sábado, 27 de fevereiro de 2021

Reflexão: A PEC da impunidade parlamentar


     Em meio à geral atenta ao BBB, à insistência de Paulo Guedes pela urgente votação da PEC 186, e diante da prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira por ofender ministros do STF, a galera no Congresso inteiro se danou a mexer os pauzinhos. Era "preciso fazer algo depressa".
     Tal comportamento se mostrou anormal, numa clara indicação de que mais parlamentares estão envolvidos nos mesmos crimes políticos do colega preso. Este foi apenas um boi de piranha, mas já deu mostra dos riscos. Na calada, surgiu o texto de nova PEC, a da imunidade parlamentar, cuja votação por sua admissibilidade foi relâmpago.
     Mas os parlamentares já possuem certo nível de imunidade. Para que mais? Este artigo objetiva dissertar e abrir reflexões sobre as possibilidades da nova PEC. Antes disso, a origem.

-> A imunidade parlamentar

     A imunidade ou inviolabilidade parlamentar é dispositivo previsto no Art. 53º da CF/1988. Visa a proteção dos deputados e senadores contra a punição por suas expressões e votos, segundo o jurista Rafael Kriek Lucena Cavalcanti, no blog jurídico Ebeji.
     O objetivo do dispositivo citado é a democratização das expressões dos parlamentares em sessão, de análises  em plenário ou em votação aberta de alguma proposta ou decreto, o que era muito restrito na ditadura militar, quando alguns parlamentares preferiam votar em silêncio para evitar represálias.
     No entender do STF, a inviolabilidade parlamentar tem três tipos: material, absoluta e relativa. A material bate com o conceito básico acima, fora da atividade de mandato; a absoluta ocorre quando o parlamentar se expressa dentro da casa legislativa a que se vincula; e a relativa, quando estiver fora da casa. (Ebeji)
     Seguindo essa classificação do STF, vale lembrar de casos recentes, como a prisão de Silveira pelo vídeo hostil aos ministros do STF. A opinião em si não foi o problema, e sim a ofensa acompanhada de ameaças, reiterada em suas redes sociais, fora da Câmara. Nesse sentido, ele se saiu como qualquer cidadão comum.
     A decisão de prisão em flagrante pelo STF se concentrou mais no parágrafo 2 do Art. 53 da CF, segundo o qual os congressistas "não podem ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável", sendo os autos "remetidos dentro de 24 horas à Casa respectiva para que, pelo voto da maioria dos seus membros, resolva sobre a prisão". 
     O flagrante foi justificado pela publicação do vídeo nas redes sociais públicas do deputado. 
     Outro fato coincidente e merecedor de menção por aqui é o súbito cancelamento da quebra dos sigilos do senador Flávio Bolsonaro pelo STJ, após tempos de investigações muito aos trancos e barrancos. A decisão ocorreu após o presidente Jair Bolsonaro "dar o seu jeitinho".
     A despeito disso, a presente imunidade parlamentar tem sido alvo de crítica por parte dos juristas, que denunciam o caráter frequentemente absoluto de certas expressões em caráter material que se reiteram na imprensa, mesmo ocorridas em plenário.
     Ofensas públicas que afetem a honra de terceiros são injustificadas, necessitam ser punidas, bem como o simples inocentar um parlamentar a despeito das provas pungentes do contrário. São dois pontos a serem analisados criticamente sobre os limites dessa inviolabilidade. E a nova PEC, abordará isso?

-> A nova PEC da imunidade parlamentar

     A conduta imediatista da Câmara em relação ao texto da PEC da imunidade desagradou em cheio a opinião pública e o STF, em meio à emergência da C19 e outras pautas que podem por o futuro da nação em jogo.
     Apesar da admissibilidade do texto, não houve consenso entre os partidos para a votação. O bloco opositor, grande nesse momento, não aceitou votar. Desistindo, Lira prometeu alterações no texto, que já aparece com pontos bem controversos, segundo disponibilizado pela mídia.
     No regimento, o texto é analisado jurídica e constitucionalmente pela CCJ; depois, por 40 sessões plenárias por comissão especial seguidas por audiência com especialistas e votar numa proposta, que só após parecer favorável da comissão o texto vai para votação em plenário.
     Mas, como a CCJ ainda não estava formada, Lira queria que a PEC seguisse direto ao plenário, daí o imbróglio com alguns partidos, devido à formação de comissões na próxima semana. Mas, a relatora da PEC já fez o parecer de admissibilidade que foi aprovado.

-> Reflexão final crítica acerca da PEC (texto original)

     É normal a crítica da opinião pública sobre a citada votação relâmpago de nova PEC de imunidade parlamentar. Afinal, a patuleia mostra cansaço de tanta impunidade a parlamentares - apesar de estes estarem lá, sobretudo, por eleição popular direta (há vários suplentes, não eleitos).
     A crítica se estende também às alterações contidas no texto, que segundo Arthur Lira, se resumem apenas ao Art. 53º da CF, se referindo às formas de abordagem do parlamentar que tenha cometido  "excessos de opinião, voz e voto". 
     A PEC ocorre principalmente sobre a forma de abordagem e custódia do parlamentar que tenha praticado ato criminoso, entre outras providências. Abaixo aparecem os principais pontos de alteração propostos, citados pelo G1-Globo:
     - Parlamentar não poderá ser afastado do mandato por decisão judicial: segundo a CF, o STF determina esse afastamento para posterior julgamento. É que ocorreu nos casos Silveira e Flor de Lis (este último foi criticado por Lira);
     - Quem cometer crime em flagrante ficará sob custódia da Casa legislativa correspodente: a PEC faz entender que haverá dependências próprias onde o infrator ficará. Ou seja, acaba a possibilidade de prisão como no caso Silveira;
     - Acusados responderão por seus atos diretamente à Comissão de Ética da sua casa legislativa: é questionável: se a comissão de Ética é formada de parlamentares, alguns deles colegas de partido, vale tudo? 
     - Acusados não serão mais imputados civil e penalmente: consequência direta do tópico acima, se torna uma clara forma de impunidade, desta vez a ser constituída. É o ponto mais questionável para a opinião pública.
     - Medida cautelar a afetar o mandato só terá efeito após confirmação pelo STF: já que se dissolve a possibilidade de imputação judicial, esse ponto indica que a entrada da justiça caberá somente em casos de "grande gravidade". 
     Apesar de termos visto várias atitudes republicanas dos parlamentares, em especial reprovando alguns decretos presidenciais absurdos, interesses seletivos são habituais. O próprio Lira pode ser um exemplo clássico, por sua extensa ficha corrida.
     Quanto à comissão de Ética para a qual o acusado responderá, segundo a PEC, vale salientar que muitos dos futuros comissionados serão responsivos por condutas antiéticas e imorais, graves ou não. Um tópico suficientemente discutível, em virtude de poder abrir precedente de uma inviolabilidade absoluta ao infrator.
     Vale refletir também os significados dessa PEC não tanto para casos como o de Daniel Silveira e Flor de Lis, de expressão política irrelevante comparada a de Flávio Bolsonaro1. A coincidência da sua presunção de inocência coincide muito com a PEC e com a afinidade de Lira, que também a quer logo votada para a sua promulgação.
     Portanto, fica apresentada a PEC. Da disciplina da imunidade ou incentivo à impunidade?

