sábado, 30 de janeiro de 2021

#Curiosidade: o perigo social em duas versões


Tendemos a confiar nos nossos próximos, mas o perigo está onde menos esperamos: no trabalho, na vizinhança do bairro ou da rua, ou na nossa casa. Este é o décimo-quinto artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de Personalidade.
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     Anderson voltava para casa acompanhado de seu amigo Rogério. Ambos conversavam, até que num momento este último, ao conferir o dinheiro pego no bolso, pediu ao amigo um pouco para inteirar o que pretendia.
     Anderson então foi verificar sua carteira. Afinal, são amigos de anos. Ao tirar uma cédula, foi subitamente agarrado no pescoço, imobilizado pela surpresa e pelo mata-leão. Sem conseguir respirar, se debateu, mas o braço poderoso de Rogério o sufocava ainda mais. 
     Vários minutos depois de inglório esforço físico sem ar, Anderson faleceu. Satisfeito, Rogério o largou, pegou a carteira com tudo dentro e correu até desaparecer na noite, o corpo sem vida abandonado na rua mal iluminada e totalmente deserta.
     O fictício relato acima revela um crime tantas vezes ignorado ou sem solução, cometido por alguém possivelmente... psicopata. É sobre esse transtorno, em duas versões, que este artigo visa tratar.

-> Transtorno de Personalidade Antissocial ou Psicopatia?

     O Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS, TPA) é um dos mais conhecidos males psíquicos, por ser explorado no cinema como a popular Psicopatia. Mas, afinal, são a mesma coisa mesmo?
     O nome psicopatia remete à Psicopatologia, área da Psiquiatria e da Psicologia que estuda os males psíquicos em geral, devido à etimologia: psyché = alma; pathos = doença. Nesse sentido em abordagem genérica e simplista, psicopatia seria qualquer patologia psíquica. Só que não se usa assim.
     Psicopatia é nome usado no meio forense para diagnosticar presos com traços como ausência de empatia, remorso e sentimentos, e indiferença a regras sociais e legais. O diagnóstico forense tem peso na definição do veredicto final nos processos judiciais.
     Mas há quem distinga TPA de psicopatia. Especialista em infratores violentos, Stephen Blumenthal diz que o TPA é basicamente impulsividade e agressão, enquanto psicopatia é total frieza e cálculo.
     Nesse sentido, se conclui que a expressão da sigla TPA (ou TPAS) se reserva à denominação clínica pelo Manual de Doenças Mentais (DSM-IV e V), com codificação própria no Código Internacional de Doenças-10, da OMS.

Características, prevalência, etiologia, diagnóstico e tratamento - Stephen Blumenthal
     O sujeito TPA não consegue controlar seus impulsos emotivos, sendo muito reativo e agride verbal ou 'no braço' por qualquer motivo. Receber um olhar insistente basta para explodir. É problemático no trabalho e na vida afetiva. É o "esquentadinho ao dobro", que precisa ser contido pelos outros para não ir além.
     É o mais propenso a desacatar os policiais e servidores públicos, quando contrariado em suas necessidades ou vontades. Se não bate no provocador, desconta nos objetos. É propenso a abusar de álcool e drogas psicoativas, embora não obrigatoriamente.
     Age de forma mal planejada ou sem plano prévio, indicando decisões por impulso, sem a reflexão racional necessária, daí as encrencas no trabalho e instabilidade empregatícia. Afetivamente é muito ciumento e possessivo, passível de cometer violência doméstica. Há remorso, ainda que a empatia seja diminuída.
     Já o psicopata é autocentrado, frio e calculista. Os fins justificam os meios e não o contrário. Age com descaso às regras sociais e à lei e não tem empatia com o outro. Tem visão utilitária das pessoas e grande poder de convencer, por seu caráter naturalmente manipulador e à sensação de onipotência. Ele estuda cada gesto, olhar e emoção do outro.
     Sempre atribui ao outro a sua própria culpa justificando-se com mentiras; culpa as vítimas por sua inocência; tem total indiferença aos efeitos negativos de sua exploração sobre outros por considerá-los apenas seus instrumentos de domínio ou de alcance de objetivos. Daí ter instabilidade empregatícia, em seu desrespeito à equipe e às trapaças.
     Embora frio e calculista, o psicopata desconsidera as consequências de seus atos, que são efetuados sem motivo aparente, só para afastar o tédio. Se mete em irresponsabilidades como direção perigosa e gastos descontrolados, e delitos como assaltos, trapaças, ataques a patrimônio, estelionato, golpe, etc.
     A grande maioria dos TPAs e psicopatas não mata. Os cinematográficos serial killers são psicopatas que atuam geralmente sós e com repetição, com um modus operandi pessoal, e entre cada novo crime há um intervalo, que pode durar até anos.
     Se as relações afetivas do TPA são marcadas por ciúme explosivo, as do psicopata são impossíveis devido ao desprezo ao parceiro, promiscuidade, e pela índole irresponsável, arrogante e teimosa.
     A explosão do sujeito TPA o expõe mais à prisão, embora tente resistir; o psicopata termina preso pelo reconhecimento do seu modus operandi criminal e, em geral, por não resistir à coerção. Daí a incidência ser alta entre a população carcerária (até 31% e 10%, respectivamente).
     Prevalência: o TPA varia até 3,3%, e a psicopatia, a 1,5% na população geral, na proporção de 6 homens/ 1 mulher. Seria interessante estudar o meio político, dadas as facilidades concedidas1, que atraem os psicopatas, que justificam seus crimes em demagogias ou culpando colegas.
     Etiologia: genética, e desencadeada pelo ambiente. Normalmente os TPAS têm história infantil de transtorno de conduta (TC, prejudicar os outros e crueldades com animais), mas nem todos os TC vão necessariamente ser TPAS. Se o TC infantil tiver hiperatividade (TDAH) junto, o risco de desencadeio do TPAS é maior.
     Comorbidade: comum; geralmente, abuso de psicoativos, TPB ou TDAH2.
     Diagnóstico: critério DSM-V. Sinal-chave: desprezo persistente ao direito alheio. Outros: desprezo delituoso à lei; frieza emocional; falta de empatia e de remorso; índole irresponsável; manipulação com mentiras convincentes.
     Diferencial: TPB (este manipula para ser cuidado); TC (é padrão somente até os 15 anos); transtorno de abuso de drogas (impulsividade decorre do abuso) e TPN (narcisista não é enganador).
     Tratamento: o TPA é tratável com psicoterapia cognitivo-comportamental e fármacos, em um curto prazo para evitar consequências legais (reincidentes ou não) em vez de mudar o paciente. O psicopata parece não responder ao tratamento devido ao processamento de castigo e recompensa (é indiferente à punição).

