média vocabular brasileira. 
        Há outros tipos de patrulha também, como a censura (sigilo) e a física.

Uma reflexão final: o identitarismo bolsonarista

        Se o identitarismo se define a partir de uma retórica politizante de uma identidade, vale salientar então o identitarismo político. 
        Assumindo seu caráter político-ideológico atual, o bolsonarismo pode ser compreendido como forma específica de identitarismo, pois deriva da radicalização da identidade de eleitores e fãs com os ideais, princípios e preconceitos de Jair Bolsonaro, hoje alçado à presidência da República.
        O forte republicanismo petista renovou grupos de direita, e daí surgirem os cristonazifascistas a requerer autoridade que agregue religião, política e militarismo. Bolsonaro foi a referência escolhida, e logo veio o preço: a sua eleição abriu a caixa de Pandora autoritária e psicopática, o bolsonarismo.
        A parcela arrependida de Bolsonaro se defende ao dizer que "não imaginava" que haveria tantas revelações claras de crimes de responsabilidade, indecoros, e pior, corrupção - mote de base de toda a direita, além do bolsonarismo. E arrependimento é nada mais que a revelação da própria culpa.
        Entre os com amplo acesso à informação e aos populares previamente avisados por terceiros, a escolha foi voluntária, o que impede retirar deles o peso da culpa. Exceção só cabe aos moradores de áreas dominadas por milícias que nele votaram por sobrevivência, sua e de suas famílias.
        Pelo menos os arrependidos reconheceram seu erro. O consolo é não estar mais entre os gados bolsominions, casos perdidos. Mas, infelizmente veio tarde: estamos todos agora coletando os frutos podres do punhado de árvores podres que agora tomou Brasília de assalto.
        Dai entender a razão de Ghiraldelli, sobre o perigo do identitarismo. Fica o aviso às lideranças de siglas de esquerda: cuidado com suas turmas de identitários.
        
----
Imagem: Google

Notas da autoria
1. Criado-mudo era o escravo que, durante a noite, ficava ajoelhado ou sentado ao lado da cama de seus senhores segurando os objetos deles. Se fosse pego dormindo, era castigado.

Para saber mais
        
        

CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...