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. A relevância política do senador se refere só por ser filho do presidente da República e suas ligações com grupos paralelos.

Para saber mais
- https://blog.ebeji.com.br/imunidade-parlamentar-material-absoluta-e-relativa-manutencao-do-entendimento-do-stf/
- https://jus.com.br/artigos/29608/criticas-ao-carater-absoluto-da-imunidade-parlamentar-material-brasileira
- https://www.camara.leg.br/noticias/730472-camara-aprova-admissibilidade-de-pec-sobre-imunidade-parlamentar
- https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/02/26/camara-pec-imunidade-sexta.ghtml
- https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/02/26/sem-consenso-camara-desiste-de-votar-pec-da-imunidade-e-envia-texto-para-comissao.ghtml
- https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2021/02/23/stj-anula-quebra-dos-sigilos-de-flavio-bolsonaro-no-caso-das-rachadinhas.ghtml
- https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2021-02/lira-pec-deve-disciplinar-imunidade-por-excessos-de-voz-e-voto

 

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Reflexão: os perigos da PEC 186


     Em meio à mixórdia envolvendo a prisão de um deputado bolsonarista após ofensas e otras coisitas más, ressurge a pressão pela renovação do auxílio emergencial (coronavoucher). O ministro da economia Paulo Guedes achava tal renovação uma "temeridade contra o teto dos gastos", justificando-se na falácia de "parcos recursos devido à pandemia".
     Com isso, Bolsonaro lançou a falácia de que "o Brasil está quebrado", para justificar, na prática, a péssima conduta de seu próprio governo, e também negar a continuidade do auxílio. Pretexto idiota, exceto nos sentidos político e ético. Com recursos acumulados em mais de R$ 2,1 trilhões em impostos recolhidos, o Brasil vai bem, e os grandes grupos transnacionais sorriem.
     Agora, Guedes lança a ideia: uma proposta de emenda da Constituição, para a renovação do coronavoucher em quatro quantias mensais de R$ 200 ou 300, para metade dos necessitados da fase anterior. É a PEC 186/2020. Apenas mais uma para por mais fogo no parquinho dos recursos públicos das já enfraquecidas áreas da educação e da saúde.

-> Ministério da Saúde (MS) e Ministério da Educação (MEC)
     
     De todos os ministérios, o da Saúde (MS) é o que mais demanda volume de recursos públicos, em virtude da dimensão de abrangência dos serviços de saúde pública pelo SUS, conforme princípios da Lei 8080/1990 (Lei do SUS), e na saúde suplementar (saúde privada).
     Dada a natureza centralizada e universalista do SUS, o MS tem o maior número de servidores, e presta contas em saúde pública em todo o país. Comumente a mídia da casa grande alega isso como a justificativa para o "rombo" nas contas públicas, uma mentira bem conhecida.
     No governo Bolsonaro, foi chefiado por dois médicos: Henrique Mandetta, privatista que aprendeu o valor do SUS na C19; e Nelson Teich, o breve, que se escafedeu após 28 dias. Após certo tempo sem ninguém, o general de intendência Eduardo Pazuello vira ministro, e cúmplice no genocídio da C19.
     Sua cadeira é uma das diletas do Centrão. Uma vantagem genérica é haver, no grupo, qualificados em saúde. Ser ministro da saúde é, para o Centrão, adquirir um relevante poder estratégico na administração de recursos e serviços. E muito dinheiro, claro.
     O outro ministério é o MEC, a segunda pasta em volume de recursos públicos para a sua estrutura complexa de serviços desde a educação infantil ao ensino superior, programas como os de incentivo ao ensino profissionalizante e inclusão de minorias étnicas e especiais na educação, e avaliação objetiva de estabelecimentos de ensino básico e superior, públicos e privados.
     Por conta de sua dimensão e estrutura, o MEC é também uma menina dos olhos do Centrão, que também tem parlamentares professores, para a ocupação de sua cadeira. A ocupação de ministérios é uma pauta cobrada pelo Centrão que bate de frente com o militarismo do presidente.
     O MEC foi palco de situações controversas e infelizes, como propostas esdrúxulas, fake news com universidades, cortes de recursos e exclusão do programa de inclusão, envolvendo os ex-ministros Ricardo Vélez e Abraham Weintraub. Hoje é ocupado por Milton Ribeiro, que deu novos cortes.
     
-> Enfim, a perigosa PEC 186/2020: reflexões finais

     Como mencionado no início, a proposta de emenda constitucional 186, segundo o ministro Paulo Guedes, tem como objetivo a "realocação" de recursos públicos da Educação e da Saúde para "cobrir o rombo fiscal" que poderia ser gerado com a liberação do auxílio emergencial.
     É pretexto, uma chantagem, como salienta com propriedade a especialista Maria Lúcia Fatorelli no Extra Classe de 25/2. Faz sentido: antes do fim do coronavoucher de R$ 600, Guedes já insistia que o salário dos servidores iria ser, na melhor das hipóteses, congelado. 
     Na reunião sinistra de 22/4/2020, cujo vídeo chegou ao STF por conta das ofensas de Weintraub (já tratado neste blog), Guedes foi claro que "no abraço coloco uma granada no bolso do inimigo: salário congelado até 2022". O inimigo em questão é, claramente, o servidor público, pintado como inimigo da nação pelo governo e pela grande mídia.
     Claro que então não estava em pauta o pretexto atual da PEC. Mas possivelmente houve outro, o do "programa" de treinamento de jovens com armas nas FFAA para depois, se quiserem, se integrar às milícias tão decantadas pela família Bolsonaro. Daí o congelamento então proposto1.
     Há possibilidade de, segundo se propõe, converter o corte em "confisco" de 25% dos salários dos servidores da saúde e da educação através dessa PEC. E, não bastando isso, um dos dispositivos mais temidos é a abolição do piso de recursos do MEC e do MS.
     O confisco salarial é a senha para outra cláusula contida na PEC 186: o calote ao piso da educação e da saúde. Típico em todos os países, esse piso é necessário ao funcionamento dos serviços essenciais e os salários. Vilipendiadas desde antes, educação e saúde correm sério risco de zerarem seus recursos e paralisarem - algo tão inédito quanto insano. 
     Como esclarece Fatorelli, a PEC 186 surge para institucionalizar o calote, que, como percebemos, ocorrerá quando bem entenderem governo e parlamento, sob chantagens injustificáveis, como a do auxílio. Nessa chantagem está o escabroso estratagema de retirar 25% de salários e carga horária dos servidores, para tapar o rombo.
     Outra sordidez: o confisco salarial é uma cláusula da PEC 32 (reforma administrativa). Notando má aceitação desta na íntegra, Paulo Guedes vai aos poucos, pelas beiradas do angu para, quando chegar ao cerne, a PEC 32 já terá sido assimilada pela maioria sem resistência da oposição.
     Ir por etapas é uma tática tão inteligente quanto insana: enrola a oposição a impedindo de encaixar as peças do quebra-cabeças em tempo curto e hábil, enquanto parte do parlamento lança mão de outros estratagemas como a PEC da impunidade, e o povo se atenta no BBB ou nas lives de Bolsonaro.