-> Reflexões finais

     A opção de escrever sobre esses transtornos foi inspirada no requentar recente de uma matéria sobre  a possível psicopatia de Jair Bolsonaro, dada a sua indiferença à atual catástrofe da C19. Mas, salienta-se a intenção não política deste artigo, embora mereça reflexão. Afinal, o presidente tem evidentes traços de psicopatia, descritos no artigo anterior.
     Em suposto julgamento em tribunal internacional, o diagnóstico pode gerar um veredicto polêmico, que dependerá da análise pela legislação internacional. Vale salientar que os especialistas concordam que a frieza metódica revela ação consciente, não importam as consequências - traço visível no líder3.
     A visão geral sobre TPA e psicopatia encontra discordância entre os especialistas, tanto no ambiente clínico quanto no forense, no que se refere à separação em dois transtornos diferentes ou em critérios de denominação para um mesmo mal. 
     A descrição do TPA pelo DSM-IV tende à unificação: um mal, dois nomes, que tem concordância de Morana et al (2006). Dois pontos motivadores são: não medir as consequências de seus atos e o perigo à sociedade. Além disso, prevalece em homens.
     Já Stephen Blumenthal discorda ao apontar vários aspectos: TPA (explosão emotiva, algum remorso e empatia mitigada pela agressividade) e psicopatia (frieza, método, cálculo, explosão atitudinal, sem nenhum remorso nem empatia). Mas, não seria psiquiatrizar demais as variações psíquicas?
     Pela análise de Blumenthal, a pessoa temperamental normal explode e após rancor posterior reflete sobre o erro e procura se retratar; e a pessoa TPA tem explosão descontrolada e rancorosa e posterior resistência à reflexão e retratação exigidas, com o remorso aparecendo tempo depois, após sofrer as consequências.
     Assim, seguindo-se essa linha de análise, a pessoa psicopata aparenta distinção maior, o que não é necessariamente fácil, dado o poder manipulador e convincente. Uma tendência narcísica e se posar de vítima acompanhando os sinais clássicos podem ajudar no diagnóstico.
     Em conclusão, vale salientar que cada um de nós tem uma caixa-preta psicológica, cujo conteúdo nem nós mesmos conhecemos em absoluto. Então, até prova em contrário, não devemos confiar em ninguém à primeira vista. Pois, o perigo social pode estar perto, ao nosso lado, ou na nossa casa. Em qualquer das duas versões.
    
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Imagem: Google

Notas da autoria
1. No Brasil impera a cultura de imunidade que facilita o cometimento de crimes comuns ou políticos.
2. Sigla de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, ligado ao comportamento.
3. Bolsonaro.

Par saber mais
https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-antissocial-tpas
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000600005
- https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/04/psicanalistas-veem-bolsonaro-com-atitude-paranoica-e-onipotente-diante-da-pandemia.shtml
- https://www.pragmatismopolitico.com.br/2018/07/psicopatas-reabilitados-saude-ciencia.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/01/reflexao-psicopatia-de-bolsonaro-e.html



quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Reflexão: psicopatia de Bolsonaro e crise civilizatória


     As notícias mais recentes que viralizaram nas redes sociais sobre a crise na saúde foram mais do que suficientes para finalmente houvesse, por parte da mídia, o interesse sobre o "espectro interior" do presidente Jair Bolsonaro.
     Surpreende que só agora houvesse percepção, ou preocupação da mídia em relação ao tema. Este blog já versou sobre, e agora volta com novas reflexões, desta vez analisando por aspectos mais psiquiátricos.
     Mas, antes, será mostrado um compilado de fatos que se marcaram pela revelação de uma personalidade obscura e antissocial que foi eleita para presidir uma nação, para melhor compreensão do público sobre a dinâmica do assunto.

-> Compilação de relevâncias de um perfil

Antes da presidência
     Por não haver menção de comportamentos anteriores, este item compila fatos a partir da passagem de Bolsonaro nas FFAA, que arcaria seu CV comportamental a revelar uma visão pessoal distorcida.
     Foi um militar agressivo, indisciplinado, rebelde e indiferente à ética institucional. Fi resistente às advertências e à prisão disciplinar. Saiu das FFAA como capitão da reserva aos 33 anos, após laudo psicológico com dados "arriscados". Em seguida entrou na política.
     Na política ele se imunizou com liberdades que o fariam amado por alguns e odiado pela maioria. No Legislativo foram 26 anos de insultos provocativos a colegas e populares, sobretudo a mulheres e homossexuais. Eis, os fatos mais conhecidos, segundo Congresso em Foco de 2017:
     - Pinochet devia ter matado mais gente. Em 1998.
     - No período da ditadura deveriam ter fuzilado uns 30 mil corruptos, a começar pelo presidente Fernando Henrique, em 1999.
     - Eu não corro esse risco, meus filhos foram muito bem educados. Sobre um filho namorar negra.
     - Não vou combater nem discriminar, mas se eu vir dois homens se beijando na rua, vou bater. Em 2002.
     - Desaparecidos do Araguaia? Quem procura osso é cachorro, em 2009.
     - O filho fica assim, meio gayzinho, leva um couro e muda o comportamento dele. Em 2010.
     - Sou preconceituoso com muito orgulho, em 2011.
     - Seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra por acidente do que aparecer com um bigodudo por aí - em 2011.
     - Fui ser deputado federal para não andar de ônibus, fusca, van, e morar bem, em 2013.
     - Não te estupro porque você não merece, para a então colega Maria do Rosário em 2014.
     - Mulher deve ganhar salário menor, porque engravida. Quando ela voltar [...] vai ter mais um mês de férias, ou seja, trabalhou cinco meses em um ano. Em 2015.
     - O erro da ditadura foi torturar e não matar. Em 2016.
     - Sou capitão do Exército, minha missão é matar, em 2017.
     - Defendo as milícias porque elas são a segurança nas comunidades, em 2017.
     Em entrevista nos anos 1990 revelou sonegar impostos; anos depois foi denunciado por depositar em grana viva R$ 200 mil da JBS nos cofres do então PP. Recentemente o Brasil saberia que os Bolsonaro costumeiramente movimentam enormes somas suspeitas em grana viva.
     Católico, viu nos fiéis neopentecostais de Macedo e correlatos um grande instrumento coletivo, com a ajuda das TICs, para o seu poder de intenções reacionárias e caóticas. Nesse contexto, ele se elegeu presidente da República.