Fôlegos finais...
    Mas, o Congresso também tem outra preocupação urgente, votar a submarina PEC da imunidade2, elaborada enquanto a PF levava Daniel Silveira à prisão e o STF elabora decisões de novas prisões de parlamentares envolvidos em fake news e outros crimes antidemocráticos.
     A urgência se mostrou na votação relâmpago da PEC da imunidade. Por conta desta, o texto da 186 será provavelmente adiado, mais um além de outros ocorridos devido à sindemia de C19 e, claro, de mimos aos bancos, de quase R$ 2 trilhões só no ano passado. 
     Por outro lado, a PEC 186 enfrenta críticas de juristas. "Defender, no meio de uma pandemia, deste tamanho e dessa natureza, o desfinanciamento do SUS é uma cretinice. E claro, inconstitucional", disse Eloisa Machado, professora da FGV-Direito em São Paulo e coordenadora do Centro de Pesquisas Supremo em Pauta.
     Eloisa estendeu a dura crítica ao significado da PEC em jogar sobre as classes populares e os servidores públicos de baixo escalão (também populares) o alto preço a pagar em nome da chantagem pessoal e hipócrita de Guedes para fugir da questão fiscal e fornecer auxílio emergencial, que ele já considera "muito preocupante".
     Vale salientar que a PEC 55 (teto dos gastos) de 2018 substituiu a correspondência do piso como percentagem pelo total de gastos com recursos na educação e na saúde no ano anterior conforme a inflação oficial3 - o que mostra um subfinanciamento ainda pior do que as percentagens anteriores, respectivas em 4 e 5% do PIB (a inflação oficial girava em 2%, em média).
     O parágrafo acima já é suficiente para mostrar porque a PEC 55/2018, a "do fim do mundo", já veio como um grave erro fiscal e ético. E pior ainda será a aprovação da PEC 186/2020. Muito mais do que uma bagunça jurídica, é uma desumanidade psicopata dos grandes títeres: Lira, Pacheco, Bolsonaro e Guedes.
     A "PEC da morte" ou do "genocídio" não deve ser só adiada. Deve ser definitivamente esquecida, se os parlamentares almejarem serem reeleitos em 2022.

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Imagens: Google (montagem: autoria do artigo)

Notas da autoria
1. Esse parágrafo é uma conjectura pessoal, por falta de informações em fontes disponíveis, mas que faz sentido na intenção do governo.
2. Será abordada no próximo artigo.
3. Exclui, na prática, a inflação da economia popular, que é sempre bem maior do que a oficial.

Para saber mais
https://pt.wikipedia.org/wiki/Minist%C3%A9rio_da_Educa%C3%A7%C3%A3o_(Brasil) (MEC)
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Minist%C3%A9rio_da_Sa%C3%BAde_(Brasil) (Saúde)
https://g1.globo.com/educacao/noticia/2019/04/08/ministro-da-educacao-e-demitido-apos-gestao-marcada-por-controversias-e-recuos.ghtml
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eu-estudante/enem/2020/06/19/interna-enem-2019,865347/gestao-de-weintraub-foi-marcada-por-criticas-e-polemicas.shtml
- https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2020/08/milton-ribeiro-demite-secretaria-de-educacao-basica-apoiada-por-olavistas.shtml
- https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2021/02/governo-insiste-em-cortar-recursos-da-saude-e-educacao-e-votacao-da-pec-emergencial-deve-ser-adiada/
- https://www.extraclasse.org.br/opiniao/2021/02/senado-votara-hoje-pec-186-que-da-calote-em-direitos-sociais-e-entes-federados/
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/22/tirar-dinheiro-do-sus-para-renovar-auxilio-e-inconstitucional-diz-jurista.htm
- https://www.sintrajufe.org.br/ultimas-noticias-detalhe/18052/pec-186-reducao-de-ate-25-dos-salarios-do-funcionalismo-esta-entre-as-prioridades-dos-novos-presidentes-da-camara-e-do-senado
- https://www.sintrajufe.org.br/ultimas-noticias-detalhe/18119/votacao-da-pec-emergencial-sera-na-terca-com-ameaca-a-saude-e-educacao-e-congelamento-salarial-no-texto-confisco-segue-no-horizonte

     
 

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Adendo: respingos da prisão de Silveira


     No artigo anterior houve uma exploração do tema da prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL-RJ), cujos reflexos mais visíveis se fizeram no seio da sociedade através das redes sociais.
     Como apontado, a causa da decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes teria sido um vídeo postado por Silveira nas redes sociais, com teor de linguajar chulo, expressão violenta e ameaças aos ministros, desde a reação de um deles a uma fala ameaçadora do general Villas Boas.
     De fato o vídeo consta no documento elaborado por Moraes, que tem se destacado por incomodar Bolsonaro. Mas, segundo o canal do Youtube Pensando Alto, do professor Roberto Cardoso, o vídeo foi causa primária sobre Siqueira. Há outro fator primordial e mais amplo em jogo, e balança geral.
     Aplicar novas análises nesse contexto é o objetivo central deste artigo.

-> O vídeo e a truculência de Siqueira

     O vídeo ficou conhecido pelo grande público por conta da ampla divulgação pela mídia e nas redes sociais. Ele chama atenção pelo linguajar chulo e desrespeitoso com ameaças, desafiando dispositivos constantes principalmente na Lei de Segurança Nacional, conforme documento de Moraes.
     Todos os ministros do STF foram alvos genéricos dos vitupérios, mas ficou mais grossa a direção ao ministro Edson Fachin. A causa foi apontada pelo próprio parlamentar como a reação (tardia) de Fachin a uma fala em tom desafiador do general Villas Boas, proferida em 2019.
     O material tem a sua relevância, o vídeo atentou contra a democracia na defesa do AI-5 vigente na ditadura, contra o Estado de direito e à independência harmônica entre os três poderes. E ameaçou com métodos truculentos a autoridade dos ministros da instituição máxima do poder judiciário.
     No nosso Estado, a independência harmônica entre judiciário, legislativo e executivo e o Estado de direito constituem dispositivos republicanos, abrangendo nação (o povo e suas razões moventes), o governo e Estado. Foi contra a República que Silveira se virou, na sua razão bolsonarista.
     Bolsonarista por identidade política e por sua essência naturalmente truculenta, a despeito de, até onde se sabe oficialmente, não ter registro de autos de resistência em seus quase 6 anos de PM.
     Porque é reflexo de Bolsonaro, que externaliza sua índole e desejos em suas políticas traduzidas em anticiência, fanatismo religioso-ideológico e destruição, efetuados contra os pilares republicanos hoje reconhecidos na LSN.
     Por isso, o vídeo foi causa mais estrita que levou à prisão o seu próprio autor. Mas, certamente, não foi de graça, assim como tantos outros atos ocorridos contra o STF, prestes a serem desmascarados a partir de suas origens, anteriores, talvez, à eleição de Bolsonaro. 

-> Financiamento estrangeiro

     Na campanha eleitoral 2018, redes sociais passaram a ser ringues cibernéticos de forte polarização de dois grupos, os bolsonaristas identificados na extrema-direita e os antibolsonaristas. 
     Não sendo necessariamente de esquerda, os antibolsonaristas eram generalizados como petistas, lulistas, 'mortadelas', comunistas, etc. A coisa ainda é assim, só que menos intensa.
     Essa polarização tem sido criticada pela truculência e muitas fake news de bolsonaristas e anárquicos extremistas. Apesar da lei de informação e da CPI no Congresso, eventos de ódio continuam.
     Antes da posse de Bolsonaro, foram noticiados disparos de fake news no WhatsApp financiados por entes privados, resultando na CPI das Fake News 2019. Ainda em 2019, no Rio, uma carga de peças de 117 fuzis de uso restrito das FFAA dos EUA foi descoberta na casa do miliciano Ronnie Lessa.
     Em 2019 eclodem manifestos bolsonaristas contra o Congresso e o STF com ofensas, ameaças, gritos de ordem, por incentivo do Gabinete do Ódio2. Ali estava o 300 pelo Brasil de Sara Giromini, que acampava em Brasília com pesadas armas e fardas. Eram atos antidemocráticos, de 2019 a 2020.
     Os manifestos agora se reduziram às fake news conspiradoras do gabinete do ódio, versão brazuca do QAnon, estendidas à antivacina em plena sindemia de C19 e a tragédia resultante. Claro, nada disso também saiu de graça. E uma confirmação foi feita.
     Foi feita por um ministro do STF, Dias Toffoli que apontou um financiamento internacional para os ataques antidemocráticos, os sustentando para o fim de desestabilizar a democracia. A afirmativa saiu numa entrevista ao programa Canal Livre, da Bandeirantes, no dia 21/2.

-> Reflexões finais

     O financiamento internacional certamente não é pouco, e nem tão recente. É sabido que entre os grandes atores desse financiamento se destaca um braço-direito do seio político-ideológico que ajudou na eleição de Donald Trump em 2016: Steve Bannon.
     Quem já leu sobre Bannon sabe que, mais do que ideólogo, ele tem ligações estreitas com magnatas poderosos, banqueiros, e empresários e políticos de caráter bem suspeito, e foi mentor das campanhas de Trump e Bolsonaro, tendo como mediador o Bolsonaro 03 e Olavo, que indicaram o fidelíssimo Ernesto Araújo para chanceler na marcha contra alucinações ideológicas deles próprios.
     Embora não haja fontes a confirmar isso tudo, é muito provável que Eduardo, o 03, esteja por trás, também, da mediação do financiamento internacional das práticas contra a democracia, as instituições e a República, denunciadas por Toffoli na citada entrevista. Nada se descarta até prova em contrário.
     É perfeitamente normal que Toffoli tenha sido cauteloso em não dizer detalhes, seja por falta de fontes sólidas ou outro motivo. Mas há vários sinais além da violência gratuita, com armas de grosso calibre e uso restrito por qualquer um, a formação das PMs4 estaduais pela União, os 117 fuzis, além das fake nws e lives on-line do gabinete do ódio de Brasília.
     Nada acima é confirmável, mas também não se descarta. Mas é certo que a prisão de Silveira e a afirmativa de Toffoli sejam passos iniciais de uma demandada de prisões recomendadas pelo STF a outros parlamentares. Um efeito dominó que vai dar muito pano para manga.
     O STF terá muito trabalho pela frente, e o Congresso também. Afinal, chega o dia em que tanto lixo por baixo do tapete terá que ser varrido. Um recado de que tudo tem um limite, até o bolsonarismo. E esse será o recado mais duro do STF. E nos resta aguardar para assistir em nossas telas.

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Imagem: Google.

Notas da autoria
1. Filósofo grego clássico, autor da célebre A República.
2. Grupo on-line com núcleo em Brasília, criador de sites noticiosos de fake news, incentivo a manifestos e arruaças de ódio.
3. Grupo de ativistas pró-Trump, responsável pelo recente manifesto de invasão do Capitólio após a vitória de Biden.
4. Suspeita-se do propósito do governo em fortalecer grupos milicianos a partir dessas novas polícias.

Para saber mais
https://www.youtube.com/watch?v=bJB9quQZa4E (Pensando Alto de Roberto Cardoso)
- https://www.youtube.com/watch?v=Ct6zVdjiFec (Bemvindo Sequeira)
https://180graus.com/na-politica/toffoli-aponta-financiamento-internacional-a-ataques-antidemocraticos-no-brasil
https://revistaforum.com.br/politica/delegado-confirma-que-armas-tinham-registros-da-marinha-americana-mas-diz-que-sao-fakes/
- https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/03/20/marielle-o-que-se-sabe-sobre-as-pecas-que-serviriam-para-montar-117-fuzis.htm

     
 

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Respingos da prisão de Daniel Silveira: análise


     Nessa semana, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) postou um vídeo no qual destila fala ameaçadora e de ódio dirigida aos ministro do STF, principalmente Edson Fachin. O vídeo viralizou nas redes sociais, a partir de postagem do próprio deputado.
     Além das ameaças e expressões de ódio em linguagem chula, o deputado caprichou na sua apologia ao AI-5 da ditadura militar. Terra fértil para germinar a decisão do ministro Alexandre de Moraes pela prisão em flagrante, favorecida por 11 a 0 no STF.
     Na Câmara, o tema da prisão ganhou urgência. Arthur Lira, presidente da casa, formalizou votação aberta para o tema. Resultado: 364 votos em bloco a favor da prisão. O presidente Jair Bolsonaro se silenciou sobre o fato. 
     Aliás, de onde saiu Daniel Silveira? Qual o significado legal dessa prisão? Esses e outros tópicos serão analisados aqui.
     