Na presidência: resumo analítico
     Neste item, não serão enumerados fatos em si por causa da grande quantidade e a sucessão rápida dos mesmos, se centrando num resumo analítico dos mesmos.
     Para seus sectários e fãs, a falas mostram o tipo "sincerão", e a aliança com os neopentecostais, o "cristão pela família e os bons costumes". Muitos destes só iriam se dar conta de ser um personagem mais recentemente, quando as iniquidades se avolumam. 
     O ideário de segurança pública se tornou um caos que piorou a relação das PMs com a população, ocorrendo guerras urbanas. As milícias assimilaram inaudito poder de fogo, e alguns grupos se aliaram ao tráfico tornando-se narcomilicianos - com aval do presidente.
     Propôs liberar armas (até fuzis) para a geral; acabar com radares nas estradas; retirar multa de quem tira cadeirinha para crianças; findar exame toxicológico em motoristas de caminhões e ônibus; liberou mais de 300 agrotóxicos proibidos no resto do globo; negou água e produtos de higiene aos indígenas.
     Guedes foi nomeado para piorar a crise. Conseguiu queimar 10% da reserva de U$ 380 bilhões em 2019, faz incessantes cortes de recursos da área social, repassou quase R$ 2 trilhões3 aos bancos, aumentou impostos e quer privatizar estatais restantes, entre outros negócios escusos não divulgados pela grande mídia.
     E notícias mais recentes: Guedes disse que auxílio emergencial só com corte na tão cortada saúde, enquanto ressoa o escândalo cartão corporativo de compras de Bolsonaro com mais de 1,8 bilhão em mercado, com valor de milhões só em chicletes, sem falar no resto. 
     O caos na saúde amazonense com falta de oxigênio, que aos poucos assola o país, não foi iniciativa de Pazuello, mas da pasta da Economia que brecou recursos para a compra dos galões. Mas, tudo tem, necessariamente, aval ou mando do presidente, que se manifesta contra a OMS e as vacinas.
     Sobre a saúde e a C19 à qual se liga o caos supracitado, já foi citado neste blog a estratégia política em disseminar o vírus, conforme largamente divulgado pela mídia. O vírus se tornou um instrumento poderoso de morte, cujos dados oficiais se aproximam de 220 mil. Bolsonaro rindo à toa.

-> Reflexões finais

     Defesa a torturadores, refutação das normas sanitárias relativas à C19, desprezo à vida, o semeio da anomia social pelo desregramento das leis e esfacelamento da República, estímulo a atos de altíssimo risco, obstrução e interferência na justiça e outras instituições, tudo são mais do que indicativos.
     Todos os fatos acima são mais do que suficientes para um diagnóstico clínico: Bolsonaro não é louco, é psicopata, conforme matéria de abril do ano passado, mas só vindo à tona agora. E não é dos mansos: a provada ligação a grupos criminosos que assolam o Rio não deixa mentir.
     Pela psiquiatria, psicopatia e sociopatia são Transtornos de Personalidade Antissocial (TPAS)4, com padrão de descaso às consequências de seus atos e direitos dos outros, cometimento de atos ilícitos e trapaças diversos, com prazer e sem remorso, e uso dos próximos para se bel prazer.
     Segundo Morana et al (2006), sociopatia é termo para "diagnóstico médico", e psicopatia é usado para "diagnóstico legal", e mais conhecido entre a geral. Todavia, ambos denominam um mesmo mal, que pode ser heterogêneo e de leve a grave.
     Bolsonaro tem vários sinais sociopáticos: usa seus ministros para fazer seus desmandos; nega a própria culpa alegando a outros; mente o tempo todo; gasta muito com superfluidades; nega a política contra a C19 e outros flagelos de saúde e sociais; debocha das consequências trágicas de seus atos.
     Seu sorriso é um esgar. Seu olhar, penetrante, mas sem sentimento. Não há remorsos, sentimentos. Ele sabe o que faz, pois tudo é bem calculado. Cada vez mais cercado pelas investigações, reage com xingamentos, chantagens e ameaças. 
     Autocentrado e autocrático, Bolsonaro vê os fins justificarem os meios. Como político, mostra ter frieza e método, em ápice na presidência. Suas ações políticas são extensões de seu eu, a sua índole traduzida na sucessão de tragédias calculadamente premeditadas.
     Muitos eleitores de Bolsonaro se arrependeram de sua escolha, o que é perfeitamente normal, até louvável. Mas há um séquito fiel, diminuto, mas fanático, que faz um tremendo barulho, outra mostra de um dom fácil aos psicopatas: o poder convincente, não importam as provas concretas em contrário.
     Um dado certo é que a eleição de Bolsonaro nos mostra, ao menos, um ponto bom, mas dolorido mesmo assim: informação prévia é sempre valiosa, desde que seja por meios mais confiáveis, que destrinchem a vida pregressa dos candidatos. 
     Muitos foram os nomes que surgiram para aparecer e depois caírem o esquecimento. Mas isso só favoreceu a repetição da história, com novos nomes. Bolsonaro é só mais um exemplo desse erro estúpido. Agora é lutar para que ele vire uma espécie como memória indelével, para que a história nunca mais se repita.
     
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Imagem: Google

Notas da autoria
1. TICs = tecnologias de informação e comunicação, pelas quais Bolsonaro foi votado via disparos em massa de fake news.
2. Resultou do boom da venda de commodities principalmente na era petista.
3. Estimativa pessoal: desde maio de 2020 a grande mídia tem poupado o Guedes silenciando-se nesse tema específico.
4. Será tema de artigo próximo na categoria #Curiosidades.

Para saber mais
https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/05/e-dai-o-esgar-genocida-e-dai-lamento.html
https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/05/o-churrasco-necropolitico-ele-nao-e.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/01/analise-o-pior-golpe-e-o-do-capital.html
https://www.conversaafiada.com.br/brasil/bolsonaro-nao-e-louco-e-um-psicopata-diz-psicanalista
https://www.onzedemaio.com.br/psicalalista-afiirma-bolsonaro-nao-e-louco-e-psicopata/
https://www.apufsc.org.br/2021/01/22/pesquisa-revela-que-bolsonaro-executou-uma-estrategia-institucional-de-propagacao-do-coronavirus/
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-antissocial-tpas
- https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/as-frases-polemicas-de-jair-bolsonaro/
- https://catracalivre.com.br/cidadania/bolsonaro-assume-propina-ao-explicar-doacao-de-r200-mil-da-jbs/
- https://www.redebrasilatual.com.br/economia/2020/01/venda-de-reservas-internacionais-pelo-governo-deixara-brasil-vulneravel-a-crises-externas/
- https://br.financas.yahoo.com/noticias/parasita-e-o-sistema-financeiro-protegido-por-guedes-reage-sindicato-a-fala-do-ministro-142444578.html
- https://brasil.elpais.com/brasil/2021-01-21/pesquisa-revela-que-bolsonaro-executou-uma-estrategia-institucional-de-propagacao-do-virus.html
- Morana et al (2006) - https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000600005





 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

# O perfeccionista ao extremo


Às vezes lidamos com gente tão perfeccionista que chega a nos dar aflição. É sobre essas pessoas que se trata o décimo-terceiro artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de personalidade.
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     Ele se esmera no seu escritório nos mínimos detalhes. Maços de papel perfeitos, o monitor e o teclado à frente bem alinhados. Pastas organizadas por cor no armário. Tudo impecável, perfeito
     A equipe se acostumou ao seu jeito, mas não à chatice. Uma manchinha na mesa motiva reclames. Os demais não sabem, mas ele tem um transtorno, silenciado pela vergonha.
     Este artigo tem por objetivo versar sobre dois transtornos psíquicos bem parecidos, mas distintos.

-> Dois transtornos, uma confusão
     
     Este tópico visa mostrar distinções sobre dois fenômenos muito confundíveis pela semelhança, mas diferentes: o Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva (TPOC) e o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC).

TPOC: características gerais
     É um fenômeno psíquico de preocupação exagerada com a organização, muita inflexibilidade e perfeccionismo que pode interferir nas tarefas cotidianas. O sujeito TPOC é rígido, inflexível, teimoso e desconfiado, recusando ajuda em suas tarefas e tendo atuação solitária.
     Ele se preocupa tanto com perfeição e controle que tudo tem que ser feito de modo bem específico. Verifica detalhes minuciosos, listas, documentos, procedimentos, cronogramas e regras. Daí não terem bom proveito de tempo, atrasando a conclusão de tarefas importantes.
     Com a equipe, pode mostrar lista de detalhes a serem seguidos, se chateando (ou negando) com alternativa sugerida por colegas. Sua excessiva dedicação ao trabalho e produtividade pode deixar em segundo plano o lazer, que deve ser perfeito para ser vivido.
     É afetivamente muito controlado, sério ou formal. Pode ser racionalista e não tolerar uma expressão emocional. Pode ser fanático e moralista consigo e com os outros. É obediente aos superiores e defende seguimento exato das regras, sem tolerar atenuantes circunstanciais.
     Prevalência: varia de 2,1% a 8% na população geral; mais comum entre homens.
     Comorbidade: depressão maior ou distímica; abusos de álcool. A maioria dos casos é isolada.
     Etiologia: possivelmente traço familiar de compulsividade, perfeccionismo e rigidez.
     Diagnóstico: critério específico DSM-V; sinais-chave: preocupação persistente com perfeccionismo, ordem. Outros: preocupação (detalhes, regras, horário, etc.); esforço de perfeição que interfere no tempo; dedicação excessiva ao trabalho; rigidez excessiva; relutar em  dividir tarefas; etc. 
     Diferencial: TOC (obsessão com ritualismos?, ou com ordem e perfeição?); TPEsquiva (isolamento social se deve ao trabalho ou para evitar relações?); TPEsquizoide (formalidade por rigidez extrema ou por incapacidade de intimidade?)
     Tratamento: psicoterapia psicodinâmica e medicação com inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs).

TOC: características gerais
     É um fenômeno psiquiátrico com pensamentos, compulsões e obsessões indesejados, recorrentes e persistentes, e comportamentos repetitivos (compulsões) inconscientes para tentar minar ou prevenir a ansiedade ligada às obsessões. Tem gravidade bem variável e gera sofrimento ao paciente.
     A tríade indesejada causa angústia ou ansiedade acentuada. Os pensamentos intrusos são de danos, riscos a si e/ou a outrem, contaminação, dúvida, perda ou agressão. Esses pensamentos impulsionam atos repetitivos (compulsões). O paciente luta para inibir pensamentos e compulsões.
     As compulsões são várias: asseios, verificações de detalhes, contagem, ordenação de objetos em padrão específico. Especialmente se ligadas a eventos reais, são feitas várias vezes por dia. Em casos extremos, a soma sintomática interfere tanto na vida do paciente que este tem incapacidade laboral.
     A luta do paciente contra a ansiedade se deve por reconhecer serem infundadas muitos pensamentos, mas, conscientemente ou não, considera outros razoáveis. Esconde seus ritos e obsessões temendo os constrangimentos e estigmas. Daí romperem relações afetivas e se isolarem socialmente.
     Prevalência: de 1 a 2% da população geral, maioria no sexo feminino (EUA).
     Comorbidade: ansiedade (76%), bipolar (63%), depressão maior (41%), TPOC (23 a 32%).
     Etiologia: componente possivelmente familiar ou pressão ambiental (inconclusivo)
     Diagnóstico: história clínica dos pensamentos e compulsões que demoram pelo menos 1 h/vez1. O diferencial com TPOC é principalmente pela conduta psíquica e comportamento.
     Tratamento: Psicoterapia de exposição e prevenção de rituais, e medicação com clomipramina ou ISRSs. 

-> Considerações finais

     O objetivo inicial deste artigo foi, na medida do possível, expor diferenças de dois transtornos, que são confundidos pelas semelhanças de nome. Mas vale nessas considerações finais expor mais uns dados importantes.
     É possível que a maioria dos leitores possa identificar em si a presença de um comportamento ritual ou, então, uma preocupação intensa em organizar as coisas ou esmiuçar detalhes. Mas identidade de um caractere ou outro não vai significar, necessariamente, um diagnóstico. 
     Um motivo que pode explicar isso é a exigência contemporânea, aliada à sofisticação tecnológica incessante que impõe novos detalhes em tarefas e, daí, novas preocupações que podem nos deixar ansiosos ou preocupados em organizar dados.
     Pacientes com qualquer um desses transtornos são, de fato, estigmatizados, e como há confusão, ambos os transtornos são tidos pelo senso comum como TOC. Justamente porque possamos ter um ou mais caracteres encaixáveis com um dos males, devemos sempre refletir antes de julgar.
     Os pacientes TOC e TPOC devem assumir assumir as suas respectivas condições, e pelo sofrimento ocasionado, procurar um profissional. O TOC necessita de ajuda psiquiátrica, mas muitos psiquiatras fazem psicoterapia, o que facilita muito diante da crescente dificuldade de acesso a psicólogos.
     Para os pacientes TPOC, a ajuda profissional é a garantia de melhora plena dos "defeitos". Para os TOC, pode ser o passo da melhora plena ou mesmo a cura. É o caminho para a conquista de uma vida praticamente normal e de qualidade.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. H/vez: hora por vez (abreviatura)