-> A ficha corrida de Daniel Silveira, o fortão inapto

     Daniel Lucio da Silveira (Petrópolis, 1982) teve outas ocupações antes de se entrar na PMERJ em 2012 através de uma batalha judicial. Estudou Direito na Universidade Estácio de Sá. É também professor de muhai thai e defesa pessoal. Mas, o que lhe deu fama foi a indisciplina agressiva.
     Em 2007, como cobrador de ônibus em Petrópolis, explicou na delegacia a origem de várias licenças falsas para faltar ao trabalho. Investigações apontaram que o "homem de branco" que os assinava era um faxineiro do hospital. Em 2012 foi preso pela primeira vez por vender anabolizantes em academias.
     Na sua passagem na PMERJ recebeu duas advertências, 14 repreensões, 60 sanções disciplinares e teve 90 prisões, uma delas de mais de um mês. Obteve novas licenças para evitar a expulsão e driblar a Lei da Ficha Limpa. Mas, a conta chegaria, através de um vídeo que o notabilizou.
     O vídeo foi sobre um patrulhamento em Duque de Caxias (RJ), denunciado à Ouvidoria do MP-RJ como ação paralela. O que motivou a sua expulsão da corporação. Nesse e em outros, Daniel defendia o lema "bandido bom é bandido morto", daí a apologia às violentas operações nas favelas. 
     Em 2018, após o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), Daniel e o colega Rodrigo Amorim quebraram uma placa simbólica criada por militantes. Eles alegaram que a placa cobria a de sinalização da praça Floriano Peixoto e para "evitar vandalismo dos psolistas".

Um político meia boca e agressivo
     Eleito na violência do bolsonarismo, Daniel foi um votante favorável a textos deletérios governistas como congelamento salarial de servidores públicos, benefícios a caçadores e atiradores, legalização da grilagem, pacote anticrime de Moro, reforma da previdência, anistia a dívidas das igrejas, etc. 
     Votou contra criminalização dos responsáveis por rompimento de barragens, exclusão de docentes2 da reforma da previdência, aumento do fundo partidário e o Fundeb apenas para ensino público.
     Fez duas propostas ridículas: um "dia nacional em memória às vítimas do comunismo" (oi? Como?), e a doação obrigatória de órgãos de pessoas assassinadas pela polícia.
     Em 2019, como "autoridade", invadiu o Colégio Pedro II alegando uma "cruzada pela educação" para suposta inspeção: a reitoria o denunciou à PF por entrar sem autorização. Depois, publicou fake news sobre a revista AzMina, e foi flagrado insultando o jornalista Guga Noblat e jogando seu celular ao chão.
     Em 2020, pagou com grana pública R$ 110 mil ade consultoria a uma empresa que ainda não estava aberta, segundo a revisa Época. E também participou de atos antidemocráticos contra o congresso e o STF.
     E neste 2021, se destacou em dois vídeos: o que o levou à atual prisão, e outro de cunho racista, no qual ele disse que "só contrata pessoas brancas". Mais um crime na conta.

-> Reflexões finais: os respingos da prisão

     A prisão de Silveira respingou nas instituições públicas e privadas, na opinião pública e até mesmo na presidência e sua ideologia.

Entendendo a decisão do STF
     A decisão de Alexandre de Moraes pela prisão do deputado se valeu em crimes de atentado contra o Estado de Direito com violência; tentar impedir livre exercício dos poderes da União e dos Estados; propaganda pública de atos violentos ou ilegais para alterar ordem sociopolítica; incitar crimes citados na Lei de Segurança Nacional, etc.
     A decisão de prisão em flagrante suscitou debate jurídico. A defesa do deputado ironizou como uma "nova modalidade de flagrante". Enquanto alguns juristas e agentes da PF o neguem, Alexandre de Moraes o justifica na Lei de Segurança Nacional (LSN).
     Criada na ditadura (1973) durante o AI-5, a LSN regulamentou perseguição a opositores públicos e privados, e também, calar deputado crítico do regime. Foi atualizada no governo Dilma no respeito ao Estado democrático de direito, aos três poderes e na adição do dispositivo antiterror de 2013.
     Os crimes atribuídos a Silveira se encaixam em vários atentados ao Estado de Direito e aos três poderes, com ameaças e métodos violentos (terror), e o vídeo prova o flagrante, segundo Moraes. Um caso de jurisprudência, talvez.

Nos canais de mídia
     Não é segredo para ninguém que o jornalismo não é isento de ideologia. É essencialmente humano, com matizes de direita (elite) e esquerda (popular). Há canais independentes1, sem ligação a partidos ou fundações.
     A prisão foi noticiada à larga, inclusive na plataforma Youtube e correlatas. Em geral foi bem vista, mas com matizes diferentes. As mídias de esquerda deram como vitória contra o bolsonarismo, já as da direita a exploraram para tapar as notícias das reformas draconianas de Guedes.

Em Bolsonaro et caterva
     Bolsonaro e seus lacaios se calaram por algum tempo como reação à prisão de Silveira. Seguidores deste interpretaram como abandono - que pode ser real, normal num líder nacional que se destacou no extremo desprezo às mais de 240 mil vítimas da C19.
     Depois o presidente respondeu com evasivas, talvez num sinal de que ficou mexido: menos um de sua ala ideológica na Casa, além de alguns de seus famosos seguidores na equipe do gabinete do ódio.
     Embora se saiba que o bolsonarismo sobreviverá à morte da era Bolsonaro, a exemplo do nazismo, hoje criminalizado, não é possível negar que o STF enquadrou o modus operandi da ideologia, num claro recado à família Bolsonaro et caterva de estarem entre os próximos alvos.
     Que o digam dois nomes da ala bolsonarista, a pastora assassina Flor de Lis e a mitomaníaca Carla Zambelli no inquérito das fake news.
     Mas a agenda econômica parece não ter sido atingida, exceto no adiamento das votações das tão ansiadas reformas, devido aos protocolos relativos à prisão. Mas, podem ser adiadas de novo, devido aos dois casos supracitados.

Na opinião pública
     A opinião pública segue o rumo das correntes do oceano de informações difusas. E uma determinada mídia a informar o fato mostra com muita facilidade a profunda polarização política popular. É aí que verificamos o mosaico reativo, da alegria dos antibolsonaristas ao lamento dos eleitores do ex-PM, que corre risco de cassação.
     Entre os bolsominions houve avaliação mais pró-Daniel: "pelo menos ele não rouba", na esteira do mote da corrupção. Entre os "neutros" e os "contra Bolsonaro e PT", domina a análise da conduta do deputado, com base em possibilidade psiquiátrica, como possível personalidade antissocial. 
     Foi em meio à opinião pública que apareceram alguns perfis "juristas" nas redes a debater sobre a natureza dos crimes cometidos pelo parlamentar e a atuação do STF. Alguns ironizaram a decisão do STF em defender a democracia enquadrando o ex-PM numa lei criada na ditadura. 
     Mas, se verificou ligeira maioria assente à afirmação de que a conduta de Daniel foi bem agressiva e ilegal, de fato configurando crime de natureza política e contra o Estado de direito. E a compreensão de que o STF dá seus recados a Bolsonaro e sua ideologia - e não é o primeiro.
    
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Imagem: Google.

Notas da autoria:
1. Os recursos financeiros provêm de assinantes populares.
2. Docentes = professores.

Para saber mais
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Daniel_Silveira
- https://www.brasildefato.com.br/2021/02/17/quem-e-daniel-silveira-o-deputado-bolsonarista-preso-apos-ameacas-ao-stf
- https://extra.globo.com/noticias/brasil/atestados-falsos-prisao-repreensoes-na-pm-folha-corrida-de-daniel-silveira-24887731.html
- https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/02/deputado-daniel-silveira-resiste-a-usar-mascara-no-iml-e-levanta-a-voz-para-policial-civil-veja-video.shtml
- https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/02/prisao-de-deputado-mostra-os-custos-do-bolsonarismo-para-os-poderes.shtml
- https://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2021/02/6087079-deputado-daniel-silveira-e-preso-apos-apologia-ao-ai-5-e-ataques-ao-stf.html
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/17/prisao-de-deputado-indica-que-guerra-bolsonarista-a-democracia-sera-longa.htm
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/17/defendido-por-daniel-silveira-ai-5-nasceu-para-punir-discurso-de-deputado.htm
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/18/video-de-daniel-silveira-e-aula-de-como-o-bolsonarismo-manipula-a-violencia.htm
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/19/silveira-perde-poder-mas-se-fortalece-na-disputa-de-sociedade-diz-freixo.htm
- https://www.diariodocentrodomundo.com.br/eu-so-vou-contratar-pessoas-brancas-diz-daniel-silveira-em-video-editado/
- https://theintercept.com/2021/02/21/com-prisao-do-deputado-daniel-silveira-stf-enquadrou-modus-operandi-bolsonarista/
- https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2021/02/daniel-silveira-stf-familia-bolsonaro/


domingo, 21 de fevereiro de 2021

#Curiosidade: duas versões dos "esquisitos"

 
Conhece alguém que seja assim... esquisitão e/ou excêntrico? Claro, sempre nos deparamos com gente assim, e nunca sabemos porque são assim. São dois tipos nesse artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de Personalidade.

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     Beatriz é uma jovem ativa: é auxiliar de escritório durante o dia e estuda Direito à noite. Sua irmã, Berenice, é uma professora da 1ª à 4ª série do ensino fundamental. Beatriz é introvertida, muito "na sua", e Berenice vê razão mística para muitos acontecimentos, com fama de excêntrica entre os colegas.
     Nesse momento da sindemia de C19, as duas irmãs se dedicam aos afazeres principalmente por home office. Beatriz aparece mais no trabalho, às vezes, quando solicitada pelo seu chefe, enquanto Berenice cumpre na escola vazia alguns encontros burocráticos.
     O home office para Beatriz e Berenice é ótimo; para a primeira por ser solitário, e para a segunda, uma facilidade esperançosa de que nada está perdido. A primeira não se importa com o que pensam sobre a sua aparente indiferença; a segunda idem, mas "tudo se resolve", pois "os deuses conspiram a nosso favor". Mas bem que poderia ser diferente...
     A geral não sabe, mas Beatriz e Berenice têm uma história de psicologia difícil. Sim, ambas, cada uma com uma versão própria de um transtorno psíquico de personalidade. Não são agressivas, mas, sim, "esquisitas". Essas duas versões da "esquisitice" são temas deste artigo.

-> Transtornos de personalidade esquizoide (TPEqz) e Esquizotípica (TPEqzt) 

     O Transtorno de Personalidade Esquizoide tem a sigla TPE no MSD-V1, mas para evitar confusão com o de personalidade esquiva (TPE), este artigo usará a sigla TPEqz.
     Para o TP Esquizotípica, será usada a sigla TPEqzt para distinguir do tipo esquizoide (TPEqz) e do TPE (esquiva). Também sigla TPE no DSM-V.
     O quadro geral do TPEqz é de desinteresse por relações sociais e emotividade limitada em relações interpessoais. É um transtorno de características estáveis ao longo da vida.
     O quadro geral do TPEqzt, por sua vez, é de desconforto em relacionamentos íntimos, percepção distorcida (florida) dos fatos e um comportamento excêntrico. É da subclasse dos TPs excêntricos.

Clínica, comorbidade, prevalência, diagnóstico, tratamento
     A pessoa TPEqz não aparenta interesse em relações sociais amplas, nem com parentes, com exceção da família e parentes próximos. Prefere hobbies sem interação social, como caminhadas solitárias ao ar livre ou sentar-se num banco ou diante da janela para ver o movimento das ruas ou da natureza.
     Relações interpessoais são limitadas, sem amigos confidentes. Não se importa com o que pensam dele, se bem ou mal, passando a impressão de autoabsorvido. Devido ao distanciamento aparente, seus namoros são raros e tende-se a ficar solteiro; o interesse sexual é eventual ou esporádico.
     Não demonstra reação a fatos importantes e parece passivo diante de certas circunstâncias. Mas, ao se sentir à vontade em algum momento com alguém, pode revelar seu sofrimento nas relações sociais ou interpessoais mais íntimas. Tem cognição e consciência normais, sem alucinações ou paranoias.
     A pessoa TPEqzt também tem limitação social, mas por acreditar que não foi aceita por ser diferente, e fica ansiosa em momentos sociais, mais ainda com desconhecidos. Atribui poder mágico aos fatos ou em relação a alguém (ideias de referência), e poder protetor mágico se fizer algo três vezes ao dia ou antes de algum afazer, por exemplo.
     Na comunicação, usa linguagem e maneirismos estranhos ou bizarros, e não olha direto para o seu interlocutor. Sua vestimenta é também assim, ou descuidada. Pode ter conduta rígida por não entender ou não se adaptar às dicas sociais habituais. Tende a ser fora do convencional. Por vezes acredita que os outros quere interferir em sua vida. 
     Prevalência: para o TPEqz chega a 5% da população geral, e para o TPEqzt, até 4%. Ambos, mais presentes no sexo masculino (EUA). No Brasil, faltam dados atualizados.
     Etiologia: para o TPEqz é principalmente ambiental (indiferença ou negligência na infância); para o TPEqzt, sobretudo biológica por compartilhar algumas alterações cerebrais da esquizofrenia.
     Comorbidades: a principal é a depressão maior (até 50% das pessoas TPEqz tem 1 episódio, e entre os TPEqzt igual incidência, mas pelo menos 2 episódios). Transtorno psicótico leve pode ocorrer em algumas pessoas TPEqzt sob estresse. Mais raramente, pessoas TPEqz podem ter TPL2.
     Diagnóstico: critério clínico pelo DSM-V; sinais no início da vida adulta (abaixo, conforme tópicos para cada TP em tela):
     TPEqz: desinteresse por relações sociais; impressão de autoabsorvido; preferência por atividades e lazer solitários, passividade aparente frente às oportunidades;  desinteresse afetivo e/ou sexual. 
     TPEqzt: limitação social por se acreditar mal visto; comunicação, pensamento e vestes bizarros; crenças idem; falta de adaptação a dicas sociais habituais; suspeição com aparente interferência na sua vida.
     Tratamento: para ambos, psicopterapia comportamental e de habilidades sociais. Medicação: só em casos específicos graves, a critério clínico (TPEqz), e antipsicóticos de 2ª geração e antidepressivos a pacientes TPEqzt, como tratamento primário, para aliviar a ansiedade. 
     Geralmente, os pacientes dos dois TPs tendem a aceitar os transtornos, após uma resistência inicial.