Para saber mais
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-obsessivo-compulsiva-tpoc
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtorno-obsessivo-compulsivo-e-transtornos-relacionados/transtorno-obsessivo-compulsivo
- https://www.psicologiasdobrasil.com.br/voce-sabia-que-transtorno-obsessivo-compulsivo-toc-e-diferente-de-transtorno-da-personalidade-obsessivo-compulsiva/


domingo, 24 de janeiro de 2021

#Curiosidade: O narcisista 


A figura ao lado é uma obra-prima de Caravaggio (1571-1610), Narciso. E ela inspira este décimo-segundo artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de Personalidade, para falar sobre o transtorno dos que se amam demais.
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     Ele carrega em si a máxima: "o maior e melhor amor da sua vida é você mesmo", e a solta com toda a naturalidade para aqueles que no momento estão tristes ou deprimidos, como se estes fossem milagrosamente se alegrar.
     Como resposta à pergunta do amigo, triste devido a um plano malsucedido, ele apenas aconselhou, sem nenhuma empatia no olhar, com arrogância a subestimar o amigo por uma situação momentânea.
     Pode ser minimamente estranho, mas pois bem, caros leitores, esse comportamento pode não ser um problema de caráter que sugira um propósito. Pode ser um transtorno narcísico, e o personagem seco pode nem saber disso.

-> Conceito, características, comorbidades, diagnóstico e tratamento

     O Transtorno de Personalidade Narcisista ou Narcísica (TPN) é uma alteração psíquica ligada à regulação da autoestima, e daí se acharem merecedores de adulação constante. O nome do transtorno se liga ao mito de Narciso. 
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     Narciso era filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope, e tinha uma irmã gêmea. O adivinho Tirésias previu que ele teria uma vida longa, desde que nunca visse a sua própria imagem. Ele era apaixonado por sua irmã, com quem se parecia em beleza.
     Um dia ela morreu e, desgostoso, Narciso se debruçou sobre um lago para ver em seu reflexo a imagem de sua irmã. E teve o seu fim. Onde estava seu corpo, restou apenas uma flor, o narciso.
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     O paciente TPN necessita ser bajulado para se sentir bem consigo. Superestima seus atributos e realizações e subestima os alheios. Se acredita único, original e especial, também na aparência e na vida amorosa. Daí as suas interações sociais se limitarem a pessoas tão especiais quanto ele mesmo.
     Arrogante e altivo ao subestimar os outros, o paciente TPN se revela sem empatia, sendo impedido de estabelecer interações sinceras.
     Como depende de elogios constantes e ainda quer saber o que pensam dele, o paciente TPN tem, na real, autoestima frágil. Não suporta a menor crítica negativa e seus próprios fracassos, e responde com raiva ou desprezo, reagir com violência ou se afastar, numa pseudo-aceitação para proteger o seu ego grandioso. 
     Por conta dessas características e da extrema seletividade de interações, o paciente TPN evita, na medida do possível, situações passíveis de falhas. Por isso, eles podem ter dificuldade de se realizar profissionalmente de fato, uma vez que falhas são inevitáveis ao longo da vivência.
     Etiologia: componente hereditário possível, que pode ser explicado também na forma da criação da criança (excesso de críticas ou de elogios) 
     Prevalência: varia entre 2% e 6,2% na população geral (EUA), principalmente no sexo masculino.
     Comorbidade: comum. Depressão maior ou distímica; outro transtorno de personalidade (paranoico, borderline, ou histriônico); casos situacionais se ligam a abusos de tóxicos como a cocaína.
     Diagnóstico: critérios específicos via DSM-V; sinal-chave: ego grandioso e necessidade de elogios. Outros: sensação infundada da própria importância; fantasias de realizações ilimitadas ou de poder; se sentir especial; relações somente com quem tem "alto calibre"; falta de empatia.
     Deve ser diferenciado da personalidade antissocial devido à motivação da exploração de outrem; do bipolar porque sua mudança de humor se liga à autoestima; e da personalidade histriônica porque só querem ser sempre admirados. 
     Tratamento: psicoterapia psicodinâmica; medicação só em comórbidos com depressão ou paranoico e mesmo assim, depende estritamente da gravidade.

-> Reflexões finais

     Se somos sadios em nossa estrutura afetiva e psicossocial, temos autoestima normal. Suportamos uma crítica mais pungente e nos lisonjeamos com um elogio e seguimos nossas vidas. Mas, se a pessoa se ofende à menor crítica e adora bajulações o tempo todo, aí tem coisa errada.
     Mas, não é nada fácil distinguir o no normal do transtornado. O que pode caracterizar o TPN é a incapacidade do sujeito em controlar a sua necessidade de elogios e autoestima, gerando sofrimento. Porém, ainda ocorrem outras fatores que dificultam distinguir o normal do patológico.
     Um ambiente favorável a comportamentos de alta seletividade, arrogância e troca de bajulações é aquele em que se juntam pessoas que se declaram eruditas devido aos seus CVs1 de peso e certo poder financeiro.
     Por motivos como esse, os pesquisadores estatísticos em saúde mental têm sérias dificuldades em definir prevalências. A dominância do TPN entre homens pode se ligar ao ambiente que sugere uma suposta superioridade masculina em papel social, rendimento e até inteligência.
     Mas, uma vez tendo um familiar ou amigo diagnosticado com TPN, vale avisar da necessária ajuda profissional constante, cuidando-se em especial se for comórbido grave, que pode precisar de fármacos adequados. 
     O importante é salientar que todo sofrimento mental tem jeito, e na maioria dos casos tende a ser tratamento temporário. Por isso, nunca nos descuidemos, em nome da qualidade de vida.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. CV = curriculum vitae. No texto aparece no plural.