-> Reflexões finais

     O diagnóstico de esquizoide e esquizotípico não é fácil, assim como os demais transtornos. Para o esquizoide, por exemplo, o profissional procura observar principalmente desinteresse generalizado e passividade aparente aos fatos, oportunidades e pessoas, e não a introversão.
     Sujeitos muito tímidos ou introvertidos em geral têm habilidades sociais e interesses normais, bem como reagem a fatos ou circunstâncias. O tímido tende a se embaraçar numa conversa, e o introvertido é mais ouvinte do que falante. 
     Já o esquizotípico pode ser confundido com pessoa de humor crítico e teatral, que tende a se vestir de modo muito peculiar, não necessariamente descuidado ou espalhafatoso.
     A prescrição de medicação é determinada pelo profissional em especial para esquizotípicos classe comórbido grave, com mais episódios depressivos ou de caráter psicótico. É excepcional prescrever para o esquizoide comórbido, dada a ausência de visão distorcida da realidade. 
     De qualquer forma, mesmo que deparemos com um paciente desses, devemos nos lembrar de que cada um de nós é único, com reações próprias às pressões exercidas pelo mundo atual, e habilidades precípuas. Portanto, de maluco, todos temos um pouco. Preconceito não cabe aqui.
   
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Imagens: Google (montagem: autoria do artigo)

Notas da autoria
1. Manual Diagnóstico de Doenças Mentais, sigla em inglês. O V é a 5ª edição.
2. Transtorno de personalidade limítrofe ou borderline.

Para saber mais
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-esquizoide-tpe
- http://www.psiquiatriageral.com.br/dsm4/person2.htm



sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

O frágil terror cristonazifascista


INTRODUÇÃO

     Enquanto a geral assiste atenta às sessões de impropérios exibidos na vigésima primeira versão do reality show BBB e a C19 ataca o povo em festa, lá em Brasília o presidente Jair Bolsonaro assinou tranquilamente quatro decretos relativos à posse de armas pelo cidadão comum.
     Tais decretos, segundo mostra a matéria do G1 - Globo de 13/2, versam sobre as modificações de regramentos desde a compra da arma à posse e ao porte das armas: num deles, o cidadão comum poderá ter direito a até seis armas de fogo.
     Os bolsonaristas mais abastados se esbaldaram com o fato, enquanto a maioria popular se limitou ao aceno de cabeça ou um joinha, sem máscara nas ruas. Porque aqueles têm poder aquisitivo suficiente para comprar armas legalmente, e estes, só se ilegalmente, e ainda assim não sai nada barato.
     A julgar pela fotomontagem e pelo títulos, vocês leitores certamente questionarão, o que tem a ver os decretos das armas do presidente, crime organizado e a intolerância religiosa. Calma, vão ver que têm muito a ver, sem precisar ser diretos. 

-> A aliança Neopentecostal-Bolsonaro: breve histórico

     O clima pós-Collor deu maior espaço a movimentos e partidos de esquerda. De carona, entram em cena parlamentares pentecostais e neopentecostais. Politicamente opostos, esquerda e evangélicos caminharam lado a lado. O petismo assumiu o poder e a bancada da bíblia se tornou a mais famosa no Congresso.
     Com o Centrão (de Lira, Maia, Renan, etc.), a bancada se prostitui com o governo, não importa o líder. E o faz em nome de seus interesses econômicos e, por marketing, das pautas cristocêntricas. Se destaca mais por aí do que nas suas propostas barulhentas, mas irrelevantes ou ridículas.
     Irrelevância e barulhos à parte, essa bancada evidenciou o movimento evangélico popular1, que se juntou a grupos de direita nas ruas na era Dilma, em 2013, com apoio da mídia da casa grande a se expressar em lindas palavras. É nesse cenário que surge Jair Bolsonaro.
     Deputado veterano, do baixo clero e ligado ao centrão, Bolsonaro era da bancada da bala, mas vagueava pela da bíblia, a defender os valores cristocêntricos e, junto a Malafaia, Macedo e outros do mesmo naipe, formou uma aliança evidenciada no processo de impeachment de Dilma.
     A vitória de Bolsonaro em 2018 se deveu, em grande parte, pelo curral eleitoral de púlpito2. Daí se estima que, dos 57 milhões de votos, 20 milhões saíram desse curral, graças ao discurso moralista do então candidato.
     Outros pontos conhecidos da aliança neopentecostal-Bolsonaro se evidenciou no discurso da fé acima da ciência, da Bíblia sobre a Constituição, e nas pautas cristocêntricas, como a nova agenda de costumes, considerada relevante pelo governo.

-> Outras alianças

     Mas, sempre há alguma sujeira por baixo do belo e límpido tapete vermelho do glamour e poder. E nessa aliança não é diferente não. Até revela coisas piores do que se imagina. A começar pela própria aliança entre igrejas evangélicas e o tráfico no Rio de Janeiro, idealizado pelo pastor Marcos Pereira3.
     O motivo pastoral inicial, na esteira da pioneira Igreja Católica de reabilitar criminosos presos, deu lugar a um pacto no qual bandidos soltos evangelizados perpetuam seus crimes, somando intolerância religiosa na área dominada, e/ou guarda de armas em dependências da igreja.
     A intolerância religiosa está além das diferenças de crença. A fé afro é parte central da etnografia africana mais ampla, numa identidade histórica do povo negro. E é sobre esse sentido que os grupos criminosos no aval dos líderes pastorais se investem contra. Mas, só localmente.
     Essa aliança acima se revelou muito lucrativa para ambos os lados: os pastores têm maior domínio evangelizador para ter mais dízimos, e os criminosos com um seguro depósito de muambas, e lucrando com seu comércio.
     No cenário entram as milícias. Defendidas por Bolsonaro, com a eleição deste e de representantes seus no embalo, ganham poder pleno, mesmo sendo criminosas. Entram já articuladas com prefeitura e igrejas evangélicas. No Rio, a aliança se consolidou na gestão de Crivella, aliado do presidente.
     A relação com a política ocorre na eleição de representantes em prefeituras e legislaturas, o que se explica em eventuais assassinatos de candidatos a vereador ou vereadores de fato (Marielle foi apenas um entre vários), bem como nas eleições de seus representantes ou aliados.
     As milícias diversificam suas atividades: comércios em geral, fornecimento de gás, eletricidade, internet (gatonet), jardinagem, imóveis, segurança em geral, etc. Tanto residentes quanto comerciantes pagam taxas extras por esses serviços. 
     O poder articulador das milícias surpreende, talvez pela experiência da diversidade de serviços com os moradores das áreas dominadas e junto a instituições importantes como a DPU4, sobre moradias do programa Minha Casa, Minha Vida.
     Na aliança entre milicianos e pastores não há menção de intolerância tal como com o tráfico. Mas há pastores que procuram converter os aliados, parte dos quais acata sem deixar de seguir seus crimes. 
     Na aliança entre milicianos e igrejas evangélicas, não há menção de intolerância religiosa tal como nas áreas dominadas pelo tráfico. Mas, muitos pastores procuram converter milicianos, alguns deles autodeclarados evangélicos, sem deixar de seguir sua carreira criminosa. 
     Entre as diversas atividades que marcam a carreira criminosa figuram assassinatos de encomenda, tráfico de armas de uso restrito das FFAA, e em alguns locais do Rio, até a narcomilícia, como já foi tratado neste blog.