Para saber mais
https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-narcisista-tpn
https://pt.wikipedia.org/wiki/Transtorno_de_personalidade_narcisista
https://arteeartistas.com.br/narciso-de-caravaggio/


sábado, 23 de janeiro de 2021

Análise: o pior golpe é o do capital


     Há poucos dias, duplamente nocauteado pela direção da Anvisa por aprovar a Coronavac e criticar o fracassado kit-C19, Bolsonaro reagiu para declarar que caberia às Forças Armadas decidirem se o povo brasileiro continuará na democracia ou se voltará a viver na ditadura.
     Como mostrado em várias mídias e no artigo anterior a este, a geral entrou em polvorosa, por envolver as Forças Armadas, sem pensar que a declaração de Bolsonaro viola a Constituição e o próprio regimento dirigido aos militares de não se manifestarem politicamente.
     Além da aparente distância das FFAA com o presidente, outros fatores a tornar a declaração um mero desabafo é que os poderes presidenciais são limitados pela atuação do Legislativo Nacional e pelo Judiciário dos Tribunais superiores. Bem, e os numerosos crimes de responsabilidade...
     Mas, enquanto a geral se preocupa, em plena violência da C19, com as bravatas de Bolsonaro, há um outros planos na esfera de governo que deveriam preocupar, e este artigo objetiva mostrar em análise. Planos que são verdadeiros golpes.
     
-> O golpe Guedes 

     O ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, já foi tratado neste blog, nos artigos Guedes, o submarino sob a tempestade, e Quem de fato governa o Brasil?. Neste, se trata sobre seu protagonismo e naquele, sobre como ele conduz o governo enquanto outras tempestades sugam a atenção do povo.
     Guedes é uma figura controversa, com várias faces, cada qual com nuanças peculiares, conforme quem interpreta as suas ideias e atuação. A visão anarconeoliberal combina com governos autoritários como o de Pinochet, para quem trabalhou reduzindo o Estado chileno a mero fiscal administrativo e de segurança ideológica.
     Penalizou tanto os populares chilenos com a perda de acesso a serviços essenciais e previdência que, passadas as trevas da ditadura, hoje evita visitar a "Suíça latina". E segue para fazer o mesmo aqui.
     Aceitou ser ministro de Bolsonaro pelo viés autoritário e neoliberal. Só não decolou ainda porque a crise que ele mesmo criou por irresponsabilidade se tornou a grande barreira. 
     Especializado em especular, ele aproveita um evento oportuno como a C19 para forjar crise e agir transformando grande parte dos recursos públicos em títulos da dívida para mimar o sistema financeiro. Com isso cria-se uma ditadura da miserabilização das classes populares e médias.
     Nesse sistema anarcoliberal com formato de liberdades individuais plenas (na prática, só para quem tem $), Guedes trabalha, blindado pelo silêncio e pelas atenções da geral a outras coisas.

-> O golpe fundamentalista

     Damares Alves também já foi abordada em alguns artigos, como os exemplos Cristofascismo, base bolsonarista e A frase de Damares: uma reflexão crítica. Em ambos se trata sobre o seu perfil pessoal e sua atuação enquanto figura religiosa à frente de um ministério teoricamente de direitos humanos.
     A indicação dessa pastora neopentecostal é fruto da influência de dois títeres do radicalismo cristão brasileiro, em especial Edir Macedo (IURD) e Silas Malafaia (Assembleia de Deus Vitória em Cristo - ADVC) que, diferenças pessoais à parte, têm afinidades que valem ser apontadas.
     São trilhardários, arrancam dinheiro dos fiéis com apelações, até têm passagens suspeitas. Não têm carreira política, mas influenciam os parlamentares evangélicos e o governo Bolsonaro.
     Defendem a moral social cristocêntrica e não toleram crenças não cristãs, embora não assumam ao público. Enquanto Macedo utiliza seu poder econômico sobre os políticos, Malafaia é cristofascista.
     O cristofascismo é a soma de fascismo e cristianismo, um elemento vital do bolsonarismo que se concretiza nos também ministros Milton Ribeiro (MEC) e Mendonça (Justiça).
     Não por acaso, Bolsonaro cobra do Congresso análise da agenda de costumes, um grupo de pautas conservadoras no momento engavetadas, como o Escola sem Partido, proibição de assuntos de gênero na escola, os estatutos da família e do nascituro, o tal cura gay, etc.
     Minimizada pela opinião, ela tem seus riscos, pois muitos direitos podem ser perdidos, via vedação total do aborto, exclusão de tipos familiares, etc. Os LGBTIs pode ficar ainda mais vulneráveis.
     Outra pauta é a evangelização dos indígenas: Bolsonaro nomeou um pastor para presidir a Funai e enviar missões sobre grupos isolados que mantêm tradições ancestrais. A evangelização é crime por lei, mas está muito frequente na era bolsonarista.
     A pecha de doida de Damares, vendida através de traumas de infância, engana. Fiel ao presidente, negou proteção às vítimas1 de violência doméstica e LGBTIfobia, e tentou impedir abortos terapêuticos de meninas2 estupradas, geralmente por familiares. Daí ser peça importante nessa classe golpista.

-> O golpe genocida: reflexões finais

     "Minha especialidade é matar". Essa declaração do então deputado Bolsonaro na tribuna da Câmara foi muito mais do que uma afirmação. Foi um recado, um aviso bem claro sobre quem ele é e como é valiosa a prudência no voto. Mas, seus fãs interpretaram diferente e o elegeram presidente.
     Desde então deparamos com a morte como marca de governo, pelos mais diversos meios, desde todas as violências tradicionais conhecidas na cidade, no campo e na floresta, até arrochos econômicos sucessivos e a disseminação descontrolada da C19.
     Não era para se estranhar. Mas é inédita a legitimação de agentes e meios de morte. Movimentos criminosos organizados são os agentes legitimados a cometerem, à vontade, as citadas atrocidades. Na economia, quem ordena os crimes contra a economia popular e os serviços essenciais é Guedes. 
     Pazuello, ministro da saúde, é o agente a assinar a negação da salvação de vidas na C19, sob mando direto de seu chefe, que reiteradas vezes repetia sua antipatia e desprezo nas suas declarações a cada milhar de mortes. E tudo começou em meados de 2020, recusando todas as propostas possíveis.
     Como celerados lobotomizados, os bolsominions são os agentes da transmissão horizontal da morte como manda o seu ídolo, aparentemente sem perceber serem também alvos desse ultramicroscópico e eficiente instrumento que ajudam a espalhar.
     O vírus dá conta do recado em matéria de mortes certeiras e sofridas, e parece avisar as pessoas da desnecessidade das armas, pois polícia, FFAA, tráfico, milícias e narcomilícias possuem verdadeiro arsenal que deveria ter destino restrito, mas é usado à larga, à vontade por esses grupos.
     Ele está também em espaços que a geral evita apontar: as megaigrejas neo e pentecostais, que têm estado lotadas mesmo na onda mais letal da sindemia (eles sempre desafiaram a ordem da justiça). Os pastores também são agentes ativos e seus fiéis subordinados na propagação do vírus.
     Por tudo isso, há um genocídio em andamento, e corre livre, leve e solto como alegres crianças num parque. Na lei brasileira, a pena capital só se legitima em casos de guerra, mas na vida real corre todo dia e o país está em guerra, na qual, somados, quase 300 mil3 vidas foram ceifadas, mais de 216 mil delas só pela C19.
     Está explícito, diante e para ciência de todos, que Bolsonaro institucionalizou a propagação do vírus da C19. Mas não só ele. Os demais meios e agentes citados tiveram seu aval. A única diferença é a inalcançável eficácia do vírus, graças aos seus agentes.
     Mas, vale fechar: essa mixórdia ocorreu a mando daqueles poderosos deitados no berço esplêndido do grande capital. Toda essa guerra é parte do pior dos golpes, o do capital. Como subordinado direto, Bolsonaro foi "apenas" o mais eficiente deles.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. Pessoas de todas as idades, sexos, classes sociais e outros, vitimadas pela violência doméstica.
2. Embora não explícita nos textos jurídicos, a abordagem dessa realidade é tratada como jurisprudência
3. Conforme soma de dados oficiais, excluindo subnotificações. 