-> Nisso, o decreto das armas

     Em maio de 2019, após a ressaca das eleições e do ano novo, Bolsonaro então manda a público o primeiro dos quatro primeiros decretos que versam sobre a flexibilização da posse e porte de armas por cidadãos comuns. Nesse caso, o decreto suscitou alegria entre os seus apoiadores.
     Mas a ficha logo caiu para a maioria pobre dos apoiadores, pelo preço e o fato de não ter mexido em pontos obrigatórios do Estatuto do Desarmamento lulista, como registro de nota fiscal de loja, atestado de bons antecedentes e laudo de plena aptidão mental.
     Tais pontos demonstram que, ao contrário dos fakes dos bolsominions, o Estatuto não vedava ao cidadão civil a posse e o porte de arma, desde que com devida autorização assinada por autoridade competente e acatando restrições bem específicas. 
     Alterações: Número de armas por cidadão civil5 (Estatuto- 2; decreto 2019- 4; agora, 6); Porte (no Estatuto- não; decreto 2019- sem menção; agora- até 6); Laudo de aptidão: antes, carimbo de psicólogo cadastrado na PF; agora, pode qualquer profissional inscrito no sistema de Conselhos de Psicologia.
     Apesar do apoio da ala ideológica, o Congresso rejeitou o primeiro decreto, pelos riscos como o aumento de conflitos com armas de fogo por motivo torpe, e o embate pelo excludente de ilicitude nas GLOs (garantia da lei e da ordem) policiais. O novo decreto adensa quatro documentos.
     Que também corre risco de rejeição. Há traços de ilegalidade a indicar a ignorância das autoridades em segurança pública. "Assegurar o porte de arma é apenas mais uma ilusão de segurança [...] ao longo da história, empresários e gestores já venderam inúmeras promessas de garantia de segurança". O risco de veto pelo congresso é grande.
     Adicionando-se a dois planos já postos nesse blog (tirar a responsabilidade estadual pelas polícias para formar um "corpo pretoriano", e o treinamento de jovens favelados para segurança pública), os decretos são vistos por analistas de segurança e juristas como extensão autocrática do governo para controle social.
     
-> Reflexão final

     A reflexão final não é em si complicada de se entender. Bolsonaro deseja impor um novo formato de nação, com uma sociedade ultramilitarizada e armada, cristocêntrica, cristofascista, heteronormativa, racista e patriarcal em seu modo mais agudo.
     Para isso, ele coloca em prática, na medida do possível, a negação da ciência que tem resultado em tantas mortes pela C19 e sem um plano claro de vacinação; e em paralelo, na calada, Guedes avança nas suas reformas de destruição do Estado cujos textos já tramitam no Congresso.
     À sua disposição há ideólogos, travestidos de parlamentares, como grupelhos correlatos ao de Sara Giromini, milícias e pastores neopentecostais. Todos com sangue nas ventas e nos olhos a destilar ódio e violência, em nome do Deus da destruição pelo renascimento.
     Mas, o bolsonarismo talvez não esperasse enfrentar instituições que, mesmo não funcionem a nosso contento, ainda possuem solidez e contam com cabeças honrosas e de notável saber jurídico. Fora que ele mesmo seja, na real, um movimento ideológico truncado e confuso, sem solidez prática.
     Até mesmo as minorias religiosas não cristãs, como as da perseguida fé afro, são mais sólidas do que os ideais bolsonaristas. Elas estão na raiz do constructo da própria nação brasileira, em cores e ritmos que ultrapassam fronteiras das negações de qualquer natureza, cristã inclusive.
     A destruição só é plena quando é tão ampla e global quanto o macrossistema capitalista que domina o mundo, das ditaduras às mais plenas democracias. O tradicionalismo que Bolsonaro ainda sustenta se restringe ao Brasil e perdeu, neste ano, seu maior sustentáculo, o trumpismo.
     A prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira a mando do STF indica que o bolsonarismo é um cão a morder a rodar em si mordendo o próprio rabo. Ele pode sobreviver por muito tempo como uma ideia, mas só. Como política, ele aos poucos se pulverizará como uma fia poeira soprada pelo vento da História.
     
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Imagens: Google (fotomontagem: autoria)

Notas da autoria
1. Fruto da redemocratização, assumindo aos poucos papel eleitoral importante, com seu clímax a partir do petismo.
2. Com Malafaia nas marchas para Jesus, Macedo nas "catedrais" e Pastor Everaldo no batismo no rio Jordão (Israel).
3Até prova em contrário, ele não tem participação no pacto com criminosos nos novos favores trocados que se seguiram.
4. Defensoria Pública da União
5. PMs, agentes penitenciários, membros do MP e de tribunais.

Para saber mais
- http://www.ihu.unisinos.br/188-noticias/noticias-2018/584446-foram-os-evangelicos-que-elegeram-bolsonaro
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2019/12/igrejas-em-presidios-uma-relacao-de_15.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/01/bolsonaro-e-as-pms-prenuncio-de-golpe.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/12/tradicionalismo-politica-e-misticismo.html
- https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160120_intolerancia_religioes_africanas_jp_rm
- https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/milicias-do-rio-tem-parceria-com-policia-faccoes-e-igrejas,3bde5cb8c088913dfba3cd70bfd74e42jmtxsc4z.html
- https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2021/02/15/povo-nao-esta-vibrando-por-armas-como-diz-bolsonaro-e-calafrio-de-covid.htm
- https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/02/13/veja-o-que-muda-com-os-novos-decretos-de-bolsonaro-sobre-armas-de-fogo.ghtml
- https://www.justificando.com/2019/05/28/quais-sao-os-reais-problemas-do-decreto-que-flexibiliza-a-posse-de-armas/
- 


     

     
     
     

 

CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...