Referências
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/08/quem-de-fato-governa-o-brasil-cada.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/06/guedes-o-submarino-sob-tempestade.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/01/a-frase-de-damares-uma-reflexao-critica.html
- https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2020/03/cristofascimo-base-bolsonarista-alves.html
- https://theintercept.com/2020/05/01/cristofascismo-bolsonaro-pascoa/
- http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/600150-cristofascismo-uma-teologia-do-poder-autoritario-a-uniao-entre-o-bolsonarismo-e-o-maquinario-politico-socio-religioso-entrevista-especial-com-fabio-py
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Cristofascismo#:~:text=O%20termo%20cristofascismo%2C%20uma%20combina%C3%A7%C3%A3o,caracterizou%20como%20totalit%C3%A1rios%20e%20imperialistas.
- https://valor.globo.com/politica/noticia/2020/12/16/bolsonaro-precisa-da-agenda-de-costumes-na-camara-para-se-reeleger-avalia-maia.ghtml
- https://brasil.elpais.com/brasil/2021-01-21/pesquisa-revela-que-bolsonaro-executou-uma-estrategia-institucional-de-propagacao-do-virus.html

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Reflexão: a real ameaça da bravata 


     A semana mal começou, e o presidente Jair Bolsonaro declarou em tom ameaçador: "As nossas Forças Armadas decidirão se ainda viveremos na democracia ou numa ditadura". A fala deixou muita gente ouriçada, já imaginando tanques de guerra a desfilar nas ruas.
     É uma reação compreensível, afinal é um temor de algo que as pessoas na mais sã consciência não desejam de volta. Mas, foi uma reação irracional, instantânea, ou seja, puramente impulsiva.
     Pois vale concatenar vários fatos, dos quais a maioria possa não ter noção ou acredite não haver ligação. Mas há, e este artigo tem como objetivo fazer uma reflexão sobre as motivações da fala e as suas possíveis implicações.

-> Bolsonaro: um poder realmente militar?

     Ao nomear vários militares para vários órgãos, inclusive estratégicos em matéria de importância nacional, Bolsonaro passou para a patuleia aquela boa e enganosa impressão de que "finalmente as coisas vão funcionar". Bem, não necessariamente.
     A ocupação de cargos por militares em instâncias do governo não é novidade. Sempre houve alguns, mas nem na ditadura de 1964-85 foram tantos nomeados como agora, que conta com mais de 10 mil deles. Em maioria, a única atividade é ter adendo nos seus já vultosos soldos.
     Há um regimento disciplinar do pós-ditadura, segundo o qual as FFAA não devem participar de atividade política. O que, pelo visto, tem sido desrespeitado, ou foi revogado e ninguém soube.
     A pose de mando dos militares é enganosa. Bolsonaro foi claro: eles são subordinados. O que tem se mantido, independente de eventuais roubos de cena pelo vice Mourão, o chefão do GSI1 Augusto Heleno e o ministro da saúde Eduardo Pazuello.
     Aliás, Pazuello é mostra inconteste de que qualificação não interessa para ocupar cargos de chefia. Bolsonaro poderia chamar um oficial médico, mas espertamente negou: o médico seria uma barreira a seus propósitos mais instintivos. Uma mostra de que as flores da relação são escolhidas a dedo.
     Em janeiro de 2019 vários saíram, ofendidos pelo histriônico Olavo de Carvalho, e Bolsonaro nada fez por eles. Os militares têm olhado com reserva as políticas tortas de seu líder. Eles conhecem bem a sua passagem nada alvissareira no Exército, e seu assustador laudo psicológico clínico.
     O caos na saúde amazonense parece tê-los reaproximado. Mas é só por conveniência financeira e de poder. E só. Quarteis continuam sem comida para os soldados e sem munição e armas à larga, por falta de tradição guerreira - apesar da ampla publicidade para atrair os jovens.
     A falta de recursos materiais suficientes é um indicativo de que a ideia de Bolsonaro não seja mais do que outra de suas intermináveis bravatas para distrair a geral, em plena segunda alta da C19.

-> Utilidade das FFAA e a real de Bolsonaro
 
     Mera bravata ou intento de golpe real, a fala de Bolsonaro, segundo Juan Arías, não deve ser vista como brincadeira, mas como perigosa ameaça à democracia, na tentativa de ele tentar se manter no poder a todo custo, por se acreditar "enviado e blindado por ele", como alguns pastores já disseram.
     Isso revelaria a utilidade dos militares no governo Bolsonaro: uma barreira contra todo intento de impeachment pelo parlamento. Deus usa farda e porta arma. Uma ideia de efeito especial entre jovens interessados na carreira militar ou ideólogos militaristas. 
     Não é tão por acaso que o ministro Paulo Guedes, em 22/4/2020, fez a perigosa proposta sobre alistamento de jovens para treinar nas FFAA por um ano e, também, a recente proposta de Bolsonaro junto aos parlamentares sobre as polícias regionais mais... autônomas.
     Todavia, vale ressaltar que não há publicação de reação das FFAA às propostas de Bolsonaro. Reina um silêncio sepulcral, que dá margem a interpretações muito diferentes. 
     A mais possível delas seria o famoso "quem cala consente"; outra pode ser um "deixa disso". O mais provável, no entanto, pode ser o silêncio a mando de algum dos milicos mais leais ao presidente, para evitar vazamento na mídia.
     Mas há outra circunstância interessante a lembrar: a bravata serviu como reação do presidente ao próprio nocaute devido à aprovação da famigerada Coronavac e às críticas ao Kit-Covid pela direção da Anvisa. E os militares que infestam a agência reguladora nem se lixaram para a manifestação.
     A aparente inação desses militares na Anvisa é um indicativo que não deve ser descartado. Ela pode dizer muita coisa, sendo a mais palpável a posição neutra em relação aos arroubos do líder atual. Até parecem distantes da ideia de impeachment: "ah, isso não é com a gente".
     Por tudo isso, a boquinha é o grande elo a ligar os militares a Bolsonaro. Um elo tão tênue que, ao menor sinal, tiram o seu da reta. Mas, e o golpe? Golpe? Ah, mordeu sim, mas logo assopra. Guedes não usa farda e é muito pior.

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Imagem: Google

Notas da autoria
1. Sigla de Gabinete de Segurança Institucional, um adendo à Abin, por sua vez um substituto do SNI da ditadura.

Para saber mais
https://www.defesanet.com.br/pr/noticia/33480/Bolsonaro-x-Militares---Cada-um-no-seu-quadrado/
https://politica.estadao.com.br/blogs/coluna-do-estadao/crise-na-amazonia-reaproxima-bolsonaro-e-militares/
https://maquinandopensamentos.blogspot.com/2021/01/bolsonaro-e-as-pms-prenuncio-de-golpe.html
https://brasil.elpais.com/opiniao/2021-01-18/o-desafio-arrogante-de-bolsonaro-que-acredita-ser-blindado-por-deus.html

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

#Curiosidade: sempre a chamar atenção


O tema surge por sugestão de um amigo estudante de Psicologia, que pretende se especializar na área de Psicologia Clínica.
Este é o décimo-primeiro artigo da categoria #Curiosidades, subcategoria Transtornos de Personalidade.
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     Numa roda de conversa entre amigos, num momento de família unida, num comício político ou mesmo durante um culto religioso, há sempre uma pessoa que faz de tudo para chamar a atenção dos demais presentes.
     Ou aquele que, num simples diálogo, o tempo todo impede o outro de falar, mas com vistas a chamar a atenção para si e/ou se impor como o certo na questão, impossibilitando o fluxo de uma troca sadia e civilizada de ideias. 
     O senso comum tende a imaginar tal comportamento como o de uma pessoa mal educada ou muito cheia de si, que desrespeite os demais. Sem conseguir imaginar que a pessoa tenha um transtorno de personalidade histriônica.
     É sobre este mal que o presente artigo tenciona abordar.

-> Conceito, características, comorbidades, diagnóstico e tratamento

     Somos seres bem relacionais, e por isso temos às vezes necessidade de atenção do outro, conforme a circunstância. Mas, se não for possível, sabemos que a atenção virá na hora oportuna, e tocamos a vida em paz. O que indica que não somos histriônicos. Mas, não é nada fácil identificar um.
     O Transtorno de Personalidade Histriônica (TPH) é uma alteração psíquica caracterizada por uma excessiva emotividade, constante busca de atenção e sugestionabilidade. Essa necessidade de atenção é constante e, se fracassado o intento, o paciente se aborrece ou se deprime dramaticamente.
     Para chamar a atenção, o paciente pode usar de charme sedutor, exaltar seus atributos no trabalho ou mostrar opiniões fortes, mas inconsistentes de bases e argumentos. Em esforço maior de atenção, fica dramático. A sugestionabilidade leva à confiança em pessoas nem sempre adequadas.
     No trabalho, se dirige especialmente às chefias para enfatizar seus atributos, mas, se levando pelo apontamento do outo, pode se aborrecer e simplesmente mudar de emprego. Pois é também imediatista: a atenção requerida tem que ser direta e rápida. Do contrário, sofre.
     A vida íntima é extremamente difícil, pois o frequente papel de vítima e manipulações emocionais a indicarem dependência ao parceiro causa um profundo desgaste no relacionamento. O rompimento da relação é especialmente traumático ao histriônico.
     Comorbidades: transtornos antissocial, narcisista, borderline, depressão maior ou distímica, ou um mal neurológico chamado transtorno de conversão. Casos isolados são mais brandos. A incidência é de mais de 2% da população geral1 (a suposta maioria feminina não é conclusa, merece mais estudos).
     Diagnóstico: critério clínico DSM-V; sintomas-chave: excesso de emoções e na necessidade de atenção; e entre outros, desconforto se não tem atenção; interações sempre provocativas; dramatização; sugestionabilidade; mudança emocional rápida e superficial; discurso impressionista, mas vago.
     Tratamento: basicamente, psicoterapia psicodinâmica. Não há prescrição de medicação, exceto para os casos com alguma das comorbidades citadas.

-> Reflexões finais

     Como qualquer outra pessoa com transtorno psíquico qualquer, o sujeito com TPH é estigmatizado no meio social. Ou, se os seus conhecidos sabem de que porta um transtorno, é visto como maluco ou sem noção.
     No senso comum, o sujeito TPH é quase sempre mal visto como carente demais ou provocador, devido à nossa ignorância sobre o distúrbio. O profissional o diagnostica por um método específico, distinguindo de transtornos parecidos como o dependente, borderline e narcisista.
     O sujeito TPH também pode ser tachado como o cheio de si, pela sua emotividade exaltada e teatral numa roda de debates, numa discussão relacional ou no trabalho. Ou, devido à provocativa aparência, não raro é tido(a) como perua (mulher) ou almofadinha ou gay (homem).
     É possível que o TPH seja mais comum do que se sabe até o hoje. Como no Brasil há preconceitos e negligência política sobre a saúde mental, os pacientes tendem a negar a sua condição e o tratamento, o que contribui para o agravamento de seu próprio sofrimento.
     Mas é necessário conscientizar que, a partir do momento em que se admite a sua condição psíquica, os pacientes dão um grande passo para a vida normal, seja pelo controle ou mesmo a cura. Afinal, os transtornos psíquicos não são loucuras, e muito menos o fim em si.
     
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Imagem: Google.

Notas da autoria
1. Conforme estatística de saúde mental nos EUA. No Brasil se estima uma estatística semelhante ou superior. 

Para saber mais
- https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-histri%C3%B4nica-tph
- https://diariodeuberlandia.com.br/noticia/24060/brasil-e-recordista-em-doencas-mentais

CURTAS 98 - ANÁLISES (Brasil- Congresso)

  A GUERRA POVO X CONGRESSO                     A derrota inicial do decreto do IOF do governo federal pelo STF foi silenciosamente comemo...